A Filha Perdida escrita por ACL


Capítulo 3
A surpresa


Notas iniciais do capítulo

Às vezes um irmão mais novo é sinônimo de surpresa...



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/324866/chapter/3

Inútil. Tudo o que eu fiz foi inútil. Quatro anos tentando fazer com que ninguém nos adotasse foram em vão.

Fiquei sem reação e quando voltei ao normal, estava sendo obrigada a ir com as outras duas meninas até o escritório principal para falar com nossos “novos pais”. Todos no orfanato estão surpresos, raramente um casal deseja adotar um adolescente, quanto mais três. Principalmente o casal sendo novo, como eles são.

Nos fazem esperar um bom tempo. Dizem que é para assinar uns papéis, mas eu acho que tem algo a mais. Já vi outras pessoas serem adotadas e nunca demorou tanto quanto hoje. Fico aborrecida, odeio esperar. Por fim a diretora do orfanato aparece e nos manda buscar as coisas no quarto.

– Vou ter que deixar meu irmão aqui? – pergunto, assustada.

– Infelizmente, sim – responde a diretora. – Não posso obrigar os pais a adotar nenhuma criança, mesmo que sejam irmãos.

– Não existe uma lei que impessa a separação de irmãos?

– Um projeto de lei. Que está muito longe de se tornar lei, portanto, não há nada que eu possa fazer.

Duvido que não haja nada que ela possa fazer. Também não acredito no que ela diz. Mas, de uma forma ou de outra, não há nada que EU possa fazer. Claro, eu poderia largar tudo e sair por aí com Jay... mas seria mesmo bom para ele?

O pior de tudo é que eu não sei o que fazer.

Fui pegar minhas coisas, que eles tinham deixado prontas enquanto eu esperava. Não dei uma última olhada no meu quarto com aquele ar de saudade que eu sempre imaginei que sentiria quando fosse embora daqui. Porque eu sempre pensei que eu iria embora com meu irmão e já podendo administrar o dinheiro da minha mãe e o quarto seria tudo o que eu deixaria para trás. Nunca imaginei que as coisas não pudessem ser diferente do que eu queria. Não sou uma pessoa de fazer planos B.

Depois de séculos, me deixaram ver Jayme. Ele estava feliz, brincando com os amigos que tem e que eu não consegui fazer aqui – e em lugar nenhum. Ele me viu e logo veio correndo para mim, carinhoso, bem Jayme.

Não posso ver aquele rostinho redondo. Ele tem a mesma pele morena que eu, mas, ainda assim, fica com as bochechas rosadas de tanto correr. Ele está suado e provavelmente não comeu nada desde o almoço. Penso em como não vai ter mais ninguém que se importa com ele tanto quanto eu – o suficiente para brigar com ele se ele não comer. Aqui, eles deixam a criança com fome até que ela vá procurar por comida (isso fora dos horários das três refeições principais).

Tento controlar o choro, não vai ser bom para ele me ver chorar. Fico pensando no que falar para ele, em que forma seria menos chocante até que ele pergunta:

– Cissa, você fez 18 anos?

Estranho. Não é uma pergunta que ele faz normalmente e é totalmente inesperada.

– Não, por quê?

– É que você está indo “embola”. E você disse que ia me avisar. Por que não avisou?

– Eu... Como você sabe disso? Que eu vou embora?

– Eu sonhei – ele falou com uma naturalidade tão grande que eu poderia ter acreditado. E se tivesse, eu ficaria mais assustada do que já estou.

– É sério, Jay, quem contou?

– Ninguém! – ele falou um pouco mais alto. – Eu sonhei, eu “julo”. Eu sonhei que você vai para aquele lugar com o “marango” e, Cissa, é tão lindo lá... Você vai gostar.

– Jay, Jay, veja só: as coisas não acontecem só porque você sonha Jay... Não esse tipo de sonho. Você vai entender um dia.

– Mas você vai "embola", não vai?

– Vou.

– Vou sentir saudades, Cissa. Mas não vai ser por muito tempo, depois eu também vou para lá.

Já não sei o que pensar. Eu deveria estar o consolando e o que está acontecendo é o contrário. Meu irmãozinho de quatro anos estava me acalmando. Ou tentando.

– Tudo bem, Jay. Um dia eu volto. Eu venho buscar você.

O abraço antes que ele diga qualquer coisa. Cheiro o cabelo dele, guardando cada lembrança que eu puder. Não sei o que vai acontecer agora. Não vou ser capaz de impedir que ele seja adotado. Não sei se, se ele for adotado, se vou ser capaz de encontrá-lo. Eu não sei se venho buscá-lo.

– Ah, não. Você não vem. Aquele cara bunda-de-cavalo que vem.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Uma pena, não é? Não esqueçam que a história está apenas começando...



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Filha Perdida" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.