Em Minhas Memórias escrita por Mary e Mimym


Capítulo 36
Perdão


Notas iniciais do capítulo

Wow! Esse capítulo me surpreendeu muito, ele não seria assim, não mesmo, porque eu já estava planejando que ele fosse o penúltimo da história, mas ele é o antepenúltimo, ou seja, ainda teremos mais dois capítulos para finalizarmos... Nossa! Sério, o capítulo está... Tipo... Eu não sei a palavra certa para defini-lo, só sei que a emoção não cessou no cap. anterior, se prosseguiu neste também. Boa Leitura.



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Como eu poderia explicar o que senti? Foi uma explosão de todos os sentimentos juntos, mas o que se destacou dos demais foi a raiva que sentia. Porém, não demonstrei imediatamente, fui consumindo a cada segundo que passava naquele quarto.

Não era possível! Aquilo não poderia ser verdade. Não! Talvez fosse uma brincadeira daquele professor maluco!

Olhei para Elesis e ela estava espantada, mas não mais que eu. O professor esperou que eu absorvesse toda a informação e, depois, concluiu:

–Eu passei pelos policiais, que vieram atrás de mim pedindo minha identidade. A primeira coisa que fiz, foi olhar para a parte interior do carro. – Ele passou as palmas das mãos no rosto, como se a recordação o deixasse tonto – Lá estava ela… Com o rosto no volante, com a garrafa de bebida alcoólica no banco do carona, com a parte lateral do rosto sangrando. Eu… Eu não pude ver mais nada. Não consegui. Encostei-me no carro e escorreguei até o chão. Os policiais não sabiam o que fazer, tinham que ter me impedido de ver, mas… - O professor respirou fundo antes de continuar, mas eu queria que ele calasse a boca, nenhuma palavra dele mudaria a dor que eu estava sentindo – Uma pessoa, acho que uma médica, não sei, veio em minha direção e disse que minha mulher estava viva, só que precisavam ter cuidado para tirá-lado carro. Assim que ela terminou de falar, o Corpo de Resgate foi até o carro e começaram a retirá-la, uma maca já estava posicionada à sua espera. Eu queria estar ao lado da minha esposa, mas precisava saber da família do menino também. Levantei do chão e fui até seus pais, sua mãe chorava muito, o que fez aumentar mais ainda a minha dor. – Então ele sentiu o que eu estou sentindo agora… Porque uma palavra a mais, é uma dor a mais – Conversei com eles para entender o que estava acontecendo, mas estavam nervosos demais para falar. Ouvi um dos bombeiros gritar por ajuda. Olhei para trás, assim como seus pais olharam de imediato para a ambulância para saber se havia acontecido algo com você, mas era com a minha mulher. Ela estava tendo uma parada cardíaca. Eu os deixei e corri até o encontro dela, mas me impediram de me aproximar mais. Eu fiz de tudo para estar ao lado dela nos últimos sopros de vida… Mas não deu… Não me deram a chance de dizer adeus…

O professor se silenciou e foi a minha deixa de falar.

–Sua mulher destruiu a minha… Ela destruiu porque sentiu medo de perder alguém... – Minha voz estava baixa e rouca, mas aumentou gradativamente - Isso acontece sempre, todo mundo perde alguém, alguma coisa. A vida é assim! – Abri os braços indignado – Ela não tinha o direito! Ela…

–Ronan, você está se exaltando. – Elesis se levantou.

–Então eu preciso manter a calma, é isso?!

–Nem parece que você acabou de ouvir o que aconteceu! – Elesis passou as mãos em ambas bochechas – Como você consegue sentir raiva disso? Como tem coragem de dizer isso ao professor?!

–Elesis, não foi você quem quase perdeu a vida, que está destinada a ficar sem lembrar nem mesmo do nome! Então, não venha tirar satisfações comigo do que eu devo ou não dizer! Chega de bancar o idiota que aceita tudo calado, que se importa mais com os outros do que consigo mesmo. Eu nunca entendi o motivo daquela pessoa ter me atropelado. Pensei em várias coisas, uma delas foi da pessoa estar bêbada e, olha que coincidência, ela estava!

O professor se afastou com a cadeira de rodas.

–Eu queria te pedir uma coisa…

Em meio ao meu surto emocional, a voz dele era calma e compreensível. Tentei controlar minha respiração, para me acalmar também. Sabia que estava passando dos limites, mas eu não conseguia reagir de forma mais branda. Era mais forte que eu. Fiquei em silêncio esperando pelo pedido.

–Perdoe-me. E, acima de tudo – O professou olhou para cima e as lágrimas desceram – perdoa a minha esposa. Não quero que se coloque no lugar dela, pois só ela sabia o que se passava em sua mente.

Virei o rosto para o lado. Recusando-me a continuar olhando para o professor. Cruzei os braços e assim fiquei.

–Ronan? – Elesis me chamou – Você está se comportando como um imaturo, sabia? Já está na hora de tomar uma atitude de homem! De superar a dor que está transformando-o em um ser rancoroso. Se você tem a possibilidade de perder a memória, eu tenho quase certeza que estou perdendo, de vez, o Ronan que conheci e que amo.

Meu coração foi restaurado dos cacos que havia se transformado ao se quebrar inteiramente. Elesis disse a palavra que mexe com qualquer ser humano, que é capaz de muita coisa. Amor.

Olhei para ela e, depois, para o professor, este já estava na porta do quarto perto do enfermeiro. Eu juro que eu lutei e relutei o máximo possível, mas minhas armas contra o ódio estavam enfraquecidas e eu cedi.

–Não a perdoarei por ter tirado de mim a chance de viver. Porque estar preso neste hospital não é ter uma vida. É como ser uma sombra vagando no escuro. A sua existência fica ausente.

Elesis reprovava o que eu dizia. O professor assentiu.

–Bem, já vou. – Ele se virou em direção ao corredor – Espero que eu tenha tirado todas as suas dúvidas sobre o seu acidente.

–Não estamos numa aula, então você não tirou as minhas dúvidas. Só me deu a certeza que a vida é injusta

Vê-lo sair do quarto doeu muito. Não era eu falando aquilo tudo. Eu jamais seria tão severo ao ponto de renegar um perdão. O ódio muda a pessoa, a faz ser o que nunca pensou ser. Afinal, a nossa atitude define quem realmente somos.

–Ronan… “Às vezes, a verdade não é boa o bastante. Às vezes, as pessoas merecem mais. Às vezes, merecem ter toda a sua fé recompensada.” – Elesis caminhou até a porta, que estava aberta. Ela sabia que eu estava tendo um momento de reflexão comigo mesmo depois do que eu dissera, como ela mesma disse, eu não estava sendo eu mesmo.

Olhei para ela, com a vista embaçada, pois, por mais resistente que o ódio fosse, a fraqueza de um homem, diante as suas atitudes erradas, consegue ser mais forte, consegue dominá-lo e fazê-lo ceder. No meu caso, chorar.

Elesis acabara de recitar uma frase do filme “Batman: O Cavaleiro das Trevas”, um dos meus heróis da ficção. Ele também era uma sombra na escuridão, mas conseguiu sobrepujar essa dor, amenizá-la, pelo menos. Eu não poderia deixar essa profunda repugnância se tornar parte do que eu não sou.

Fiquei tão perdido e enevoado em meus pensamentos que, quando olhei para a porta, Elesis não estava mais lá.

Meu coração voltou a ficar inquieto, aflito, completamente desesperado. Eu deveria fazer alguma coisa. Errei. Pequei da forma mais podre e esdrúxula possível. Atingi alguém que foi capaz de entrar no meu quarto e me contar uma história que ninguém havia tido coragem de contar.

Eu era um Erudon capaz também de mudar a mim mesmo para me redimir daqueles que acabei de magoar profundamente. Não posso deixar que o ódio faça de mim um monstro.

Levei minha mão esquerda até o soro que estava preso nas costas da minha mão direito e o arranquei, tirando o esparadrapo que o prendia. Vi subir de forma ligeira e incontrolável uma montanha de sangue, que me fez ansiar de vômito. Respirei fundo e me sentei na cama, percebi que o sangue escorria da minha mão até os lençóis branco e azul bem claro. Chegando até pingar no piso.

Fiquei completamente tonto por tentar levantar. Não consegui de primeira. Só de saber que Elesis estava se afastando de mim, dava um aperto no coração capaz de ultrapassar a dor e raiva que sentia. Agora sim poderia ser por causa do meu orgulho que nos separaríamos e eu não poderia permitir isso. Eu não permitiria!

Tentei levantar, mas minhas pernas bambeavam e me colocavam de volta na cama. Minha mão estava completamente vermelha de sangue e eu evitava olhar, mas era impossível, pois a cada esforço que fazia, eu pressionava a cama para dar impulso e sujava tudo.

Tentei de novo, com uma dor nas pernas que parecia que eu era sedentário a vida toda, meus ossos estavam fracos, minha cabeça girava e eu não tinha um ponto fixo, mas permaneci tentando ficar de pé; meus pés me deram suporte e foram meus alicerces para que minha vértebra ficasse ereta novamente. Cambaleie para frente, como se fosse uma criança aprendendo a andar. A tontura era demasiada, mas me equilibrei o máximo, deixando os braços abertos até sentir segurança.

Pronto! Estava de pé novamente. Caminhei até a porta, apoiando em tudo que eu via, para não ter a infelicidade de tropeçar.

Cheguei até a porta e coloquei meu corpo para fora. Os remédios que eu tomava me deixavam assim, com o corpo pesado e um tanto incapaz de ficar de pé.

Olhei para os dois lados, mas eu não via Elesis. Saí do quarto. O corredor estava vazio. Comecei a andar pela direita, que levaria a uma sala de espera.

Ronan OFF

Elesis ON

Não sei como tive forças para deixar o Ronan sozinho naquele quarto. Eu não fazia ideia de como ele se sentia, ainda mais depois de ter ouvido tudo aquilo que o professor disse. Ele estava diferente, o Ronan não era daquele jeito.

Sinto-me culpada por tê-lo feito sofrer e proporcionado a ele uma parcela de dor. Mais aquele idiota passou dos limites!

Confesso que também fui fraca, pela segunda vez na minha vida, vejo uma pessoa errar da forma mais ríspida e não faço nada, apenas permito que continue… Que vá embora… Que fale o que jamais sairia de sua boca! Que deixe o ódio o transformar em um ser irracional.

Sair do quarto do Ronan, foi como tirar de mim a alegria que conquistei ao seu lado em nossa doce infância.

Cheguei à Sala de Espera, onde estavam todos – exceto uma pessoa – sentados nas poltronas que havia no recinto. Arme era a úncia de pé, estava encostada na parece, com a cabeça inclinada e apoiada no piso que revestia o concreto.

A mãe de Ronan olhou para mim com um sorriso ainda em formação, pois, com certeza, estava dividade em se sentir feliz por eu ter aparecido, ou triste por ver que eu havia aparecido… O fato foi que ela logo desfez o sorriso que nem chegara a se formar direito em seu rosto, já que viu, em meu semblante, um rosto inchado e vermelho, infelizmente.

–O que houve, filha? – Perguntou a minha mãe, que estava ao lado da mãe de Ronan.

–O professor de geografia, da nossa escola, – Arme se virou em minha direção bruscamente, como se o que eu dissesse fosse destruí-la, como a Kriptonita faz, gradativamente, ao enfraquecer o Superman. Saí de meu devaneio e prossegui, mas não deixei de olhar para Arme – contou ao Ronan o que aconteceu na noite do seu acidente.

A mãe dele colocou as mãos sobre a boca e abaixou a cabeça; Arme levou uma das mãos até a boca e suspirava pesadamente.

–Como ele reagiu depois que soube? – Perguntou o Sr. Erudon, tirando a minha atenção das duas e me fazendo focar em seu rosto preocupado e cansado.

–Ele… Bem, o Ronan…

–Deve ter ficado fora de si! – Exclamou Arme, conhecendo bem o amigo que tinha – Ele nem deve ter medido as palavras que deve ter dito ao professor.

Concordei com o que ela disse, relutando para fazer isso, mas foi o que aconteceu, de fato.

–Ele ficou sozinho no quarto? – Arme perguntou à mim, dando um passo a frente.

–Sim. – Olhei para todos os lados, Arme me fez perceber que não era para deixar o Ronan sozinho. Eu já tinha sufocado o meu orgulho, eu estava começando a deixar minha sensibilidade ser mais forte que meu alter ego superior a qualquer tipo de sentimento – Ele precisa de mim…

Ao dizer isso, virei-me e dei de cara com o médico de Ronan.

–O que houve? – Perguntou ele, confuso.

–Licença. – Pedi e desviei dele, saindo apressada, virando logo em seguida para pegar um corredor que daria no seu quarto.

Ouvi a voz do médico perguntando se aconteceu algo com o Ronan, depois disso não ouvi mais nada. Até porque dei de cara com outra pessoa a minha frente.

–Ronan!? – Não estava acreditando que ele perambulava pelo corredor, com a mão de sangue, provavelmente do soro, se apoiando na parede, com a cabeça baixa. Fui até ele – Você é louco! O que pensa que está fazendo?! – Olhei ao meu redor – Não tem um enfermeiro que te viu fazendo isso?!

–Fui cauteloso. – Aquele garoto queria testar minha paciência.

–Isso não é hora para brincar, Ronan!

Ele levantou o rosto e seus olhos se fixaram nos meus. Eu não via mais nada além da orbe azul celeste das iris mais perfeitas que já vi.

–O que você está fazendo aqui?! – Insisti.

–Você saiu do quarto… Eu não poderia deixar ir embora de novo…

–Eu saí, porque… - Tentei, juro que tentei desviar meu olhar do dele, mas eu estava vidrada – Porque você queria que eu fosse embora, não foi?

–Se eu pudesse mudar o que falei naquele quarto, o faria. Mas a realidade não me permite voltar no passado, apenas ter recordações do que fiz. Mas saiba que eu não queria que você saísse.

–Eu queria te bater naquela hora que você gritava comigo. – Disse.

–Imaginei. – Ele sorriu, mas não por muito tempo.

Ronan fechou os olhos, como um ato de arrependimento. Foi nesse momento que desvencilhei minha visão. Acabei vendo duas enfermeiras vindo em nossa direção, no meio do caminho se deram conta que um paciente estava fora do quarto – Ronan – e apressaram os passos.

–O que o senhor faz aqui fora? – Perguntou uma delas, segurando o braço de Ronan.

A outra observou a mão dele e fechou o semblante.

–Temos que levá-lo para o quarto imediatamente, ele ainda está sob o efeito dos remédios e está sem o soro.

Ronan estava fraco demais para tentar impedir que as duas o levassem. Eu também não poderia fazer nada.

–Mas o que é isso?! – Olhei para trás e vi o médico de Ronan correndo em nossa direção.

Toda atenção foi para a irresponsabilidade do Ronan em ter saído do quarto nas condições em que se encontrava. Mas aquilo tudo não o impediu de dizer uma coisa:

–Elesis, - voltei a olhá-lo – eu te amo muito para dizer de verdade que a quero fora do meu quarto… Fora da minha vida… Não era eu ali… Era só o ódio tentando…

–Tentando transformar você em um monstro capaz de ter raiva da vida e de todos ao seu redor, só porque ela foi “injusta” com você. – Completei a fala dele e não pude deixar de sorrir quando ele disse que me ama.

Ronan abaixou o rosto, talvez envergonhado, ou cansado.

–Eu preciso me desculpar com o professor. – Disse ele, com a voz baixa.

–Eu não sei o que aconteceu, Ronan, mas você vai voltar para o seu quarto agora! – O médico não parecia estar brincando. Enquanto uma enfermeira segurava o braço direito do Ronan, o médico segurou o outro braço livre.

Uma equipe de enfermeiros apareceu ao final do corredor. Eles vinham em nossa direção. Olhei para as portas dos quartos, já imaginando que alguém estaria passando mal.

Elesis OFF

Ronan ON

Eu não tinha mais forças para ficar de pé, meu corpo estava começando a pesar muito, minha perna não seria forte o bastante para aguentar. Minha cabeça doía e minha vista embaçava cada vez mais.

Vi que as atenções sobre mim – um menino que estava sendo irresponsável em sair vagando pelo corredor do hospital –, foram para um grupo de enfermeiros, que andavam rápido. Olhei para eles, tentando manter a minha visão consciente do que eu realmente via. Reconheci um dos enfermeiros: Era aquele que estava com o meu professor de geografia.

Passaram por nós e adentraram em um quarto uns dez metros a nossa frente. O meu médico acompanhou aquele grupo entrar no quarto e, quando eles fecharam a porta, ele fez um comentário que me fez despertar do meu cansaço:

–Acho que paciente daquele quarto, que tem Leucemia aguda, não está muito bem… - Sua voz era de conformação e, ao mesmo tempo, tristeza.

Eu e Elesis nos entreolhamos. Não poderia ser o professor, não é? Aquele cara maluco… Que fica me perturbando. Que entrou na minha vida para mudá-la completamente, em todos os sentidos.

–Não pode ser… - Murmurei.

–O que disse? – Perguntou a enfermeira.

–Eu preciso ver aquele paciente daquele quarto. – Pedi.

–Você verá a sua cama, agora. Onde já se viu um menino como você sair do quarto e ninguém te ver? – Disse o médico, começando a andar, assim como a enfermeira que também me segurava.

Elesis ficou olhando para a porta fechada, a porta que poderia ter o nosso professor. Eu estava andando contra a minha vontade, mas não tinha como resistir e ficar ali parado.

–Eu preciso ver meu professor. – Tentei puxar meu braço da enfermeira, que apertou mais sua mão.

–Que professor? – Indagou ela.

–O cara que está naquele quarto e que pode não acordar mais, eu preciso vê-lo! – Dei mais um puxão.

–Ronan! – O médico parou; Elesis, que nos acompanhava, também – Você não sabe como foi perigosa a sua atitude de sair daquele quarto! Pare de se comportar como uma criança! Você acha que seu caso é menos especial, pois saiba que você pode morrer fazendo isso de novo!

Engoli em seco. Elesis soltou um breve suspiro de surpresa e medo.

–Eu não sei o que você fez, mas se não tomar cuidado, não se lembrará nem dessa sua rebeldia em sair do quarto sem acompanhamento médico. Por Deus, não sei como você está de pé ainda. – Ele colocou as mãos na testa.

Pouco me importei com o que ele disse, mesmo tendo me machucado com suas palavras. Minha concentração foi toda para a porta do quarto que foi aberta e os enfermeiros foram saindo. Um de cada vez.

O meu médico percebeu que eu não estava dando a mínima para ele e virou o rosto, para saber o que me dispersava.

As duas enfermeiras que estavam conosco abaixaram a cabeça. O médico se virou para mim novamente, e seu rosto estava como antes: conformado e triste.

–Por favor, só nos diz se aquele paciente não era professor. – Pediu Elesis, sabendo exatamente o que eu estava pensando.

–Sim, ele era professor de geografia.

–Como assim “era”? – Perguntei, minha respiração estava ficando fora de controle e eu queria me livrar das mãos da enfermeira, já que era a única que me segurava agora.

–Eu sinto muito se vocês o conheciam. – Disse ele.

–Não… Não! Espera! –Chamei o último rapaz que saía do quarto, ele me olhou e franziu o cenho – Ele está vivo, não está?

O rapaz abaixou o rosto e seguiu o mesmo caminho que os demais.

–Ronan, se você o conhecia…

–Deixe-me vê-lo, por favor. – Pedi, desistindo de puxar meu braço. Relaxando meu corpo.

–Eu não posso e você precisa voltar logo para seu quarto, já passeou demais pelos corredores deste hospital. Se meu supervisor souber… E ele saberá, eu levarei uma bela bronca.

–Eu converso com ele, mas me deixa ver o meu professor. – Persisti, mas forças me faltavam para alterar minha voz e mostrar determinação.

Elesis me olhava o tempo todo. Eu já tinha feito muita coisa, muita coisa errada, diga-se de passagem. Mas eu me redimi com Elesis, pelo menos achava isso, disse que a amava e isso me proporcionou uma felicidade sem igual, fez com que a tempestade em meu interior cessasse de vez, mas o sol se recusava a aparecer e, com isso, quando anoitecia, eu não via a lua iluminando-me à noite. O meu dia era escuro como a noite por causa da ausência do sol, minha vida continuava cinza por eu recusar um perdão que necessitava tanto de mim.

O médico voltou a me segurar e eu olhei para a Elesis desesperadamente clamando por ajuda. Meus olhos estavam inundados pela tristeza só de pensar que o professor poderia ter…

Mas o que ela poderia fazer? Bater no médico para que ele me soltasse? A Elesis era agressiva, mas não chegava a tanto.

Ele começou a andar e eu pesei meu corpo para baixo, tentando permanecer inerte. Com meu corpo cansado e relaxado, eu me tornava bem pesado que o normal.

–Anda Ronan, você precisa voltar para o soro. – O médico olhou para frente e viu meu rastro de sangue, pingos do líquido que escorria do minúsculo furo que estava em minha mão. Ele balançava a cabeça negativamente, tornando a me puxar com mais força.

–Por favor! – Gritei, a enfermeira que segurava meu outro braço afastou o rosto – Eu preciso vê-lo, você não entende!

–Ronan, eu realmente não entendo! Ele está morto!

–Não. – Continuei firme em minha tentativa de não andar – Você não entender… - Minha voz estava falhando, estava com vontade de chorar – Ele precisa do meu perdão. Por favor… Se for mesmo para eu perder toda lembrança que possuo, quero estar bem comigo mesmo em saber que um dia perdoei a pessoa que… Me fez… esquecer.

Tinha um nó na minha garganta, um nó que não era fácil de se desfazer. Eu não poderia culpar ninguém pelo que passei, pois eu mesmo estava tornando tudo mais difícil.

–Ah… - O médico parecia ter compreendido o que eu dizia – Aquele professor te contou, não foi? Do motivo do seu acidente. O médico deu uma pausa, parecia se lembrar de algo – Ele te visitava sempre que podia, quando ia para a fisioterapia. Acompanhava todo o seu regresso e progresso, dando assistência aos seus pais. Não quiseram que você soubesse, pois era jovem, continua sendo, para aceitar, compreender e perdoar o que ele te contasse.

–Então! – Olhei para ele – Eu preciso perdoá-lo, pois não o fiz quando ele me pediu, entende?

–Mas ele se foi…

Caí de joelhos no chão. Não sei como, mas foi tão repentino que o médico e a enfermeira não tiveram tempo de me segurar.

–Ronan! – Elesis se agachou ao meu lado – Vai ficar tudo bem, você não precisa se castigar por não ter…

–Elesis, eu preciso perdoar, nem que seja a mulher dele, por tudo o que aconteceu, você não entende! Não ficará nada bem!

Ela riu. Não entendi, mas ela riu. Elesis foi segurar a minha mão, mas recuou.

–Lembra quando eu caí da bicicleta? Eu não queria saber de mais nada, achava que nada ficaria bem depois daquele incidente, mas você estava lá, você estava ao meu lado. Você me mostrou que, a amizade consegue penetrar as barreiras mais resistentes criadas pelo homem. Você não me deixou sozinha quando eu caí, não me deixou sozinha naquele quarto, quando meu pai foi embora e você estava mudando de escola. Você não me abandonou nenhuma vez, Ronan. Eu que não enxerguei isso a tempo de não deixá-lo só também. Aqui, neste hospital. – Elesis deu uma pausa, tanto as enfermeiras como o médico não sabiam o que fazer. Eu a olhava intensamente, torcendo para não ser traído pelo meu corpo e cair no chão por não me aguentar ajoelhado – Ronan… - Ela segurou a minha mão, o que não tinha feito antes – Você me perdoa? De coração, me perdoa?


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Notas finais do capítulo

Então... '-'