Momento Infernal escrita por Elizzabeth Haaps


Capítulo 8
Capítulo 03 (parte 1) — Quem é você?


Notas iniciais do capítulo

Amadinhos, eis o mais novo capítulo de MI pra vocês (novamente dividido em DUAS PARTES, não me matem, escrevo muito, rç). Agora entraremos no mundinho de Leonor Prado.
Quais os segredos que ela esconde? Porque "dama dos disfarces"? E como ela se encaixa no mundo de Oliver Linth?
HAHAHAHA
Perguntas? Perguntem pelos comentários que irei responder *-*
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Aquele inicio de inverno estava sendo mesmo rigoroso: o vento não perdoava, a chuva mal tinha um intervalo e o frio completava o trio indesejável. Porém, naquela noite em especial, por seja lá qual for o motivo, os céus resolveram dar uma aliviada. Quando os primeiros raios solares invadiam Alvorada, Rio Grande do Sul, a chuva cessou, quase que instantaneamente; muita gente perdera esse espetáculo da natureza, pois descansavam de um dia cansativo de trabalho, mas uma pessoa em especial presenciou tudo aquilo e no fim sorriu aliviada: Leonor Prado.


Ela estava com a roupa toda molhada – aquele maldito capuz não tinha serventia nenhuma no fim das contas –; suas botas tinham rasgado; seus braços tinham vários pequenos cortes e em sua perna também outro ferimento, só que profundo. Ela caminhava lentamente pelas ruas desertas de Alvorada sem saber o que faria em seguida. Seu corpo expulsava o sangue por aquela abertura muito rapidamente e, embora estivesse com uma faixa amarrada na perna, a fim de tentar estancar o mesmo, não estava tendo muito sucesso. A cada passo para frente, mais parecia uma regressão infinita; a dor que ela sentia a cada centímetro que se aproximava do seu esconderijo era terrível. Aqueles belos cabelos pretos agora mais pareciam palha suja e fedorenta; o vestido de gala escarlate que um dia impressionou a todos, agora não passava de farrapos embaixo de mais farrapos. Aquela tinha sido uma noite e tanto...


A noite da festa dos Austins Gray, a família mais poderosa do Rio Grande do Sul, era a mais esperada por todos; quem conseguiu garantir o convite dourado era uma pessoa de sorte. Murmúrios, bochichos; aquele foi o tema da conversa de muitas pessoas durante uma semana. Todos estavam ansiosos para ver quem seria o sortudo que ganharia a mão da filha do casal Cândido Austins Gray e Luísa Austins Gray. Aquela era uma tradição passada a muito na família Gray, e nem mesmo o tempo e o seu modernismo fora capaz de apagar. Normalmente essa ocasião seria muito particular: o marido da pequena e bela Ana Clara herdaria todo o patrimônio da família; ele daria continuação aos negócios e seria encarregado de passá-los para o seu filho. Infelizmente, Luísa não teve a sorte, por assim dizer, de oferecer ao seu marido um filho, por tanto caberia o seu genro dar continuidade a sua árvore genealógica.


Certamente não foi por falta de tentativa, porém a Sra. Gray deu a luz para duas garotas; Madelaine e Ana Clara, tendo o intervalo de três anos uma da outra. Mas para a tristeza de todos da família, a filha mais velha do casal fora sequestrada há alguns meses – na véspera de seu casamento na verdade –, deixando todos abalados e amedrontados. Até o dia de hoje, nenhuma notícia, nem resgate, nem nada... Como aquilo poderia ter acontecido com os Gray’s? O tempo não para e os negócios também. Dizia o velho Sr. Austins Gray, com seus cabelos já grisalhos. E então cá estamos: a grande noite. O anuncio de quem seria o grande felizardo... Mas o que Leonor tem haver com toda essa tradição cansativa? Bem, tudo. Ou melhor, quase tudo.


Havia uma rixa entre as famílias Gray e Johnson – a segunda família dominadora do estado. Apressados em acabar com toda a festa dos Gray, e deixá-los assim sem um herdeiro – o que era muito difícil de escolher, pois a seleção era rigorosíssima –, e já que o velho Cândido estava cansado para tais formalidades; aquela seria uma oportunidade única, e acabar com aquele casamento seria indispensável. Safa e esperta como era, Leonor logo se adianta e procura a família Johnson para oferecer-lhes os seus serviços.



Aquele dia tinha começado com o pé direito. Depois de obter informações especiais de certas famílias, Leonor vai em busca do que desejava: dinheiro. Diferente de todos, ela via aquele dia da premiação, por assim dizer, como uma grande oportunidade e não mais uma exibição feitas pelos Austins. Depois de marcar uma hora com Ricardo Johnson, o barão do café em terras distantes, ela se adiantou em colocar o seu plano em ação: obter o convite dourado, participar da festa mais luxuosa de Alvorada e de quebra, ganharia apenas para se divertir.


— Por favor, queria senta-se. O Sr. Johnson logo a atenderá. — Disse a secretária.


Sentada confortavelmente em um dos tantos sofás da mansão dos Johnson’s, Leonor esperava o dono da casa. Observava os quadros – Picasso, Van Gogh, Pollock, Klimt... Ela nunca entendeu como alguém poderia desperdiçar tanto dinheiro em uma coisa imóvel, abstrata, antiga, velha; e vendo aquela coleção tão seleta, Leonor respirou fundo e balançou a cabeça negativamente. Até cogitara em armar algum plano para roubar um daqueles quadros e fazer o dinheiro valer, mas logo lembrou-se que não ficaria tanto na cidade. O tempo estava demorando a passar, e ela já impaciente, resolveu então olhar a casa mais de perto, ver se poderia pegar alguma coisa dali; ganhar dinheiro fácil aqui...


Contornando o sofá dava-se para ver uma entrada, e ela mostrava uma bela sala de jantar. Mesa surtida com dezesseis lugares, cadeiras todas forradas com um tecido meio brilhoso – logo Leonor se adiantou em olhá-lo de perto e pode perceber aquele brilho de perto, e ele era ouro, fios de ouro. Mais a frente, tinha a adega, todos os tipos de vinhos, de todas as idades; cada um mais delicioso que o outro. Ela poderia até pegar um para si, gostaria até, mas antes que se atrevesse, viu que aquela porta de vidro tinha um alarme – uma pequena esfera fixada no canto direito com o auxílio de outras seis, menores, que faziam o papel das travas –; o controle de acesso estava no lado de trás de uma das colunas que enfeitavam a sala de jantar.


— Não posso negar, o sistema é bom.

— Fico feliz que tenha gostado. Posso garantir que é de excelente qualidade, de ultima geração.

— Tudo isso para uma adega?

— Uma adega abastecida com os melhores vinhos dos anos cinquenta. — Com esse comentário Leonor deu de ombros. — Mas certamente você não veio aqui falar de vinho.

— Certamente.

— Me acompanharia? — Ricardo fez sinal com a mão para que Leonor o acompanha-se à sala. Assim ela o fez.

— Perdoe-me, mas não souberam me falar quais são tuas intenções para comigo, poderia ir logo direto ao assunto? Confesso que estou aqui apenas pela tua beleza, até porque, o que uma mulher formosa como tu havia de querer? Fiquei curioso.


Leonor cruzou as pernas lentamente e a fenda da sua roupa logo deixou à mostra aquelas que eram belas e firmes. Erguera a sobrancelha esquerda, piscou os olhos lentamente e sorriu.


— Acontece que um elogio nada se torna, quando é óbvio o que se comenta. Mas não vim falar de nada disso. Negócios Sr. Johnson. Vamos falar de negócios.

— Que tipo de negócio uma mulher como tu poderia querer? Além de...

— Nada disso. Duas palavras: convite durado. — Ricardo riu, pegou um dos seus charutos e o acendeu.

— Acredite, tu não és a primeira a vim atrás desses malditos convites, lamento informar-te, mas...

— Cala a boca! — Leonor exclamou. O barão olhou para ela incrédulo, quase deixara o charuto cair.

— Só sabes dizer que é superior, falar de poder, luxuria... É claro que todos me agradam, mas o que vim lhe propor está cima disso... Barão. — Disse num tom sedutor — Vim lhe propor vingança.

— Vingança? Qual o teu nome mulher? — Ele disse parecendo interessado.

— Parece que esse casamento está para acontecer realmente... — Continuou a falar sedutoramente — E você não quer continuar à sombra dos Gray, quer? — Como Ricardo não disse nada Leonor entendeu que aquela era uma deixa para ela continuar, e assim o fez.

— Lhe proponho acabar com esse noivado.

— Como você poderia fazer isso?

— Meu jogo, meus métodos, minhas regras. Você apenas contribuirá com o dinheiro. Dois milhões de dólares. Em espécie, claro. — Ricardo não respondeu de primeiro, ficou pensando.

— Creio que terei que dispensar.

— Bem, poderemos fazer do meu jeito ou você simplesmente ficará assistindo sua derrota de perto sem poder fazer nada, novamente. Você deve gostar de ser o segundo em tudo, não? — Leonor disse calmamente para ele recostando-se no sofá. Do jeito que Ricardo era, aquilo estava no papo já.

— Como poderei saber se posso ou não acreditar em você? — Ele disse depois de dar uma boa tragada em seu charuto cubano. O Johnson não era homem de jogar para perder, queria o melhor sempre; queria tudo.

— Não poderá.

— Então é um tiro no escuro?

— Cada um faz o seu trabalho. Você com a maleta de dinheiro e eu... Bem, quanto a mim você verá de perto, não? Ou você não recebeu os convites dourados?

— Se veio aqui sabe muito bem a resposta para essa pergunta. — Com essa Leonor sorriu, mas nada disse; então ele continuou. — Tudo bem, mas metade agora, e metade quando o serviço estiver concluído.

— Barão... Estamos nessa vida para tudo ou nada. Sempre foi assim. Viver ou morrer, ganhar ou perder... E nos negócios é mesma coisa querido. Ou você me entrega os dois milhões agora, ou nada feito. Sinto muito. — Leonor disse fazendo expressões penosas.


Com esse ultimato Ricardo ficou pensativo. Ele sabia que poderia ser sim um golpe, mas também nunca ninguém tinha lhe oferecido algo assim, e os homens que ele tinha contratado tantas vezes falharam... Todos... Será que uma mulher seria capaz de tanto? Mas o que ela faria afinal? Tinha sido tão vaga, misteriosa... Talvez ela trabalhasse assim também...

Depois de vários pensamentos e tentativas de conectar uma coisa em outra, Sr. Johnson encara Leonor por alguns instantes, serio; a mesma ainda recostada no sofá apenas o observa. Ele balançou a cabeça negativamente e sorriu. Esse realmente já está no papo – pensou Leonor que sorriu de volta.


Como tudo tinha sido resolvido, Ricardo logo apressou-se em pegar o dinheiro de Leonor. Deixando-a esperando na sala, ele se dirigiu ao seu quarto, onde encontrava-se um dos cofres da casa. Sua suíte presidencial, como ele gostava e poderia ser chamada, era composta por uma cama feita sob encomenda, – no formato de uma coroa preenchida, quase formando uma esfera completa –, envolvendo a mesma havia um edredom de seda na cor azul enfeitado com vários fios de ouro espalhados abstratamente; lindas cortinas, também na cor azul, obstruíam a luz do dia; uma lareira feita de pedra para os dias mais frios, com um lindo quadro de Picaso em cima; um guarda-roupa, também feito sob encomenda, tinha a forma do símbolo do infinito; dentro do mesmo estava o cofre embutido na parede. Ricardo digitara a senha e sacara dali os contados dois milhões de dólares, colocara todo numa maleta preta com detalhes em vermelhos nos lados e saiu dali.



Enquanto Sr. Johnson estava prestes a colaborar com a pesquisa de campo, por assim dizer, de Leonor, ela estava analisando o alarme daquela adega. A Sra. Prado sabia que aquele alarme tinha energia própria, então se a força elétrica fosse desligada não adiantaria nada... E ainda havia as câmeras, espalhadas por toda a casa... Ela ficara analisando, pensando, arquitetando se havia alguma possibilidade de fazer rápido, sem deixar rastro, mas antes que ela pudesse bolar algum plano ouvira passos descendo a escada, era Ricardo. Rapidamente ela se retirou dali e sentou no sofá balançando a perna, como se nunca tivesse saído dali.


— Que uma coisa fique claro: eficiência, rapidez e discrição. Não quero que de qualquer forma o meu nome seja citado direta ou indiretamente.

— Não precisa me ensinar como fazer o meu trabalho. Ao contrário dos homens que o senhor mandou, eu sou muito melhor. — Leonor disse sorrindo e erguendo a mão para que Ricardo a entregasse a maleta com o dinheiro. Ele fez menção de entregar, mas recuou.

— Como saberei se você não fugirá daqui levando todo esse dinheiro? — Leonor bufou.

— Querido... — Ela passou a mão na bochecha dele carinhosamente — Não tem como saber. Você confia ou não. Essa é a sua escolha, e você sabe que nessa hora eu sou sua melhor e única chance.

— Única? Não creio nisso. — Ela rolou os olhos.

— Quantas vezes você já tentou e falhou? — Ele ficara pensativo; sabia que ela tinha razão, mas não ousaria confessar.

— Tudo bem. — Disse entregando o dinheiro a ela.

— Muito bem. Boa escolha, e agora o ingresso para o show. — Debaixo de uma almofada havia três convites dourados, que fora largados ali num lapso de raiva; ele pegou um e entregou rapidamente para Leonor. Ela pegou o papel e saiu dali andando firmemente, confiante, de um jeito que era até atrevido. Estava feliz. Tudo estava dando infinitamente certo.



Dinheiro na mão, otário no bolso e vida nova, de novo. O veículo de Leonor a esperava no jardim dos Johnson; uma Hayabusa na cor preta com um L e um P na traseira da moto. Ela montou na moto e saiu dali com a maleta cheia de dinheiro, feliz, confiante. Enquanto ela atravessava a cidade, o vento brincava com os seus cabelos cumpridos e loiros; as pessoas não passavam de vários vultos abstratos passando rapidamente, e a sensação de liberdade tomava conta de seu corpo. Não demorou muito, e depois de várias curvas, algumas estradas retas, caminhos largos, Leonor chega a seu esconderijo.


Aquele local era de tamanho médio e até servido de certo conforto. Abastecido com algumas poltronas, uma boa cama de casal e dois computadores – onde ela ganhava a vida: obtinha as informações necessárias para a construção de seus planos. Naquele galpão abandonado também havia uma saída de emergência nos fundos: indispensável em qualquer bom local de trabalho, claro. No meio daquele local havia uma entrada secreta que dava acesso às armas, dinheiro, mantimentos, roupas... Enfim, tudo para um bom disfarce. Leonor estacionou sua moto nos fundos e preocupou-se logo em guardar seu dinheiro.



Perto de uma coluna no lado direito daquele lugar, havia uma parte do piso de madeira que era solta: a entrada para um certo tipo de porão, mas digamos que moderno. Leonor desceu as escadas improvisadas e logo seus olhos verdes avistaram uma porta. A porta. Trajada com um identificador de ultima geração – com detector de digital, reconhecimento de voz (esse inclusive detectava sinais de estresse, nervosismo e aflição. Ele discava automaticamente o numero da polícia e acionava o alto falante, fazendo com que quem estiver do outro lado da linha ouça a conversa feita dentro do local) e reconhecimento do globo ocular. Após todas essas etapas já feitas, Leonor adentra no que ela gostava de chamar de: maquina de disfarces, pois era ali que ela se caracterizava, se inovava, se reinventava. Era ali que nascia: Angélica, Renata, Mary, Elizabeth, Nina, Lorena, Dalette, Eduarda, Mariana, Zoe... Cada uma com um fenótipo diferente, cada uma com um jeito diferente, cada uma com uma tarefa ímpar, porém todas ligadas por uma velha cicatriz.


A sala subterrânea era bem iluminada; mantinha uma temperatura agradável pelo ar condicionado; provida de vários tipos de armas – de revólver à AK 47 –, silenciadores e munição de vários tipos; esses ficavam organizados em algumas prateleiras à direta daquela sala; à esquerda um closet abastecido com vários tipos de roupas, calçados, jóias, acessórios, maquiagem; à frente tinha uma escrivaninha com um computador portátil que era encarregado mostrar a Leonor todo o movimento da cidade, – ela tinha acesso livre às câmeras graças a um programa codificador que alguém que conhecia, uma pessoa, que era colega de outra, que mantinha contato com um tal, tinha conseguido –, e era assim que ela mantinha o controle dos seus planos. Havia dois lugares para colocar o dinheiro: o primeiro era visível, um baú antigo de cedro com várias divisórias, meio velho, que ficava no canto inferior da sala; e o segundo: uma coluna oca na parte mais alta, por assim dizer, do local.


Leonor abrira aquela maleta e colocara metade do dinheiro em um lugar e metade no outro, largou a bolsa em qualquer lugar, e foi escolher a sua roupa para aquela ocasião que era tão especial. Passando o olho nas roupas de gala estendidas ali, ela logo avista o vestido que seria perfeito: uma bela peça com ombro único, uma fenda de tamanho médio, costas à mostra e um pouco de transparência; os acessórios não foram muitos, afinal quem deveria chamar a atenção aqui era o vestido, e para completar: um belo scarpin nude.


O tempo passava rapidamente enquanto Leonor observava a cidade pela tela daquele computador, e quando menos se esperava a noite já mostrava toda a sua beleza: a lua estava brilhando forte, as estrelas faziam desenhos perfeitos no céu, e as folhas das árvores dançavam conforme a música que o vento emitia... Quando percebera que a escuridão já se fazia presente, levantou-se dali, pegou sua roupa, os acessórios incomuns, esperou a porta fechar atrás dela e subiu para arrumar-se com mais espaço. Com o vestido cuidadosamente colocado na cama, ela vai então tomar um banho; não demorou muito e voltara de toalha para arrumar-se; olhando no espelho ela avistara aquela cicatriz...


Velha companheira de guerra; aquela amiga inseparável, inerente, única. Leonor lentamente passa a mão naquela sua amante e fecha os olhos. Ela lembra-se de tudo... Respira fundo. Seus olhos teimam em produzir algo que ela não queria, algo que não valia mais apena... Aquelas lágrimas quentes e salgadas escorriam pela sua face quando ela finalmente olhou-se no espelho; engoliu seco; concentrou-se. O que ela via ali era uma mulher forte, guerreira, habilidosa, sexy, corajosa, convincente... Agora eram tantas as qualidades... Não podia deixar-se abater por algo do passado.

Com um sorriso no rosto Leonor se arrumava, produzia-se, e depois de ter colocado toda a roupa era a hora do acessório: uma peruca de fios pretos, longos, lisos, de corte reto e com uma franja pequena; esta a esperava na penteadeira. Com habilidade ela arruma aquele cabelo fazendo os últimos retoques, termina a maquiagem, cuida de pegar sua bolsa e uma mochila, e lá estava ela pronta para mais um trabalho.



Felizmente naquela hora da noite o transito não estava congestionado, e Leonor pode observar todo o movimento das ruas pela janela do carro: algumas pessoas andavam de bicicleta, outras passeavam com seus cachorros; outras simplesmente estavam sentadas conversando, mas a verdade é que a rua estava mesmo vazia. Todos aqueles que não receberam o convite dourado estavam em suas casas para ver a premiação ao vivo na TV, e o outros estavam indo elegantemente para a festa, o que era caso de Leonor.


Alguns metros antes de chegar à residência dos Austins Gray, um caminho de luzes já indicava o local do estacionamento; em frente ao portão principal meia dúzia de homens fazia a segurança do mesmo. Uma mulher de estatura média, cabelos ruivos, vestida com um terno feminino preto, era a encarregada de conferir o convite e indicar a vaga para o portador do mesmo. Quando chegou sua vez, Leonor abaixou o vidro e esperou a mulher se pronunciar.


— Bem vinda à casa dos Austins Gray. — Disse a mulher sorrindo — Poderei lhe indicar sua vaga senhora assim que ver seu convite dourado. Por favor. — Aquela mulher estendeu a mão esperando pelo convite. Leonor balançou a cabeça lentamente em sinal positivo e pegou o convite que estava no outro banco do carro. A mulher checou o número e o nome e sorriu novamente.

— Bem vinda Sra. X. — A mulher piscou. — Aproveite a festa. Sua vaga é no corredor B13. Boa festa.

— Certamente será ótima Olívia. Ótima. — Leonor disse e arrancou o carro dali levando-o para o local onde era sua vaga.



Estacionado o carro, Leonor pega as duas bolsas e sai. Antes de dar qualquer passo conferiu se estava ou não no campo de visão de alguém – felizmente a resposta foi negativa – então saiu dali colocando uma das bolsas no canto do jardim, onde havia três saídas e entradas perto. Feito isso, se dirigiu para o salão de festa. Já havia muitas pessoas no local, – inclusive a imprensa – todas com suas roupas de gala; em suas mãos com taças do bom champagne Moët & Chandon; ao som da musica clássica ambiente, relaxante, elegante. Assim que ela adentrou na sala todos olharam para ela. Deslumbrante, sedutora, atraente, envolvente, instigante... Assim estava Leonor. Chamando atenção tanto com a sua beleza, quanto com o vestido, ela se vê sendo olhada por todos; as mulheres, algumas, chocadas, outras tomadas pela inveja; os homens, todos, não tiravam os olhos dela, casados, solteiros, velhos ou novos... Todos a admiravam, desejavam-na. A dama de vermelho sorriu sedutoramente olhando para todos e andando com elegância, requinte, com um ar de superioridade; pega uma taça de champagne e fica por observar todos que a observava.


Seu alvo naquela noite era: Gustavo Leal – cabelo e olhos castanhos; altura um pouco acima da média; pele branca; sorriso encantador; se esse não fosse mais um trabalho ela com certeza o pegaria pra si... Se é que entendem. Após analisar o conjunto de pessoas que ali estava, concluiu que tinha chegado um pouco cedo, e decidira caminhar pela mansão dos Gray, afinal, tinha que colocar logo o seu plano em ação.


O salão de festa ficava no meio certo do térreo da mansão. Mais para o lado direito havia a sala de jantar, uma bela mesa com trinta e duas cadeiras – essas confeccionadas com curvatura no espaldar que encaixa perfeitamente na lombar do usuário e com estofamento fino e agradável ao toque –, o faqueiro de prata estava exposto na mesma, assim como as peças de jantar. Leonor olhou para os lados e então pegou uma das facas que ali estavam... Que mal havia em pegar uma simples peça de prata? Ela a colocou em sua bolsa e continuou com sua caminhada. Mais ao fundo da casa havia uma escada de madeira e ferro forjado, no triplex uma luminária de cristais e fibra ótica que mudavam de cor.


Leonor apressadamente sobe aquela escada e encontra um corredor com várias portas brancas fechadas. Parece mais um corredor de hospital. – Pensara sorrindo e balançando a cabeça desaprovando aquilo. Ela já estava quase no fim do corredor quando uma porta se abre assustando-a

.

— Creio que esteja perdida, certo? — Disse o homem de cabelos e olhos castanhos, pele branca e altura um pouco acima da mediana. Era ele. O seu alvo. Gustavo Leal.

— Se estava, acabei de me encontrar. — Ela disse se aproximando dele.

— Os convidados devem ficar no andar debaixo. O que quer aqui?

— Você. — Assim que ela terminou de falar a música lá embaixo aumentara o volume, a festa iria começar realmente. Leonor passara o dedo no queixo de Gustavo e foi saindo dali lentamente.

— Espere. Quem é você? — Indagou o homem.

— Te espero na terceira música. — Ela disse virando-se e piscando para ele. A dama de vermelho descera as escadas sorrindo. Será que aquilo seria de fato coisa de criança? Seria tão fácil assim?


Os convidados dançavam enquanto ela aguardava a terceira música começar. E no intervalo entre a primeira e a segunda, o Sr. Austins Gray finalmente pega o microfone e começa a falar. O velho Cândido estava com um belo smoking, sapatos italianos e cabelos bem penteados, bem como sua mulher Luísa, trajada com um belo e elegante vestido na cor creme, cabelos cuidadosamente alinhados em um penteado simples e sofisticado.


— Gostaria de agradecer a presença de todos nessa noite que tanto me alegra e me orgulha. Hoje, como todos devem saber, anunciarei o noivo da minha filha Ana Clara Austins Gray, aquele que não só será meu genro, mas também o homem que tomara conta dos nossos negócios; continuará com a nossa árvore genealógica, e fará muito feliz a mulher, espero. — Com esse comentário final ouviu-se algumas risadas baixas e controladas.


Assim que a segunda música começou a tocar, as luzes focaram-se no topo da escada onde ali apareceu uma linda menina de pele branca, cabelos finos e loiros, com um belo vestido cujo modelo era de um ombro só, justo, com um excelente bordado, em um belíssimo tom roxo. Mas apesar de toda aquela beleza, a feição da moça era nervosa, ansiosa, aflita, apreensiva; logo aquele clarão invadira seus olhos e ela recuou um pouco, mas depois sorriu nervosamente e desceu aqueles degraus tentando demonstrar o máximo de confiança que conseguira.


No inicio da escada estava o seu noivo, Gustavo, a aguardando. Quando a distancia entre os dois não passava de meros centímetros ele, com delicadeza, pegou na mão dela e a conduziu ao centro do salão; a música iniciou-se e ambos começaram a dançar. De um lado pra o outro; olhos no olhos; de hora em hora um sorriso meio torto, desconcertado e tímido, nascia daqueles dois lábios... E assim fora aquela dança do casal, e quando a música cessou-se, em uni som aplausos eclodiram numa bela melodia. Após o termino dos mesmos o Sr. Gray novamente voltou falar.


— Apresento-lhes Gustavo Leal, que logo se apresentará como: Gustavo Austins Gray. — Como se fosse um chamado, o que de fato era uma deixa para que ele se dirigisse onde Cândido estava, Gustavo aproxima-se dele que passa-lhe o microfone.

— Honra. Única palavra que invade minha mente neste momento. Estou honrado por ter a oportunidade de representar essa família que tanto admirei e admiro; penso que nada poderia me deixar mais feliz, completo, satisfeito nesse momento. Repito que honrado eu estou, mas não só por fazer parte dessa linda família, mas também por ser uma peça na vida da minha amada Ana. Uma mulher incrível, forte, que soube muito bem com conquistar meu coração, confesso; uma mulher que quando me olha, vejo ternura, doçura, amor em seu olhar. Ana Clara Austins Gray. — Nesse momento a garota achegou-se perto do seu noivo, que a beijou. Houve aplausos mais uma vez. E um beijo rápido, sem muita vida, breve. Era claro como uma lágrima que aquilo não tinha passado de palavras vazias, e se pudesse, no lugar da maquiagem, lágrimas cobririam os olhos daquela garota; olhos tristes, desanimados, deprimidos.


Uma nova música começou a tocar, a terceira pela contagem de Leonor. Ela aguardava Gustavo perto da lareira; observava aquela cena com indiferença, até sentia piedade daquela garota, mas quem lhe interessava não era ela, eram aqueles olhos castanhos ora confiantes, ora desconfiados, receosos. Ela examinava cada gesto do garoto, cada movimento dele, cada olhar. E quando ele finalmente vinha em sua direção – depois de arrumar alguma desculpa para se desvencilhar daquela família no momento –, ela sorriu novamente. Ele estava curioso, impaciente, inquieto, afinal o que aquela mulher poderia querer com ele?


— Agora sou todo ouvido. — Disse direto.

— Não me acompanhará em uma dança? Adoro essa música. — Leonor disse antes de puxá-lo pra dançar. Eles foram para um lugar um pouco discreto, meio afastado dos convidados, e começaram a dançar juntos, lentamente, um passo de cada vez, um para cada lado. A canção já estava quase no meio quando não aguentando aquela situação Gustavo falou.

— Confesse. Tu apenas queria uma oportunidade para dançar comigo. — Ele sorriu — Não me enganas.

— Enganar? — Leonor sussurrou no ouvido dele. — Não sou eu que ludibrio aqui, certo Thiago Martins. — Ao ouvir esse ultimo nome Gustavo se reclinou para trás olhando para ela assustado.

— Do que você está falando? — Ela o forçou a recostar-se novamente nela, e continuaram a dançar.

— Calma. Não queremos chamar a atenção por aqui, certo Thiago? — Leonor sussurrou novamente.

— O que você quer?

— A pergunta aqui é o que você tem a me oferecer, não você propriamente dizendo é claro... Mas o que o Sr. Gray teria para me oferecer? Até porque, quem sou eu para querer alguma coisa, quando você faz questão de me dar...

— Não sei do que você está falando.

— Que coisa feia. Enganar a mulher que conquistou seu coração... Pergunto-me mesmo como você conseguiu enganar o Gray... Pra quem foi casado por dois anos, foi pai e preso, até que você esta com uma boa aparência, não?

— O que você quer? — Gustavo, ou melhor, Thiago, foi direto.

— Três peças de uma.

— Não sei do que você está falando.

— Não me faça rolar os olhos. Três valiosos colares de diamante.

— Você é louca?!

— Eu sei onde eles estão, poderia até roubá-los, sabe? Mas quando posso poupar-me do trabalho sujo não perco a oportunidade. E como eu tenho você...

— Eu não posso fazer isso!

— Poder não pode, mas deve e vai. Seu futuro está em jogo aqui garoto. E você pretensioso como é, com certeza o fará.

— Isso não é uma coisa que se faça em cinco minutos...

— Na verdade — Disse Leonor interrompendo o garoto. — Esse é o tempo que você tem para completar o roubo. Estarei esperando no corredor B13 no estacionamento, e vou logo lhe adiantando que com um segundo de atraso, esses telões aqui ficaram repletos de lindos vídeos caseiros, fotos de confraternizações familiar, de um certo casamento...

— Tudo bem.

— Corredor B13. Em quatro e cinquenta e nove, quatro e cinquenta e oito...


A dama de vermelho logo apressou-se em sair dali; esperaria no lugar combinado e que aquilo fosse rápido. Porém, antes de deixar o lugar por completo passou pela mesa de som, tirou um pen drive da sua bolsa e deixou com ele um bilhete que dizia: Quando houver agitação aperte o play. Com certeza acalmará os ânimos de alguém. Feito todo o trabalho ela logo encaminhou-se para o corredor onde o belo CCX preto esperava por ela. Leonor estava pensativa naquela noite; queria entender o motivo de Ricardo não ter aparecido até aquele momento... Quero dizer, o noivo tinha sido apresentado; o casamento estava confirmado, e ela não tinha feito nada para impedir. Porque Ricardo está tão quieto? – Pensava ela. O que ele pretende?


O ponteiro do relógio estava terminando de dar a sua quinta volta quando Gustavo apareceu no corredor combinado; estava nervoso, suando, com medo. Será que alguém tinha descoberto? O visto? Com as mãos no bolso ele continua andando calmamente; Leonor estava no fim do corredor, em pé, recostada em seu carro sorrindo; com o olhar penetrado, concentrado nele. Via-o olhando discretamente para todos os lados a procura de alguém, ou algo, que o fizesse parar com aquilo, que o fizesse desistir; algo que o ajudasse; quer fosse por mágica, quer fosse por qualquer outra coisa... Porém, a magia naquele momento aconteceria sim, mas de outra forma.


— Creio que o combinado foi cumprido. — Disse ela dando um passo pra frente, levantando a sobrancelha esquerda, quando Gustavo estava próximo o suficiente para ouvi-la.

— Aqui! — Ele exclamou tirando os colares do bolso. Rapidamente os entregou pra Leonor, que os guardara em sua bolsa.

— Que menino bonzinho. A Carmem deve orgulhar-se muito de você, mas é claro que ela não pode mais, não é verdade?

— Já fiz o combinado, agora tenho que voltar pra festa antes que sintam minha falta. — Antes do garoto virar as costas, foi chamado por ela.

— Tenho algo pra você. — Então Leonor entregou um saco para ele.

— O que tem aqui?

— Algo para não sentirem falta tão cedo. Ah, quando houver uma agitação fora do normal, corra para a mesa de som e o pare.

— O que você quer dizer com isso?

— Adeus.


Dado o recado ela virou-se dando a deixa pra o garoto sair, e assim ele o fez. Gustavo já estava longe; Leonor terminava de colocar uma calça por cima do vestido mesmo, quando ouvira alguém bater na janela do carro. Lentamente ela se abaixa e pega a faca de prata que estava dentro da sua bolsa, a coloca na parte de trás do coes da calça e abaixa o vidro lentamente. Na sua frente, um homem branco de terno, costas largas, feições duras, olhos confiantes; ele a olhou analisando-a e em seguida deu um sinal pra que a mesma saísse do carro. Ela rolou os olhos; já sabia o que aquilo significava. Pelo menos deu tempo de colocar a calça. Pensou ela enquanto olhava para o homem. Saindo do carro lentamente, ela finalmente se pôs de pé. O indivíduo a olha de baixo para cima e sorri; ela devolve o sorriso e se aproxima dele passando a mão carinhosamente pela bochecha dele.


— Até que olhando assim você é bonito. Mas algo me diz que não poderemos desfrutar de muito.

— Tem alguém que exige uma conversa.

— Exige? — Nesse momento outros dois homens aproximaram, cercando-a. Um deles se parecia muito com o primeiro, mas o outro ela já conhecia... Barão Johnson. Trajado com um belíssimo terno, uma gravata cor escarlate e um charuto em mãos, ele se aproximou mais até que a luz do estacionamento o iluminasse o bastante pra que visse em seus olhos raiva.

— Eu já sabia que você não faria o combinado. Então tomei algumas precauções. — Disse apontando para ambos os homem de preto que ali estavam.

— Adorei sua gravata. Combina com o meu vestido, não? — Os homens se aproximaram mais. — Ah, por favor... Isso só pode ser brincadeira...

— Muito pelo contrário. Eu o classificaria como um acerto de contas.

— Acerto de contas?

— Digamos que, no momento que você falou seu preço, referiu-se também ao valor de sua vida. Espero que tenha uma boa noite. — Ricardo falou deixando os três sozinhos no local. Leonor tentou evitar isso abrindo a porta do carro para entrar, mas, em um movimento rápido, o homem na sua frente esticou o braço fechando a porta num estalo seco.

— Você não faria isso com uma dama, faria?

— Com uma dama, não. Com uma ladra vadia...

— Ui. Se a intenção era ofender, — Leonor sorriu — você não conseguiu.

— Minha intenção aqui é completamente outra. — Ele sorriu confiante.


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Notas finais do capítulo

É isso amadinhos *-*
O que vocês acham que vai acontecer com a Leonor? Como ela vai se safar dessa agora?
HAHA
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Reviews MUITO BEM VINDOS AMORESSSSSSSSSSSS
bjsbjs ♥