Para Sempre Lidinho escrita por Érica, Mariana R


Capítulo 45
Em família


Notas iniciais do capítulo

"Às vezes fico, assim, pensando... Essa distância é tão ruim. Por que você não vem para mim? Eu já fiquei tão mal sozinho. Eu já tentei, eu quis chamar... Não dá para imaginar quando é cedo ou tarde demais para dizer adeus, para dizer jamais."... (Titãs)



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“Bruno, você está me escutando?”

                O som distante da voz de minha mãe me trouxe de volta dos devaneios. Suspirei pesadamente e olhei para o rosto contrariado de dona Marta.

                “Não... É, desculpa. Eu tava meio longe.”

                “Dá pra notar.”

                Sussurrou minha maninha, Juliana, que se encontrava sentada ao meu lado.

                Sempre fomos muito amigos, fato do qual me orgulhava, e tínhamos a estranha capacidade de reconhecer o estado de espírito um do outro. E hoje, o meu não estava nada legal. Vim jantar com minha família quase por obrigação quando no fundo o que mais desejava era estar em outro lugar, com outra pessoa... Não é que eu não aprecie a companhia deles, mas queria passar mais tempo com Fatinha, mesmo ela não desejando o mesmo. Entretanto, dona Marta fez questão em ter os filhos e o marido reunidos numa espécie de celebração.

                “É só uns lances lá do trabalho... Não há nada com o que se preocupar.”

                Falei ao pé do seu ouvido. Ela me olhou interrogativamente.

                “Sei...”

                Ju sabia o real motivo para meu desanimo, mas respeitava o meu espaço e, por isso calou-se.

                “Que seja! O que importa é que estamos todos aqui, em família, para uma noite agradável. Seu pai venceu um importante caso. Portanto, Bruno trate de esquecer os problemas.”

                “Claro...”               

                Mas dizer não era o mesmo que fazer, certo? E hora ou outra me perdia novamente nos pensamentos. A mente vagava longe, indo parar na mesma direção: Fatinha. Aquela loira maluca e cheia de vida que tava tirando meu sono com sua indiferença e distanciamento.

                “Por que tem que ser tão difícil?”

                “O quê?”

                Dessa vez foi meu pai a me interpelar. Sem dar-me conta, falei em voz alta o que me vinha à cabeça.

                “Nada. Eu só tava pensando alto...”.

                “O que eu acho é que você tem trabalhado demais, filho. – Falou dona Marta, sempre protetora – não deve ser fácil passar o dia todo na ‘Citrus’ e voltar para um lugar como aquele.”

                O desdém de minha mãe pelo ‘lugar’ – quarto da Fatinha – era claro. Para não entrar em conflito, me calei.

                “Deixa ele mãe. O Bruno quer ficar perto da Fatinha, só isso.”

                Apesar de não precisar, Ju veio em meu socorro. Sorri para minha irmã, e pude ver que o tempo em que eu a defendia e amparava havia ficado para trás. Juliana era uma mulher formada, madura e uma ótima pessoa. Mas independente disso, sempre seria a minha maninha.

                Dona Marta riu da afirmação de Ju.

                “Não quer que eu acredite nisso, quer? Eu conheço o seu irmão, Juliana. Se ele se meteu naquele ‘muquifo’ foi única e exclusivamente pelo filho. Aquela garota não tem nada a ver com a decisão, errônea, do seu irmão de ir morar naquele hotelzinho.”

                “Engana-se, mãe. A Fatinha foi um dos principais motivos que me levaram a ir viver no Hostel.”

                Dona marta não perdeu a compostura diante das minhas palavras e continuou a falar como se nada houvesse sido dito.

                “Bruno, você não pode tá falando sério! Que influencia é essa que aquela garota tem para ter feito você sair de casa e ir para esse ‘Hostel’? Filho, eu sou sua mãe, não há necessidade de mentir para mim. Eu sei que está tão desgastado quanto nós com essa gravidez! Se não fosse por isso, jamais sairia de casa!”

                “Marta, querida, o Bruno teve os seus motivos. Ele é adulto e sabe muito bem o que faz...”.

                Meu pai tentou remediar o clima de tensão que se instalava entre nós, mas minha mãe não estava disposta a parar por ali.

                “Adulto? Essa é boa, Olavo. Adultos não engravidam garotas, se é que se pode dizer isso, como aquela Fatinha. Não duvido nada que ela tenha feito isso de propósito só para obrigar nosso filho a assumir um compromisso com ela. Conheço bem o tipo daquela lá, sempre a espera do primeiro desinformado para dar um golpe!”

                “MÃE!”

                Bati as mãos sobre a mesa ao me levantar. A cadeira em que estava caiu no chão, mas não me importei com isso. Tudo o que queria naquele momento era que ela parasse de ofender a Fatinha. As suas palavras, desprezo deixavam meu estômago revirado. Dona marta não usou o termo, mas praticamente comparou a mãe do meu filho a uma qualquer! Permaneci calado por um tempo, mas ela havia passado dos limites.

                “Bruno, calma aí!”

                 Juliana me olhava ansiosa e na tentativa de me acalmar pôs as mãos no meu braço.

                “Calma, mesmo! Isso lá é maneira de se portar, rapaz?”

                Enfatizou o Doutor Olavo.

                “O que o senhor quer que eu faça quando a mulher que espera meu filho, seu neto, é insultada na minha presença?”

                “Sua mãe não quis dizer isso, ela...”.

                Porém, antes que o meu pai achasse uma explicação para o comportamento da minha mãe, esta resolveu se pronunciar.

                “Pode deixar, Olavo. Eu sei o que disse e não me arrependo de tê-lo feito! Não é segredo para ninguém que eu não gosto da ‘Fatinha’. Desde o inicio eu soube que ela só iria atrapalhar a vida do nosso filho, e pelo visto conseguiu! Ele trocou a Ana, uma garota tão boa, por uma menina vulgar e sem princípios que não pensou duas vezes antes de dar o golpe da ‘barriga’. Agora, me responda como é que uma mãe pode ficar calada diante de um absurdo desses? Meu filho, a quem eu amei e cuidei com todo o carinho se volta contra mim por causa de alguém que nem sabemos de onde vem! Os pais a mandaram embora e devem ter os seu motivos, e pensar que ela carrega o meu neto me dá náuseas!”

                Incredulidade acentuava as feições do meu rosto. Quem sentia náuseas ali era eu, por tudo o que eu, por tanto tempo, fiz questão de ignorar. Não me admira que Fatinha se sentisse acanhada na presença da minha mãe, sempre buscando uma maneira de manter-se afastada. Era claro que minha mãe não a conhecia, e como tantos outros a julgavam a pior das pessoas. Mas era mais do que isso, cada silaba proferida por ela estava carregada de desprezo e aquilo me atingiu como um golpe.

                Vislumbrei todas as ocasiões nas quais fui eu a pessoa a agredir Fatinha. O seu semblante magoado, as ofensas que foi obrigada a escutar, as vezes em que a procurei e que depois de usá-la, larguei-a sem um pingo de remorso. Todas as lembranças voltavam-se contra mim, pesando sobre a consciência e o peito. Fatinha... Tudo o que eu fiz a ela, e não o bastante, agora ela era insultada por minha própria mãe por carregar no ventre um filho meu.

                “Marta, controle-se!”

                “Por quê? Para quê, Olavo? Vai me dizer que não pensa igual? Que a Fatinha é a nora que desejava para o nosso filho? Me poupe! Pode parecer preconceituoso e mesquinho, mas é a verdade. Em nenhum momento da minha vida pensei que teria o desgosto de saber que uma mulherzinha seria a pessoa a gerar meu neto. Mas pode ter certeza, que se depender de mim, essa criança será salva da influencia daquela mulher! Queria Deus ela nunca ter engravidado!”

                “Você tá se escutando, mãe? Escutou o que acabou de dizer?”

                Marta, aos poucos, pareceu voltar a si e compreender o peso do que disse. Consciente ou não, ela queria que meu filho não existisse, que a Fatinha não gerasse o seu neto. Só de pensar que algo pudesse acontecer, que a gravidez de Fatinha não se concretizaria me tirava chão.

                “Eu, eu... – minha mãe tentava desculpar-se – Não é que eu deseje que algo ruim ocorra, mas seria mais fácil se essa gravidez não tivesse acontecido. Você tinha um futuro todo pela frente, planos de estudar fora, se especializar, mas vai ter que assumir essa responsabilidade, estará para sempre ligado a uma pessoa que não é do seu nível, que não ama.”

                “Não queira falar sobre o que você não sabe, Marta.”

                “Marta?”

Questionou a mulher visivelmente abalada por eu não ter emprego a palavra mãe ao me referir a ela.

“Bruno, por favor, esfria a cabeça primeiro. Não fala nada no auge dos ânimos.”

Pediu Juliana com o olhar suplicante. Meu pai só assistia a cena, calado, impassível diante do que estava prestes a ocorrer naquela sala.

“Não, Ju o que aconteceu hoje aqui não pode ser ignorado. Acho que em parte foi culpa minha, sabe? Deixar que as coisas chegassem a esse ponto. Bem ou mal, eu sou culpado por me omitir e permitir que a Fatinha fosse tratada tão mal. Eu, inclusive, fui um dos que a desprezaram, e cego que sou, fui incapaz de ver a pessoa maravilhosa que ela é. Mas isso é passado e não vou desperdiçar, talvez, a única chance que me resta para me redimir. Eu a amo. Amo. E só espero que ela possa me amar também, mesmo eu sendo um babaca.”

Abracei Ju e segui para porta. Minha mãe veio no meu encalço e me agarrou pelo braço.

“Bruno, por favor, não se vá assim... Nós precisamos conversar.”

A mulher a quem tanto amava e admirava – menos depois de hoje – chorava copiosamente. Não sei se por vergonha ou arrependimento, mas não conseguiu abrandar meu coração.

“Não, Marta. Bastante coisa já foi dita e acho que por hoje foi o suficiente. Queria que estivesse feliz por mim, mas parece que o que eu sinto não importa, não é? A questão sempre foi o que você achava bom ou não. Lamento por isso. Lamento por saber que talvez não possa te olhar com os mesmos olhos, que quando pensar em você tudo o que veja seja uma mulher em cima de um pedestal negando-se a olhar para o interior das pessoas. Não te julgo, porque já fiz o mesmo um dia, mas graças a Deus eu enxerguei a tempo o que estava perdendo por causa da minha estupidez... – Um nó se formou em minha garganta, mas continuei – Só te peço que reflita bem sobre isso tudo, sobre essa noite e escolha o que quer para você. Eu já fiz a minha escolha. Eu amo você, mas vou ficar do lado da Fatinha e do meu filho. Se quiser fazer parte da minha vida e da do seu neto, aconselho a começar a tratar a mãe dele melhor. Não aceitarei mais insultos, ofensas ou o que quer coisa que seja. Quando você entender que eu os amo e que eles são minha família também, talvez a gente possa tentar uma reconciliação. Ate lá, acho melhor ficarmos um pouco afastados.”

Não precisei me desvencilhar da mulher chorosa dado que me largou instantaneamente deixando os braços caírem pesados junto ao corpo. Não me olhava nos olhos e trazia no rosto contorcido sinais de angustia. Olhei mais uma vez, talvez a ultima, o meu antigo apartamento. Ju havia se aproximado e chorava baixinho. Meu pai continuou calado, mas em vez de raiva, vi refletido na sua postura compreensão. Doutor Olavo sabia que não voltaria com a minha palavra, e que, definitivamente, eu havia me tornado um homem.

Caminhei cegamente ate o elevador. Entrei e me deparei com uma loira pequena de mechas azuis e pretas que sorriu calorosa. Não sorri de volta.

“Noite difícil?”

Indagou Lia enrolando uma mecha no dedo.

“Vida difícil.”

Encostei-me contra a parede e fechei os olhos.

“Hum...”

“Hum não é uma palavra.”

“Hum é mais que uma palavra. É quando uma ideia surge na nossa cabeça e, por mais idiota que pareça, te faz ver que talvez, que só talvez... Você deva tentar.”

A loira tirou um pacote da bolsa e o entregou para mim.

“Não é meu aniversário, então por que tá me dando um presente?”

O embrulho era pequeno e trazia um cartão.

“Red?”

Perguntei ainda com o embrulho em mãos.

“Vermelho... Dizem que dá sorte. Faz um tempo que eu queria dar isso para uma pessoa, mas não sabia como. Acho que estava esperando por esse momento, no qual eu faria mais do que apenas dar algo material, entende?”

“Lia, ‘cê’ tá bem? To te achando muito estranha...”.

“É... Só faz um favor, entrega para a Fatinha. Depois você me agradece.”

“Agradecer o quê?”

As portas do elevador se abriram e a loira saiu sem responder o que aquilo significava.

Sem paciência para joguinhos, segui para o Hostel. Ao entrar no quarto, vi Fatinha muito grávida de cinco meses, sentada na cama lendo algo.  Vestia um vestido rosa de alças, e dava para notar pelo tecido a barriga já despontando.

“Pensei que estivesse dormindo.”

“To sem sono...”.

Respondeu com a indiferença já conhecida por mim. Suspirei e entreguei o pacote que Lia me deu no elevador. Fatinha me olhou desconfiada, mas nada disse nada enquanto eu seguia para o banheiro. Sozinho, aproveitei para lavar o rosto e flexionar os músculos tensos. Retornei ao quarto estranhamente silencioso. Fatinha segurava o que parecia ser uma roupinha de bebê e chorava olhando para a peça... Vermelho!

“Dizem que dá sorte...”.

“Fatinha tá tudo bem?”

 Me aproximei devagar da Loira que pulou da cama e me abraçou. Aconcheguei-a entre os braços tomando cuidado para não machucar a barriga.

“Hey, que isso? Por que tá chorando?”

“Por que você é um babaca muito fofo! Mas como você soube que esse, como soube que essa cor...”.

“Alguém me disse que vermelho dava sorte...”.

E foi como se essa frase tivesse explicado tudo o que eu não conseguia entender.

O que mais queria era beijar a Loira nos meus braços, dizer que a amo, mas contive a necessidade de extravasar meus sentimentos. Era cedo demais. Aquele abraço havia sido um grande passo depois de meses de distância e frieza. Não podia correr o risco de apressar uma maior demonstração de minha parte e acabar estragando tudo. Hoje eu dormiria feliz só com esse abraço. Amanhã seria outro dia e outras oportunidades viriam para eu mostrar a Maria de Fátima dos Prazeres o quanto a amo e desejo fazê-la feliz.

Sorri ao aspirar o perfume da garota junto a mim.

Lia tinha razão, eu iria agradecê-la depois.


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Notas finais do capítulo

Capítulo by: Érica!

Marta não te chamo de cobra porque isso é elogio, tá? Lacraia peçonhenta é o que você é! E familía é fogo, mas essa mãe do Bruno é 'dose cavalar'! TaDinha da Fatinha nem sabe do barraco que rolava com seu nome. A única coisa boa é ver que agora ela tem quem a defenda: O Bruno! O Moreno mostrou que os tempos de 'Babaca' ficaram no passado e agora o que importa é a sua Fat e o baby que eles terão. E aí? Gostou? Comente!

Ps: Semana passada eu postei um capítulo sobre a amizade FaLia e o quanto eu queria que isso acontecesse, né? Bem isso aconteceu em Malhação, mas foi de uma forma tão tosca que acharia melhor ver as duas brigando do que nessa 'falsa amizade' de apoio mútuo. Amigo não é aquele que te faz um favor ou te ajuda quando você precisa de algo. Amigo é quem te entende, ajuda, respeita e faz coisas por você sem ser necessário você saber. Muito conveniente para Lia que sempre desprezou a Fatinha procurar a 'Periguete' na hora da precisão... Quer dizer que se não fosse por isso, era cada uma para um lado? Vergonha mandou lembranças Lia (E autoras)! #Desabafo



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