Estrela Guia - A História De Carlisle Cullen escrita por Claudia Carvalho


Capítulo 3
Esperança




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Uma morte lenta, mas necessária. Por que não sacrificar uma vida de monstro – se é que se pode chamar isso de vida – por milhões de vidas humanas? Não pode haver nada de errado com isso.

A primeira coisa a fazer seria encontrar um esconderijo com uma distância segura de qualquer civilização e sinais de humanos.

Comecei a correr para mais longe do vilarejo, na direção oposta a da qual viera, cada vez mais floresta adentro, para a mata fechada, procurando por onde não houvesse trilhas, nem qualquer sinal de humanos. Avistei uma montanha, longe o suficiente para ficar pequenina no meu campo de visão e corri em sua direção. Não tive dificuldade em escalá-la – muito pelo contrário, a monstro caçador no qual meu corpo de transformou parecia feito para fazer todas as coisas impossíveis. Perto do pico da montanha havia uma caverna. Ela era funda – virava numa esquina e continuava – e escura, mas meus olhos não tinham problemas com distâncias e escuridão – só percebi que estava escuro porque o tom das cores da rocha ia escurecendo conforme a distância. Não estava interessado em saber até onde a caverna ia. Fui até a metade exata entre a entrada e a esquina e me sentei. Não estava cansado – longe disso, me sentia perfeitamente relaxado em qualquer posição. Aposto que poderia ficar de cabeça para baixo por anos e nunca ficaria cansado, apenas entediado.

Comecei a cantarolar uma cantiga para me distrair, mas não me lembrava bem das que conhecia antes – era como se eu estivesse tampando minhas orelhas com as mãos – você escuta um som fraco, mas ainda consegue entender o que dizem.

Que estranho, pensei. Todas as lembranças são tão... fracas. Até as lembranças visuais são como se eu olhasse por uma vidraça suja de poeira. Mas é claro, o monstro no qual me tornei deveria se sentir (e ser) superior aos humanos, para que assim pudesse matá-los sem nenhuma piedade. Mas eu não vou permitir que isso me faça mudar de ideia!

            Mas era impossível. Quanto mais eu me recusava a me lembrar dos momentos humanos, mais eu pensava. No princípio achei muito ruim, mas com o tempo percebi que pensar naquelas lembranças me tornava mais humano mentalmente, embora não mudasse em nada meu corpo – eu ainda era um monstro sedento por sangue.

            Demorou, mas finalmente o sol nasceu. E foi aí que me dei conta do óbvio: vampiros queimam à luz do sol! Pelo visto minha morte ia ser mais rápida do que eu esperava. Levantei-me e corri até a entrada da caverna, pronto para meu auto sacrifício, com os olhos fechados. Eu podia sentir o calor dos raios solares contra minha pele, aparentemente mais quente que de costume. Finalmente, pensei, pronto para sentir a dor que sentiria ao me transformar em cinzas. Mas a dor nunca chegava. Ora essa, por que toda essa demora?

            Então abri meus olhos. Eu estava de pé na beirada da caverna, com os braços abertos para abraçar a morte, mas eu não estava queimando – pelo contrário, eu estava brilhando como uma pedra preciosa!

            Tive nojo de mim mesmo. Como eu podia ser tão poderoso e indestrutível? Por que não havia um jeito mais simples de resolver o problema?

            Voltei para onde antes estava sentado e fiquei ali, pensando nas minhas lembranças humanas indistintas para me distrair. Com o lento passar dos dias, minha garganta queimava cada vez mais, como se alguém estivesse colocando lenha numa fogueira sem parar – como se essa parte do meu corpo ainda estivesse passando pela transformação.

            Uma semana e meia se passara, e a dor estava insuportável. Quando caiu a noite tive medo de seguir meu próprio cheiro de volta para a aldeia, então saí da caverna e corri montanha a baixo, e depois na direção oposta da qual tinha chegado. Fechei os olhos e prendi a respiração, concentrando-me apenas em correr o mais rápido que pudesse. Senti como se estivesse voando, até que meus pés pisaram em algo molhado. Abri os olhos para ver aonde meus pés haviam me levado. Eu estava à beira de um rio. Tomei minha decisão rapidamente: mergulhei e nadei, sem me preocupar com meu rumo. Contanto que não estivesse voltando, estava tomando o caminho certo. Nadei até ver um muro de terra a minha frente. Então saí da água e continuei minha corrida às cegas e sem rumo. Tomara que a água apague meu rastro, pensei. Foi então que tomei uma decisão arriscada, mas necessária. Abri meus olhos e voltei a respirar, trilhando o caminho de volta ao rio, me guiando pelo meu cheiro. Quando cheguei à margem farejei, procurando pelo meu cheiro. Nada. A água provavelmente apagou meu rastro, pensei com alívio. Então voltei a correr, desarmado da visão e do olfato.

            Quando estava bem longe, percebi que não conseguiria achar um esconderijo sem usar os olhos, então os abri novamente. Então avistei uma formação rochosa e corri na direção dela, com a esperança de encontrar uma caverna ou gruta. Estava com sorte: havia uma caverna e, embora não fosse tão profunda quanto a outra, serviria perfeitamente. Enquanto a adentrava, percebi uma coisa que deveria ter notado antes, se não estivesse tão perturbado com essa coisa de vampiro: não havia som de seres vivos próximos a mim. Era como se fugissem sempre que me aproximasse.

            – Até os animais têm consciência de abominação que sou – murmurei. – Mais um sinal de que estou tomando a decisão certa.

            Mais duas semanas se passaram, com sol e chuva, e eu estava começando a enlouquecer de dor. Implorava a Deus para tivesse piedade de mim e me levasse. No dia que completaria um mês de transformação, a sede chegou ao seu ápice, e eu estava cego e surdo de dor – não literalmente, mas não conseguia me concentrar em nada que não fosse a sede. Quando a noite caiu, senti que seria a última vez que veria a lua.

            E de repente tudo mudou. Olfato e audição começaram a trabalhar juntos, em estado de alerta: havia cheiro de sangue. Não era cheiro de sangue humano, mas ainda sim era sangue. Algo molhado e cheiroso que prometia acabar com toda a dor que estava sentindo há um mês. Tudo aconteceu automaticamente, instintivamente. Eu havia perdido todo o controle do meu corpo. O único pensamento coerente que me ocorreu foi a identificação dos animais: era um grupo de cervos. Me levantei e segui o cheiro e os sons que o acompanhava. Fui direto até um macho enorme, o líder, o maior do bando inteiro. Ataquei com tamanha rapidez que ele nem sequer viu o que o atingira. Depois de esgotar seu sangue, corri atrás do bando que fugia e abati mais três, acabando com eles em seguida, como fizera com o primeiro.

            Quando voltei a raciocinar me vi lambuzado de sangue, me sentindo estufado; embora a queimação na garganta tivesse sido reduzida a quase nada, ainda havia alguma dor, mas nada preocupante. E nada comparável ao ardor excruciante que eu sentia antes.

            Foi então que algo me veio à mente: o sangue de animal me fazia forte e saciava, eu podia sentir seu efeito imediato. Ainda que minha garganta ardesse, era algo fraco, abafado, por hora. Talvez eu não tenha que me matar para salvar vidas humanas e nem seja obrigado a viver como um monstro assassino. Definitivamente, há alguma esperança.


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