Livin' On A Prayer escrita por Teruo


Capítulo 12
Sweet Child O' Mine


Notas iniciais do capítulo

Então gente, eu demorei dois meses para postar um novo capítulo, mas eu prometo que a espera vai compensar, pois este capítulo está GIGANTE. Além disso, tenho uma novidade para vocês: estou disponibilizando a partir de agora playlists no Spotify com o setlist de cada show!

https://open.spotify.com/user/teru-0/playlist/1VSSHnRHpGxGaiOehAFORM

Boa leitura!



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29/06/2012

2 horas e 50 minutos antes

Os quatro músicos estavam ao lado do palco esperando o horário para se apresentarem. Cada um possuía um visual peculiar para aquela apresentação: Shikamaru estava com uma camisa social branca dobrada até a altura dos cotovelos, uma gravata borboleta preta, um colete preto com uma rosa vermelha encaixada em seu bolso esquerdo, calças e sapatos sociais também pretos e com o cabelo penteado com gel para trás; Sasuke vestia uma calça jeans skinny azul, um coturno desgastado, uma camiseta branca baby look, uma jaqueta de couro com alguns botões prateados a adornando e seu cabelo formava um grande topete moldado a base de pomada; Chouji, por sua vez, vestia um macacão industrial surrado verde-acinzentado, botas velhas e uma máscara de  hóquei repleta de manchas vermelhas;  por fim, Naruto estava apenas com um calça skinny vermelha, seu corpo estava suado, seus cabelos loiros arrepiados e seu olho esquerdo estava inchado devido a um hematoma.

Era surpreendente que aquele lugar era o mesmo bar em que eles se apresentaram pela primeira vez. O estabelecimento fora repaginado, não somente no quesito estético, mas também em seus serviços. Mesmo com restrições orçamentárias, Ibiki, guiado por Shikamaru, reposicionara o velho e finado Till Dusk TIll Dawn para uma clientela nova. Com algumas decorações aqui, uma iluminação ali, uma limpeza geral acolá e uma demão caprichada em todos os cantos; além da substituição de pias, vasos sanitários e algumas portas. O bar passara a ser chamado de Fink’s e possuía agora um tom mais convidativo, em contraposição ao antigo clima soturno. Somado a isso, ao invés de vender apenas bebidas e tira gostos prontos, como amendoins e frios, e funcionar todos os dias das seis da tarde até as seis da manhã apenas com o trabalho de Ibiki, agora o local contava com uma pequena equipe que prepararia e serviria porções, lanches e drinks variados, incluindo até opções não alcóolicas, funcionando de terça a sexta das dez da manhã até às dez da noite, e de finais de semana das dez da manhã até às três da tarde, reabrindo às seis da tarde até mais tarde de madrugada, mas sem horário definido. Todavia, a essência que o proprietário aspirava para o local, que eram o amor a contracultura e à música, foram mantidos, porém ao invés de aparentar ser um estabelecimento antiquado e estagnado no tempo, o Fink’s transmitia a ideia de um negócio hipster aberto por quem amava o charme dos clássicos.

A hora de iniciar a apresentação já chegara, os quatro músicos estavam posicionados em cima do palco. A casa não estava cheia ainda, mas já havia uma generosa multidão formada por jovens que estudavam no colégio Horace Green, cuja maioria era de garotas curiosas para descobrir quem seria a felizarda para quem Sasuke se declararia através das músicas. Dessa vez, eles não tiveram imprevistos, pois chegaram antes da abertura do bar, fizeram a montagem de equipamentos e checagem de som, além de todos estarem sóbrios e preparados psicologicamente para o que estaria por vir.

As luzes então se apagaram e vagarosamente um riff de guitarra começou a ser tocado por Sasuke. As luzes voltaram quando os outros instrumentos começaram a soar.

— Senhoras e senhores, sejam bem-vindos ao Fink’s. Este lugar é mais bonito do que eu me lembrava, não sei se foi a reforma ou então é a plateia de hoje que está fazendo a diferença. – Naruto sorria enquanto olhava a sua volta, segurando o microfone e posicionando-se ao centro para começar a tocar a sua guitarra. – Agora, vamos ao que interessa.  – O loiro terminou fitando o pequeno amigo Konohamaru que se encontrava em uma posição estratégica logo à frente do palco, com um notebook ao lado e com uma câmera em mãos. – NÓS SOMOS O FIGHT KLUB E EU ESPERO SHOOK YOU ALL NIGHT LONG (SACUDIR VOCÊS A NOITE TODA)! – Ele então gritou e começou a cantar em seguida.

24 horas antes

O quarteto estava reunido na garagem de Sasuke depois deles serem convocados por Naruto para as mudanças de última hora. O Uzumaki, ao invés de contar por telefone todas as suas intenções, preferira dizer que gostaria de fazer um ensaio para ajustar alguns mínimos detalhes, já que talvez no dia seguinte eles não tivessem tempo de se reunir em decorrência de seu suposto compromisso que não fora dado explicações.

O Uchiha estava calado sentado no sofá ainda escrevendo em seu caderno assim como no hospital, enquanto os outros discutiam o que fariam em relação aos planos de Naruto.

— E aí gente, tudo bem? – Naruto os saudou amistosamente. – Então, na real eu não queria ensaiar o nosso setlist.

— E o que você gostaria de fazer? – Chouji o perguntou.

— Será que podemos trocar algumas músicas? – Naruto questionou hesitante enquanto o coçava sua nuca. – Tipo umas quinze?

— Não. – Shikamaru respondeu lacônico. – Já que não vamos ensaiar, boa noite. – Disse virando-se em direção à saída.

— Quinze? – Chouji indagou incrédulo. – Quinze é muito! Será que não poderia ser somente duas ou no máximo cinco? – O gorducho perguntou solicito tentando encontrar um meio termo.

— Esperem um pouco, por favor! – Naruto exclamou. – Eu sei que é metade do nosso setlist, mas eu juro que não vai obrigar você a aprenderem tocar quinze músicas novas.

— O que você sugere que façamos? – O baterista perguntou.

— Eu só queria que vocês considerassem a possibilidade de a gente arrumar o setlist a fim de que nos prendêssemos a um mesmo tema. – O Uzumaki falou retirando do bolso um papel sulfite com o setlist que eles iam apresentar e uma caneta azul.

— E qual seria esse tema? – O baixista perguntou ressabiado, esperando não receber alguma resposta engraçadinha.

— Só um momento. – Disse o loiro fazendo algumas marcações na folha. – Veja aqui. – Ele disse apontando para suas rasuras. – Como vocês podem notar, nosso setlist já é composto por metade de músicas que de alguma forma são “fofinhas”. – Ele disse fazendo aspas no ar. – O que eu gostaria de mudar são somente essas que eu marquei e substituí-las por outras musiquinhas mela-a-cueca.

— OK, eu entendi o que você quer fazer, mas por quê? – Shikamaru questionou suspeitando das intenções do loiro.

— Simples. Por que nós, homens, fazemos qualquer coisa nessa vida? – Naruto perguntou com um sorriso malicioso. – Pra comer alguém, é óbvio!

— Ai meu saco. – O Nara suspirou sem muita paciência.

— Ainda não entendi o seu ponto com isso Naruto. – Chouji falou com ar curioso.

— Chouji, vai por mim, essa playlist atual vai umidificar calcinhas, mas com a minha playlist elas vão parecer o Niagrafalls. – Naruto falou com um tom confiante enquanto abraçava o baterista com um braço e estendia o outro a frente como se dessa forma fosse possível ver o resultado de sua previsão. – Te garanto que com isso você pega alguém. – Disse dando um tapinha no peito de Akimichi.

Chouji ficara tentado depois de ouvir o que o Uzumaki dissera, pois ele nunca havia se envolvido romanticamente com ninguém por motivos de timidez, enquanto Shikamaru fechara a cara, já que considerava esse comentário vil.

— Eu sei que vocês ficaram tentados com essa proposta, mas talvez não estejam tão dispostos a aprender novas músicas, correto? – O loiro se desvencilhou de Chouji e caminhou até uma mesinha para ter apoio para escrever. – Não se preocupem! Um terço das músicas, ficarão encargo meu e do Sasuke, né não emo? – Naruto perguntou animado, mas não obtivera resposta, pois o Uchiha continuava compenetrado em sua escrita. – As outras a gente pode pegar do setlist da semana que vem, já que já estávamos praticando e se ainda ficarem faltando algumas, a gente pega umas bem fáceis para evitar a gastura. O que me dizem?

— Gostei! – Chouji exclamou animadamente pensando nas possibilidades que lhe aguardavam depois da apresentação do dia seguinte.

— Passo. – Shikamaru respondeu com o semblante taciturno e então seguiu em direção à saída. – Se não vamos ensaiar, estou indo embora. Até amanhã.

— Qual é?! Quebra essa pra gente cabeludo. – Naruto ranhetou. – Vamos lá, ajuda o time.

— Se não formos ensaiar, então, me desculpe, mas estou indo embora, porque eu tenho coisas mais importantes para fazer. – O Nara falou emburrado, mas ainda assim calmo.

— O que você está fazendo Sasuke? – Perguntou Chouji se aproximando do Uchiha que ainda estava em silêncio escrevendo.

O Akimichi estava curioso, já que apesar de Sasuke não ser a pessoa mais falante do mundo, ele costumava interagir ao menos quando Naruto o insultava ou então quando alguém o chamava, porém hoje ele se mantivera em silêncio tempo todo. Ao mesmo tempo, o baterista queria se afastar dos outros dois músicos, pois sentia que o clima entre eles estava ficando tenso.  Mesmo sem obter resposta do Uchiha, o gorducho ficou em pé em frente dele enquanto tentava ler aquelas anotações. Eram rabiscos quase impossíveis de serem decifrados, mas o pouco que era inteligível aparentava ser uma carta.

Enquanto Chouji continuava a observar Sasuke escrevendo, Naruto e Shikamaru continuavam a discutir e cada vez com mais fervor, pois o loiro continuava a insistir. Cada vez mais, o Uzumaki aumentava a voz e soltava impropérios, enquanto o Nara não alterara o tom calmo, mas mudara a maneira como se expressava. Era como se Shikamaru tivesse voltado alguns anos no tempo e recomeçara a falar de maneira ultra formal, porém condescendente que repelia todos a sua volta. Isso não era comum, mas ocorria quando o Nara extrapolava sua paciência, o que em situações normais seria algo bem difícil de ocorrer, porém a vida não estava sendo tão gentil nos últimos dias, por isso uma pequena desavença foi assumindo proporções gigantescas.

A discussão ficou tão acalorada a ponto de atrapalhar a concentração do Uchiha que se levantou e foi em direção a casa. Chouji o seguiu pois gostaria de saciar sua sede, por isso se dirigira para a cozinha para ter um copo d’água e quem sabe conseguiria algo para forrar o estômago.

— Vós estais a delirar! Sois um efebo incauto que estais a matutar somente valendo-se da lascívia de vosso falo! – Shikamaru o repreendeu e em seguida retirou um dos cigarros de seu bolso.

— Para de viadagem! Não entendi uma caralha do que você falou. – O Uzumaki bradou. – Eu sei que você não tava muito a fim de passar a sexta à noite com mais três cuecas tendo que aprender a tocar músicas que você não tá a fim, mas você perdeu a votação. Simples assim, três é maior que um, não é professor? – Naruto o provocou com a voz sardônica.

— Entendeis o seguinte, ó parvo de madeixas flavas, não tendes mais tempo para vicissitudes. Vossa lascívia não há de ser saciada amanhã. Em que pese vossa avidez, não hei de mudar meu arbítrio para atender vossas vis cobiças. – Shikamaru terminou, então tragou seu cigarro.

— Cara, na moral, para de ser pau-no-cu! – As veias do pescoço do loiro estavam saltadas. – Vamo lá, é importante, pode não parecer, mas é importante. – Naruto respirou fundo e repensou se deveria abrir o jogo sobre suas intenções. – Veja, minha prima e o Sasuke brigaram feio e eu quero dar um jeito nisso. Eu não queria te contar, porque expõem os dois. Agora que você sabe, tem como cooperar? – Naruto perguntou mais calmamente tentando demonstrar trégua.

— Compreendo agora a quietude de vosso amigo e o porquê de vossa insistência, não obstante não podemos nos precipitar com decisões fugazes. – O Nara baforou seu cigarro.

— Acho que você ainda não entendeu. Nós precisamos fazer isso! – Naruto exclamou enquanto se aproximava do baixista. – Eu sei que é uma ideia horrível. Eu sei! Mas você nunca fez algo idiota para se desculpar com a garota que você tá a fim?

— Nos vemos amanhã. – O Nara falou virando as costas e pegando o case com o baixo.

— Para de ser mesquinho! – O Uzumaki gritou enquanto dava a volta e confrontava Shikamaru. – Eu já sei sobre a professorinha que você tá pegando, então por favor mostre ao menos um pouco de simpatia por alguém que tá com o coração angustiado, porque você sabe como é se importar com alguém especial. – Naruto se enfureceu segurando Shikamaru pelo colarinho.

— Solte-me agora. Não tenho mais tempo para reinação. – O baixista disse de maneira assertiva segurando firmemente o braço que o prendia.

— Você é egoísta demais! Eu sei que você está louco pra sair daqui pra dar um meteco gostoso com a professorinha, mas puta que pariu nos ajude! – Naruto continuava a fitar o outro músico enquanto o chacoalhava e gritava, mas ao perceber a indiferença que o respondia o loiro explodiu. – Vai à merda, você e aquela piranha que você e o resto do colégio tão usando de balde de porra.

Para a surpresa de Naruto, repentinamente seu corpo se chocara contra o chão e quando seus olhos azuis observavam o teto uma pancada lhe fora estancada de tal maneira que seu olho esquerdo se fechara e sua cabeça quicara com o impacto.

— Basta! Estou farto de vossas troças desmedidas e vossas observações misóginas. Por que fazeis isso? Não penseis que essas mulheres são filhas, mães e seres humanos detentoras de direitos e ambições? – Shikamaru o questionou enquanto segurava o pulso cerrado a cima do rosto do loiro.

— É claro que eu concordo com isso! – Naruto esbravejou. – Por que você não quer ajudar? – O loiro indagou com os olhos lacrimejando. – Eu não queria contar isso pra você e nem pro Chouji, mas a Karin vai morrer logo. – Sua voz soluçava e impedia que as palavras saíssem claramente. – Eu também não sabia até pouco tempo atrás, mas ela tem uma porra de um coração leproso. Eu e o Sasuke somos dois bostas, porque quando a gente podia a gente não deu a mínima pra existência dela; cagamos legal na cabeça daquela garota. Agora que ela tá pra bater as botas, ela não quer nos ver nem pintados de ouro. – Naruto disse se levantando enquanto observava a expressão blasé do outro músico se transformar em surpresa. – Não precisa fazer isso por mim, mas ajude o Sasuke fazer isso, porque se não a cabeça dele vai entrar em parafuso. – O loiro então se aproximou cautelosamente e então repousou suas mãos sobre os ombros do baixista. – Por favor, ajude ele a fazer isso! Eu não quero que os dois deixem a treta sem resolver, porque eu tenho certeza de que isso vai ficar revirando dentro dele pro resto da vida. Pense em como você ficaria se brigasse com a sua namorada e de repente algum acidente acontecesse e ela viesse a falecer. Você conseguiria viver com a culpa de que suas últimas palavras pra ela foram amargas? – O Uzuamki falou emocionado, mas contendo sua voz.

Shikamaru o fitava quieto enquanto pensava em Kurenai e refletia o quão correto Naruto estava com tal colocação.

O peso das últimas palavras proferidas para uma pessoa amada tem um peso muito grande, mesmo que seja apenas um monte de palavras vazias que não caracterizem a verdade, se seus lábios sibilaram asperezas, o amargor de seu tom irá lentamente te corroer na medida em que a saudade aumentar.

— Por que mentistes? – Shikamaru questionou depois de passar um breve momento em transe enquanto observava o loiro limpar as lágrimas.

— Sei lá. – Ele deu de ombros e então ficou pensativo. – Eu simplesmente odeio falar sobre meus problemas, eu sei que isso não vai acontecer, mas eu tento me convencer de que se não falarmos sobre nossos problemas eles vão desaparecer. – O Uzumaki respondeu abrindo e fechando o olho esquerdo forçosamente.

— Entendo. – O moreno de rabo-de-cavalo respondeu seco e em seguida tacou o resto de cigarro no chão. – Ide chamar Chouji e Sasuke para que comecemos a ensaiar. – Ele ordenou enquanto massageava a fronte com as pontas dos dedos.

— Sério?! – Naruto exclamou contente por sua insistência ter dado resultado. – Só não comenta com eles sobre o que eu acabei de te contar. – Ele falou indo em direção a porta da casa. – Ah, e me desculpe pelas coisas que eu falei sobre sua namorada, foi tudo da boca pra fora. – Ele virou-se para dizer antes de entrar para chamar os amigos.

— Tudo bem, só sejais mais assertivo da próxima vez; vás direto ao ponto, sim? – Shikamaru respondera menos irritado e em seguida puxou mais cigarro.

1 hora e 26 minutos antes

            Eles estavam magníficos naquela noite. A felicidade transmitida jamais levantaria suspeitas do tamanho da tristeza que preenchia a alma da banda naquele momento; ironicamente, os dois que estavam se sentindo miseráveis eram os dois vocalistas que traziam mais alegria a plateia, ora com gestos e beijos no ar, ora com encaradas e eventuais conversas entre uma música e outra.

            A multidão começava a aumentar a medida em que as músicas iam sendo tocadas, lentamente o ambiente era lotado por pessoas alheias ao colégio Horace Green e o lacônico proprietário, o senhor Ibiki Morino, começava a desfazer seu semblante aterrorizador. Ele apesar de não morrer de amores por todas as músicas tocadas, precisou dar o braço a torcer pela qualidade das interpretações, pois possuíam uma identidade própria, apesar de serem covers. Além disso, ele estava surpreso pelo faturamento da noite de reabertura do estabelecimento, já que não acreditava que as estratégias de Shikamaru fossem impactar tanto no movimento; ainda relutante, ele começara a apreciar o novo posicionamento do bar.

            – O que vocês estão achando galera? – Naruto perguntou após encerrar mais uma das músicas. – Que bom, também estamos adorando tocar para vocês! – O loiro respondeu à plateia. – Lembrando, pessoal da interwebs venha para o Fink’s, o endereço está aí na tela! Cameraboy, mostre a eles o que eles estão perdendo. – O Uzumaki apontou para Konohamaru, que em seguida mostrou o público para a câmera. – Agora, vamos aos assuntos importantes da noite. – Ele disse com um sorriso malicioso estampado em seu rosto. – Sasuke, você já encontrou sua primeira dama?

            – Deixe me ver. – O Uchiha disse depois de se aproximar do microfone. Ele então olhou de um lado para o outro do local fingindo procurar por alguém. – Ainda não, talvez seja porque eu precise de óculos, talvez seja porque ela ainda não chegou ou talvez ela não queira me ver. Seja como for, espero que ela esteja nos vendo e saiba que todas as músicas são para ela. – Ele terminou enquanto fitava a câmera.

            – Ok, ok. Você ouviu? Nosso menino de ouro não consegue enxergar muito bem, então por favor grite para que ele consiga te achar...ou você vai quebrar o coraçãozinho dele e daí ele vai ter que buscar o conforto no colo de outra? – Naruto perguntou soltando gostosas gargalhadas. – Agora, e você cabeludo? – Ele apontou para Shikamaru. – Está interessado em alguém?

            Apesar de querer apenas tocar, Shikamaru entendia a importância de se comunicar com a plateia, pois dessa forma conseguia ganhar a empatia das pessoas, assim como também ganharia tempo para que elas consumissem mais. Por isso, mesmo a contragosto, ele não repreendeu o Uzumaki, e apenas balançou negativamente a cabeça como resposta.

            – Como assim? – Naruto perguntou fingindo incredulidade. – Será que o nosso baixista gosta de meninos? Ó meu Deus, que revelação bombástica. – O loiro em seguida colocou as mãos na bochecha com a boca aberta esboçando uma falsa surpresa.

            O Nara revirou os olhos enquanto continuava a balançar negativamente a cabeça.

            – Ó céus, que esquecido sou eu. – O loiro disse enquanto batia de leve em sua testa. – É claro que você não está interessado em alguém, porque você já é comprometido, não é?

            O baixista apenas suspirou, pois já começara a achar muito longa a interação com a plateia, no entanto não se manifestou.

            – Meninas, tirem os olhos, porque ele já é muito bem casado e tem filhos! Ah, e a esposa dele é modelo da Channel, então tirem o cavalinho da chuva porque esse homão da porra já tem dona. – O Uzumaki exclamou rindo e logo em seguida falou com um volume menor para fingir confidência. – Mas eu tô na pista ainda, venham em mim. – Ele terminou com uma piscadela. – Agora voltando para nossa programação normal, vamos tocar...

            Subitamente, Chouji interrompeu Naruto com um golpe estrondoso em um dos pratos de sua bateria.

            – Opa, foi mal grandão, culpa minha. – O loiro riu divertidamente ao entender do que isso se tratava. – Já ia me esquecendo, meninas, e esse aqui no fundo. – Disse apontando para Chouji. – É um dos maiores atores pornô do momento, ele usa essa máscara porque ele não quer misturar sua imagem em meios diferentes, mas eu te garanto que você irá reconhece-lo depois que ele te fizer chegar lá dez vezes seguidas sem parar. Podemos continuar agora? – Naruto perguntou olhando para Chouji, que o respondeu com um sinal de positivo enquanto gargalhava por trás da máscara.

            Em seguida, Chouji bateu suas baquetas uma na outra quatro vezes e então todos começaram a tocar novamente. Era um ritmo calmo, com uma harmonia pacífica e uma melodia melancólica guiada pela Gibson de Sasuke.

Cold and frosty morning, there’s not a lot to say

(Manhã fria e congelada, não há muito o que dizer)

About the things caught in my mind

(Sobre as coisas presas em minha mente)

And as the day was dawning my plane flew away

(E assim como o dia ia raiando meu avião decolou)

With all the thing caught in my mind

(Com todas as coisas presas em minha mente)

            Naruto cantava emocionado, provavelmente nunca colocara tanta energia em sua voz; as veias de seu pescoço estavam saltadas e cada final de verso pareciam que inchavam cada vez mais.

And I want to be there when you’re coming down

(E eu quero estar lá quando você estiver caindo)

And I want to be there when you hit the ground

(E eu quero estar lá quando você acertar o chão)

            Ao terminar esse verso, Naruto se afastara um pouco do microfone para que Sasuke pudesse ir e cantar o refrão. O Uchiha então começou a exteriorizar sua alma através da voz e toda pressão que ele tinha sobre os ombros davam peso a cada sílaba proferida enquanto ele estava encarando a câmera com olhos penetrantes, como se pudesse ver a alma desnuda de quem quer estivesse assistindo através de seus orbes.

So don’t go away

(Então não se vá)

Say what you say

(Diga o que disser)

But say that you’ll stay

(Mas diga que você ficará)

Forever and a day

(Para sempre e mais um dia)

In the time of my life

(No tempo de minha vida)

‘Cause I need more time

(Porque eu preciso de mais tempo)

Yes, I need more time

(Sim, eu preciso de mais tempo)

Just to make things right

(Só para fazer as coisas certas)

            Chouji, que excepcionalmente naquela noite não possuía linhas percussivas difíceis, podia observar mais atentamente a performance dos outros músicos. O baterista estava surpreso com o empenho que os vocalistas haviam colocado naquele show, pois estavam mais enérgicos do que o habitual. Em vista disso, o Akimichi se deleitava por detrás da máscara com a ideia de que toda aquela gana era para conquistar garotas e por isso se pegava rindo vez ou outra quando um pensamento errante o entretinha com imaginações do que aqueles dois que estavam cantando já não haviam feito para encantar as jovens. Mal sabia ele de que aquele esforço cafajeste era na verdade uma demonstração de nobreza.

Damm my situation and the games I have to play

(Maldita seja minha situação e os jogos que eu tive que jogar)

With all the things caught in my mind

(Com todas as coisas presas em minha mente)

Damm my education I can’t find the words to say

(Maldita seja minha educação, eu não consigo encontrar as palavras para dizer)

About the things caught in my mind

(Sobre as coisas presas em minha mente)

***

And I want to be there when you’re coming down

(E eu quero estar lá quando você estiver caindo)

And I want to be there when you hit the ground

(E eu quero estar lá quando você acertar o chão)

            Naruto terminou de cantar o pré-refrão e cedeu novamente o espaço para que Sasuke pudesse se aproximar e cantar sua parte.

            As garotas ali presentes se esgoelavam tentando chamar a atenção dos músicos, pois realmente pensavam que podiam ser as pretendidas. Enquanto isso, eles continuavam a jogar olhares para pontos aleatórios para que a farsa fosse mantida. Os sorrisos que aqueles rapazes tinham em seus rostos ocultavam a culpa e o arrependimento. Talvez, a emoção extra por eles demonstrada fosse a válvula de escape que os mantinha em pé sem as lágrimas.

So don’t go away

(Então não se vá)

Say what you say

(Diga o que disser)

But say that you’ll stay

(Mas diga que você ficará)

Forever and a day

(Para sempre e mais um dia)

In the time of my life

(No tempo de minha vida)

‘Cause I need more time

(Porque eu preciso de mais tempo)

Yes, I need more time

(Sim, eu preciso de mais tempo)

Just to make things right

(Só para fazer as coisas certas)

             Naruto se aproximou um pouco antes do amigo terminar de cantar o refrão e posicionou ao lado para que eles cantassem os próximos versos juntos.

            Assim que Sasuke terminou de sibilar o refrão, todos os instrumentos cessaram e com eles as luzes se foram também. Os quatro músicos ficaram em silêncio no escuro por alguns segundos, até que somente as vozes do Uzumaki e do Uchiha soassem em harmonia.

Me and you what’s going on?

(Eu e você, o que está acontecendo?)

All we seen to know is how to show

(Tudo o que sabemos é como mostrar)

The feelings that are wrong

(Os sentimentos que são errados)

            Assim que eles terminaram os diminutos versos, as luzes se reacenderam e ao centro do palco encontrava-se Sasuke solando com uma guitarra melancólica. Sozinho, o Uchiha improvisou um blues melódico que mostrava a todos um pouco de como ele estava se sentindo.

18 horas antes           

Os músicos haviam terminado de ensaiar já era de madrugada, cansados e famintos, todos, com exceção de Sasuke, que preferira continuar em sua casa, foram para o restaurante perto de lá.

            Eles já haviam pedido e estavam esperando seus pratos, quando Chouji levantou uma questão importante que fora posposta até o presente momento, mas que deveria ser endereçada o mais rápido possível, uma vez que a apresentação estava a menos de um dia de acontecer e eles deveriam estar com tudo preparado para evitar imprevistos de últimos minutos.

            – Gente, temos que falar sobre o elefante na sala. –Chouji falou enquanto brincava de dobraduras com um guardanapo. – Precisamos decidir o nome da banda agora. – Ele soltou sua preocupação e depois olhou para os dois colegas.

            – Não deveríamos ter a opinião de Sasuke sobre isso também? – Shikamaru perguntou enquanto massageava a fronte com uma das mãos.

            – Náh. – Naruto balbuciou com descaso. – Ele não vai se importar com o que decidirmos agora. Vai por mim. – Ele terminou enquanto virava o pescoço para ver se seu burguer já estava chegando.

            – Ideias? – Chouji indagou.

            – Sem nenhuma no momento. – Shikamaru respondeu e logo em seguida bocejou preguiçosamente. – Por mim, o que vocês decidirem está bom. – Ele disse, em seguida olhou para sua frente e mirou na camiseta do Akimichi, que mostrava uma cabeça decepada com metade do rosto queimada, depois observou Naruto rindo enquanto assistia um macaco urinar em sua própria boca pela tela de seu celular. – Contanto que não seja nada estúpido ou escatológico. – Ele ressalvou depois de lembrar das outras ideias que aqueles dois já haviam sugerido.

            – Chouji, qual era o nome lá do bar? – Naruto perguntou enquanto guardava seu celular em seu bolso.

            – Till Dusk Till Dawn. Por quê? – O baterista perguntou depois de finalizar sua garça de guardanapo de papel.

            – Já que aquele lugar virou praticamente nossa casa, eu pensei que seria bom que ele virasse parte de nossa banda também. – O loiro terminou sua frase e em seguida bebericou o copo de água que estava em sua frente.

            – O bar mudou de nome, por causa do reposicionamento de mercado. Agora ele se chama Fink’s. – Shikamaru murmurou sonolento.

            – Que tal Wandering Thoughts (Pensamentos Errantes)? – Naruto perguntou empolgado.

            – Boa! Mas acho que ficaria mais legal ainda Wandering Suicidal Thoughts (Pensamentos Suicidas Errantes). – O baterista respondeu animadamente.

            – Gente, o “Fink’s” do bar é com F igual ao personagem Rat Fink e não do tipo thinks (pensar), então eu não acho que combine tanto assim. Além disso, por favor, nada envolvendo suicídio também. – O Nara os suplicou com a voz arrastada de um velho ranzinza que já não tem mais paciência para as trivialidades dos jovens.

            – Rat Fink? Quem seria esse? – O Akimichi indagou curioso.

            – Saca só. – O Uzumaki falou enquanto estendia seu celular para mostrar a imagem de um rato verde todo disforme na tela de seu celular. – Cabeludo, que parada é essa?

            – É um símbolo... – Ele então parou por um instante, refletiu e então resolveu responder de maneira lacônica sem entrar em muitos detalhes. – Ele é o anti-Mickey-Mouse.

            – Porra, eu sempre odiei esse rato filho da puta. – O loiro ranhetou. – “Eu sou o Mickey Mouse e eu sorrio de orelha a orelha”. – Ele afinou a voz para que ficasse parecida com a do camundongo. – Eu sempre quis esmurrar aquele engomadinho da voz fina! Sempre que meu tio me levava no parque, aquela ratazana falava para eu sorrir para a câmera e depois me abraçava. Como eu odiava aquilo e queria dar um soco na cara daquele anão naquela fantasia... O Pateta, por outro lado é dez de dez.

            – Realmente o Pateta é mais legal que o Mickey, mas sabe quem é o mais foda de todos? Pato Donald, pronto falei. – Chouji respondeu animado enquanto levantava suas mãos para o alto de forma dramática.

            – Por favor, foco. – O moreno de rabo-de-cavalo pediu com a costumeira voz mansa, mas já sem mais esperanças.

            – Ok. Então, – O Uzumaki parou brevemente para pensar em um nome e então expressou o primeiro nome que lhe veio à mente. – que tal The Anti-Mickey Club? Não, não. The Fink’s Club?

            Antes que os outros dois músicos pudessem comentar algo, a garçonete trouxe os pratos que eles tanto esperavam: Naruto pedira um cheese-burguer-bacon e uma cestinha de batatas fritas, Chouji requisitara uma costelinha ao molho barbecue e uma porção de onion rings, e Shikamaru escolhera apenas uma xícara de café expresso, porém recebera também uma fatia de apfelstrudel.

            – Com licença. – O Nara se pronunciou ao receber o pratinho. – Eu não pedi a torta.

            – Ops. Devo ter me confundido. Fique com ela por conta da casa então. – A garçonete loira respondeu com um sorriso simpático.

            – Obrigado, mas eu não posso aceitar... – Shikamaru respondeu polidamente antes de ser interrompido por Naruto.

            – Shiu! Só aceita, se não quiser dá para mim. – O Uzumaki murmurou encarando o amigo e em seguida virou-se para agradecer novamente pelo mimo, mas ao mirar para a moça que os atendera, notara que ela já não estava mais ali parada.

            – Acho que ela gosta de você. – Chouji comentou com um sorriso capcioso e em seguida perguntou ao amigo. – Qual nome dela?

            – Não, ela só deve estar cansada e, por isso, se confundiu. – Sem enrubescer-se ou demonstrar qualquer tipo de acanhamento, o Nara respondeu com mesma parcimônia usual. – Nome? Eu não lembro... Acho que começava com “i”. – Ele respondeu acirrando as sobrancelhas enquanto tentava buscar em sua memória. – Ou talvez “t” ou “m”.

            – Esse mundo é injusto! – Naruto lamentou-se. – Você esnoba essa gata que está te dando mole desde o primeiro dia que viemos aqui, sendo que você já está pegando aquela professora deliciosa.

            – Meça suas palavras. – O moreno de rabo-de-cavalo o advertiu enquanto lhe lançava um olhar de reprovação.

            – Quando foi que você comentou com ele sobre o lance da professora, Naruto? – Chouji perguntou surpreso.

            – Ok, parei, um olho roxo já é mais que o suficiente. – O Uzumaki respondeu risonho enquanto levantava as mãos para o alto demonstrando rendição e com isso Chouji franzia a sobrancelha incrédulo. – Na hora que você e o Sasuke entraram na casa, Chouji.

            – Já que o Naruto comentou, o que está rolando entre vocês? – O gorducho respondeu com um misto de receio e curiosidade. – Foi por causa dela que você voltou da faculdade?

            – Sim... e não. – Shikamaru pela primeira vez parecia um pouco desconcertado enquanto tentava planejar como iria responder as perguntas. – Eu não saí da faculdade por causa dela, mas sim, porque já me graduei. Contudo, a escolha de vir de volta a Los Angeles e não a outro lugar está ligada a ela... digamos que eu sou um ombro amigo que ela pode contar em momentos difíceis.

            – Está mais para pau amigo. – O loiro sussurrou para o baterista.

            – Mas afinal, vocês estão namorando? – Chouji questionou o amigo.

            – Não, somos apenas amigos. – O baixista respondeu brevemente e em seguida tentou mudar de assunto. – Algum de vocês estaria interessado na torta?

            – Não, pode ficar. – O Uzumaki respondeu estreitando os olhos. – Se vocês são só amigos, então quer dizer que não teria problema algum em convidar a garçonete para sair, não é?

            – Não acho que ela queira isso e tão pouco estou interessado em romances no momento. – Shikamaru replicou e novamente tentou trocar de assunto. – Vocês tiveram mais alguma ideia de nome para a banda?

            – The Fight Club (O Clube da Luta). – O Akimichi falou despretensiosamente e em seguida emendou sua pergunta. – Por que você não quer romances no momento?

            – Porque... – O Nara tentou responder, mas não conseguia achar as palavras adequadas, então deu-se por vencido e respondeu simplesmente. – não. Qual foi mesmo o nome que você sugeriu para a banda? – Por mais uma vez ele tentou desviar o foco da conversa.

            – The Fight Club. Saca igual o filme e o livro? – O gorducho falou e rapidamente quis voltar ao tópico anterior, mas fora interrompido.

            – Gostei! Sonoro para caralho! Já consigo imaginar os pôsteres, camisetas e tatuagens com esse nome. – Naruto exclamou. – Mas de onde você tirou a ideia?

            – Você tinha falado àquela hora “alguma coisa- Club” e aí a primeira coisa que eu pensei foi “Fight Club” por causa do seu olho roxo. – O baterista disse e em seguida assoprou um dos anéis de cebola empanados de seu prato antes de pô-lo na boca. – Além disso, eu lembro que depois do show, seu tio perguntou se a gente tinha aberto nosso próprio clube da luta depois de nos ver nosso estado deplorável. – Ele então parou, tossiu com a mão à frente da boca tentando desengasgar e depois de consegui-lo concluiu. – E também porque você e o Sasuke caíram na porrada aquele dia no meio da rua antes dele ir levar o amplificador para arrumar.

            – Gosto da ideia, principalmente porque tanto o livro, quanto o filme do Fight Club são obras fantásticas; questionamentos existenciais, niilismo, consumo como forma de preencher os vazios da modernidade líquida, entre outras questões cobertas com uma máscara de violência e humor ácido. – Shikamaru comentou e em seguida terminou de beber sua xícara de café. – Mas acho que talvez seja melhor adaptarmos para não termos dores de cabeça com o uso indevido de direitos autorais futuramente. Por isso, sugiro pegarmos alguma referência ao livro, como por exemplo “Jack’s Heart” (Coração de Jack), ao invés do título em si.

            – Porra nenhuma. – O Uzuamki rebateu. – Então a gente faz que nem as fábricas chinesas e damos um jeitinho na escrita. Ao invés de Club com “c”, o nosso será com “k”. Porque “The Fight Club” tem um puta peso e é sonoro demais.

            – Verdade. – Chouji comentou. – Lembra daquele caso que nossos pais mostraram a respeito daquela fábrica chinesa que utilizava o mesmo design dos celulares e do logo da NOKIA, porém o “O” deles tinha um micro risco de tal forma que apesar de parecer muito com NOKIA, era na verdade NCKIA?

            – Está bem, por que não? – O Nara suspirou e em seguida deu de ombros.

40 minutos antes

            As luzes coloridas cessaram e apenas um feixe branco iluminava o Uchiha que se encontrava sozinho no centro do palco. Ele ainda estava com sua Les Paul empunhe, seria a última música da noite que ele iria tocar com essa guitarra antes de trocar para sua Stratocaster que já estava afinada meio tom abaixo para o restante daquela noite.

— Bem, enquanto eles estão mudando a afinação dos instrumentos, eu gostaria de tocar uma música especial. – Sasuke falou no microfone enquanto mexia no volume de sua guitarra e desligava o pedal de distorção. – Não é um rock, mas acho que vocês vão gostar. Essas daqui foi uma das primeiras músicas que eu toquei para a senhorita a quem eu dedico a noite de hoje. Você se lembra? – Ele perguntou tirando os cabelos do rosto e colocando-os para trás. – Porque eu ainda me lembro bem. – O Uchiha então pigarreou para limpar a garganta. – Ela é mais ou menos assim.

Made a wrong turn

(Tomei o caminho errado)
Once or twice

(Uma ou duas vezes)
Dug my way out

(Cavei minha saída)
Blood and fire

(Sangue e fogo)
Bad decisions

(Decisões ruins)
That's alright

(Tudo bem)
Welcome to my silly life

(Bem vinda à minha vida tola)

***

Mistreated, misplaced, misunderstood

(Maltratada, desloacada, incompreendida)

Miss know it, it's all good

(Senhorita sabe tudo, está tudo bem)

It didn't slow me down

(Isso não me parou)

Mistaken, always second guessing

(Errada, sempre em dúvida)

Underestimated, look I'm still around

(Subestimada, veja, eu ainda estou por aqui)

Ele delicadamente solfejava as notas de sua guitarra que ecoava com um toque de reverb que dava um brilho ao som. Ora mansa, ora ríspida, sua voz hipnotizava as garotas que estavam próximas ao palco.

Pretty pretty please

(Linda, linda, por favor)

Don't you ever ever feel

(Nunca, nunca sinta-se)

Like you're less than fucking perfect

(Como se você fosse menos do que malditamente perfeita)

Pretty pretty please

(Linda, linda por favor)

If you ever ever feel

(Se você um dia, um dia se sentir)

Like you're nothing

(Como se não fosse nada)

You're fucking perfect, to me

(Você é malditamente perfeita para mim)

Com os olhos fechados, Sasuke entoava o refrão e reavivava em sua mente o dia em que a cantara para Karin. Ele lembrara de como também sussurrara no ouvido da pequena ruiva essas mesmas palavras após terminar de tocar.

You're so mean

(Você é tão má)

When you talk, about yourself

(Quando fala de si mesma)

You're wrong, change the voices

(Você está errada, mude as vozes)

In your head

(Em sua mente)

Make them like you instead

(Ao invés disso, faça com que elas gostem de você)

So complicated

(Tão complicada)

Look how we are making

(Olhe como estamos conseguindo)

Filled with so much hatred

(Preenchida com tanto ódio)

Such a tied game

(Um jogo empatado)

It's enough, I've done all I can think of

(É o suficiente, eu fiz tudo o que pude pensar)

I've chased down all my demons

(Eu cacei todos os meus demônios)

I see you do the same

(Eu vejo que você fez o mesmo)

A memória de Karin com seios à amostra, tímida a sua frente, não para saciar-lhe a libido, mas para lhe mostrar as cicatrizes, fruto da operação cardíaca, o fez soltar um singelo sorriso enquanto se preparava para cantar novamente o refrão.

Pretty pretty please

(Linda, linda, por favor)

Don't you ever ever feel

(Nunca, nunca sinta-se)

Like you're less than fucking perfect

(Como se você fosse menos do que malditamente perfeita)

Pretty pretty please

(Linda, linda por favor)

If you ever ever feel

(Se você um dia, um dia se sentir)

Like you're nothing

(Como se não fosse nada)

You're fucking perfect, to me

(Você é malditamente perfeita para mim)

4 horas antes

            Shikamaru estava sentado com um dos volumes das Fábulas de La Fontaine em mãos recitando-o para a pequena Mirai. Entre uma página e outra ele bocejava pois fora direto do restaurante para a casa de Kurenai, que saíra cedo pois tinha reunião com os outros professores para finalizar o ano letivo.

            O moreno lutava contra o sono, mas parecia impossível vencê-lo. Já fazia mais de vinte e quatro horas que ele estava acordado e o cansaço pesava os olhos cada vez mais. Mesmo assim, o Nara se manteve comprometido em tomar conta da neném e assim o fizera durante o dia. Troca de fraldas, banho e papinha; Shikamaru tomara conta da pequena Mirai como um pai exemplar. Depois de tudo isso, ele decidira que estava na hora de pô-la a dormir, pois já passara da hora da soneca da tarde. A pequenina era enérgica e recusava-se a fechar os olhos, mesmo depois de seu guardião ter lido algumas dúzias de páginas, ela ainda se mantinha alerta. Por conta disso, o Nara pusera o livro de lado por um instante e sacara seu celular do bolso, escolhera um jazz tranquilo e o deixara tocando; enquanto a melodia preenchia o ambiente, ele ninava com ternura aquela pequena criatura que finalmente começara a bocejar. Mais alguns minutos e finalmente Mirai dormira no colo de Shikamaru, mas ele não comemorara, pois caíra nos braços de Morpheus antes de sua protegida.

            Não se passaram mais do que uma hora desde que os dois caíram no sono, e Kurenai regressara à residência. Ela abrira a porta casualmente sem se importar se faria ruídos ou não, mas imediatamente após ver tanto Mirai quanto Shikamaru dormindo, ela se aquietara e depois disso começara a andar sorrateiramente para não acordá-los. Ela, após encostar a porta, sacou o celular da bolsa e preparou-se para tirar uma foto daquela situação. Era tão meigo ver o Nara, aquele rapaz ranzinza, segurando delicadamente a garotinha.

            A professora, após capturar aquela imagem terna, guardou o celular e foi em direção dos dois para levar a filha para o berço. Ela se aproximou tão sorrateiramente que seus passos eram mais silenciosos que folhas caindo vagarosamente no outono, em seguida, tão gentilmente quanto o toque da seda ela segurou o braço de Shikamaru para pegar para si sua querida Mirai. Mesmo assim, o moreno acordara abruptamente enrijecendo os músculos e puxando para perto de seu peito sua protegida, não com tanta força que a fosse machucar, mas apenas o suficiente para que ela não fosse retirada de seus braços sem consentimento.

            – Me desculpe Shika, eu não queria lhe acordar. – Kurenai respondeu com um sorriso doce.

            – Tudo bem. – Ele respondeu ainda um pouco surpreso por ter sido tirado do sono.

            – Como foi o dia? Espero que ela não tenha dado tanto trabalho. – A bela mulher então pegou cautelosamente a filha no colo e a beijou na testa.

            – O dia foi bem tranquilo. – O músico em seguida bocejou, pois, o sono ainda lhe pesava as pálpebras. – Trabalho? Imagina, a Mirai é uma anjinha. – Ele respondeu espreguiçando.

            – Mas pelo seu olhar cansado parece que ela te esquentou a cabeça por umas boas horas. – Ela comentou com um riso no rosto enquanto ia em direção ao quarto para deixar sua pequena descansar confortavelmente no berço.

            – Ei, isso não é justo. Essa cara de morto é a única que eu tenho. – Ele murmurou ironicamente enquanto puxava o celular.

            Shikamaru fora finalmente conferir as mensagens que ele havia recebido de Naruto há algumas horas atrás. Ele não havia se interessado antes, já que estava ocupado tomando conta de Mirai; além disso, ele sabia que não era algo urgente, porque instruíra os amigos a ligarem para ele somente se fosse algo de suma importância estivesse prestes a acontecer.

            “ouuu cê sabe se o manolo lá do bar tem internet? – N. Uzumaki 14:03”

            “e se ele. Tem cmarea e pc pra agente transmitir td ao vivo – N. Uzumaki 14:04”

            “? – N. Uzumaki 14:05”

            O baixista suspirou desgostoso ao ler, pois cada erro gramatical e ortográfico lhe trazia uma urticária, já que atentavam a um dos valores que ele interiorizara quando mais jovem; a ordem é essencial para o progresso, portanto, as regras de cada pilar de conhecimento humano devem ser seguidas para que possamos melhorar como espécie, e somente após ser deliberado pragmaticamente, devemos lutar contra elas. Todavia, ao mesmo tempo tentava se conter, porque tinha em sua bagagem cultural a leitura de alguns professores que defendiam que a mensagem sobressaí a forma, de maneira que discriminar alguém se baseando no jeito como ela transmite suas ideias é considerado um preconceito linguístico, uma vez que se o interlocutor compreendeu o quê o comunicador emitiu, então a linguagem, mesmo que destoe da norma culta, cumpriu seu papel.

            “??????? – N. Uzumaki 15:10”

            “ken ñ responde é bixxxa sabia – N. Uzumaki 15:31”

            “O putaquepariu eu cabei de ir lá – N. Uzumaki 16:07”

            “e ñ tm porra de equip nenhum – N. Uzumaki 16:07”

            “daí tem como vc e o Chouji irem pro calçadaum pegar lá na loja um mic pra agente faze transmissão pelo YT? – N. Uzumaki 16:08”

            Shikamaru continuou lendo as mensagens tentando não fazer juízos de valor sobre a maneira como Naruto havia escrito. Apesar de ter achado uma boa ideia transmitir a apresentação, ele lia aquilo sem muito ânimo, porque já previa que preparar os equipamentos para a transmissão possivelmente lhe trariam mais dores de cabeça.

            “é pq eu to indo pro hospital pra leva meu note pra karin. Asistir nosso show – N. Uzumaki 16:08”

            “nevermind. Meu estagiário e o Chouji já resolveram isso – 16:55”

            “só mais uma coisa – 16:55”

            “VAI TOMA NO CU!!!!!!! – 16:55”

            “pode voltar a aproveitar seu dia de princesa. Sò ñ falta hj no bar – 16:56”

            – Que cara é essa? Você ficou bravo por que eu te perguntei se estava cansado? – Kurenai perguntou depois de voltar e ver Shikamaru emburrado segurando o celular.

            – Oi? – Ele questionou meio surpreso e depois guardou o aparelho, pois já lera todas as mensagens. – Não. É só... trabalho. – Ele respondeu atrapalhado.

            – É brincadeira. – Ela comentou risonha enquanto ia em direção à cozinha. – O que você quer comer hoje? – Kurenai perguntou antes de entrar.

            – Obrigado pela hospitalidade, mas eu tenho que ir daqui a pouco, por causa do trabalho. Então, deixa para a próxima. – Ele respondeu e em seguida se levantou do sofá.

            – Poxa, é sábado à noite! Eu sei que você é workaholic, mas uma hora ou outra você vai ter que jantar. Então, fique, por favor. Eu ficaria feliz com sua companhia. – A encantadora mulher de cabelos castanhos pediu com a voz manhosa enquanto ela esperava a resposta encostada na porta.

            O Nara momentaneamente parou de costas para Kurenai e ficou fitando a porta de entrada à sua frente. Foram alguns míseros segundos, mas que foram o suficiente para que ele lembrasse de como os últimos meses não foram fáceis para aquela bela dama com quem ele dividia fortes laços afetivos. Por esse motivo, ele arfou suavemente com olhos fechados e em seguida virou na direção dela.

            – Você tem razão. – Shikamaru disse com um tom amistoso. – O que vamos cozinhar? – Ele perguntou arrumando seu rabo-de-cavalo e indo em direção a ela.

            – “Vamos”? – Ela perguntou com uma pitada de ironia.

            – Você sabe que eu sei cozinhar bem, não sabe? Afinal, quem é que preparou a papinha da Mirai hoje? – Ele perguntou com um sorriso convencido.

            – Olha, você sabe que requentar comida não é o mesmo que cozinhar, né? – Ela novamente questionou com semblante sardônico.

            – Quer dizer que esquentar no micro-ondas não é a mesma coisa que...

            – Como ousa?! Eu já te falei que não é para esquentar a papinha no micro-ondas, porque... – Ela manifestou-se com um misto de ultraje e gozação antes de ser interrompida.

            – Eu sei. Só estou brincando com você, mamãe coruja. – Ele disse sorrindo.

            Era raro Shikamaru ter uma conversa tão descontraída com alguém; nem mesmo com Chouji ou seus familiares ele costumava adotar um tom tão leve, mas com aquela mulher era diferente. Talvez fosse por causa de seu sorriso acolhedor, talvez fosse o amor mútuo pela literatura ou, quem sabe, fosse porque ela o conheceu no momento mais conturbado de sua vida e lhe ajudou a levantar quando ele se encontrava completamente vulnerável.

Seja qual for o real motivo, o músico era grato pela amizade; não somente grato, como também se sentia em débito com a bela dos olhos cor de mel, por isso, ele não pensou duas vezes e voltou a Los Angeles quando soube que ela estava com início de depressão. Shikamaru já estava adiantado com o cronograma de aulas da faculdade, mas quando soube da situação de Kurenai, ele aumentou o número de matérias para acumular créditos o suficiente para se formar e em pouquíssimo tempo já estava com o diploma em mãos. Naturalmente, seu pai ficou muito orgulhoso com a notícia, pois estava ansioso para que o filho assumisse o seu posto no escritório, porém sabia que ainda faltava a licença da Ordem dos Advogados para que ele pudesse exercer a profissão. O quê Shikaku não sabia e também o desagradou profundamente quando soube é que Shikamaru não iria fazer os exames para o LSAT e que provavelmente, apesar de ter adiantado a faculdade, ainda demoraria alguns anos para que ele se inscrevesse para obter sua licença. O patriarca ficara ainda mais irritado com o fato de seu filho não explicar corretamente os motivos para os quais optara por tomar essa decisão, apenas lhe dissera que precisava resolver assuntos inacabados e honrar seus deveres como um homem da família Nara.

Apesar de não saber exatamente o que dizer ou fazer para ajudar aquela moça, Shikamaru esteve ao lado dela assim que pode. Ele a reconfortou, ouviu suas angústias, disse que aquilo era normal depois de tudo o que aconteceu, esteve presente no dia-a-dia para lhe ajudar a espairecer e, talvez o mais importante, a convenceu a procurar ajuda profissional. É claro que além disso o moreno de rabo-de-cavalo cuidara da pequena Mirai. Por mais que essas ações fossem importantes, elas não eram o suficiente, pois havia ainda a questão financeira; as sessões de terapia não eram exatamente baratas e além do mais, bebês oneram as economias de seus pais. Por causa disso, Shikamaru se desdobrava com seus empregos para ajuda-las financeiramente; não era muito, mas certamente já complementaria a renda familiar.

Mesmo cheio de afazeres, o Nara decidira entrar em uma banda, porque precisava espairecer, além disso, dessa forma ele conseguiria resolver três problemas de uma vez só, já que relaxaria, possivelmente faria mais um pouco de dinheiro com apresentações e, o mais importante, manteria a promessa que fizera a seu melhor amigo de que não importa o que acontecesse ele continuaria sempre a se desafiar. Todavia, por ironias do universo, seu passatempo tornou-se um empecilho depois da primeira apresentação. Em detrimento disso, ele não tivera muito tempo nos últimos dias para conversar com Kurenai, por essa razão que quando ela pediu sua companhia ele aceitou, mesmo sabendo que seu tempo estava curto.

Eles passaram o tempo colocando os assuntos em dia enquanto preparavam um robalo assado com ervas e legumes, e uma saldada de batatas rústicas para acompanhar. A conversa era leve, os dois sorriam e riam das anedotas um do outro. Seria difícil imaginar que ambos estivessem com pesos tão grandes se alguém os visse naquele momento. Em um determinado momento, o celular de Shikamaru tocou e o nome de Chouji apareceu no visor.

— Alô, Chouji? – Shikamaru atendeu enquanto secava uma das mãos e em seguida trocou o celular de mãos.

— Ô desgraça, aqui é o Naruto! Por que você não me responde?! – O loiro perguntou exaltado do outro lado da linha.

— Quem é? Aconteceu alguma coisa? – Kurenai perguntou preocupada após fechar o forno.

— É meu colega de banda. Não, está tudo bem. – O Nara respondeu afastando o telefone de seu rosto.

— Puta que me pariu! É por isso que você não me atendia, não é mesmo, seu safadinho? – O Uzumaki escarnecia com a voz trêmula com as risadas.

— Naruto, se não é nada importante, eu estou desligando. – E subitamente, o baixista estava de volta com seu tom apático.

— Não, não, não. Calma aí! – O loiro exclamou esbaforido. – Serei o mais rápido possível, já que você falou que era só para ligar se fosse importante. – Ele parou de falar pois estava tomando fôlego e em seguida ele disparou como uma metralhadora. – O gordão ficou com cagaço do palco de novo depois que eu falei que teria uma galera para nos ver hoje, no qual uma galera dessa galera vai ser das minas dos nossos colégios. Daí ele surtou e começou a entrar em paranoia até que eu dei um tapa nele e mandei ele segurar as pontas. Depois do tapa, ele me disse “me bate, me arranha e me chama de piranha”, mas aí eu falei para ele “quer me foder, me beija” e mandei ele parar de piadinha porque agora não era a hora. Parênteses: viu só, depois do seu soco eu tomei jeito e virei gente; posso até dizer que eu sou o responsável da nossa dupla: Le Ninja & Shamu. Tá, o nome é ruim, mas ainda estamos trabalhando nisso. Aí, como eu estava só de calça de lycra vermelha e com o olho roxo, por favor não me pergunte o porquê, eu tive a brilhante ideia de a gente tocar fantasiado de personagens do cinema; aí eu vou de Tyler Durden, o emo vai de motoqueiro viado e o rolha-de-poço vai colocar alguma máscara. Como você é inteligente, acho que já sacou que é para você ir fantasiado de alguma coisa que mostre sua personalidade. Sugiro você ir de Mr. Vernon, Diretor Rooney ou quiçá Dona Balbricker se quiser ser diferentão, porque...

— Naruto. – Ele interrompeu o outro com uma voz assertiva, mas pacífica. – Isso não foi breve. Já entendi. Há mais alguma coisa que você gostaria de dizer antes de eu desligar?

— Deixa eu pensar. – O Uzumaki calou-se e em seguida exclamou. – Já sei! Não se esqueça da camisinha antes de dar aquela catracada da hora, porque, já pensou você ser pai? Obrigado. De nada. Por favor, não me mate. Te amo, beijo na nádega direita e tchau.

            – Está tudo bem? – Kurenai perguntou risonha ao ver que Shikamaru estava calado, boquiaberto e com o olhar perdido.

            – Eu acho que eu vou matar alguém. – Ele respondeu guardando o celular com o olhar ainda vago. – Primeiro, um monte de disparates, depois recebo a notícia que tenho que me travestir de algum personagem de cinema para apresentação de hoje, por fim, mais uma tonelada de má-criações.

            – Problemas com o coleguinha de banda? – Com o mesmo tom de voz jocoso, ela perguntou.

            – Você não vai acreditar na quantidade de bobagens que essa juventude é capaz de produzir.

            – É claro que eu sei! Sabe por que, Sr. Velho-Ranzinza? Dois motivos: primeiro que eu sou professora de literatura, então eu leio uma boa quantia de bobagens; segundo, eu sou jovem ainda, então eu sei o que se passa na cabeça dessa juventude. – Ela disse confiante enquanto ia em direção a bancada pegar manteiga para misturar com as batatas.

            – Please. – Ele falou com um sorriso debochado. – Se eu já sou velho, você então... é uma múmia decrépita. – Ele terminou de dizer tentando manter a seriedade.

            – Como ousa! – Ela rebateu com surpresa. – Você vai se arrepender de ter dito isso. – Ela falou enquanto se aproximava com a manteiga de garrafa empunhe lançando lhe um olhar ameaçador.

            – Brincadeirinha, você sabe que você parece mais nova do que eu. – Ele tentou se esquivar com um sorriso estupidamente forçado. – Trégua? – Ele perguntou levantando o pano de prato branco ao alto.

            – Vou pensar no seu caso, já que dizer que eu pareço mais nova que você não significava muita coisa, porque venhamos e convenhamos, o Sr. Velho-Ranzinza está acabado. – Ela terminou mostrando-lhe a língua.

            – Está bem. Você parece ser tão mais nova do que eu que se nós saíssemos de mãos dadas na rua, a polícia iria querer me prender por corrupção de menores. Melhor? – Ele perguntou sorrindo aproximando-se do fogão para ver como estavam as batatas. – Agora que estamos em paz, você pode me ajudar a pensar em alguma fantasia para eu usar hoje? Lembrando que tem que ser de algum personagem que lembre algo sobre mim.

            – Aquele louva-deus do mal que aparece em Vida de Inseto. A Mirai adora esse filme! – Ela respondeu prontamente.

            – Por quê?

            – Eu já falei, ele é do mal. – Ela implicou.

            – É sério, estou sem ideias e não tenho mais tempo para alugar fantasias. Por favor, eu preciso da sua criatividade feminina. – Ele falou com o tom de voz um pouco mais sóbrio.

            – Que tal Don Corleone? – Ela respondeu após pensar por alguns instantes.

            – Deixa eu adivinhar, é porque ele é velho-ranzinza, todo mundo tem medo dele e porque a fantasia seria só roupas sociais?

            – Não. Na verdade, é porque ele é um homem forte, honrado à sua maneira, protetor da família e tem um toque galanteador. – Ela foi listando as qualidades do personagem enquanto se aproximava de Shikamaru e posava sua mão direita na face dele.

            – Galanteador? – Ele murmurou a uma curta distância do rosto da bela.

            Lentamente eles se aproximaram, de olhos fechados os dois se moviam a fim de que seus lábios se encontrassem. Eles estavam com a respiração inconstante, as mãos trêmulas e um frio na barriga que remetia a um primeiro amor, paulatinamente seus lábios estavam se alcançando e a medida em que a distância que os separava ia diminuindo, os reflexos citados se intensificavam. Quando eles estavam a menos de um palmo de distância, a pequena Mirai acordou e começou a chorar, o que os separou e fez com que o beijo fosse suspenso, deixando os dois com os rostos corados enquanto se separavam, pois um deles devia continuar a cozinhar e outro a pegar a bebê do berço.

Meia hora antes

            Durante aquela noite, os músicos estavam se apresentando bem, porém havia algo faltando. Eles colocavam seus corações em cada nota, mas ainda assim o show não estava à altura do que eles almejavam; eram suficientemente bem executadas para alegrar a multidão, contudo, por terem rearranjado o set praticamente inteiro de uma noite para outra, havia momentos em que um deles tinha que improvisar sob o tom da canção e tentar encaixar algo que combinasse com a melodia que ele não decorara. Sem exceções, todos tiveram contratempos por falta de familiaridade com alguma das músicas, sobretudo Shikamaru e Chouji tiveram que exercitar muito a criatividade para preencher suas linhas musicais; já os vocalistas, tiveram mais dificuldade em se lembrarem de todas as letras, palavra por palavra, por esse motivo, quando algum deles não se recordava, ele apontava o microfone para a plateia ou então gritava algo como “agora vocês” e deixava que o coro de vozes do ambiente suprisse a lacuna por ele deixado. Ademais, havia a limitação de equipamentos que não permitia que eles executassem o cover com a mesma qualidade da versão original, uma vez que, por exemplo, eles não tinham o piano ou violão utilizados na gravação do estúdio. Todavia, ao mesmo tempo, por causa desses detalhes, eles conseguiam dar uma identidade própria às artes de outros músicos. Era algo lindo de assistir, mas ainda estava cru; em outras palavras, essas apresentações eram joias a serem lapidadas por ourives. 

            O show estava oscilando entre momentos muito bons e outros razoáveis conforme eles iam passando pelo setlist. Os picos de magistralidade marcavam as músicas que todos tinham familiaridade, pois nesses momentos eles estavam em comunhão e a sinergia do grupo potencializava a habilidade individual, tornado o todo maior que a soma das partes.

Chegara o momento em que os músicos entrariam no mais perfeito ajuste-fino em que eles tocariam uma música que está cravada no âmago de todos eles e por ser um clássico seria acompanhada com fervor por toda a multidão do começo ao fim.

Naruto estava posicionado ao centro do palco, com sua Variax dourada empunhe e um sorriso malicioso. As luzes foram ficando cada vez mais fracas de tal forma que somente mostrava a silhueta dos outros músicos, elas então esmaeceram e somente restara uma que mirava no loiro. Ele começou a palhetar o “exercício pessoal meio idiota” de Slash [Guns N’ Roses] em sua guitarra e ficou soberano sob os holofotes durante os primeiros quinze segundos até que os outros músicos foram iluminados por feixes oscilantes que piscavam no ritmo da canção. Eles se deixaram imergir com aquela melodia e a cada nota tocada eles sentiam prazer de estarem realizando algo significativo. O Uzumaki terminou seu solo e em seguida preparou-se para iniciar os versos com sua voz agudíssima com toques de drive para lhe dar aspereza.

She's got a smile that it seems to me

(Ela tem um sorriso que me parece)

Reminds me of childhood memories

(Trazer à tona memórias da infância)

Where everything

(Onde tudo)

Was as fresh as the bright blue sky

(Era fresco como o límpido céu azul)

***

Now and then when I see her face

(Às vezes quando olho seu rosto)

She takes me away to that special place

(Ela me leva para aquele lugar especial)

And if I stare too long

(E se eu fixasse meu olhar por muito tempo)

I'd probably break down and cry

(Provavelmente perderia o controle e começaria a chora)

            Normalmente os vocais ficavam a cargo de quem tocava a guitarra rítmica, porém dessa vez Naruto ficara encarregado de solar enquanto cantava, porque era ele quem já tinha aprendido as linhas de Slash, assim como também era ele o dono da voz aguda que melhor substituía o timbre de Axl Rose em seu auge. O loiro pouco se preocupou com essa responsabilidade, na realidade, ele até preferiu que assim fosse pois era apaixonado pela melodia da guitarra principal que permeava toda aquela canção; aquela certamente era uma das músicas que compunham o top dez favoritas do Uzumaki. Por conta disso, ele cantava como mais energia do que antes fazendo com que suas veias saltassem do pescoço e sua alva pele tornava-se avermelhada com o esforço.

            O final da primeira repetição do refrão chegara e com ela Naruto iniciara uma singela dança, não era nada complexa pois ele ainda tinha que tocar um diminuto solo antes de voltarem para os versos. Apesar de tosca, aquele gingado era muito semelhante ao que Axl realizava durante os shows, porém ao invés de usar o pedestal com o microfone, o loiro segurava sua guitarra como companheira de dança.

She's got eyes of the bluest skies

(Ela tem os olhos como os céus mais azuis)

As if they thought of rain

(Como se eles pensassem em chuva)

I hate to look into those eyes

(Detesto olhar para dentro daqueles olhos)

And see an ounce of pain

(E enxergar o mínimo que seja de dor)

***

Her hair reminds me of a warm safe place

(Seu cabelo me lembra um lugar quente e Seguro)

Where as a child I'd hide

(Onde, quando criança, eu me escondia)

And pray for the thunder

(E rezaria para que o trovão)

And the rain

(E a chuva)

To quietly pass me by

(Passassem quietos por mim)

            Novamente chegara o momento do refrão. O Uzumaki continuara com a mesma gana de antes cantando emocionado. Chouji apesar de considerar Sweet Child O’ Mine uma música muito “leve” para seus gostos, estava apreciando aquele momento, pois ela era uma das primeiras músicas que lhe despertara o interesse em aprender tocar bateria quando era mais novo e ainda não havia migrado para os subgêneros de metal extremo. Por conta disso, ele sorria por trás daquela máscara de hóquei e tentava golpear com mais fervor suas baquetas a fim de demonstrar sua apreciação pelo momento.

            Shikamaru, apesar de estar apreciando a música, continuava com o seu usual tom blasé. Mas vez ou outra deixava sua mente se perder na melodia e fechava os olhos para senti-la melhor, os pequenos detalhes que ele capturava com a privação da visão lhe ouriçavam os pelos do braço. Os arrepios reavivavam as sensações por ele vividas mais cedo com Kurenai e a isso ele só conseguia se questionar silenciosamente “o que eu fiz?”. O misto preocupação e culpa o faziam sair do transe que a música o colocava.

            O Uchiha estava tocando também com pujança, mas ao contrário das vezes em que ele estivera no centro do palco cantando, ele não esbanjava sorrisos falsos para alegrar a plateia. Não é que ele não estivesse gostando de tocar, mas ele não conseguia parar de pensar em Karin. Por isso, Sasuke fitava intensamente a lente da câmera segurada por Konohamaru e desejava com todas as suas forças que a pequena ruiva estivesse os assistindo.

Oh, oh, oh, oh

Sweet child o' mine

(Minha doce criança)

Uh, uh, uh, uh

Sweet love of mine

(Meu doce amor)

            Após terminar de cantar o refrão mais uma vez, o loiro prontificou-se a tocar o solo. Ele atacava com tenacidade as cordas de sua guitarra, golpeando as com sua palheta ou então as puxando com os dedos para que seu instrumento gritasse. Naruto ia aumentando gradativamente tanto a força quanto a velocidade com que tocava, com isso a banda toda sentia-se compelida a fazer o mesmo, o que tornava aquela apresentação cada vez mais memorável.

            Depois de terminarem de tocara a metade desse solo, Naruto encontrava-se segurando a guitarra verticalmente, assim como Slash costumava fazer em suas apresentações, em frente ao microfone. Ele então encheu os pulmões e gritou:

            – Senhoras e senhores, where do we go now (para onde nós vamos agora)?

            E assim fez-se o coro e todos cantavam repetidamente “where do we go; where do we go now”. Depois de algumas repetições Naruto voltou a solar sua guitarra e juntamente cantava algumas vezes os mesmos versos que a plateia. Com muita ferocidade ele continuava, era lindo de se ver como o instrumento era dominado por suas mãos, parecia até que a guitarra era um prolongamento de seu corpo, tamanho era a maestria com a qual ele a fazia cantar.

            Em um dos momentos finais, o Uzuamki se ajoelhou e continuou a atacar brutalmente as cordas. Tudo estava bem até que sua corda Si estourou depois de um bend colossal. Isso o fez se desconcentrar momentaneamente, fato que fez com que todos percebessem que algo havia acontecido e olhassem para o loiro. Sem perder muito tempo, ele então começou a improvisar com as cordas restantes e depois de alguns instantes finalizou sibilando “Sweet Child O’ Mine” no microfone.

            Era crucial que eles continuassem a tocar, pois com essa música eles elevaram muito os ânimos da multidão. Eles de alguma forma deviam continuar rapidamente, por isso, em questões de segundos após terminar, os olhares de Naruto e Sasuke se cruzaram e em seguida foram em direção a outra guitarra do moreno que estava de lado. Sem nem dizer uma palavra sequer, o loiro desplugou sua guitarra e a levou em direção ao apoio onde o amigo deixara o outro instrumento. O Uchiha por sua vez, se aproximou do microfone e começou a dialogar com a plateia.

            – É pessoal, parece que tivemos alguns problemas técnicos... – Ele então começou a observar as pessoas na multidão e os olhares impacientes lançados a ele mostravam altas expectativas.

            O moreno então calculou que Naruto provavelmente demoraria uns dois minutos e meio para afinar corretamente a Les Paul no meio da barulheira, tempo inexistente para se perder naquele momento. Ele então olhou para os lados e viu que os outros dois colegas de banda não estavam apostos caso ele quisesse começar sem Naruto, pois Shikamaru estava com uma garrafa de água em mãos e Chouji tentava secar o suor de seu rosto sem que as outras pessoas descobrissem sua identidade.

            – Falta de profissionalismo é foda. Sorte de vocês que eu estou aqui. – O Uchiha comentou com um tom sarcástico após tomar uma decisão de momento para contorna aquela situação. – Que tal eu tocar algo novo para vocês? Ela não está finalizada, deveria ser tocada no piano e ainda não tem um nome. Mas é o que tem pra hoje. – Ele falou enquanto mexia em seus pedais de efeito para tornar o timbre mais próximo ao jazz. – Eu tentei escrever ontem uma carta para uma certa pessoa, porém eu não consegui. Por isso, resolvi apelar para algo que eu sei fazer e comecei a escrever um poema... quando eu me dei conta o poema já tinha alguns versos e uma melodia que ficava batendo na minha cabeça. Bem, chega de enrolar, ela é mais ou menos assim.

            Apesar de inseguro, Sasuke iniciou sua música, pois sabia que era preciso fazer algo rápido para entreter aquelas pessoas, do contrário o interesse delas poderia desaparecer ou ao menos diminuir significativamente. Com uma levada diferente da maioria das baladas que eles tocaram naquela noite, o moreno dedilhava os acordes dissonantes com um ritmo de bossa-nova, um gênero que sua mãe adorava quando ainda era viva. Era uma progressão harmônica gostosa de ser escutada, era leve e melancólica.

            Os outros músicos observavam atentamente o que estava acontecendo, pois aquilo também os pegara de surpresa. Em especial, Naruto fitava tão atentamente que se esquecera momentaneamente o motivo pelo qual Sasuke estava fazendo aquilo e por isso deixara de lado a afinação da guitarra.

I crossed the seven seas shouting your name

(Eu cruzei os sete mares gritando seu nome)

I walked through a thousand lands looking-for your sign

(Eu caminhei através de mil terras procurando por seu sinal)

My journey made me decline my heritages claim

(Minha jornada me fez abrir mão do meu direito pelas minhas heranças)

And the time shattered me apart, but that’s fine

(E o tempo me despedaçou, mas tudo bem)

            Sasuke cantava emocionado, enquanto pensava na pequena ruiva que ele havia machucado. Ele sentia-se angustiado em pensar que ele nunca mais veria o sorriso de Karin e por isso esteve torcendo a noite toda para que ela o estivesse assistindo. Principalmente neste momento, o Uchiha queria que ela o visse e aceitasse essa música como um pedido de desculpas.

I finally know where you’ve been for so long

(Eu finalmente sei onde você esteve por todo esse tempo)

Just to see your face once more, it will worth it all

(Apenas ver seu rosto mais uma vez, isso irá valer tudo)

I’ll rest by your side, where I belong

(Eu descansarei ao seu lado, onde eu pertenço)

And every problem shall become small

(E todos os problemas se tornarão pequeninos)

            Com a voz grave aveludada, ele despejava cada um dos versos com ternura. A sua volta, a multidão calara-se no escuro e em seguida ressurgira com dezenas de luzes de celular balançando silenciosamente atentas de um lado para outro no breu.

Now I’m crawling to the underworld to save your soul

(Agora eu estou rastejando para o submundo para salvar sua alma)

I’ll sing ‘till my throat bleed to lure everyone like Orpheus did

(Eu cantarei até minha garganta sangrar para distrair a todos assim como Orfeu o fez)

The Lord of the Dead’s won’t keep the beauty that he stole

(O Senhor dos Mortos não manterá a bela que ele roubou)

And we, my darling, will live the love which fate forbid

(E nós, minha querida, viveremos o amor que o destino proibiu)

Forgive me for the times I’ve failed your feelings

(Perdoe-me pelas vezes que eu falhei com seus sentimentos)

Please, stay with me and let’s redo our silly things

(Por favor, fique comigo e vamos refazer nossas coisas tolas)

1 minuto antes

            Karin estava deitada na cama de hospital ainda com o computador que seu primo levara aberto a sua frente. Ela estava pálida e gélida como a neve. Ao seu lado, sua mãe segurava com amor sua mão enquanto a escutava suspirar. Elas estavam sozinhas naquele quarto de hospital, conversando a respeito de pequenos fragmentos da infância da jovem misturado com alguns outros devaneios.

— Eu só queria um pouco mais de tempo. – Karin soprou essas palavras com sua lânguida respiração. – Queria dizer que aquela música está perfeita do jeito que está. Queria que você me ajudasse a planejar o meu casamento, mamãe. – A jovem apertava a mão de sua mãe com todo o restante de força que ainda possuía. – Queria que o papai me contasse mais uma daquelas histórias entediantes de como ele e o vovô quase pescaram o Monstro do Lago Ness. – A pequena ruiva tossiu com a respiração pesada. – Queria ouvir mais alguma das piadinhas infames do Naruto. Queria ao menos abraçar o Sasuke uma última vez para poder me despedir. – A Uzumaki falou trêmula com seus olhos marejados se fechando. – Mas tudo o que eu posso fazer é me desculpar; desculpa mamãe por ter sido um fardo para vocês por tanto tempo, espero que agora você e o papai possam realizar todas as viagens que vocês sempre quiseram, mas nunca puderam. Obrigada por tudo. Eu quero que você saiba que eu amo muito vocês. – Essas foram as últimas palavras que Karin pronunciou antes de fechar os olhos cansados.


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Notas finais do capítulo

Enfim, acabamos o capítulo, você tem algum comentário? Ah, by the way, a última música que eles apresentaram é de um poema que eu escrevi. Espero que tenham gostado!

Por favor deixem um comentário, porque eles me motivam a continuar a escrever. Abraços e até a próxima.



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