A Filha Do Sol escrita por Let B Aguiar, Taty B


Capítulo 27
Lar doce lar


Notas iniciais do capítulo

Oieeee pessoal! Como vão vocês? Cara, vocês não tem noção da minha emoção agora hahaha Tô postando o último capítulo da minha filha nos últimos meses ♥ Espero que você gostem tanto desse capítulo quanto eu! E é claro, achem que foi um bom season finale haha. Nos vemos lá embaixo, com uma surpresinha ;)



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O foco de mais de oitenta campistas se voltou para nós. Todos se reuniam em volta da fogueira e meus irmãos seguravam os instrumentos musicais, prontos para encerrar a confraternização. Talvez se tivéssemos surgido fantasiados como os Backyardigans não teríamos chamado tanta atenção.
– O que é isso? – uma campista de Afrodite berrou.
Franzi as sobrancelhas. Aparentemente tínhamos aterrissado bem, sem nenhuma surpresa. Do que ela estava falando, afinal? Observei o resto dos campistas e percebi que eles não olhavam para nós, e sim para nossas roupas.
Olhei para baixo e soltei um sonoro palavrão. Pela barba grisalha de Zeus! Essa era a retribuição de Afrodite? Eu estava usando um vestido branco longo de um ombro só, excessivamente adornado de detalhes dourados. Fitei minhas mãos e estas se encontravam cheias de anéis e pulseiras de ouro decoradas com pedras preciosas tão gigantes que sem dúvida custavam mais que minha casa e a poupança de mamãe junto. Um brinco de ouro grande pendia de minhas orelhas e um colar que completava o conjunto de joias pesava em meu pescoço. Mas o que mais me chocou foi a sandália de salto alto amarrada aos meus pés. Sem mencionar que todos os arranhões e cortes haviam se extinguido de minha pele.
Eu fiquei surpresa com toda aquela transformação. Não me sentia bonita e nem confortável. Vestidos, jóias e salto alto? Isso não era nem um pouco Patricia! De repente, me lembrei de algo importante: Kallistei. Por sorte, Afrodite também havia pensado na espada, e eu sequer tinha reparado que segurava uma carteira na mão esquerda. Meu arco e flecha estavam seguros em minhas costas e a mochila jazia aos meus pés. Deuses, que fim Afrodite deu para minhas botas? Xinguei-a mentalmente por ter feito isso. Nunca gostei de chamar atenção, e meu pior pesadelo se tornou realidade. Acredite, foi muito desconfortável.
– Por que ela está vestindo um Dior? – outra campista de Afrodite reclamou.
– Olhe essas jóias... isso é um absurdo!
A garota loira que havia levantado de seu lugar me olhava como um cachorro selvagem.
– Vocês não são filhos de Afrodite para ganhar a benção de nossa mãe! Isso é contra as leis!
Voltei meu olhar para os meninos e vi que eles, assim como eu, sofreram uma repaginada. Ryler vestia uma roupa comum: camiseta vermelha, shorts jeans surrados e um tênis sport. A sua vestimenta nem podia ser comparada com a espalhafatosa combinação que me foi reservada. Ele estava maravilhoso, pois não precisava de muito para roubar suspiros de uma garota. Então o choque veio. Ao lado dele, Leo vestia uma calça jeans, camiseta branca, uma jaqueta de couro e calçava um cortuno preto. O cabelo foi cuidadosamente arrumado num topete perfeito e ele até parecia ter passado por um procedimento estético no rosto. Leo estava... lindo. Agora eu tinha certeza que não estava desequilibrada ao achá-lo bonito. Ele só precisava se arrumar com mais frequência.
Quíron trotou em nossa direção e o chalé de Afrodite continuou protestando.
– Isso é ridículo! Nossa mãe só pode estar louca!
– Quíron, faça algo!
– Ela está vestindo um Dior! Você tem noção disso? Um Dior!
– Aposto que está calçando um Louboutin. Eu não tenho um Louboutin!
Quíron fez sinal para que ficassem quietos. O centauro os ignorou e nos fitou com seus olhos expressivos. Ele vestia uma camiseta neutra, sem nenhuma estampa bizarra, por incrível que pareça.
– Eles devem ter uma explicação muito boa para isso, não é mesmo?
– Na verdade, não. – eu fui sincera.
A menina de Afrodite bufou e fez menção de continuar falando, porém, Quíron a interrompeu.
– Por favor, recolham-se para seu chalé, filhos de Afrodite. Estendo esse pedido aos outros campistas, também. Peço para que apenas os conselheiros permaneçam. A fogueira está encerrada, tenham uma ótima noite de sono. Boa noite.
Os campistas não economizaram nas caras de quem comeu e não gostou e começaram a se retirar de pouco em pouco. O chalé de Afrodite continuou ralhando e Quíron os cortou, dizendo que conversariam depois. Piper tentava conter os ânimos de suas irmãs, enquanto eu morria de vontade de estapear cada uma delas. Meus irmãos pediram autorização a Quíron para me dar um abraço coletivo rápido. Eu estava morrendo de saudade deles e de todos os outros meus amigos.
– Por Apolo, você está viva! – Austin exclamou, impressionado até demais.
– E linda! Cara, você viu a reação do chalé de Afrodite? – Carlos zombou.
Johnny abriu caminho no meio dos meus irmãos e me abraçou como um panda.
– Johnny, você vai me matar! – balbuciei, ficando sem ar.
– Ai Pattie, que saudade que senti de você! Sua voz de passarinho fez tanta falta na hora da fogueira!
– Voz de passarinho? Que bela comparação!
Meus outros irmãos não tiveram tempo para tagalerar muito, porque Quíron os apressava para se retirarem.
– Vamos, garotos. Quando Pattie for para o chalé vocês conversam. Agora precisam ir.
– Espera! Eu não vou ficar mais nenhum segundo com essa roupa ridícula! Eu preciso me trocar, Quíron. Por favor. – exclamei, sem me atrever a sair do lugar calçando um salto de dez centímetros.
– Tudo bem, Pattie. Mas vá rápido. Temos que conversar. – Quíron concordou e seguiu em direção à casa grande.
Meus irmãos rumaram para o chalé, menos Will, que era o conselheiro. Nossos olhares se cruzaram e eu não consegui dar as costas e sair de lá. Sua expressão estava péssima e parecia estar chateado com alguma coisa. Ele sequer me abraçou! Tentei encontrar um motivo para ter lhe magoado, então me lembrei de que não trouxe de volta ao acompamento algo importantíssimo...
– Will, me desculpa, eu não...
– O que aconteceu com a biga? Por favor, me digam que ela está em algum lugar, mas que está aqui.
Engoli seco. O que eu diria para Will? Eu não podia simplesmente dizer “Ah, a sua querida biga afundou num lago nojento e foi convertida em milhões de pedaços”. Tais palavras o deixariam arrasado! Por outro lado, ainda não entendia porque a biga tinha um significado tão grande para ele.
– Cara, me desculpe, mas aconteceu um acidente e a biga acabou parando no fundo de um lago. – explicou Leo. Além de bonito, ele estava cheiroso. Ryler tinha se afastado um pouco quando meus irmãos vieram me recepcionar, mas fez questão de se posicionar ao meu lado e segurar minha mão – Não tinha jeito de salvá-la. Me desculpe, foi tudo culpa minha, eu traí sua confiança. Eu prometo construir outra melhor e maior!
Will abaixou os olhos e não respondeu. Um clima péssimo se estabeleceu entre nós e eu me senti um monstro por não ter tentado recuperar a biga. Eu sabia que não éramos de todo culpados pelo acidente, mas preferi ficar calada e não piorar a situação.
Piper se juntou a nós, além de Percy, Annabeth e os outros conselheiros. Piper estava maravilhosa como sempre, mesmo vestindo a típica a camiseta do acampamento e uma bermuda jeans.
– Então quer dizer que vocês encontraram mamãe? – perguntou ela. – Isso nunca é um encontro muito agradável. Prepare-se para aguentar minhas irmãs reclamando. E ah, não se assuste com a maquiagem quando se olhar no espelho.
Piper sorriu e me abraçou. Deuses, só agora eu percebi o quanto estava com saudades desse lugar, dessas pessoas e todo o conjunto. Piper desfez o abraço e foi em direção a Leo e lhe dar o mesmo abraço apertado, dando lugar para Percy, Annabeth e os outros conselheiros me saudarem.
– Como foi a missão? O que vocês fizeram com Circe? – Annabeth indagou, seus olhos cinzentos brilhando de curiosidade.
– O que Pattie fez com Circe, você quis dizer. – Ryler intrometeu-se. Ele me abraçou de lado e me deu um beijo na bochecha.
– A heroína aqui mandou aquela feiticeira louca para o Tártaro! Uma passagem só de ida para o inferno! – Leo sorria, mas pareceu um pouco relutante ao contar a novidade.
Senti minhas bochechas esquentarem. Percy e Annabeth de repente pareceram ter sido acometidos por uma doença terminal. Mas ambos sorriram e reassumiram suas posturas. Eu deveria conhecer bem pouco sobre a história dos dois.
– Tá brincando? – Percy exclamou. – Pattie, isso é demais! E vocês dois, viraram porquinhos-da-índia?
– Porquinhos-da-índia, não. – eu falei. – Mas foram transformados em dois coelhinhos muito fofinhos.
Apertei a bochechas de Ryler e Leo e eles riram. O término da missão apaziguou os conflitos entre nós três, de certa forma.
– Ha, ha, ha, muito engraçado. – Leo gargalhou sarcasticamente. – Pelo menos nós não ficamos mudos.
Piper arqueou uma sobrancelha.
– Mudos?
– É, Pattie ficou muda. – Ryler respondeu azedo. – Tudo culpa daquela feiticeira louca.
Eles ficaram chocados e Quíron surgiu à porta da casa grande, olhando feio para todos.
– Crianças, chega de papo furado. Deixem Pattie ir trocar de roupa. Teremos muito tempo para ouvir as histórias de nossos heróis recém-chegados.
Ninguém ousou desobedece-lo. Meus amigos se dirigiram para a casa grande, enquanto eu corri até o chalé 7, louca para tirar aquele vestido tosco e todas as jóias que não combinavam em nada comigo. Coloquei uma camiseta limpa e cheirosa do acampamento, meu melhor jeans e encontrei minhas queridas botas no baú da cama. Afrodite não era tão louca assim, afinal.
Fomos presenteados com um banquente especial na casa grande. Quíron colocou ao nosso dispor pratos cheios de guloseimas, o que significa que Leo e Ryler não perderam tempo em atacar a comida como se não vissem um lanche de hambúrguer há décadas. Tenho que confessar que também estava morrendo de fome, mas optei por ser mais discreta.
Nós descrevemos cada detalhe da missão e todos explodiram em risadas quando contamos sobre nosso encontro com Hermes. Até mesmo Travis e Connor Stoll ficaram surpresos com a atitude do pai e pediram para que repetíssemos essa parte duas vezes. Depois de alguns minutos, já havíamos terminado de discursar sobre as aventuras que vivemos, e também tínhamos terminado de comer a junk food oferecida exclusivamente para nós.
– Não me surpreende que Afrodite tenha dado a benção dela para vocês. – Piper comentou. – As formas de agradecimento de minha mãe são muito estranhas, ainda mais considerando que vocês salvaram o filho favorito dela.
– Odiei esse agradecimento. Um beijo e um abraço estavam de bom tamanho. – reclamei.
Todos riram.
– Tadinha de você! A benção de Afrodite dura em volta de uma semana. Ou seja, durante mais ou menos sete dias você pode fazer qualquer coisa para tirar essa maquiagem e desarrumar o cabelo, mas eles sempre vão permanecer intactos. É impossível remover a benção, acredite. Eu tentei de várias formas...
Bufei, frustrada ao extremo com esse presente indesejado. Bom, se eu pudesse ao menos ficar com as jóias e convertê-las em dracmas...
– Pattie, você pode nos mostrar a espada que Psiquê lhe deu? – Quíron pediu educadamente.
Peguei o isqueiro do bolso e o abri. Kallistei surgiu intacta e brilhante, como de costume. O queixo de todos ali sentados caiu, especialmente o de Percy, que parecia ter visto a coisa mais bela de toda sua vida.
– Essa é a verdadeira Kallistei. – Quíron observou. – Ouvi muitas histórias sobre essa espada, mas não sabia que ela era mágica e se transformava em um objeto.
– Ah, Psiquê disse que a sua forma mágica muda de acordo com o dono. E o meu, ainda não sei por que, é um isqueiro. E por algum motivo, só eu e Leo conseguimos manusear Kallistei.
– É verdade. Ryler tentou abrir a espada, mas acabou se queimando. – Leo enfatizou.
Ryler esboçou sua expressão carrancuda e se afundou na cadeira quando percebeu que os irmãos Stoll riam baixo dele.
– Essa espada dá de dez a zero em Contracorrente. – Percy comentou cabisbaixo – Ela nem precisa ser polida!
Annabeth revirou os olhos.
– Percy, não inferiorize Contracorrente. Ela é uma espada tão incrível quanto.
Ele fez cara de cachorro que caiu da mudança, mas não rebateu a namorada. Como Annabeth conseguia ser tão dura com Percy? Ele era tão fofo!
– Vocês realmente jogaram a feiticeira mais poderosa do mundo no Tártaro? E mataram o cachorro de Hécate? – Lou Ellen, do chalé de Hécate, indagou com certa indignação e descrença. – Vocês acabaram de comprar briga com nossa mãe e com todo nosso chalé!
– Circe ia me matar e acabar com todos os homens do mundo! Eu fiz o certo! Não me diga que esperava que eu virasse amiguinha dela? Aquela mulher é um monstro e mereceu ir para o Tártaro!
Lou Ellen cerrou os olhos e levantou da mesa de ping-pong irritada, se retirando da casa grande. Sinceramente, pouco me importava a opinião dela e de todo seu chalé. Nunca fui com a cara de nenhum filho de Hécate. Só eu sabia a situação em que me encontrei ao enfrentar a feiticeira. Era eu ou Circe, e enquanto eu pudesse lutar, com certeza seria ela. Circe, ao contrário de mim, é imortal e tem toda uma imortalidade para retornar do Tártaro e dar continuidade a suas maldades.
Quíron bufou frustrado.
– Família nunca é uma boa coisa para se atingir. – suspirou. – Bem, de qualquer forma, o que Circe disse para você, Pattie?
Reproduzi cada palavra de Circe antes de ser jogada no Tártaro e todos escutaram atentamente. Tocar nesse assunto me fez relembrar com exatidão o que a feiticeira falou segundos antes da escorregar para o abismo... “Pergunte ao seu pai sobre a sua profecia”. Eu poderia perguntar, com toda certeza. Mas meu pai era o deus das profecias e dos oráculos e jamais me responderia. O destino deve sempre ser uma incógnita.
Annabeth ouvia tudo com ouvidos biônicos e ostentava uma expressão nem um pouco boa. Ela parecia estar moldando dentro de seu cérebro todas as possibilidades boas e ruins que os avisos de Circe poderiam significar. No final, ela lançou um olhar tenso para Quíron e o mesmo suspirou.
– A meu ver, Circe parece ter mencionado algo futuro. Eu não sei o que pode ser, mas não podemos acreditar em tudo o que ouvimos, certo? Circe é uma feiticeira ardilosa, e tenho minhas suspeitas de que falou tais coisas apenas para lhe aterrorizar.
Ele tentou nos passar segurança, mas o centauro não parecia muito certo do que dizia. Até ele pareceu incerto sobre o significado das palavras da feiticeira.
– Depois de Gaia, eu duvido que algo pior possa acontecer. – Percy resmungou.
– Nada é impossível, Percy. Você já deveria saber disso. – Annabeth ponderou. Ela segurava as próprias mãos, demonstrando estar tensa. – Não acho que algo terrível está prestes a acontecer, porque nós certamente já teríamos recebido algum sinal. Mas também não acho que devemos ignorar as palavras de Circe. Afinal, por que ela raptou Eros? Será que esse era o seu único objetivo? Como ela mesma disse, não estava sozinha. Circe tem aliados. A probabilidade de que algo aconteça mais para frente, na minha opinião, é grande. No entanto, não temos pista nenhuma do que se trata, ou muito menos de quem se trata.
Parando para analisar a situação com calma, vi que Annabeth estava repleta de razão. Circe não blefou; pelo contrário, ela tentou justamente me alertar. Mas o que podia acontecer era uma incerteza. Eu não queria acreditar que coisas ruins aconteceriam no futuro, mas no fundo eu sabia que as chances eram grandes. Assim como eu também sabia que provavelmente estaria envolvida nisso.
– Vocês estão sendo pessimistas. – Travis tentou amenizar. – Qual é! Faz pouco tempo que vencemos a guerra contra a Gaia, não é possível que forças do mal já estejam sendo reunidas outra vez por algum titã ou deus renegado.
Quíron analisou o que Travis disse.
– O que você falou faz sentido, Travis. Todos ainda estão muito fracos, e se uma movimentação das forças do mal estivesse acontecendo, os deuses estariam cientes e nos avisariam. Pode ser que nada aconteça por algum tempo, mas não significa que estamos livres de perigo.
Todos mergulharam no silêncio. Eu não participei da guerra contra a Gaia, mas tinha conhecimento da proporção dos estragos, e eu definitivamente não gostaria que tantas tragédias se repetissem ou até mesmo que algo pior acontecesse. Porém, como as pessoas costumam dizer... querer não é poder.
Quíron pigarreou e sorriu.
– Minhas crianças, não quero que pensem nisso por enquanto...
– Acho meio difícil depois dessa conversa. – Leo opinou.
– Não vamos perder o foco, sim? – Quíron continuou. – Creio que já discutimos tudo o que precisava ser discutido por hoje. Podem retornar aos seus chalés, amanhã vocês tem que levantar cedo. Exceto vocês três, Pattie, Leo e Ryler. Vou abrir uma exceção devido à missão. Sei que estão cansados e precisam descansar. Portanto, vocês poderão acordar às 10 horas da manhã.
Quíron nos lançou outro sorriso. Se eu não estivesse tão cansada e abalada com tudo isso, eu teria o retribuído. Nos levantamos da mesa e saímos da casa grande, exaustos e sonolentos. Quíron desejou boa noite e fechou a porta da casa. Cada líder foi para seu respectivo chalé, deixando Will, Piper, Leo e Ryler sozinhos comigo.
Piper suspirou.
– Isso foi muita informação, meu cérebro precisa de descanso. Boa noite para vocês, até amanhã.
Piper deu um tchauzinho com a mão e correu em direção ao chalé de Afrodite. Ryler me abraçou de lado e bocejou.
– Acho que vou indo também. Estou precisando dormir.
– Tudo bem, até amanhã. – disse.
Ryler me deu um selinho e acenou com a cabeça para Leo e Will. Meu irmão cerrou os olhos e Leo bufou. Ah, deuses, o que eu fiz para merecer todo esse ciúme?
Assim que Ryler foi embora, desejei que tivesse mais alguém ali. O clima ficou tenso entre nós. Will não abria a boca, Leo estava com medo de falar algo e receber um soco de Will, e eu não sabia o que dizer para quebrar o gelo.
Pigarrei e lancei um olhar de “me ajude, por favor” para Leo.
– Will...
– Pattie, não precisa se desculpar outra vez, ok? Desculpas não vão trazer a biga de volta.
– Cara, a culpa não foi dela. Foi minha. – explicou Leo, assumindo a culpa por algo que não fez. Eu o admirei mais ainda por tomar esse tipo de atitude apenas para me proteger. – Se você quiser, eu posso construir uma biga nova. Não vou me importar.
– Não foi culpa sua, Leo. Nós perdemos o controle da biga. Nunca tivemos a intenção de voltar sem ela, Will. – completei.
Will colocou as mãos nos bolsos do jeans e abaixou a cabeça.
– Você só precisa nos dizer se quer. Eu vou ajudar Leo a construir a biga nova. Isso é o mínimo que eu posso fazer por você. Olha, eu sei que não vai ser a mesma coisa, mas...
– Tudo bem, vocês podem construir uma biga nova. – Will cedeu. Ele parecia estar mais calmo e deu o seu típico sorriso bondoso. – É claro que não vai ser a mesma coisa, mas vai dar para quebrar o galho.
Leo colocou a mão no peito e suspirou aliviado.
– Ufa, pensei que você ia socar minha cara. Pode deixar comigo...
– Com a gente. – corrigi.
– Pode deixar com a gente, Will. – Leo sorriu. – Eu e a Pattie vamos construir a biga mais bonita que você já viu na sua vida. Você vai querer chorar quando ver o resultado final.
Will deu uma risada fraca.
– Assim espero! De qualquer jeito, fiquei feliz por completarem a missão com sucesso. Pensei que ficariam mais de uma semana fora.
– Espera aí! Passamos quantos dias fora do acampamento? – perguntei.
– Pattie, vocês ficaram só quatro dias em missão. Pensou que foi um mês? Hoje ainda é dezoito de julho.
Arregalei meus olhos. quatro dias! Passamos por tantos maus bocados e aventuras que a sensação era que tínhamos ficado semanas longe do acampamento.
Leo deu uma batidinha no ombro de Will e sorriu.
– Eu sei que você sentiu minha falta, Solace. Você está com vergonha de falar.
– Cale a boca, Leo! – Will deu risada e deu um soco “fraco” no bíceps de Leo.
Leo massageou o lugar.
– Depois dessa eu até vou ir embora. – disse num muxoxo. – Boa noite para vocês. Amanhã, Solace, quero minha revanche. Amanhã.
Will abriu os abraços como se chamasse Leo para briga.
– Pode vir, cara! Te espero no refeitório para quebrar meu recorde outra vez.
– Do que vocês estão falando? Vai me dizer que...
– Nós já fizemos uma competição de quem comia batata frita mais rápido. – Leo me situou na conversa.
– E eu ganhei.
Will esboçou um sorriso inconveniente e Leo revirou os olhos. Quem poderia fazer uma idiotice dessas? Meninos, óbvio.
– Como eu estava dizendo... boa noite. O papai aqui precisa esticar o esqueleto.
Leo acenou e caminhou do seu jeito despojado até o chalé de Hefesto. Então, uma pergunta estúpida (mas engraçada) passou pela minha cabeça: se meus irmãos, que são magros e sarados, roncam, será que os irmãos e irmãs de Leo também roncam? Porque, sem ofensas, eles são um chalé um tanto quanto... grotesco. Quanto mais massa corporal, mais a pessoa ronca. Certo? Ok, vamos ignorar a pergunta.
Um vento gélido me fez voltar à realidade. Will ainda estava ao meu lado. Ele encarava a floresta e sua feição assumiu a serenidade e a calma habituais. Parado com as mãos nos bolsos e fitando a lua no céu com uma expressão serena no seu rosto bondoso, eu tive certeza de que o verdadeiro Will estava de volta.
Will virou-se para mim sorrindo e não deu nenhum aviso antes de me envolver em seus braços, numa demonstração de afeto. O abracei de volta e sorri aliviada. Deuses, como eu estava sentindo falta dos meus irmãos e agora, abraçada com Will, também percebi que sentia uma saudade especialmente grande dele e do seu jeito fofo de paizão.
– Senti sua falta, irmãzinha.
– Também senti falta de todos vocês! Sei que faz pouco tempo que estou aqui no Acampamento, Willl... Mas vocês me receberam tão bem que eu já me considero parte dessa família gigante e estranhíssima de adolescentes meio humanos, meio deuses.
Will soltou uma risada divertida.
– Tá vendo por que gostamos tanto de você? Você é o chaveirinho do chalé 7. Nós também estávamos precisando de alguém como você na nossa família. E pode ter certeza que nos orgulhou muito ao voltar dessa missão.
Não conseguia descrever a felicidade que senti ao ouvir tais palavras. Eu nem soube o que responder a Will. Eu nunca havia me sentido tão querida e tão aceita. Todos ali eram literalmente como eu. Ninguém me julgava por ser diferente ou estranha demais; fazíamos parte do mesmo mundo e estávamos unidos por um laço de solidariedade mútua.
– Me desculpe por exagerar em relação à biga. – Will tornou a falar, ao que começamos a descer a colina rumo ao chalé 7. Os outros campistas já se encontravam em seus respectivos chalés. As luzes da área comum começavam a ser apagadas. Deveria ser de fato tarde.
– Will, tá tudo ok. Você deve ter seus motivos para se preocupar tanto com a biga, e eu estraguei tudo ao afundar ela num lago da Flórida...
– Pattie, essa biga virou um símbolo da vitória na guerra contra Cronos para o nosso chalé. O antigo conselheiro de Apolo, Michael Yew, insistiu muito para que a biga fosse reconhecida como do chalé de Apolo, não só do de Ares. Afinal, ela foi encontrada numa missão conjunta. Mike morreu na guerra, e eu virei conselheiro no ápice dela... Então...eu meio que me apeguei a biga, porque de certa forma ela representa o espírito do Mike. Eu sei que parece loucura, mas...
Ele olhou para o chão durante toda sua fala. A morte desse meio-irmão que nem cheguei a conhecer deve ter sido intensamente dolorosa para Will. Ele parecia prestes a se debulhar em lágrimas.
– Will, se você tivesse me contado essa história antes, jamais teria pedido a biga emprestada. Teria preservado-a. – falei, sentindo-me mais culpada ainda, se possível.
– Pattie, não fala uma besteira dessas! – repreendeu-me, balançando a cabeça. – Sem a biga, vocês não teriam completado nem a metade da missão. E era um direito seu pegá-la emprestada. Não vamos falar mais sobre isso, tá bom?
Eu assenti. Ao chegarmos ao chalé, os garotos ainda estavam acordados. Eles me recepcionaram e me abraçaram mais uma vez. E é óbvio, me sufocaram com milhões de perguntas sobre a missão, pedindo para que eu as respondesse de maneira detalhada. Eu adorei toda a atenção dedicada a mim, mas o estado de fadiga em que meu corpo se encontrava mal permitia que meus olhos continuassem abertos. Matt foi o único a notar meu cansaço.
– Gente, daqui a pouco a Pattie vai rolar desse pufe e cair de cara no chão. Vamos deixar ela dormir.
Eles resmungaram, enquanto eu agradeci silenciosamente pelo tato apurado de Matt. Desejei boa noite e não pensei duas vezes antes de ir para meu quarto e cair na cama vestida mesmo, sem nem tirar as botas. Poucas vezes me senti tão exausta e acabada.
Meus olhos se fecharam e eu fui envolvida pelo veludo negro que se resumia aos meus sonhos. No estado intermediário entre a consciência e a subconsciência, cheguei a suspirar de alívio por voltar a ser privada de sonhos que não desejava ter.
Mas a escuridão parecia tentar estabelecer contato. Um ruído baixo e penetrante preenchia meus ouvidos. A sensação de estar sendo envolta pela brisa fria e misteriosa da noite tomava conta de mim. Não sabia definir se continuava deitada em minha cama ou se estava em pé. Meus olhos não viam nenhum tipo de luz ou sinal de vida; a fobia do escuro começou a dar seu ar da graça, fechando minhas vias respiratórias e fazendo com que o desespero se instalasse no lugar do bom senso.
E então eu escutei o sussurro baixo e sombrio da escuridão se elevar. Uma voz fria, arrastada e ruidosa como uma ventania noturna penetrou meu campo auditivo.
Ah, minha pequena e tão inocente semideusa. – definitivamente, a voz pertencia a uma mulher. Eu não conseguia vê-la, mas era capaz de sentir sua presença densa e esmagadora, me desesperando e me amendrotando mais a cada vagaroso segundo. –Se pensa que seus desafios terminam por aqui... Considere-se tola e despreparada. Você está apenas se preparando para sua inevitável ruína. Quando aqueles que se dizem bons não tem capacidade para lidar com o poder, é hora de rever os conceitos e considerar a força dos renegados e daqueles vistos como precursores do mal. Meu legado se agita debaixo de seus pés, Patricia. A escuridão e toda a desgraça que já andou sob a terra se fortalecem ao meu comando... É só uma questão de tempo. Abrace seu destino com carinho, filha do Sol.
A voz cessou da mesma maneira que outrora invadiu o sonho. A brisa carregada de sentimentos ruins e frieza desapareceu. Eu lutei para voltar a respirar e implorei para ver a luz novamente. Esse pesadelo precisava acabar antes que eu nunca mais conseguisse sair dele.
Abri meus olhos e pude ver raios de luz iluminando meu quarto. Respirei como se tivesse acabado de me libertar de um sufocamento. Eu me encontrava deitada em minha cama, banhada em suor frio e respirando ruidosamente. O pesadelo fora tão real que se tornou difícil acreditar que eu havia voltado à realidade. Me sentei na cama, tremendo, e passei as mãos pelo rosto, tentando acalmar meus instintos.
Foi só um sonho ruim, repetia para meu próprio cérebro, está tudo ok.
Levantei da cama cambaleando e me coloquei à janela, que passou a noite aberta. Apoiei-me no batente e observei a floresta sendo banhada pela aurora, as folhas das árvores assumindo um brilho dourado, as gotas de sereno refletindo o sol... Ao sentir os raios solares penetrando a minha pele, imediatamente suspirei e deixei a paz me envolver.
Não sabia quem era a dona da voz fria e repleta de ruindade que estabelecera contato comigo através do sono. Não entendia como o tempo passou tão rápido a partir do momento em que a escuridão me engalfinhou. Não entendia porque eu era considerada uma peça tão importante nesse mundo novo em que havia acabado de ser inserida. Eu era só uma típica adolescente de quinze anos de idade com força de vontade e determinação. Qualquer outro semideus poderia ser como eu.
Porém, onde há perguntas, sempre há respostas. Eu iria atrás de saber a quem pertencia a voz na escuridão e iria tentar entender por que um papel de tamanha importância fora destinado a mim. Depois de tanto tempo vivendo sem ter minhas perguntas respondidas, eu me situei numa nova realidade, desencadeei uma força interior que até então desconhecia, fiz amigos, superei meus desafios pessoais e encontrei um lar. Tinha a obrigação moral de seguir em frente, sem medo da dor ou da desgraça. Eu finalmente havia me encontrado, após estar perdida por tantos anos. Nada me impediria de alcançar as respostas.
Ouvi um de meus irmãos bater na porta do quarto, como faziam todos os dias antes de saírem do chalé e seguirem para o refeitório. Sorri sem desviar os olhos da vista da janela. Sim, eu sabia que muito ainda estava por vir. Mas enquanto eu pudesse olhar em volta e saber que eu pertencia àquele lugar, eu permaneceria forte. Isolei os pensamentos ruins e deixei as sensações boas ocuparem meu peito. Era bom se sentir em casa.


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Notas finais do capítulo

E aí, amores? Que tal? Nos digam se foi um grand finale! Agora, vamos para os agradecimentos, sim?

Let: Olha, faltam-me palavras para descrever o quanto foi bom escrever essa fic. A Pattie foi um personagem que eu criei, e minha irmã ajudou desenvolver a personalidade da nossa heroína. E agora, quem diria, ela se tornou nosso bebê, assim como essa fanfic que nós tanto amamos. No começo, fiquei um pouco receosa de postar essa história, pois não tinha certeza se os leitores se interessariam em ler uma fanfic em que os personagens principais não são Percy ou Annabeth. Eu comecei com essa história, e fico muito feliz em poder finalizá-la na companhia de todas vocês, minhas leitoras. Eu e minha irmã nos empenhamos muito nessa história, passamos madrugadas conversando sobre o enredo. Admito que as aventuras de Pattie, Leo e Ryler, (principalmente a missão do Rancho Triplo-G) nos fez quebrar as cabeças! Nós pesquisamos muito sobre tudo. Eros era um deus que nunca havia sido mencionado antes em qualquer livro do Rick Riordan, então isso nos rendeu uma boa procurada na internet. Mas nada que não tenha valido a pena. Na verdade, essa história é um tesouro para mim. Tanto ela quanto os personagens que criamos.
Gostaria de agradecer do fundo do meu coração a todos que leram e acompanharam A Filha do Sol. Espero não ter decepcionado em alguns aspectos, mesmo que eu ache difícil isso não ter acontecido. Uma das melhores sensações do mundo para uma escritora, é toda vez postar um capítulo e receber um comentário. Então, muito obrigada a quem comentou! Juro que quando vi a primeira recomendação quase infartei! Haha. Ok, acho que já disse bastante. Muito obrigada novamente, suas lindas ♥

Taty: Caraca, minha irmã falou TANTO que me deixou sem saber o que escrever.
Primeiro de tudo: obrigada, obrigada e obrigada de novo. Palavras não são suficientes para agradecer a cada leitor de A Filha do Sol por não terem desistido da história e acompanhado a primeira parte até o fim. Essa é a maior retribuição para as horas de pesquisa e planejamento que gastamos para levar a vocês uma história bem escrita, bem elaborada e divertida.
Nós nos afeiçoamos de uma forma tão louca a essa fanfiction que decidimos dar uma continuação a ela (o que não estava nos planos inciais). Os personagens originais foram feitos com tanto carinho e amor que as vezes achamos que eles realmente existem nesse mundo louco de semideuses e monstros.
Trabalhamos muito para trazer a nossos leitores uma fanfiction de qualidade, fiel as duas séries escritas pelo Rick Riordan. E espero que tenhamos agradado a todos que leram e embarcaram junto com Pattie em suas aventuras.
Cara, do fundo do meu coração, obrigada por cada comentário, cada 'favoritou essa história', cada indicação e recomendação que vocês fizeram. A maior recompensa do mundo é essa. Aqui fica a nossa deixa, e ehem, perceberam o 'Capítulo Seguinte' ali embaixo? Cliquem, cliquem, cliquem!!! E confiram o sneak peek de A Filha do Sol - Parte II.

OBRIGADA!

Taty B e Let B.




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