Cold. escrita por Nancy Boy


Capítulo 1
Shiro ku.


Notas iniciais do capítulo

Escrevi isso bem rápido, because feels. Li uma cena do mangá que me fez pensar no Ciel como uma criança completa, e aí ouvi essa música: http://www.youtube.com/watch?v=ZDCEoMIUTFA
Que aliás, vocês deviam ouvir enquanto leem, é uma songfic.
E aqui a tradução, pra quem quiser ver quais frases são minhas e quais são da música: http://letras.mus.br/vocaloid/1604877/traducao.html



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 Desde quando isso aconteceu?

Eu não me faço essa pergunta frequentemente. Mas não consigo fugir dela o tempo todo. Desde quando minha voz está muda?

Bem, eu deveria saber. O momento deve ter sido o mesmo em que Sebastian apareceu... quando eu o chamei, aquele deve ter sido meu último grito verdadeiro. Mas... por que parece que foi depois?

Parece que foi aos poucos. Perdi minha voz lentamente, diferente de meu sorriso, que sumiu de súbito. Minha voz se foi ao longo dos primeiros meses, conforme eu fui percebendo que não seria o mesmo... nunca mais. Mas quando, exatamente, é o que eu queria saber. Quando minhas palavras se tornaram só ordens e minha vontade se tornou só obediência? Quando foi que eu perdi todo o resto? E, de certa forma... que resto? Acho que eu nem sei de que voz estou falando.

Está nevando. O jardim está lindo. Minha visão da janela é perfeita. Mas está tão quente aqui! Eu quero uma brisa.

Saí rapidamente para o jardim, com minhas vestes noturnas. Todos estão dormindo, e eu sinto a presença de Sebastian atrás de mim em poucos segundos.

— Boc-

Levantei minha mão para que ele se calasse.

O silêncio é quase mortal. Eu estendi a palma e senti um floco de neve se derreter sobre ela, devagar. Frio, muito frio, mas eu não estava tremendo. Eu gosto do frio.

Olhei para cima. A neve é como uma pilha de luz, sem som. Você a junta e sorri, como eu lembro que costumávamos sorrir antes de tudo acontecer. Os invernos eram divertidos, com meus pais, Madame Red, Elizabeth. Brincávamos na neve. Por que ela não tem mais graça agora? Será que estou fazendo as perguntas certas?

Como minha voz está soando agora?... bem, do que adianta. Vocês não conseguem ouvir mais nada.

Gostaria de saber se eles sentem dor. Se estão solitários. Se a solidão deles é como a minha.

Se possível, eu queria ouvir sua voz só mais uma vez... só mais uma vez, antes do fogo, antes da morte, antes do ódio. Só mais uma vez.

— Bocchan, você vai ficar doente.

Eu continuei olhando para frente.

— Nesse mundo cinzento, tudo é sem emoção, exceto pela neve. A neve é fria – peguei um floco novamente. — A neve é como minha alma, Sebastian?

Ele não respondeu, mas chegou mais perto. Eu esperei.

— Não, bocchan. Eu não esperaria tanto por uma alma fria como a neve. Sua alma é quente.

Fechei os olhos e virei o rosto.

— Quente com a raiva, não com a dor – eu falei. — Isso te satisfaz? Porque eu não tenho mais lágrimas, Sebastian, então não posso te derreter com elas.

— Talvez elas estejam apenas muito bem escondidas. Talvez você não as deixe sair – senti seu rosto ficar ao lado do meu, permaneci de olhos fechados. — E talvez seja esse esforço que deixa sua alma fervendo, mas ainda parecendo fria. O conflito.

Eu senti as malditas lágrimas, mas ele estava certo, eu não as deixaria sair. Eu nunca mais as deixei sair, e não iria começar agora. Mas eu ainda não sabia se minha alma realmente tinha algum tipo de calor. Não é o que eu sinto. Como posso argumentar com um demônio, porém? Ele sabe o que quer para o jantar, suponho.

Senti os braços dele me envolvendo, e não me movi. A neve estava se transformando em uma tempestade. Eu sabia que ele queria me levar para dentro. Mas eu queria senti-la por mais algum tempo.

Respirei fundo.

Tudo foi embora. Eu já havia aceitado, o que é que me dava essa sensação agora? Eu sinto que perdi minha voz, mas não sei nem mesmo que voz é essa! O que eu quero dizer?

Levantei minhas mãos e apertei os braços de Sebastian, que ainda estavam me abraçando. Permiti-me ficar mais perto dele, só por enquanto. Ele era caloroso também. O que nós éramos, afinal? Gelo e fogo, ou fogo e gelo?

— Eu perdi algo, Sebastian – falei baixinho, olhando para a neve. — Algo além da minha família, do meu amor... perdi algo que ainda não sei o que é.

— Mas isso é óbvio, bocchan. Você perdeu a si mesmo.

Eu me afastei um pouco e olhei para ele.

— O que quer dizer?

— Você era uma criança, mas não é mais. Também não é um adulto, porém, ou um adolescente. Você... não é nada, em essência.

Perdi a mim mesmo. Isso faz sentido. É essa voz que eu procuro, então? A da minha infância, que teve uma morte lenta e petrificante? Que sofreu um golpe intenso e foi definhando aos poucos, mesmo que somente eu soubesse disso?

— Eu quero ter minha voz de volta – sussurrei. — Quero ser algo.

Sebastian ficou em silêncio.

— Quero ser criança, Sebastian. Só um pouco mais.

Ouvi-o suspirar de forma quase... quase triste. Então ele me pegou no colo, o que me assustou, mas eu não reclamei. Ele me levou de volta ao quarto, me colocou na cama e me cobriu. Então deitou-se ao meu lado.

— Venha – falou, abrindo os braços.

Eu hesitei. Olhei pela janela, e a neve caía mais forte agora.

Olhei para ele e me decidi. Esgueirei-me até seus braços e me coloquei ali. Era irônico, eu sabia, mas consegui me sentir seguro. Seguro nos braços da minha morte, mas talvez a morte seja a melhor segurança que temos contra a vida.

Fechei os olhos e me deixei afundar ali. Protegido. Cuidado. Infantil.

A neve vira tempestade, e eu imploro para que ela não pare de cair, que me deixe naquele momento para sempre... mas não importa. Quer pare ou não, ela vai me soterrar.

A neve vai me levar com ela, e tudo vai desaparecer, inclusive minha voz miserável... mesmo que eu tenha alguns míseros momentos com essa voz de volta, eu sei que ela terá ido de manhã. E, novamente, tudo estará...

Branco.


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Notas finais do capítulo

Completando, a tal cena que falei me fez pensar no Ciel como uma criança... perdida. E nem era a intenção, mas fazer o que, mente angst.
Espero que tenham gostado e que comentem ^^