Peça Por Favor escrita por Juliana Natelli


Capítulo 4
Touchdown


Notas iniciais do capítulo

Antes de tudo, preciso dizer que não entendo merda nenhuma sobre futebol americano, mas achei que seria legal inserir esse contexto na fic, então dei uma pesquisadinha básica e coloquei as cenas. Se você viu erros grotescos nesse trecho, me perdoe x.x Mais uma vez estou usando uma das sugestões de Knight Beast X, então vou agradecer mais uma vez pelas ideias! Fiquei super feliz com os últimos reviews, gente vocês são incríveis *-*



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Então, foi o que eu fiz. Eu disse aquelas duas palavras. Bebe ficou satisfeita de imediato.

Eu não fazia a menor ideia no que estava me metendo e tentei deixar as consequências de lado, só desta vez. Eu sabia que se parasse para analisar tudo, eu iria me arrepender, por isso resolvi agir sem pensar no que poderia acontecer uma vez na vida.

- Ei, cara, tá tudo bem entre a gente agora? – Stan veio falar comigo enquanto eu arrumava meu material no armário.

Era o primeiro dia de aula e eu havia ignorado todos durante uma semana inteira. Bom, foi o que Bebe disse para eu fazer, pois aparentemente aquele tempo era suficiente para que sentissem ao menos um pouco de remorso. Mas remorso algum tiraria meus objetivos da cabeça.

Fechei a porta metálica do armário e dei um sorriso para Stan.

- É, tá tudo legal.

- Sabe, eu não quis dizer aquilo tudo. Eu não acho que você...

- Cara! – o interrompi, fazendo com que se sobressaltasse. Ri levemente por causa disso. – Relaxa, ok? Eu estou de boa.

Stan suspirou, parecendo aliviado.

- Que bom, é um saco não ter meu melhor amigo por perto.

“Sei bem.” Pensei, mas nada disse.

- Então, qual é a sua próxima aula? – ele puxava assunto, apressando o passo para me alcançar quando comecei a andar pelo corredor.

- Geometria Avançada.

Ele riu.

- Você é mesmo um nerd, Kyle.

- O que posso fazer? – tentei dar um sorriso em resposta.

- Ei, que tal fazermos algo depois da escola ou...?

- Não vai dar, Stan – eu rapidamente o cortei. – Tenho que levar o Ike num lance. Quem sabe amanhã?

Stan parecia ligeiramente chocado por eu ter dito que não, mas logo se recompôs, dando um sorriso compreensivo. Era como se entendesse que eu ainda o estava punindo pelo acontecimento do fim de semana anterior.

- Entendo...

Parei em frente à sala de aula e me virei para ele.

- A gente se vê depois – falei meio seco. Era mais difícil do que eu imaginava.

Ele acenou com a cabeça.

- Certo, até então.

Cara, isso foi dose, mas era preciso.

Minhas agonias logo foram recompensadas ao ver Wendy pela primeira vez no dia. A luz vinda da janela contornava seus traços perfeitos, rendendo a ela o ar mais angelical possível. Ela se sentava numa das primeiras carteiras e logo que me viu abriu um sorriso.

Pronto, eu estava arruinado.

- Kyle! – ela ergueu uma mão. – Vem cá, senta aqui.

Eu rapidamente ocupei o assento ao seu lado, fazendo o possível para conter a ansiedade.

- Faz um tempo que não nos vemos, o que você tem feito? – ela perguntou e eu mal podia desviar o olhar de seus lábios que se moviam conforme ela falava.

- Er, bom, eu... – não estava conseguindo raciocinar com clareza. Mas que merda!

Wendy riu levemente daquela maneira adorável que só ela conseguia.

- Você é um fofo, Kyle.

Hã? O que eu fiz?

- Ah, o Stan me contou da briguinha que vocês tiveram. Já está tudo bem? Vocês se acertaram? – ela perguntou parecendo preocupada, mas não devia fazer ideia do motivo da nossa discussão.

Quase revirei os olhos, aborrecido.

- É, já foi resolvido – falei simplesmente, sem querer prolongar o assunto.

Antes que Wendy respondesse, a professora da matéria entrou na sala. Argh, será que era impossível ficar alguns minutos apenas com a Wendy? Tudo bem que já havia outros alunos na classe, mas eram tão raros os momentos em que conversávamos somente nós dois... Espero que Bebe tenha alguma ideia a respeito disso.

-x-x-x-x-x-

O tempo até que passava rápido hoje. Quando dei por mim, já era hora do almoço e eu rumei rapidamente para a lanchonete. Após pegar uma bandeja e me servir, vi que apenas Cartman ocupava nossa mesa habitual. Isso não ia prestar.

Sentei-me no meu lugar de sempre, evitando olhar para Cartman. Afinal, ele sempre iniciava as discussões, era melhor nem lhe dar a chance.

Para a minha surpresa, mesmo depois da terceira mordida no meu sanduíche, ele não havia se dirigido a mim ainda, estando mais concentrado em outra coisa. Curioso, eu segui seu olhar.

- Por que está encarando a mesa das populares, Cartman? – perguntei.

- O quê!? – o moreno se virou bruscamente, derrubando o refrigerante que estava na sua bandeja.

Revirei os olhos. Ele corava violentamente.

- Vai assustar os outros assim na puta que o pariu, Kyle!

- Você precisa mesmo fazer toda essa sujeira só porque eu te fiz uma pergunta?

- Eu não estava encarando a Heidi Turner, se foi isso que você disse!

Ergui uma sobrancelha.

- Eu não disse.

Cartman corou ainda mais, encolhendo-se ligeiramente na cadeira.

- Não disse?

Arregalei os olhos e bati com o punho na mesa, usando a outra mão para apontar para a cara dele.

- Puta merda, você tá afim da Heidi!

- Cala a boca, judeu viado!

Tentei segurar o riso, mas falhei miseravelmente.

- É, vai em frente, Kyle. Pode rir!

E eu fiz isso mesmo.

- Porra, já deu! Fica quieto! – Cartman exclamou irritado após alguns instantes.

Para garantir que o resto do meu dia não seria um inferno, me calei, mas continuei a sorrir.

- Tudo bem, parei. Mas cara... A Heidi?

- O que é que tem? Ela é bem gata.

- Exatamente, até demais pra você, não acha?

Cartman fez uma careta de desdém para mim e mostrou o dedo médio.

- Nossa, isso é mesmo muito maduro, Cartman – falei.

Ele ia me responder, mas algo atrás de mim fez com que ele arregalasse os olhos, assustado.

- O pessoal já está vindo, melhor não abrir esse seu bico judeu sobre isso, entendeu? – o moreno sussurrou para mim por cima da mesa e logo assumiu uma posição mais natural para não levantar suspeitas.

Eu podia detestar o Cartman, mas também era seu amigo (como isso soa contraditório...). Certo, eu não iria contar a ninguém, era melhor que ele se sentisse muito grato por isso...

- E aí, caras? – Stan foi se sentando. Wendy veio logo em seguida, ocupando o lugar ao seu lado.

- Vocês chegaram cedo – ela comentou.

- É, o professor de Química nos liberou antes – eu disse. Quando falei, Wendy precisou olhar para mim e eu senti minha face enrubescer. Nervoso, acabei por virar o rosto instintivamente. Merda, merda, merda!

- Eu estava matando a aula de Literatura mesmo – disse Cartman.

Kenny deu um leve riso, se acomodando à esquerda de Cartman.

- Típico – ele disse, tirando o capuz.

- E então, Kenny? Descobriu mais alguma coisa sobre a garota da pizzaria? – Stan perguntou.

Os olhos azuis de Kenny brilharam com interesse. É, falar sobre garotas sempre o deixa animadinho.

- Sim, a deusa está em duas das minhas aulas. Acho que vai ser bem fácil, é só vir com aquele papo de “me empresta uma borracha?”, depois “você entendeu essa matéria?” e então finalizar com um “ei, vamos estudar lá em casa”. Pronto, é o suficiente para receber uma aula completa de anatomia, se é que me entendem...

- Acha mesmo que isso vai funcionar? – eu questionei, realmente duvidando.

O loiro olhou para mim parecendo surpreso.

- Kyle! Você voltou a falar com a gente?

- É, mas não abusa, McCormick – respondi.

Ele ergueu as mãos na altura da cabeça como se estivesse se rendendo.

- Sem problemas – Kenny disse e depois pegou uma batata frita de seu prato. – Fala sério, é claro que vai funcionar. Ela é ex-líder de torcida e nenhuma delas tem exatamente a fama de ser pura e virginal. Juntando com a minha ótima aparência e lábia, não tem como ela escapar.

- Ah, para, agora você tá sendo modesto – ironizei.

- Você vai ver, Kyle. Até o fim da semana ela vai ser minha.

Então, senti o iPhone vibrar no bolso lateral da calça. Eu rapidamente o peguei para ver o que era.

Armário do zelador. AGORA.

- Bebe

Fiquei encarando a mensagem desconfiado por algum tempo. Era a primeira vez que Bebe fazia contato desde aquela tarde no shopping. O que será que ela queria?

- Tudo bem aí, Kyle? – Stan espichou o pescoço, tentando ver o que eu havia recebido.

Guardei o celular com pressa antes que ele pudesse ver algo. Aquela ação o fez suspeitar de mim, eu podia ver.

- Er, não é nada! – falei, dando um riso de nervoso. – Galera, eu preciso ir. A gente se vê mais tarde – fui me levantando, recolhendo a bandeja.

Ok, todos eles tinham expressões de suspeita agora.

- Aonde você vai? – perguntou Kenny.

- A lugar nenhum, er, quer dizer, hã... Até depois! – sumi de lá antes que me embolasse mais com as palavras. Eu tinha que ser tão atrapalhado, eu tinha que ser.

Fazer Bebe esperar não era a melhor das ideias, por isso tratei de apertar o passo. Mas que lugarzinho para nos encontramos, hein? Com tantas salas na escola, a garota vai justo escolher a mais estreita e remota possível?

Assim que cheguei ao local combinado, tentei abrir a porta, mas esta estava trancada.

- Bebe? – bati na superfície de madeira. – Bebe, sou eu, o Kyle!

Ouvi o som da chave destrancando a porta e fui puxado com tudo para dentro. Estava muito escuro lá dentro, eu não conseguia ver um palmo à minha frente. Fiquei em alerta, preparando os punhos para um possível golpe surpresa.

Então, alguém acendeu a luz e eu pude relaxar.

Ali estávamos apenas eu e Bebe, dividindo o pouco espaço do cômodo com algumas vassouras e esfregões. A garota me encarava com grande fúria.

Fodeu.

- Mas que droga é essa, Broflovski?! – ela começou a berrar. – Que ideia é essa de ficar falando “Bebe, é o Kyle!” sem tem certeza de que era eu aqui dentro?!

- Quê? M-mas só podia ser você! Eu recebi a mensagem e tudo, quem mais estaria aqui?

- Não importa, só sei que você está proibido de usar o meu nome e o seu na mesma frase! 

- O que tem demais nisso?

Ela grunhiu irritada.

- E eu pensei que você fosse inteligente... Não queremos ser óbvios, certo Kyle? Ninguém pode saber que estamos nos falando.

- Tudo bem, já entendi – rolei os olhos, impaciente. – Mas também tenho que dizer que se encontrar num armário de limpeza não é exatamente a ideia mais brilhante do mundo, sabe?

- Eu consegui a chave no ano passado e com muito esforço. É o único lugar que posso controlar quem entra e sai.

- Por que você iria querer esse muquifo? Aqui tem um cheiro estranho... – olhei ao redor fazendo uma careta.

- Caramba, e isso realmente importa? Olha, Kyle, eu te chamei porque tive uma ideia.

Agora eu havia me interessado.

- Ideia? Que ideia?

Bebe deu um sorriso de lado e cruzou os braços.

- Kyle, eu quero que você entre no time de futebol.

Hã... O quê?

- Time de futebol?

- Isso. A Wendy tem um fraco por jogadores de futebol americano.

- Será que não pode ser na equipe de basquete? Eu sou realmente bom e...

- Não, Broflovski, tem que ser futebol! Eu e a Wendy já fomos melhores amigas, eu sei do que ela gosta.

- Olha, Bebe, eu não posso fazer isso, os caras iriam acabar comigo! Não sei se reparou, mas eu não sou o cara mais forte dessa escola. Aliás, eu não peso nem 70 quilos! E a maior parte do time provavelmente só quer uma razão pra poder chutar a minha bunda.

- Como assim?

- Bom, na semana passada eu descobri que estou na lista dos perdedores, coisa para a qual você contribuiu bastante. A única razão pela qual ninguém me encheu ainda deve ser porque o Stan está na porra do time. Aparecer nos testes é, vejamos... Suicídio!

Bebe deu um suspiro, massageando as têmporas.

- Escute, Kyle. Não que eu seja a especialista, mas futebol não é só força, também é necessário agilidade. E você sempre foi o garoto mais rápido da turma.

Cocei a nuca, ficando corado.

- Ah, nem tão rápido assim...

Bebe deu um tapa no meu braço. Ouch! Foi forte!

- Ei!

- Corta essa modéstia, Broflovski, não tenho tempo pra esse doce todo. Já te disse que não fico fazendo elogios à toa.

- Tá legal, já saquei. Então, você acha que se eu entrar pro time a Wendy vai magicamente se sentir atraída por mim, ou o quê?

- Bem, obviamente as coisas não são tão simples, mas isso deve ajudar.

Bufei, exasperado.

- Não sei se isso tudo vai dar em alguma coisa.

A loira boquiabriu-se, indignada.

- Tudo bem, Kyle, por que não volta pro seu plano original de ficar de vela para sempre? Tenho certeza de que essa sim é a melhor ideia.

- Ah, Bebe, mas que drama...

- Não é drama, você que é um mal agradecido!

Ela se virou e foi abrindo a porta, mas eu impedi que saísse, bloqueando a passagem com um braço. E, bom, nós ainda estávamos num apertado armário, então acabamos ficando extremamente próximos, fitando um ao outro fixamente.

Eu podia até sentir a respiração dela.

- O-o que você está fazendo? – Bebe questionou, tentando parecer autoritária, mas não conseguindo devido ao gaguejo.

Ela estava perto demais para eu me sentir completamente confortável, mas eu não podia deixar que a falta de confiança transparecesse na minha voz. Bebe tinha que saber que eu estava sendo sério quanto a tudo aquilo.

- Eu preciso da sua ajuda – admiti, esforçando-me para manter o tom firme. – Podemos tentar mais uma vez?

Bebe me encarou por mais alguns segundos (será que aquilo no rosto dela era um rubor ou tinha sido só impressão?), mas por fim cedeu, quebrando nosso contato visual.

- Ok, eu vou ajudar. – A loira fechou a porta e eu me endireitei, me encostando junto à parede. – Mas é melhor não ficar me irritando, ouviu? Não tenho paciência para imbecis.

- Entendi, desculpe – falei, evitando seu olhar.

Bebe sorriu, satisfeita.

- Certo, muito bem. Os testes são na sexta, é melhor ir treinando enquanto isso.

Do jeito que eu estava enferrujado, eu definitivamente precisaria de treino.

-x-x-x-x-x-

Deu tempo de treinar um pouco depois da aula, mas não muito, pois eu precisava ir logo para o trabalho. Pois é, eu tinha um emprego de meio-período no Café Tweek Bros. Não era grande coisa, mas era o suficiente para comprar as coisas que eu queria. Minha mãe se recusou a continuar me pagando uma mesada quando completei 16 anos, por isso tive que dar um jeito de manter o dinheiro entrando.

Já lá pelas seis horas da tarde, eu estava servindo um casal no balcão, quando meu celular começou a tocar. Droga, eu tinha me esquecido de pôr no silencioso. Terminei de servir o casal, lançando aos dois um olhar de desculpas pelo inconveniente e atendi o telefone irritado.

- Que é? Eu tô trabalhando!

- Ei, Kyle! Como vai o meu judeu favorito?

Revirei os olhos, sem paciência para aquele papo.

- Cartman.

- Isso mesmo, desculpe por incomodar. Eu só estava aqui relendo o “Mein Kampf” e tive do nada uma vontade de te ligar.

- O quê? Por acaso não é aquele livro antissemita do Hitler? – então minha ficha caiu. – Ah, seu gordo filho da mãe! Não tem mesmo nada melhor pra fazer?

Percebi que alguns clientes começavam a me observar e que Tweek me mandava um olhar ameaçador do outro lado do café. É, era melhor eu baixar um pouco a bola.

- Afinal, o que você quer? – perguntei num sussurro agressivo.

- Quero saber se você contou pra alguém aquilo que aconteceu hoje no almoço.

- Não, Cartman, eu não contei! E se quer saber, eu estou pouco me lixando pra essa sua paixonite. Agora, falando sério, não me ligue mais durante o meu expediente, entendeu?

- Escute bem, Kyle. Se essa história vazar...

- Tchau, Cartman – encerrei a chamada e coloquei o celular no modo silencioso.

Aquele bundão realmente conseguia arruinar o meu humor.

Tweek atravessou a loja e se juntou a mim atrás do balcão. Ele ainda parecia zangado.

- Você não pode ficar atendendo ligações assim, gah! Atrapalha os fregueses, Kyle – o loiro disse, seu tique habitual parecendo um pouco pior devido à irritação.

- Me desculpe, não vai se repetir. Era só o Cartman me infernizando, de qualquer maneira – falei.

E o sino da porta tocou, anunciando a entrada de alguém no café. Era uma garota de cabelos loiros alaranjados que passavam um pouco dos ombros. Ela tinha olhos azuis e um semblante de tédio no rosto. Ah, espere aí, era a irmã do Craig!

Ela percorreu o local com o olhar, como se procurasse por algo, até finalmente nos encarar. Um sorriso de lado surgiu em seus lábios, ainda que o resto do rosto continuasse impassível. Uh-oh, a garota estava vindo pra cá.

- Oi, gato – ela puxou Tweek pela camisa, forçando-o a ficar debruçado sobre o balcão, e o beijou sem mais nem menos.

Eu apenas fiquei ali meio, er, sem saber o que fazer.

Tweek se afastou dela rapidamente.

- Ah! Ruby, por que fez isso?!

É mesmo, eu tinha esquecido o nome dela... Era Ruby, então.

- Porque eu estava afim – a loira respondeu sem entusiasmo.

Tweek começou a tremer de tal forma que eu achei que ele ia convulsionar ou algo assim.

- Como podemos manter segredo se você não está nem aí? Ah! É muita pressão!

Involuntariamente, fiquei boquiaberto.

- Wow! – eu exclamei, fazendo com que eles se lembrassem da minha presença logo ao lado.

- Ah! Estou fodido! – Tweek falou, tentando arrancar os cabelos.

- O Craig não sabe, não é? – eu questionei mesmo já sabendo a resposta.

Tweek balançava a cabeça em negação, enquanto Ruby apenas me mostrou o dedo do meio. É, ela era mesmo uma Tucker.

Suspirei, deixando um leve riso escapar. Eu estava virando o confidente de todo mundo hoje pelo jeito.

- Relaxa aí, Tweek, não vou comentar com ninguém. Mas eu sugiro que vocês sejam mais discretos se querem mesmo segredo.

O loiro pareceu um pouco mais calmo, mas ainda estava preocupado.

- É sério, Ruby. Se o Craig descobrir, ele me castra e dá os restos pro porquinho-da-índia dele!

Ela revirou os olhos.

- Quando é que você vai criar culhões e enfrentar o meu irmão?

- Não faz uma pergunta dessas! Gah!

- Já sei, é pressão demais... Tudo bem, será que dá pra tirar um intervalo e ficar um pouco comigo?

- Não dá, eu já tirei o meu...

- Cara – apoiei uma mão no ombro de Tweek. –, pode ir lá. Eu te cubro.

Ele não me questionou, simplesmente sorriu e saiu pelos fundos com Ruby.

Vai, eu não era um cara ruim. Admito que ultimamente eu não viesse fazendo as coisas mais corretas, mas ninguém é perfeito, é?

-x-x-x-x-x-

- Kyle, que porra você tá fazendo aqui? – Stan me perguntou enquanto distribuía os capacetes para os novos candidatos ao time.

Era sexta-feira. Eu havia dado duro no meu tempo livre durante a semana, porém estava uma pilha de nervos mesmo assim. Eu não era um cara baixinho, mas minha constituição física era bem... modesta em comparação a alguns trogloditas que também queriam entrar para a equipe. Um deles, um cara do último ano, estava me encarando de uma maneira letal há quase vinte minutos.

- Hein, Kyle!? Que merda você pensa que está fazendo? – Stan insistiu.

- Estou aqui pra entrar pro time, duh – falei num tom óbvio.

- Bom, isso eu posso ver, mas você perdeu a noção? Por que você faria isso?

- Que é? Acha que eu não consigo? – ergui uma sobrancelha, sentindo-me desafiado.

Fomos interrompidos por um grunhido meio neandertal vindo a uns cinco metros de nós. Era aquele cara do último ano.

Stan deu de ombros, não querendo se meter.

- Cara, se você quer correr esse risco, fica por sua conta. Mas como amigo, aconselho ficar longe do Doug Rusher, aquele cara ali. Ele acabou de sair do reformatório.

Engoli a seco, começando a reconsiderar.

- Ei, garotos!

Eu e Stan nos viramos para as arquibancadas. Wendy acenava alegremente para nós de lá, com um sorriso de orelha a orelha. Nós acenamos de volta, talvez eu tenha feito aquilo com mais animação que a necessária.

- Vai nessa, Stan! Boa sorte, Kyle! – ela berrou.

Tá, esqueçam aquela coisa de reconsiderar. Tô dentro.

- Mesmo sendo meio estranho, acho que é isso. Boa sorte, cara – Stan deu um tapa nas minhas costas e se foi.

O técnico apitou para reunir todos. Lancei um último olhar a Wendy, que continuava a sorrir em expectativa. “Vai valer a pena, Kyle.” Eu ficava repassando essa nota mental. “Pela Wendy, tem que valer.”

-x-x-x-x-x-

Esses caras eram mesmo uns brutamontes. Eu conhecia todas as regras do esporte, acompanhava os jogos pela TV, mas depois do ensino fundamental ficou impossível jogar com o pessoal da minha idade. A maior parte deles era bem provido de músculos e força. Eu era meio que o oposto.

Nos testes de demonstração de força física eu me saí ordinariamente na média, o que já era melhor do que eu esperava. Mas ainda não era o bastante. Felizmente, eu ainda tinha energia para arrebentar nos testes de agilidade. Bebe tinha razão, ser eu até que tinha suas vantagens.

A primeira simulação de jogo foi um desastre. Acho que o maior problema foi a posição em que me colocaram na defesa. Nos primeiros trinta segundos de partida, o tal neandertal Doug Rusher já tinha avançado pra cima de mim. E doeu pra caralho. Mais tarde eu descobri que na verdade tinha quebrado um dente. Aquele filho da puta.

A dor me deixou imobilizado por alguns segundos e foram verificar meu estado.

- Kyle, cara, você tá vivo? – era a voz do Stan.

Eu consegui mexer um braço e depois abrir os olhos.

- É, acho que ele está acordado – agora eu via que Token estava ao seu lado.

- Nossa, o Rusher pegou pesado! Aquilo nem fazia parte da jogada –Stan dizia, me ajudando a levantar.

- Verdade, foi desnecessário. Vou falar com o Clyde pra mudar você de posição – Token avisou, saindo de cena.

- Talvez seja melhor você não insistir, Kyle. Você ainda vai acabar se matando, sabe...

Aquilo estava fora de questão. Mesmo vacilante e um pouco manco, eu me desvencilhei de Stan bruscamente.

- Sem chance! Eu vou até o fim nesse teste.

- Kyle! Você quer provar o que pra quem? Talvez nem todo mundo tenha nascido pra esse esporte!

Mal sabia ele como aquilo apenas me provocava mais.

- Valeu pela preocupação, amigo, mas eu dispenso – deixei-o ali, sabendo que iríamos acabar em uma discussão se eu ficasse.

Agora, a raiva começava a me consumir. Primeiro, aquele troglodita tinha me atacado e então o Stan continuava a tentar me fazer pular fora. Talvez a sorte não estivesse a meu favor, mas eu não ia desistir daquela merda nem que quebrassem minhas duas pernas! Mentira, se isso acontecesse eu desistia sim.

Eu logo ia procurar por Wendy mais uma vez nas arquibancadas, quando meu olhar foi atraído para outro canto. Perto do placar, uma garota loira usando óculos escuros e uma roupa no geral bem discreta me fitava. Apertei os olhos para enxergar melhor e ela ergueu os óculos revelando suas íris azuis e familiares.

- Bebe? – eu falei sem querer e olhei para os lados para ver se mais alguém havia notado. A barra estava limpa.

Andei até a garota cautelosamente, ela já havia posto os óculos novamente e ido para trás do placar. Quando cheguei lá, Bebe estava de braços cruzados e com uma perna apoiada na placa metálica.

- Vim conferir o show – ela disse dando um sorriso.

Cocei a cabeça, constrangido.

- Então você viu quando eu levei uma surra.

- É, parece ter doído.

- E ainda dói!

- Deixa de ser bichinha, Broflovski – Bebe riu de provocação.

- Essas são suas palavras de incentivo, Stevens? Tenho que dizer, você é muito boa nisso. –Ironizei.

- Olha, eu só vim te avisar que se você se sair bem na próxima, eu garanto sua vaga no time.

- Como você pode fazer isso?

Ela sorriu de forma convencida.

- Bom, é o treinador que escolhe os novos jogadores, mas a opinião do capitão do time é totalmente essencial pra ele. E quem é o capitão? Clyde. Persuadi-lo é a coisa mais fácil do mundo pra mim.

Tentei afastar da mente os possíveis meios de persuasão de Bebe e me permiti sentir uma esperança. Talvez eu tivesse mesmo uma chance!

- Ok, eu dou um jeito – falei, recuando para voltar ao campo.

- Lembre-se, Kyle, corra o mais rápido que puder! – foi a última coisa que a ouvi dizer.

Agora estava por minha conta. Eu tinha que conseguir.

Token realmente havia falado com Clyde, porque eu fui instruído a ficar agora no time do ataque. Pouco antes do apito soar, cruzei os dedos com força. Era tudo ou nada.

E sopraram o apito!

Os caras na linha de frente se confrontaram primeiro. Eu vi a bola ser trocada em passes curtos pelos jogadores do meu time, mas não sabia se eles podiam me ver ali livre. Bom, logo eu descobri quando a bola aterrissou nos meus braços.

- Puta merda – eu exclamei quando vi um batalhão correndo na minha direção.

- Corre, judeu! – alguém gritou e eu me dei conta de que ainda estava parado.

Sem mais tempo pra pensar, eu coloquei toda a força que tinha nas pernas e disparei. Dois caras se jogaram na minha frente, mas a velocidade na qual eu corria me deu impulso para pular por cima dos dois. O grandalhão Rusher vinha em meu encalço também e eu senti quando ele agarrou meu braço.

- Nem fodendo, imbecil – com uma habilidade que eu nem sabia que tinha, consegui me soltar dele e o driblei com facilidade. Ele se desequilibrou e caiu de cara no chão. Continuei minha corrida, agora com um sorriso maléfico no rosto, imaginando se o brutamonte tinha gostado de sentir o gosto da grama sintética. Há! Toma essa, otário!

Era impossível seguir em linha reta, eu precisava ficar naquele ziguezague se quisesse manter a bola nas minhas mãos. Eu a apertei com força contra o peito, as jardas iam se esgotando debaixo dos meus pés.

“Quase lá!” então, vi Wendy torcendo por mim. Ela estava de pé, gritando incentivos e batendo palmas.

- Vai, Kyle! Corre! Só falta um pouco agora!

Nem preciso dizer que a adrenalina duplicou e logo me vi cruzando a linha do gol, praticamente enterrando a bola no chão quando a joguei para baixo.

- Touchdown!!

Dei um soco no ar, comprovando minha vitória. Comecei a me tornar mais consciente do esforço que fizera, meus músculos protestando de dor e praticamente me obrigando a dar uma pausa. Contudo, não fui para o banco sentar, pois o time veio eufórico me parabenizar.

- Cara, isso foi da hora! – disse um garoto do segundo ano que eu não conhecia.

- É, de onde você tirou aqueles dribles? – perguntou Tommy Turner.

Vi Stan abrindo caminho entre os jogadores e ele me olhou com arrependimento.

- Talvez eu estivesse errado...

Meu sorriso apenas alargou. Com a ajuda de Bebe, não tem como eu ficar de fora do time.


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Notas finais do capítulo

Perdoem o capítulo enorme, quase parece uma bíblia! Se for um problema vou diminui-los ^^ Bom, eu shippo muito Creek, mas prometi que essa fic seria het, então resolvi juntar o Tweek com outro membro da família Tucker pra não perder o hábito hehe Se o Kenny pensa que será tão fácil conquistar a Mercedes, é melhor pensar duas vezes... E parece que o cupido acertou até o Cartman! Ai ai, temo que ninguém escape...
Enfim, lembrando que seus reviews são sempre muito bem-vindos e são um belo combustível pra escrever!
Bjooooos!