O Feiticeiro Parte III - O Medalhão de Mu escrita por André Tornado


Capítulo 24
III.6 Amigos para sempre.




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Os frutos daquela macieira selvagem desapareciam num ápice, sugadas por mãos ávidas. Por detrás da folhagem que se agitava, escutava-se o mastigar aflito de dois rapazes famintos, numa competição para determinar quem conseguia devorar a maior quantidade de maçãs no menor espaço de tempo, antes do protesto seguinte dos estômagos exigentes.

- Deixa ver se percebi.

Um ramo rangeu e Goten surgiu de cabeça para baixo, enrolando as pernas neste, segurando-se pela dobra dos joelhos.

- Todos os que estavam ligados ao meu pai foram enviados para a Dimensão Real quando Zephir enfeitiçou o meu sangue e só podiam regressar se algum de nós interagisse com alguém dessa dimensão. Só que não se podia interagir, pois o feiticeiro avisou-nos que, se o fizéssemos, ele seria transformado num deus. Então, viveram dias de pesadelo com medo de interagir e com medo de que passasse o prazo dos doze meses, doze dias na nossa dimensão, e que nunca mais pudessem regressar.

- Hum-hum. É isso mesmo.

Trunks contara, finalmente a história muito comprida, que acabou por não ser tão comprida assim, pois optara por resumi-la e apresentar um relato que faria o efeito desejado: acalmar a curiosidade do amigo. Encostava-se ao tronco da macieira selvagem, sentado num ramo abaixo daquele onde Goten balançava.

- Mas tu acabaste por interagir com aquela rapariga.

- Hai… A Ana.

Goten deu uma dentada na maçã que tinha na mão.

- Não tiveste medo, Trunks-kun?

- Do quê?

- De transformares Zephir num deus… De criares um inimigo que o meu pai, nem o teu, conseguiriam derrotar?

Trunks encolheu os ombros, mastigando a sua maçã.

- Não me importava com nada disso… Estava magoado com o que tinha acontecido. Pensava que estavas morto.

- Mas não estava.

- Não sabia disso. Ninguém sabia…

- Foi uma jogada arriscada.

Acabaram com as respetivas maçãs ao mesmo tempo, atiraram os caroços para longe. Trunks confessou, quase envergonhado:

- Tentei várias vezes interagir, nunca aconteceu. Mas acabou por acontecer quando não estava à espera.

Goten deslizou do ramo, pendurou-se por um braço. Reparou no trio de maçãs que Trunks guardava no colo. Escolhera as que pareciam mais sumarentas, recolhera-as para ela, pensava nela, mesmo quando falara da Dimensão Real, quando comera, quando se rira, ali, sentado naquele ramo.

- Gostas dela.

- Nani?

- Gostas da Ana… E gostas a sério.

A escuridão da noite escondeu o rubor que incendiou o rosto de Trunks. Confessou com a voz a tremer:

- Interagi com ela. Gosto dela, sim…

- E o que é isso? Interagir?

- Fiz amor com ela.

Foi a vez de Goten corar. Trunks conseguiu perceber que o envergonhara, aproveitou a descoberta para voltar a controlar a situação.

- É muito especial fazer amor com uma rapariga quando gostas mesmo dela. Vais ver como vai ser diferente quando acontecer com a Maron.

A cara de Goten coloriu-se de vermelho vivo, como uma das maçãs que tinham acabado de comer. Trunks riu-se.

- O que foi? Não me digas que…

Goten saltou para o chão, anunciando com uma voz esganiçada que deveriam regressar à cabana, a rapariga estava lá sozinha, devia ter fome e ele não tinha apanhado aquelas três maçãs para ela?, pois então, deveria levar-lhas.

Trunks saltou também. Perguntou:

- Nunca o fizeste, pois não?

- Temos de conversar sobre isso agora?

- Não há qualquer problema…

- Não quero conversar sobre isso agora.

- Vai ser ainda mais especial. Tu e a Maron.

- Ela só tem dezasseis anos.

- E depois? A tua mãe não casou com o teu pai com dezoito?

- Isso já foi há tanto tempo… Eh! E como é que sabes essas coisas?

- A minha mãe, às vezes, fala de coisas passadas, apesar de o meu pai detestar esse tipo de lamechices, como lhe chama. Recordar o passado! – E imitou a voz de Vegeta.

Goten deu um pontapé numa pedra e começou a descer a colina onde existiam as macieiras selvagens. Um dos sítios onde podiam ir buscar alimento. Havia também amoreiras e diversos arbustos com bagas comestíveis, explicara. Quando Trunks lhe dissera que achava estranho Goku alimentar-se apenas de fruta durante os treinos que deveriam ser exigentes, acrescentara que havia muito peixe no rio, javalis e veados que poderiam caçar e sempre enchiam mais a barriga. E teriam de arriscar e acender uma fogueira, pois ele não iria comer carne de veado crua.

Foram em silêncio e chegaram à cabana num instante.

- Ei, Goten.

- Hum?

- Amigos?

- Nani?... – Goten piscou os olhos, desnorteado. – Mas sempre fomos amigos. Irmãos. Companheiros de combate.

Trunks apartou o olhar.

- Fiz-te muito mal – confessou.

- Ora… É passado. Lamechices! – E foi a vez de Goten imitar a voz de Vegeta. Assentou uma mão no ombro de Trunks. – Ainda não me contaste tudo sobre essa Dimensão Real. De certeza que fizeste amigos lá… Conheceste raparigas… Antes da Ana, claro.

Trunks sorriu.

- Conto-te tudo. Teremos bastante tempo para isso, durante estas férias na montanha.

- Hai.

Dentro da cabana havia silêncio e escuridão. Trunks chamou pela Ana, mas não obteve qualquer resposta. Deixou as três maçãs em cima da prateleira por cima do baú, Goten apontou para o colchão.

- Ela está a dormir. Olha!

- Eh… Nem sequer comeu. Mas vamos deixá-la dormir. Afinal, fez uma viagem entre dimensões, esteve no Templo da Lua e andou a voar. Deve ter ficado cansada.

- Viajar entre dimensões cansa?

- Os nossos corpos na Dimensão Real eram mais pesados. Ainda me levou algum tempo a habituar-me ao peso, à falta de ar. – Deu uma cotovelada em Goten. – Olha, vamos deitar-nos também. Não devemos fazer barulho a conversar, senão estragamos-lhe o descanso.

Trunks espreguiçou-se e saiu-lhe um bocejo. Despiu a t-shirt e os calções, atirou tudo para cima do baú. Descalçou as sapatilhas, as meias, enfiou-as dentro das sapatilhas e estendeu-se no colchão. Percebeu que Goten ficara de pé, sem mover um músculo.

- O que é que se passa?

- E onde é que eu vou dormir?

- Aqui. – Puxou a Ana para si, para arranjar espaço. – Nesse canto. Acho que te vai chegar.

- Dormir com ela?

- E comigo! – Indignou-se Trunks. – Nem te atrevas a tocar nela.

- Não! Claro que não. Mas… E ela não se vai importar?

- Não se vai importar de nada, desde que esteja comigo. Vá, deita-te de uma vez!

Goten não se despiu. Deitou-se envergando o dogi esburacado. Pousou a cabeça nos braços, fixou o teto. Na penumbra, Trunks sorriu com o acanhamento do amigo.

Depois, concentrou-se na Ana, aconchegando-a no seu abraço, enlevando-se no calor que ela emanava. Cheirou-lhe os cabelos, relembrando os últimos momentos que tinham passado juntos na Dimensão Real. Apercebeu-se que mal tinham conversado na Dimensão Z, a vertigem dos acontecimentos seguintes ao regresso tinha-os impedido de estarem juntos. Também nunca julgara que tinha interagido com ela e nunca sonhara que seria possível transportá-la com ele durante o processo. Aqueles dias nas montanhas haveriam de servir também para se aproximarem mais e para encetarem novas descobertas. E divertiu-se a antecipar as complicações pelas quais ela haveria de passar enquanto se adaptava àquela nova aparência.

Goten disse em surdina, para não perturbar o sono da rapariga:

- Há uma coisa que não percebo…

- O quê?

- Quando me encontrei com ela no Templo da Lua, reconheceu-me. Chamou-me pelo nome.

- Nós também existimos na Dimensão Real, sob uma forma que nunca podíamos conhecer ou morríamos. Ela conhece-nos daí. A nossa dimensão, para a Ana, chama-se “Dragon Ball”.

- Honto? E o que é isso, “Dragon Ball”?

- Somos nós, as nossas vidas. Acho que ela conhece tudo sobre o teu pai, sobre o meu. Sobre ti.

- Ah… Que estranho…

No silêncio, escutou-se o marulhar das árvores.

- Sabes uma coisa, Trunks-kun? Acho que foi a Ana que me salvou.

Uma curta pausa.

- Porque é que dizes isso, Goten-kun?

- Foi ela que desligou a caixa onde eu estava a ser curado pelo feiticeiro. Se não fosse ela, não estaria agora aqui, contigo, e não saberias que eu estava vivo. Provavelmente, neste momento, seria um prisioneiro de Zephir, pronto para ser enfeitiçado e depois seria eu que lutaria contra ti até à morte.

- A Ana é muito especial.

Mas avisou, de seguida:

- Mas é minha!

- Eh, Trunks-kun. Continuo a gostar da Maron. – Perguntou com ternura: – E a Maron? Viste-a na Dimensão Real?

Recordou uma conversa franca, recordou uma discoteca. Recordou uma noite no hospital. Trunks sentiu-se tonto, não queria recordar. Lamechices, Vegeta tinha razão.

- Vi… Algumas vezes – respondeu. – Sobreviveu à Dimensão Real.

Haveriam de ser sempre amigos, ele e Goten, tinha pensado na altura da conversa franca. Acrescentou convicto:

- A Maron é uma rapariga cheia de sorte por ter-te a ti a gostar dela. Ela irá perceber isso, um dia.

Calaram-se.

Em breve, todos dormiam na cabana das montanhas.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
O radar do dragão.



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