Universo Em Desequilíbrio escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 3
Cabeça quente




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As labaredas continuaram varrendo a Terra e a distorção no espaço ao redor do planeta foi se tornando cada vez mais acentuada. Paradoxo acompanhava os acontecimentos da superfície da lua e percebeu que aquilo ia acontecer a qualquer momento.

Ele acionou o relógio, desapareceu e segundos depois foi parar novamente na lua, de onde podia contemplar a Terra. Só que era em outra lua onde ele pisava e era outra Terra que ele contemplava. O mesmo fenômeno se passava nesse outro planeta, que parecia estar se distorcendo no espaço.

– Hum... está se ajustando. Isso vai ser bem interessante, vai sim. Falta pouco para o show começar!

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– E aí, ela tá mais calma hoje? – Cebola perguntou para Cascão quando os dois se encontraram na praça de alimentação do shopping.
– Até que sim, viu? A Magá falou que ela não esbravejou hora nenhuma e nem ameaçou cortar sua cabeça.
– Ufa! Ainda bem!
– Acho que a Magá andou dando uns toques nela, saca?
– Tomara que ela tenha conseguido enfiar alguma coisa naquela cabeça dura! Credo, a Mônica tá chata demais ultimamente.
– Vai ver tá ficando cansada de tanto esperar você derrotar ela. Poxa, Careca, você não tá demorando demais não?

Cebola engasgou um pouco e tentou se justificar.

– E pra que a pressa? Derrotar a Mônica exige um plano muito bem feito, eu não posso ir fazendo tudo de afogadilho não!
– Sei não, viu... uma hora ela se cansa de esperar e aí já era!
– Bah, que nada! Ela não cansou até agora, não cansa mais! E também não exagera, tá legal? Você fala como se eu fosse demorar cinqüenta anos pra derrotar ela e isso não é verdade! Isso vai acontecer mais cedo do que você pensa, espera só!
– Se você diz. Olha as meninas ali, vamos. Eu tô cheio de fome!

Os dois se aproximaram da mesa onde as garotas se sentaram e Cebola dirigiu um cumprimento meio encabulado a Mônica, como se tivesse medo de apanhar a qualquer momento. Ela procurou manter a calma e os quatro pediram o lanche.

Após alguns minutos de silêncio constrangedor, Magali foi conseguindo introduzir uma conversa sobre amenidades fazendo com que os quatro se soltassem aos poucos e minutos depois eles já estavam conversando normalmente.

– Ai, ai, ai! Se eu não tirar uma nota decente nessa prova, vou ficar de recuperação! – Mônica reclamou quando o assunto se voltou para a prova de física.
– Sussa, Mônica! Eu te faço companhia!
– Só que eu não quero ficar estudando nas férias, Cascão!

Ele deu de ombros.

– Ih, eu já tô acostumado. Pelo menos a Cascuda fica comigo.
– Humpt! Se você não tivesse sido tão grossa comigo, eu teria te ajudado a estudar um monte.

Antes que Mônica reagisse com a mesma agressividade de sempre, Magali lhe deu um chute na canela para lembrá-la de manter-se no controle. Ela procurou ignorar e eles continuaram conversando.

Cebola torceu o nariz ao ver que ela não tinha revidado. Claro, ela devia estar tentando se fazer de dama, coisa que não era. “Quero só ver por quanto tempo ela vai conseguir manter essa máscara.” Decidido a saber até onde ela ia conseguir agüentar, ele continuou provocando e alfinetando. Bastava a Mônica abrir a boca para falar algo e ele sempre dava um jeito de soltar alguma piadinha de mal gosto. E quando ela não falava nada, ele implicava com seu jeito de comer e mastigar.

– Ô Mônica, você não sabe que é feio mastigar de boca aberta? Ah, esqueci. Seus dentões não te deixam fechar a boca direito, né?

Ela não falou nada, mas Magali percebeu que a mão dela apertava com força o pacote de batatas-fritas. Dava para ver o esforço que ela fazia para se controlar e não explodir de vez. Por que o Cebola não ficava quieto? Quando eles foram comer sobremesa, Mônica e Magali preferiram salada de frutas, enquanto Cebola e Cascão pediram um sunday cada um.

– Só frutinha, Mônica? Pfff! De que adianta comer fruta agora se você entupiu de batata frita antes?

A moça o encarou e ele a olhou de volta, com o nariz empinado, um sorriso debochado e um olhar provocador, como que a desafiando para uma briga. Foi preciso que Magali lhe desse mais um chute na canela para fazê-la se acalmar e as duas tentaram conversar para ver se o Cebola desistia. Mas ele não estava disposto a recuar tão facilmente. Aquela garota podia ser durona, mas ele era o rei da provocação e não ia descansar enquanto aquele fingimento não acabasse.

– Ai, que coisa! Quase não veio abacaxi pra mim, só um pedacinho de nada! – Magali reclamou olhando para sua salada de frutas.
– Se quiser, pode ficar com o meu. Eu não gosto muito de abacaxi não, é ácido demais.
– Ah, eu acho uma delícia! – Magali falou pegando os pedaços do prato da amiga.
– Pois eu prefiro frutas mais doces.
– Claro, porque de azeda já chega você, não é mesmo? – Cebola disparou.

“Calma, Mônica, calma! Respira fundo! Tenta ignorar que ele se cansa! Tenta ignorar que ele se cansa! Conta até dez, vai!” ela pensou consigo mesma ao sentir seu autocontrole escoando como areia entre os dedos.

– Ah, Mô, relaxa! Você sabe que eu tô só brincando, não sabe? Aqui, toma uma colherada do meu sorvete. Eu te deixo ficar com a cereja!

Por um instante, ela relaxou um pouco e abriu a boca para aceitar a colher de sorvete que ele lhe estendeu. Quando a colher chegou perto da sua boca, ela sentiu algo gelado e mole caindo dentro do seu decote.

– Ai, Cebola!
– Hahaha! Essa foi boa, você caiu direitinho! Hahaha!

O rosto dela ficou vermelho, seus dentes trincaram, seus olhos faiscavam de raiva e as mãos se fecharam com força.

– Você devia ter visto sua cara de susto, essa foi demais! Pena que a Denise não tava aqui pra filmar.
– Mô, tenha calma! – Magali sussurrou em seu ouvido.

Cebola continuou falando, ignorando que estava diante de uma bomba relógio prestes a ser detonada.

– Ah, não faz essa cara não, que coisa! Você não pode ficar tomando sorvete, esqueceu? Senão, além de dentuça e baixinha, você vai voltar a ser gorducha. Hahaha!

Cascão e Magali recuaram da mesa na mesma hora. Depois daquela, Mônica tinha atingido o seu limite máximo de tolerância e não dava mais para suportar.

– Ai, faz isso não Mô! Calma, vamos lá pro banheiro que eu te ajudo a limpar tudo!

Ignorando totalmente os apelos da amiga, Mônica foi para cima do Cebola.

– Ai minha santa quelupita! – ele exclamou pouco antes de ela agarrar a gola da sua blusa.

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A distorção do espaço ao redor da Terra pareceu aumentar mais ainda, dando a impressão de que o planeta estava se contorcendo como se fosse de borracha.

– Comandante, parece que a distorção está piorando! Eu nunca vi coisa igual!

Astronauta apertou os lábios, preocupado com a segurança do planeta. O que ia acontecer caso aquilo piorasse ainda mais? E se os dois universos acabassem se misturando? Aquilo podia significar a destruição de um deles ou mesmo dos dois. Não havia como saber.

As labaredas elétricas que percorriam o globo aumentaram de intensidade, concentrando-se em um ponto específico na América do Sul.

– Alferes, determine a localização exata dessa concentração de energia.

– Sim senhor. – ele inseriu alguns dados, fez vários cálculos e voltou-se para o comandante, com os olhos arregalados. – Senhor, de acordo com meus cálculos, as rajadas elétricas estão se concentrando no bairro do Limoeiro!

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Cascão andava do lado do Cebola, que caminhava com certa dificuldade por causa das roupas ensopadas. Pelo menos daquela vez encrenca não tinha sobrado para ele. Menos mal. Se tinha uma coisa pior do que levar uma surra, era ser jogado na fonte de água do shopping.

Atrás deles, alguém chamou.

– Cebola, espera aí!

Ele ignorou e continuou andando.

– Espera, vamos conversar. Desculpa, vai!

O careca não parou.

– Pô, sacanagem véi! Tenta conversar com ela!
– Conversar? Você viu o que ela me fez?
– Ué, quem mandou ficar cutucando a onça com a vara curta? Qualé, cara! A Mônica tava quieta no canto dela e você ficou provocando o tempo inteiro!
– Não muda de assunto! Eu não vou aceitar esse tipo de desaforo, quem ela pensa que eu sou? Cansei de ficar só apanhando, tá legal? É muita humilhação!

Mônica apertou o passo, sendo seguida por Magali, e conseguiu alcançar os dois segurando Cebola pelo braço.

– Ai, espera! Poxa, eu já pedi desculpas!
– Ah, tá! Depois do que você fez? Caramba, você tem que resolver tudo só na porrada?
– Mas você ficou me provocando, esqueceu?

Ele parou de andar e puxou o braço bruscamente.

– Claro, agora a culpa é minha, não é? Você é uma descontrolada, sabia? Vive dando chilique a toa e vem jogar a culpa pra cima de mim? Quer saber de uma coisa? Cansei!
– Como é?

Cascão tentou acalmar as coisas.

– Ô, segura a onda aí cara! Vamos embora que é melhor!
– Não vou segurar nada, Cascão! Tá na hora de eu falar umas poucas e boas pra essa marrenta aqui!
– Olha lá como fala comigo, ouviu?
– Estão vendo? Estão? Ninguém pode falar nada com a rainha braveza que ela acha ruim! Todo mundo tem que ficar calado!
– Cebola!
– Não, agora quem vai falar sou eu e você vai escutar. Na boa, Mônica, você já encheu o saco com esse gênio ruim! Eu não quero nenhuma descontrolada atrás de mim, valeu? Me faz um favor?

Ele ficou em silêncio por um tempo e voltou a falar.

– Fica longe de mim, tá legal? E só volta a me procurar quando aprender a agir como gente grande, porque eu não agüento mais você ficar brigando comigo por qualquer coisinha? De agora em diante, eu exijo respeito!
– Espera, Cebola! Eu já pedi desculpas e...
– E nada! eu não tenho que agüentar mais os seus desaforos, então vai me procurar lá na esquina! E se me encontrar, finge que não me conhece!
– Ei!

O rapaz saiu dali pisando duro, com Cascão ao seu encalço. Magali conseguiu segurar o braço da Mônica para que ela não fosse atrás dele.

– Deixa, amiga! Amanhã ele se acalma e esquece tudo! Vamos pra casa.
– Eu não acredito que ele fez de novo, que ódio!
– Fica assim não, ele sempre te provoca! Não sei por que a surpresa!
– Não é isso, Magali. O Cebola vive me provocando e quando eu reajo, ele se faz de vitima, como se só eu tivesse errado e ele não!
– Mas também por que você foi jogar ele na fonte? Precisava disso tudo?
– E precisava ele ter jogado sorvete na minha blusa?
– Você devia ter ignorado! Ah, Mô! Você tava indo tão bem! Se continuasse agüentando firme, ele teria desistido.
– Humf! Você fala isso porque não tava no meu lugar agüentando desaforo!
– Pois se eu tivesse no seu lugar, teria...
– Ai, pára! Você não tava no meu lugar, quem tava ali era eu!
– Puxa, o Cebola tem mesmo razão, sabia? Você é esquentada demais! Apela por qualquer coisa e acha que ninguém pode te falar nada, ninguém pode zoar, brincar...
– E você acha que aquilo foi só uma brincadeira? Teria gostado se fosse com você?

Magali fechou a cara e falou num tom enérgico.

– Vamos fazer o seguinte: é melhor você ir pra casa e esfriar a cabeça porque não tá dando pra falar com você! Ao invés de assumir que tem um gênio ruim, você fica botando a culpa em todo mundo! Amanhã a gente se fala, tá?

Ela saiu dali, ainda sob os protestos da Mônica. Ao ver que estava sozinha no meio da rua, ela acabou indo para casa remoendo sua insatisfação.

Chegando em casa, ela tomou todo cuidado para não quebrar a porta de novo e foi para a cozinha bufando de raiva a fim de tomar um copo d'água para se acalmar.

– Filha, o que foi?
– Ah, o Cebola! O que mais seria? Grrrrr! Ele me dá nos nervos!

Luisa balançou a cabeça, dando um sorriso meia-boca.

– Será que você tem sempre que brigar com o Cebola?
– Não, mas acontece que ele...
– Querida, não fique assim! Olha, suba para o seu quarto, tome um banho e troque de roupa. E tente descansar porque você está muito nervosa hoje.

Como estava exausta de tanto stress, Mônica acabou obedecendo sem discutir. Pelo visto, sua mãe não estava com disposição para ouvi-la reclamar do Cebola pela milésima vez. E pensando bem, ela mesma já estava cansada de tanto reclamar e passar raiva por causa do Cebola.


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