Segredo escrita por thana


Capítulo 7
Capítulo 7




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Eu fiquei no hospital por uma semana, eu acho, a mamãe e o papai sempre iam me visitar quando podiam, o que não era muito, mas sempre que eles apareciam eu pedia sempre a  mesma coisa “quero ir para casa” as vezes a mamãe se fazia de desentendida e falava:


 


_ Você precisa ficar no hospital até a doutora achar que já é seguro te levarmos para o seu quarto.


 


Eu já tava cansada de “explicar” qual casa eu queria voltar, e minha mãe também já tava cansada de “explicar” que ali era a minha casa.


 


_ Eu não quero ficar aqui _ eu quase gritava para ela uma noite antes de receber alta. Noite essa que eu tirei a faixa da cabeça.


 


_ Você tem que ficar aqui _ ela falava para mim com a voz autoritária.


 


_ Não, não tenho, eu vivi a minha vida inteira lá encima, posso terminar os meus dias lá também.


 


_ Eu não quero me aprofundar nesse assunto de novo _ disse ela pondo um ponto final na conversa.


 


Nesse momento a Dra. Julia entrou para uma ultima olhada em mim.


 


 


_ E então Julia? _ perguntou a mamãe antes de sequer a doutora fechar a porta do quarto.


 


A Dra. Julia carregava uma prancheta com vários papeis presos nela, depois da pergunta da minha mãe ela começou a revirar os papeis, e com os olhos ainda neles falou:


 


_ Ela pode ir embora amanhã mesmo.


 


_ Que bom _ disse a minha mãe com um sorriso no rosto de alivio _ Amanhã você vai ver seu quarto, aposto que você vai adorar! _ ela me disse.


 


_ Duvido! _ falei de cara amarrada.


 


A mamãe fingiu não ouvir o que eu falará, ela agora conversava com a doutora.


 


_ Você já os avisou? _ ela perguntou.


 


_ Sim _ falou a loira _ Eles ficaram felizes e ansiosos também, mas eu avisei que...


 


_ Não deveria ter falado _ interrompeu a minha mãe _ Eu disse que ia dar um jeito.


 


_ Não se preocupe _ disse a doutora _ Eles também entenderam, se ela não, quer não quer e pronto!


 


A Dra. Julia deu um sorrisinho amarelo.


 


A mamãe nada disse, parecia não querer forçar a doutora a algo. Eu sabia que elas estavam falando de mim e da minha estranha família.


 


Nessa ultima semana a minha mãe tinha feito de tudo para me convencer a conhecer os meus pais biológicos, mas eu tinha sido sempre categórica, se eu não podia voltar lá para cima eu também não queria os conhecer. Mesmo que ela dissesse: “Pior para você porque eles são pessoas ótimas” eu sabia que ela ia me fazer, de um jeito ou de outro, conhecê-los.


 


Passei aquela ultima noite agitada, tinha pesadelos com o cubículo cromado que me acordava a todo instante, sinceramente ainda tenho pesadelos com aquele lugar. Quando eu acordava a primeira coisa que eu pensava era: “tá, foi só um pesadelo!”, mas quando eu recuperava totalmente a consciência é que eu via que tinha sido tudo real, meu estomago revirava de raiva, medo, insegurança. Me enfiaram em uma vida, que não deveria ter sido minha, e me arrancaram de lá sem me perguntar se eu queria sair.


 


O sol demorou para aparecer aquele dia, o que era estranho porque estávamos dentro da terra, como é que a luz do sol podia entrar pela janela do quarto?


 


Enfim, quando a minha mãe apareceu, logo depois da Dra. Julia ter empurrada aquela comida sem gosto pela minha goela, ela trazia uma muda de roupa para eu vestir, afinal de contas eu não podia sair por ai com aquela camisola de hospital mostrando toda a minha retaguarda.


 


Me vesti com um short jeans preto e uma camisa azul claro (eu odeio essa camisa, só para constar) e sai com a minha mãe, quando eu me virei para seguir pelo caminho que havíamos vindo ela segurou o meu braço.


_ Não, vamos por aqui _ disse ela e me guiou para o lado contrario.


 


_ Mas... _ eu balbuciei enquanto minha mão me levava _ A outra garota foi por lá.


 


_ Aquele é o caminho mais longo _ ela explicava quando entramos em um corredor, eu me lembrava daquele corredor, ficava ali a sala onde eu escutei o Marcos levar uma bronca.


 


Assim que passamos por essa sala demos mais alguns passos até chegar a uma porta dupla, ultrapassamos ela.


 


Agora nos encontrávamos em um lugar imenso, cara você não pode imaginar o quanto grande era, ou melhor dizendo, é. Só para você ter uma vaga idéia parecia o centro comercial de uma grande cidade, sabe? Tipo, Nova York, São Paulo, Londres, Tókio, Paris... acho que já deu para entender, e como nesses lugares, tinha muita gente vestidos de vários tipos, tinham pessoas que pareciam empresários de alto escalão e outras que pareciam fazer coisas bem menos glamorosas. A única diferença é que naquele lugar havia altas paredes, acho que para impedir a terra de invadir o local, e acima das cabeças não tinha o céu azul cheio de nuvens e sim um teto com lâmpadas florescentes para iluminar.


 


_ Seja bem vinda a OSPT _ falou a minha mãe percebendo que eu tinha ficado estarrecida com tudo aquilo, ficamos por um bom tempo paradas na porta do hospital, até que ouvimos uma voz, que nos fez virar para a porta dupla:


 


_ Oi Marta _ cumprimentou um rapaz que devia ser mais velho que eu uns cinco anos, e vestia um uniforme azul claro.


 


_ Oi Paulo _ respondeu a minha mãe.


 


O tal do Paulo carregava uma caixa que parecia bem pesada.


 


_ Se você não se incomodar, dá para sair da frente _ falou ele com o que parecia ser as ultimas forças dele.


 


_ Ah, claro! Desculpe! _ disse rapidamente a mamãe e me puxou para o lado, deixando o homem passar e sumir na multidão. _ Bem, tá na hora de você ir  para o seu quarto.


 


Ela pegou na minha mão como seu eu fosse uma criança pequena e pudesse me perder naquele lugar (na parte de “eu me perder naquele lugar” ela até estava certa) e me levou pela multidão.


 


Como em grandes cidades ninguém parava por muito tempo em um só lugar, e nem pediam desculpas quando esbarravam em você. Muitas pessoas cumprimentaram a minha mãe, mas não passava de um “oi”, ninguém parava para conversar.


 


_ Para onde estamos indo? _ eu perguntei quando paramos em um trecho que lembrava muito uma avenida, parecia que ali tinha um transito de carros internos.


 


_ To te levando para o teu quarto _ ela respondeu enquanto olhava de um lada para o outro, eu fiz o mesmo e vi um caminhão que logo passou na nossa frente, o mais curioso é que esse caminhão não soltava fumaça pelo cano de escape, ainda bem por que senão todo mundo ali já teria morrido sufocado.


 


Atravessamos aquela avenida e caminhamos por cerca de 20 minutos, até chegar aos limites daquela “metrópoles”, limites esses demarcados pelos muros.


 


Quando chegamos aos muros eu percebi que haviam portas pelo longo da parede, não escondidas como as dos cubículos, pareciam mas portas de elevadores, o que realmente eram, a mamãe apertou o botão para chamar um deles e esperamos até abriu uma das portas, uma finalmente abriu, estava lotado, mas o bom é que todos desembarcaram ali.


Eu e a mamãe subimos nele, eu notei que tinha sobrado um homem.


 


_ Bom dia _ falou esse homem _ Para onde?


 


Ele devia ser uma espécie de condutor.


 


_ Para... _ disse a mamãe soltando a minha mão e pegando um pedaço de papel que estava em seu bolso _ Andar -15.


 


É isso mesmo que você leu, -15, sabe como na matemática? Quinze negativos.


 


_ -15? _ eu perguntei quando eu senti o elevador descer.


 


_ É _ ela simplesmente respondeu _ Foi à maneira que usamos para medir os níveis, já que lá encima eles calculam os andares como primeiro, segundo, terceiro e etc, os fundadores da organização pensaram que se acima da superfície é positivo, logo, abaixo da superfície deveria ser negativo, mas eu acho que era uma piada deles.


 


Pelo menos o pessoal que inventou tudo isso aqui era bem humorado, pensei.


 


Ficamos um tempo no elevador, parando algumas vezes para que pessoas pudessem entrar ou não, tinham algumas que quando ouviam que estávamos descendo simplesmente balançava a cabeça negativamente e esperávamos as portas fecharem para o elevador continuar descendo.


 


Finalmente chegamos no andar -15, minha mãe se despediu da moça com quem conversava alegremente e desembarcamos.


 


E lá estava eu em mais um corredor, já estava com e impressão de que aquele lugar devia ser igual ao um formigueiro. A única coisa diferente entre esse corredor e os outros é que esse era bem mais largo.


 


Como em todos os corredores que eu tinha entrado, havia portas de um lado para o outro. Nós andamos por ele até pararmos em uma porta branca, na verdade era a única porta branca do corredor, as outras eram todas estilizadas com desenhos ou adesivos ou os dois, ou com babadinhos ou simplesmente pintadas de outras cores. A porta a esquerda da minha era preta com desenhos de skates.


 


_ Esse é o seu quarto _ falou a mamãe apontando para a porta _ Entra! _ ela tava toda animada.


 


Eu coloquei a mão na maçaneta, girei e escancarei a porta.


 


Se dali de dentro tivesse saido um leão esfomiado querendo me devorar me teria causado menos impacto, mas o que estava ali dentro era pior, pelo menos para mim.


 


_ Acho que conseguimos trazer tudo _ disse a mamãe.


 


Aquele quarto era... o meu quarto, o quarto de onde eu tinha sido levada, como se tivessem arrancado ele da casa e jogado ali.


 


Eu deveria ter ficado feliz, eu tinha um pedaço do lugar que eu tanto queria voltar.


 


 Só que aquilo ali representava uma mentira agora, me trasia lembranças de uma vida que não parecia ser mais a minha.


 


Como eu não demonstrei reação alguma a minha mãe praticamente me empurrou para dentro do quarto.


 


Ele estava igual como eu me lembrava: a cama era maior que uma cama de solteiro e era coberta por uma colcha branca com detalhes amarelos, e ficava no canto da parede oposto à porta, do lado direito ficava uma escrivaninha com o meu laptop (antes de eu ganhar esse laptop eu tive um computador de mesa, mas como a mamãe me obrigava a limpar ele todo dia e era muita coisa para limpar eu acabei pedindo esse laptop de presente de aniversario de 13 anos, ele é bem mais fácil de limpar), do lado esquerdo tinha o meu armário e no chão o tapete redondo com um ursinho muito fofo dormindo na sua cama e com uns Z’s saindo da sua boca.


 


_ Gostou? _ ela perguntou passando o braço pelos meus ombros, eu a olhei sem dizer nada _ Espero ter trazido tudo! _ ela me deu um beijo no topo da cabeça, sai e fechou a porta.


 


Eu olhei para aquele lugar por mais alguns segundos então voltei para a porta e a deixei bem aberta. A primeira coisa que fiz foi arrancar as cobertas da cama e jogar no corredor, aquilo não era meu, eu não sentia como se fosse meu, o segundo passo foi chutar uma lata de lixo, que ficava no lado da escrivaninha, pela porta, depois peguei o tapete e arremessei dali mesmo, uma pessoa que estava no momento ali na porta se esquivou do tapete, que iria lhe acertar bem na cara, nem dei muita importância, só vi que era um garoto, ele deve ter sido atraído pelo barulho que a lata de lixo fez quando bateu na parede do corredor, em seguida abri o meu armário e abracei o maior números de roupa que estavam penduradas no cabide e voltei para a porta onde eu despojei no corredor encima da cocha e da lata de lixo.


 


_ Você é a Suzan? _ perguntou o garoto que eu quase tinha acertado com o tapete, mas dessa vez ele tava do lado da porta com o ombro apoiado na parede, vai ver ele não queria ser alvo de novo.


 


_ Sou _ eu disse secamente e voltei para o armário.


 


_ Me pediram para te levar para o refeitório _ ele falou para dentro do quarto _ Você tá com fome?


 


_ Não _ eu respondi enquanto despejava as roupas que estavam em uma da gavetas.


 


_ Por que você ta fazendo isso? _ ele perguntou mais uma vez me vendo despejar outra braçada de roupa _ Tá querendo arrumar o quarto do seu jeito?


 


_ Não _ eu falei.


 


_ Então te pediram para arruar ele? _ ele especulou enquanto eu voltava para o armário.


 


_ Não _ eu disse mais uma vez pegando o ultimo volume de roupas que estava na ultima gaveta e levando para o corredor.


 


_ Tudo isso ai é lixo? _ ele falou, eu não respondi dessa vez, achando que se eu ficasse calada ele iria embora, como eu não respondi nada ele especulou que sim aquilo era lixo.


 


O garoto ficou calado por uns instantes, eu já estava achando que ele iria embora, mas ele não conteve a língua quando eu peguei meu laptop e joguei encima de tudo que estava no corredor.


 


_ Você não vai quere isso?


 


_ Não _ eu falei olhando para o entulho que ficou no meio do corredor.


 


_ Você só sabe falar isso? _ ele questionou com as sobrancelhas juntas formando uma expressão curiosa.


 


_ Não _ falei olhando para ele e em seguida entrei e fechei a porta.


 


Olhei para o quarto, que nesse momento estava vazio, só tinha uma cama com um colchão encima uma escrivaninha vazia e um armário vazio também. Eu só não tinha colocado o armário e a escrivaninha no corredor porque eram muito pesados, e quanto a cama, bem, eu não agüentava mais dormir em chão duro e cama de hospital.


 


Me deitei na cama macia e olhei para o teto me perguntando: quem realmente eu era?


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