Planos

Acordei, mas continuei com os olhos fechados apenas sentindo o coração de Jean batendo. Eu sempre amei a sensação de estar em seus braços, isso me trazia paz e segurança. Quando finalmente abri os olhos, deparei-me com ele sorrindo para mim, mas seus olhos estavam vermelhos. Eu sabia que ele estava sofrendo por me ver assim, eu tinha até tentado terminar com ele quando descobri que iria morrer, mas ele falou que ficaria ao meu lado até o fim.

Ficamos nos encarando e sorrindo até que alguém abriu a porta desviando nossa atenção. No segundo seguinte eu fui esmagada pelos braços da minha mãe que tinha o rosto marcado pelas lagrimas.

- Meu amor, como você está? O que aconteceu? Por que você não nos disse antes? – Ela só fazia tantas perguntas quando estava nervosa, e nesse momento eu podia ver o desespero em seus olhos. Vi meu pai puxando a mamãe de cima de mim antes de dar um beijo na minha testa e mandar Jean parar de agarrar a princesinha dele, palavras do próprio Draco.

- Alguém pode explicar o que está acontecendo?

Apenas quando ouvi essas palavras percebi que não estávamos sozinhos. Encostado a porta estava um garoto idêntico ao meu pai, ao lado dele uma ruiva, e sentado em uma das poltronas um ruivo.

- Hugo, Rose e Scorpius. – eu disse.

- Nós nos conhecemos? – perguntou Rose.

- Não pessoalmente, mas já ouvi muito sobre vocês três.

Eles me olharam interrogatoriamente e eu devolvi o olhar aos meus pais. Pedi para que Jean me ajudasse a sentar. A pior coisa que existe é você não ter forças nem para sentar sozinha e ter que depender sempre de alguém.  Meus pais sentaram nas poltronas ao lado de Hugo, e Rose e Scorpius continuaram perto da porta, detalhe: eles estavam de mãos dadas. Posso estar debilitada ou o que for, mas que esses dois têm alguma coisa, eu sei que tem.

- Eu sei que vocês não estão entendendo nada, mas nós vamos explicar. – disse mamãe com calma. – Estes são Mia, e o namorado dela Jean – apenas dei um sorriso em sinal de cumprimento e Jean acenou com a cabeça. – Vou ser direta, a Mia é irmã de vocês.

- Mais direta impossível mãe. E esclarecendo, eu sou irmã de vocês três.

- Ta bom. Cadê a câmera escondida? Isso só pode ser uma daquelas pegadinhas trouxas sem graça. É impossível Draco Malfoy e Hermione Granger terem uma filha. – disse Hugo com descrença.

- Ela esta falando a verdade – disse meu pai. – Eu e sua mãe... Nós ficamos juntos por um tempo... E bem... Não foi planejado, mas a Mia acabou nascendo.

 - Já que vocês vão contar a verdade, porque não contam toda ela de uma vez? Pai em primeiro lugar não diga que meu nascimento não foi planejado. Apesar de ser verdade, é capaz de a mamãe sair torturando você por todo o hospital, e eu sinceramente gostaria que vocês não brigassem agora. E depois, já está na hora dos dois pararem de falar como se eu tivesse surgido de uma única noite de sexo selvagem, pois eu bem sei que vocês dois se amam. Agora fiquem a vontade para contar aos meus irmãos tudo que aconteceu entre vocês do mesmo modo que vocês contaram a mim.

Foi exatamente isso que eles fizeram. Nós cinco passamos às duas horas seguintes ouvindo Draco e Hermione narrarem tudo que aconteceu entre eles, enquanto tentavam – em vão, pois eles não convenceram ninguém. – deixar claro que o que eles sentiam um pelo outro era nada mais nada menos que uma mera atração física.

Quando eles terminaram a história, pediram para eu contar o que tinha acontecido comigo e foi o que fiz. Contei desde o desmaio no lago até hoje. Assim que acabei um silencio incômodo instalou-se no quarto, até Hugo dizer “Eu preciso comer.” Mamãe disse que o levaria a lanchonete do hospital e depois iria falar com o meu médico. Meu pai os acompanhou. Jean perguntou se eu queria ficar sozinha com meus irmãos, mas eu não deixei que ele saísse do meu lado. Um plano estava se formando em minha cabeça, e eu precisaria da ajuda dele.

- Eles sabem que vocês estão juntos? – perguntei a Rose e Scorpius antes que eles dissessem alguma coisa.

- Nós? Juntos? Não. – perguntou Rose, mas era obvio que ela estava mentindo.

- Não adianta mentir Rose. Enquanto meus pais estavam contando como eles se envolveram, vocês estavam de mãos dadas. Para quem finge se odiar tanto, esse é um gesto meio contraditório.

- Você está certa. – disse Scorpius – Faz um tempo que nós começamos a namorar, mas resolvemos manter isso em segredo, afinal quem aprovaria um romance entre um Malfoy e uma Weasley?

- Só não é mais estranho que um Malfoy e uma Granger, certo? – disse fazendo com que eles rissem. – Eu estava pensando em uma coisa, mas preciso da ajuda de vocês. Rose, como é o relacionamento da mamãe com Ronald? Seja sincera, por favor.

- Eu passo a maior parte do tempo em Hogwarts, mas quando estou em casa meu pai esta sempre trabalhando ou na casa do Tio Harry. Na verdade é desse jeito desde que o Hugo nasceu. Eu raramente vejo meus pais juntos.

- Você acha que eles se amam?

- Não. Com toda certeza. Meu pai ama o trabalho dele e quadribol, mas não minha mãe.

- E você Scorpius?

- Se eles se amam? Nunca. Você sabe que o casamento deles foi arranjado e minha mãe só engravidou para que meu pai não largasse dela. Nem sei se posso chamar Astória de mãe. Ela passa mais tempo gastando o dinheiro do meu pai do que preocupada comigo.

- Eu tive uma ideia meio maluca. Até que ponto vocês são contra juntar nossos pais?

- Eu não sou contra, mas duvido que você consiga isso. – disse Hugo entrando.

- Você estava ouvindo atrás da porta Guinho? – perguntou Rose brava.

- O papai vai te matar quando descobrir que você está namorando o filhote de doninha.

Então Rose passou a bater no Hugo e xinga-lo. Não pude deixar de sorrir. Era disso que eu sentia falta. Ter meus irmãos por perto e poder brigar com eles com a certeza de que no minuto seguinte estaria tudo bem de novo.

- O que você tinha pensado Mia? – Perguntou Scorpius sem ligar para a briga dos dois.

- Você percebeu que eles, quer dizer, nossos pais ainda se amam, ou eu estou enxergando de mais?

- Tenho certeza que eles se amam. Meu pai nunca defendeu Astória como ele fez com Hermione mais cedo quando estávamos na Toca.

- Bem, se as duas crianças puderem prestar atenção – disse fazendo com que Rose e Hugo ficassem quietos. – Jean, será que seus pais emprestariam a casa na praia?

- A que nós fomos nas ultimas férias? Provavelmente.

- Pelo que o médico disse, eu tenho seis meses. Eu pensei em pedir aos nossos pais para que fossemos em uma viagem de família para que eu pudesse aproveitar um tempo com vocês. Duvido que eles neguem. A casa dos Lacroix tem três quartos, pela divisão justa ficaria meninas em um, meninos no outro e adultos no terceiro. Depois nós improvisamos o resto.

- Você acha que vai dar certo? – pediu Rose ainda em duvida.

- Desculpe a sinceridade, mas o problema dos nossos pais é o mesmo do de vocês dois. Vocês têm medo de assumir que amam alguém, apenas por causa do sobrenome da pessoa. Todos vocês deixam de ser quem realmente são apenas porque estão mais preocupados com o que os outros vão pensar do que no coração. Vocês, principalmente a Rose e o Hugo, cresceram praticamente em um Reality Show, fazendo o que a mídia espera que vocês façam. Mesmo que inconscientemente vocês vivem a sombra dos seus pais, ou vão me dizer que a Rose não é a mais inteligente da família, que o Hugo não é o palhaço da turma e o Scorpius o garoto popular por quem todas as meninas são platonicamente apaixonadas? Uma coisa eu agradeço por ter crescido sem que ninguém soubesse quem eu sou. Eu tive privacidade para ser eu mesma e errar quantas vezes quisesse enquanto crescia. Sabem por que eu conheço tanto vocês? Eu recebia o Profeta Diário em casa, e não passava uma semana sem que tivesse uma matéria sobre “Os herdeiros dos heróis”. Eu tenho uma pasta em casa que contem toda a vida de vocês, coisas que vocês provavelmente nem lembram. E quando vocês tem a oportunidade de mudar o preconceito das pessoas assumindo o relacionamento de vocês, o que os dois fazem? Escondem-se. Diga Hugo, você gosta de alguém?

- Sim – e depois de uma pequena hesitação continuou – Eu gosto da Lily, minha prima.

- Ela sabe disso?

- Não.

- Por quê?

- Porque ela é minha prima, e ninguém aceitaria isso – ele disse baixinho, mas esse exemplo fez com que os três entendessem o que eu queria dizer.

- Você está certa Mia. Eu e Scorpius temos que assumir o que sentimos, e faremos com que nossos pais façam o mesmo.

- Vou enviar uma carta aos meus pais pedindo para vocês usarem a casa. – disse Jean, mas eu o impedi.

- Nós não. Eu não vou sem você. Você prometeu que estaria comigo até o fim.

- E estarei. Vou mandar a carta pedindo para nós usarmos a casa.

Sorri. Talvez eu conseguisse realizar dois sonhos antes de morrer. Escrever este livro com minhas memórias e ter a chance de ouvir meus pais dizendo que se amam. Acho que não é tão impossível.

If today was your last day/ Se hoje fosse seu último dia

And tomorrow was too late/ E amanhã fosse tarde demais

Could you say goodbye to yesterday?/ Você poderia dizer adeus para o ontem?

Would you live each moment like your last?/ Você viveria cada momento como se fosse o seu último?

Leave old pictures in the past?/ Deixaria velhas fotos no passado?

Donate every dime you had?/ Doaria cada centavo que você tivesse?

If today was your last day/ Se hoje fosse seu último dia