O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 28
Capítulo 27 - Quando Ele Não Voltou


Notas iniciais do capítulo

Aeaeaeae, me atrasei só um pouquinho dessa vez, né? ^u^ Enfim, espero que gostem desse capítulo ~ Preparem o coraçãozinho :3



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Clara sonhou com o primeiro dia de sua longa espera.

Por vezes nossos sonhos remetem aos pensamentos que tivemos antes de adormecermos. Quando Leharuin conseguiu fazê-la dormir, uma pergunta assombrou sua mente: e se ele não estiver aqui quando eu acordar? Não queria dormir, pois minha medo de perdê-lo, ainda assim não foi forte o suficiente para vencer o poder de um sono acumulado durante tantos anos.

No dia em que ele não voltou, Clara saiu para procurá-lo no mercado. Sabia que ele roubava e conhecia os riscos que ele corria por causa disso. Seu corpo inteiro tremia de medo... e se algo terrível tivesse acontecido?

No segundo dia, tentou perguntar por ele, porém poucas pessoas conseguiam ler e aquilo só a deixava ainda mais angustiada. Foi então que ela encontrou uma senhora, que descobriu ser a sua estranha vizinha reclusa. Não foi preciso perguntar, era como se aqueles olhos cor de terra já soubessem... como se aquela desconhecida fosse a mensageira que Moros enviara para lhe dizer que Leharuin estava bem.

— Ele foi embora. Fugiu, como o covarde que é — informou com a voz lenta. Por alguma razão, havia desapontamento em seus olhos.

A menina solitária voltou para casa. No início, apenas permaneceu deitada em sua cama. Não queria comer, apesar de sua avó a obrigar. O ladrão estava em algum lugar lá fora... longe do seu alcance. A promessa que ele fizera martelava seu coração. Foi então que ela percebeu. Ele teria que voltar um dia, ele recuperaria a coragem e voltaria para ela.

Desde então, ela passou a esperá-lo na janela.

À princípio, sua avó acreditou que aquilo era o início da sua melhora, entretanto, era bem diferente disso. Aquele era o início da sua loucura.

Permanecia fielmente sentada em frente a janela, sem nunca sair dali, apenas quando era forçada. Se recusou a comer, temendo que, em sua ausência, ele passasse. Temia que, se ele não a visse ali, acabasse indo embora com o falso pensamento de que ela desistira dele. A solução veio quando sua avó cedeu e permitiu que a neta passasse a realizar suas refeições sentada no seu local de vigília.

— Ele não voltou? — perguntou certa noite e foi a primeira vez que sua avó, querendo ou não, acabou se afeiçoando ao garoto.

O tempo, exercendo sua função cruel, passou sem esperar que aqueles que foram deixados para trás pudessem se reerguer. Pode-se dizer que é uma mentira o que dizem sobre o tempo curar todas as dores... por vezes ele só às intensifica. Assim ocorreu com Clara, quando esse carrasco levou sua avó embora. Demorou quase um dia inteiro para que Clara notasse sua ausência.

Imaginou que ela estivesse dormindo ou pregando-lhe uma brincadeira de mal gosto. Imaginou o possível e o impossível, menos que ela estivesse morta. Os minutos se passaram até que Clara entendesse a razão para que sua avó não respirasse. Ela não estava mais ali. Nunca mais estaria ali para cuidar dela.

Aquele dia foi a única vez que seu pai lhe deu atenção. Foi guiado até o quarto onde aquela que os havia criado repousava eternamente.

Desde pequena ela sabia que havia algo de errado com seu pai. A expressão mentalmente doente poderia ser usada, mesmo que Clara não soubesse exatamente o que aquilo significava. Naquele fatídico dia, a garota finalmente entendeu.

O homem sacudiu o corpo sem vida com delicadeza e então, ao não ter resposta, com veemência.

— Mãe? Mãe! — Podia ler seus lábios, apesar do tremor que se tornava cada vez mais violento a cada palavra que eles pronunciavam. — Mãe!

Não lhe foi permitido ir ao sepultamento. Nunca soube a razão, mas desconfiava que foi uma forma que seu pai encontrou para dizer que ela não fazia parte da família.

Dois anos se passaram quando Liese bateu à sua porta. A nova mensageira de Moros, dessa vez para informar que sua espera em breve findaria.

Agora não vivia em uma casa silenciosa e solitária. Com um certo prazer perverso, Clara observou o desafio de seu pai: ignorar os amigos da filha. Sabia que o dilema martelava sua mente, porque havia o risco de alguém falar para os condes e duques e essas outras baboseiras para os quais ele tocava. Que pessoa ouviria as músicas de homem tão insensível? Quem ouviria um pai que abandonara a própria filha?

Evidentemente que esses pensamentos cruéis nunca permaneciam por muito tempo. Afinal, ela sabia que seu pai a observava durante a noite. Por vezes, quando acreditava que ela estava dormindo, ele ficava parado na porta observando-a. Clara nunca conseguiu decifrar a expressão em seu rosto e era por isso que ela tinha esperanças. Tinha esperanças de que no fundo ele a amava, apenas tinha dificuldade para admitir isso.

Despertou no meio da noite, seus olhos escuros imediatamente procuraram por Leharuin.

O rapaz estava em pé, próximo a cama. Por um segundo, ela o confundiu com seu próprio pai.

— Clara. — Não conseguiu ler seus lábios, estava escuro demais para isso, ainda que gostasse da ideia de que ele estivesse esperando por ela. Para beijar sua boca e dizer que estava ali. Que ele sempre estaria ali.

Leharuin acendeu uma vela do velho candelabro em cima da cômoda e o levou até ela.

— Dormiu bem? — o movimento de seus lábios eram gentis e aquilo a fez sorrir. A expressão do ladrão, no entanto, era soturna e Clara pode sentir seu sorriso pouco a pouco se desfazendo. — Clara, eu estava escondendo algo de você… eu… eu descobri como achar minha mãe... precisarei ficar fora. Serão apenas seis meses, Sendulum me levará.

A notícia a machucou como uma faca. Não, ele simplesmente não poderia ir embora. Outra vez não. Apenas seis meses? Aquilo era uma eternidade! Não conseguiu reprimir o impulso de abraçá-lo e nem as lágrimas. Mesmo achando que já não possuía mais lágrimas para chorar, elas sempre a surpreendiam. Os braços quentes do ladrão a envolviam com força. Como ele poderia ter coragem de abandoná-la outra vez?

— Clara.... — Seus longos dedos levantaram seu queixo, forçando-a a visualizar as palavras que ela não gostaria que se formassem. — Eu preciso. As borboletas estão impacientes, notou que o número cresceu? É minha mãe me chamando... Seamus disse que ela quer se desculpar.

Eu não quero esperar… Não aguento a dor da espera, por favor, não me faça esperá-lo outra vez...— As palavras silenciosas que talvez ele não conseguisse decifrar. O choro mudo a atrapalhava e isso a irritava. Porque ele precisava atender ao seu apelo, porque Leharuin precisava entender que ela já não tinha mais forças...

— Meu amor, não vê? Minha vida inteira eu fiz com que alguém esperasse por mim. Melhor do que ninguém, você deve compreender a dor dela. Porque minha mãe me espera desde que me abandonou. — Mas eu nunca abandonei você!, essas foram as palavras que se formaram na mente de Clara. Sabia que estava sendo infantil, assim como sabia que acabaria cedendo. Leharuin já havia decidido. Ele não estava pedindo sua opinião, estava se despedindo. — Eruwin e Lily lhe farão companhia. Seamus e Henry também... mas eu preciso que cuide da Analiese. Pode fazer isso por mim?

Liese? — Esperava que o ciúmes não tomasse conta de seu rosto. A razão lhe era desconhecida, mas sabia que aquele sentimento não estaria ali se o ladrão pedisse para que ela cuidasse de Eruwin no lugar de Liese.

— Ela foi deserdada e a culpa foi minha. Não sei há quanto tempo ela vive sozinha... — Os olhos dourados estavam duros, com raiva e todo o vestígio daquele sentimento corrosivo desapareceu. No fim das contas, Liese também fora abandonada por seu pai. — Acho que conviveu com ela tempo o suficiente para saber que ela por vezes parece uma criança. Não quero que a vida dela se torne ainda mais difícil por minha culpa. Foi graças a ela que eu consegui voltar para você.

A garota silenciosa suspirou, de fato, Liese era como um milagre em suas vidas. Não havia motivos para não cuidar dela, mesmo que ela não entendesse o motivo de ter sentido ciúmes. Liese era sua amiga e Leharuin certamente não era o tipo de homem que se influenciava por um rosto bonito. Clara tinha certeza de que não era agraciada com a beleza e ainda assim ele havia voltado por ela. Mesmo que agora estivesse indo embora novamente…

Não poderia pensar nisso. Afinal, diferentemente da última vez, ele agora estava se justificando. Ele certamente voltaria. E a mãe dele havia esperado por muito mais tempo que ela...

No fim das contas, Clara aceitou que seu amado precisava conhecer a mãe e ficou feliz em cuidar da princesa. Era como se fossem irmãs, afinal.

Tudo estaria certo se Liese não tivesse ficado contra.

— Eu tenho uma casa, não vou morar aqui. — respondeu com uma expressão teimosa quando Leharuin propôs que a jovem se mudasse para a casa de Clara.

— Você não pode continuar morando lá. É perigoso, ainda mais para uma jovem solitária. Não pode continuar morando sozinha! — O grupo assistia a cena, porém apenas Clara e Enzo não possuíam uma expressão confusa.

— Minha porta tem tranca — disse com o olhar indiferente.

— Nossa, como se isso lhe desse segurança! — esbravejou o ladrão, a irritação tomando conta do seu corpo. — Qualquer um pode arrombar uma porta e aí você estará indefesa. Uma tranca não vai impedir que um homem doente faça... faça algo com você. Liese, você vai se mudar pra cá.

— Leharuin, eu não obedeci o meu pai. Mesmo quando ele me deserdou. Só me dê uma única razão para eu obedecer você. — A compreensão se espalhou pelos presentes, exceto por Eruwin. A sereia certamente não entendia o significado do verbo deserdar. — Você não é meu pai, não tem poder sobre mim, não pode me obrigar a fazer coisas das quais não tenho vontade!

— Porque eu me importo, Liese! Que droga, por que fica agindo como uma princesa mimada? — Nenhum lábio se moveu, nessas horas Clara podia sentir a presença do silêncio. A expressão da princesa se abalou por um breve instante.

— Talvez porque eu seja uma princesa mimada... — Era notável a força que a jovem empenhava para não chorar. Era algo que Clara não conseguia entender... se ela queria chorar, por que simplesmente não deixava que as lágrimas rolassem? Leharuin certamente não brigaria, ele iria entendê-la. Iria entender o quão machucada ela estava. — E mesmo assim eu posso muito bem cuidar de mim mesma.

— Liese... eu não quero lhe obrigar a nada, não entende? Estou pedindo, por favor, para morar aqui — o ladrão suspirou. Estava cansado, provavelmente cansado de nunca conseguir se expressar corretamente. Deixou-se cair na velha poltrona e afundou o rosto nas próprias mãos. Clara não conseguiu ver as próximas palavras de Leharuin, mas eu sim. — Você é minha melhor amiga, princesinha, eu jamais me perdoaria se algo de ruim te acontecesse.

Não foi quando Analiese cedeu que Clara finalmente percebeu. Demorou um pouco, no entanto tudo pareceu fazer sentido. Porque agora ela entendia a razão para Liese evitar Leharuin a todo custo ou como se tornava distante quando próxima a ele. Foi quando ele partiu que Clara notou a dor nos olhos da princesa. Foi aí que ela entendeu o sentimento odioso da noite passada.

E agora, caro observadores, eu irei lhe contar o erro de Leharuin.

Ele ocorreu quando nosso querido ladrão estava partindo ao lado de Sendulum e Enzo Faísca. Ele ocorreu quando o infeliz ladrão cruzou com o pai de Clara na esquina.

— É, eu voltei. — comentou com seu irritante tom sarcástico ao ver a expressão surpresa pouco disfarçada do homem. — E eu irei casar com sua filha daqui a seis meses. Quer você abençoe esse casamento ou não. Ela finalmente se verá livre de você.

Claro que não devemos culpá-lo. Tamanho era o ódio que o rapaz sentia pelo pianista, que ele simplesmente não conseguiu evitar. Agora o Pianista seria condenado a solidão. A Donzela Silenciosa seria salva pelo Perseguido Azul e eles viveriam felizes para sempre.

Naquele momento, o coração do Perseguido Azul se encheu de satisfação. O do Pianista, no entanto, se partiu. Ele jamais abençoaria aquele casamento.


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