O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 3
Capítulo 2 - Ódio e Orgulho


Notas iniciais do capítulo

Capítulo betado!



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— O menino de Marta, você soube?

— O fruto daquele caso que ela teve aos dezesseis anos com aquele pecador?

— Soube que ela estava para se casar, mas contrariou o destino…

— O que houve com a criança?

— Não era Travis o nome dele?

— Leharuin o matou?

— Dizem que as borboletas atacaram, e Travis rolou do barranco…

— Caiu em cima de uma planta fogaréu… Ele tinha alergia?

— Os amigos viram… estão arrasados…

— Aquilo é cria do demônio… Judith ainda tenta proteger aquela criança…

— Beth também, desconfiam que ela foi seduzida.

— Por quem? Por ele?

— Ele é filho de uma sereia, não é? O destino dele é a morte, mas foi salvo… Moros está irritadíssimo…

— Pobre Marta, era tudo o que ela tinha…

— Mas a planta… pode ter sido um sinal…

Os boatos corriam rápido, meus amigos, ainda mais quando se havia a necessidade de culpar alguém inocente. Entenda, um grande problema da humanidade é usar o destino como justificativa para seus atos. A responsabilidade pesa menos quando se acredita que aquilo era inevitável, que a culpa não foi sua, e sim daquele que escreve o rumo imutável de nossas vidas.

Naquela época, esse pensamento não era diferente; pode-se dizer que ele era visto de uma forma muito mais… radical. Não se podia questionar o destino. E, no momento em que encontraram o corpo de Travis completamente inchado em uma moita de planta fogaréu, os moradores acharam que aquilo significava alguma coisa.

Foi então que decidiram colocar fogo na casa de Leharuin.

Em uma noite em que todos dormiam tranquilamente, as borboletas acordaram o menino. O garoto, que até então tinha apenas oito anos, se levantou da cama para descobrir o que suas fiéis companheiras queriam em um momento tão inoportuno da noite. As borboletas o guiaram para fora de sua casa e o levaram colina acima, onde ficaram o rodeando baixinho, como se estivessem se escondendo de alguma coisa. Leharuin não conseguia entender as ações de suas amigas, e por conta disso resolveu voltar para sua casa, que brilhava intensamente.

Ficou petrificado onde estava enquanto seus olhos registravam algo que sua mente se recusava a acreditar. Uma multidão empunhava tochas, porém o desafortunado menino estava longe demais para ouvir qualquer coisa. Estava longe demais para ouvir os gritos desesperados de Beth, ou os apelos chorosos de Judith, nem mesmo os brados de fúria daquele que o havia nomeado podiam ser escutados.

As borboletas não deixaram Leharuin voltar para casa. Apesar de toda a fúria do menino e da sua vontade suicida de vingar sua família, de dar um fim àquela injustiça, elas não queriam que a pobre criança se desapontasse ao descobrir que era tarde demais, nem queriam que ele fosse atormentado pela visão dos corpos de sua querida família queimados. E acima de tudo, não queriam vê-lo machucado.

Do topo da colina, pela primeira vez, Leharuin odiou os humanos.

Vendo-se obrigado a depender unicamente de si mesmo e podendo contar apenas com a ajuda de suas fiéis borboletas, Leharuin escolheu o caminho do furto e acabou por se tornar uma lenda...

Porém, meus amigos, a história não termina por aqui. Vejam, muitas foram as suas aventuras e, quando chegar a hora, irei contá-las a vocês. Contudo, a história deve se afastar um pouco de Leharuin e viajar rumo a Delfinos…

 

 

Não havia muita coisa interessante no mar, mas mesmo assim Eruwin adorava sua vida ali. Adorava o cheiro da água e todas as criaturas que ali viviam. Porém, se havia uma coisa que Eruwin adorava mais que sua vida no mar, bem, essa coisa era afogar humanos. O desespero quase palpável que sentiam lhe arrancava um sorriso sombrio. Eles mereciam muito mais sofrimento, contudo, aquela sereia não tinha criatividade para a crueldade. De todas as formas, quebrar o coração de um homem era o suficiente para deixá-la feliz por semanas.

A sereia se viu de frente a essa oportunidade quando um indivíduo daquela odiosa espécie havia sido abandonado em uma ilhota. Ele tinha braços fortes, contudo era quase um palmo menor que ela. Os olhos estavam perdidos em algum lugar do horizonte. 

Após avaliar bem a situação, decidiu subir até a pequena ilha, com o objetivo de seduzir o náufrago desprovido de sorte antes do sol se pôr.

— Olha o que temos aqui… Seus irmãos te abandonaram? — Um sorriso encantador surgiu em seus lábios. O humano a olhava levemente atordoado (pelo menos era isso o que lhe parecia).

— Não são meus irmãos. Mas, sim, fui abandonado. Acho que irei morrer nessa ilha. Poderia ao menos me privilegiar com uma conversa? — A sereia não sabia, porém aquele rapaz era mais prudente que a maioria. E mais inteligente também.

— Todas as sereias são irmãs… Humanos não conhecem a lealdade, por isso são do jeito que são. — Até mesmo as palavras mais venenosas fluíam de forma adorável quando ditas pela sereia. Ela se arrastou para perto do alvo, o olhava mais intensamente, não possuía tempo para conversar. Ao menos não naquela ocasião.

— Por isso vocês abandonam seus filhos? — Ele observou o rosto da sereia se contorcer de desgosto e percebeu que nem sempre as sereias eram belas.

Vocês abandonam seus filhos! Nunca cumprem o acordo e… — Ela estremeceu, respirou profundamente e procurou se acalmar. Não havia tempo. Sorriu docemente, readquirindo o controle. — Diga-me, querido, qual o seu nome?

— Henry. E o seu, bela sereia? — Ele sentia seu coração fraquejar, tentava não olhar para o que os longos cabelos loiros escondiam, tentava não deixar a morte lhe seduzir. Arrastou-se um pouco para trás, temendo o contato com o ser marinho.

— Não há necessidade de saber o meu nome… sabe? — Pouco a pouco, Eruwin se aproximava de seu objetivo; e cada vez mais Henry duvidava que pudesse sair vivo dali. — Qual a importância de um nome, quando posso fazer tudo o que você mais deseja?

Os lábios da criatura estavam perigosamente perto. Henry conhecia as histórias, sabia do que o beijo de uma sereia era capaz. Entretanto, ela não parecia querer beijá-lo.

— E o que eu mais desejo? — perguntou em um sussurro, o coração batia rápido em seu peito, cada batida gritando pela sobrevivência, cada vez tentando manter um espaço entre o seu corpo e o dela.

— O que a maioria dos homens deseja, não? — Apesar de ter ficado ligeiramente surpresa com aquela pergunta, Eruwin não demorou muito para recuperar o fio da conversa. Seu tempo logo acabaria, aquele humano estava se mostrando difícil demais. Levou seus lábios até o ombro dele e sentiu o corpo de sua presa estremecer.

— Sabe, acho que nunca fui como a maioria dos homens. — Sua frase saiu falha devido ao esforço de manter sua mente funcionando. Não podia se deixar seduzir pelas palavras dela.

— É mesmo? Você tem certeza do que está dizendo? — A criatura mordiscou levemente a orelha do rapaz. Naquele momento, Henry foi vencido, estava completamente nas mãos da sereia. Ele morreria e teria apenas a Lua como testemunha.

Foi então, caros amigos, que algo aconteceu.

Eruwin gritou de pavor, ou talvez de dor, e aquele grito despertou Henry completamente. Quando ele olhou novamente para a sereia, para seu grande espanto, viu que a criatura havia perdido suas barbatanas e ganhado pés humanos no lugar.

— Maldito! Maldita! Maldito! Maldita! — Eruwin não sabia quem deveria ser o alvo de seu ódio: a sua presa, que resistira mais do que o necessário, ou a lua cheia que, com sua pálida luz, a transformara em uma frágil mulher. Olhou para trás e, para seu desgosto, percebeu que se afastara demais da margem da ilhota e agora teria que se arrastar, sendo obrigada a ferir aquelas frágeis pernas para conseguir sua barbatana novamente. Contudo, foi impedida pelo homem, que a prendera com um abraço forte. Tentou desesperadamente se soltar das garras daquela criatura imunda.

— Fique calma! Eu não vou te machucar. Se você prometer que não vai me afogar, posso te carregar até a água. — Henry não poderia dizer ao certo, talvez ele não tivesse despertado totalmente, e por causa disso sentisse essa necessidade de ajudar a sereia. Ou talvez fosse extremamente burro e quisesse, de certa forma, morrer nos braços daquele ser enigmático.

— Eu posso chegar até lá sozinha! Não preciso da ajuda de alguém como você! — Eruwin não deixaria que aquele ser repugnante ferisse seu orgulho tão facilmente. Era preferível machucar suas pernas.

— Vai levar a noite inteira, qual o problema em me deixar te ajudar? — Henry começava a ficar impaciente. Ouvira falar muito a respeito de sereias, porém nunca lhe falaram de uma sereia ser tão orgulhosa.

— Acha que sou idiota? Por que você ajudaria alguém que minutos atrás estava prestes a te matar?

— Acredito que eu seja o idiota, então. Se não quer a minha ajuda, vai ter que correr contra o tempo. — Ao perceber a confusão mal disfarçada no rosto da sereia, suspirou. Estava entre a cova e a espada. — Um navio pirata. Devem ter visto a gente, porque estão a apenas dois minutos daqui.


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Notas finais do capítulo

Olá, queridos! Estou aqui postando mais um capítulo, sei que estou um pouco atrasada, haha, mas as aulas voltaram e sabe como é, tudo fica um pouco corrido. Espero que não tenham ficado muito perdidos nesse capítulo! A Eruwin tem um peso na história e por isso tive que começar a preparar o terreno para ela aparecer, porém logo voltaremos para o Leharuin e suas borboletas. Obrigada por acompanharem essa história! Beijinhos.