Fuga escrita por Natã Cruz


Capítulo 3
Capítulo 2 - Um caminhão roubado e cem dólares




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John passou a mão em seus grisalhos cabelos enquanto lia o jornal de hoje de manhã. Seua vida desde então havia sido os escritórios e ações. E como elas haviam caído ultimamente! Eram onze da noite e ele ainda não havia saído do escritório.

- Senhor, já estou indo! – avisou sua secretária, Martha. De óculos e cabelos presos e bem redonda fisicamente.

- Tudo bem, Martha, até amanhã. – ele disse massageando suas têmporas.

A luz do seu escritório era a única acesa agora em todo o prédio.

Ele suspirou, levantou e tirou uma garrafa de whisky do seu frigobar.

 Tomou num gole.

Não havia mais motivo para John voltar cedo para casa ou ao menos APARECER. Desde seu divorcio, sua vida parece ter se perdido para sempre.

Ele se sentou novamente e tentou dar uma olhada, mas colunas de cidadania e cultura no jornal. Tentou, pois, na verdade ele queria chegar à coluna de economia.

As ações haviam subido. Quem diria?!

John é pai. Pai de Bob  Martins, portador de autismo e está com a mãe, a ex-mulher de John, a mesma que tirou dele sua casa, eletrodomésticos e ainda uma propriedade no Havaí, onde passavam o verão juntos com Bob.

Nada mais fazia sentido para John nenhum dia, nem data. Exceto nos domingos, era quando ele levava Bob ao zoológico para ver elefantes e os dar nomes engraçados.

Todo domingo tinha um presente para Bob.

Mas isso foi até o mês passado quando Bob estava correndo pelo quintal e caiu torcendo feio o pescoço.

John deixou tudo sair, não poupou lágrimas como todas as noites. O seu único filho, dependente agora de aparelhos hospitalares!

Ninguém para um abraço, ninguém para lhe fazer nada. John limpou as lágrimas, amassou o jornal em uma grande bola e a arremessou longe.

Suspirou calmo, como sempre. Calmo.

Passou a mão nos seus grisalhos e coçou a barba. Ele pegou seu whisky e levantou.

John foi para casa.

 ~~~~~~

A correria foi descontrolada, Mattew se camuflou entre os andarilhos que fugiam e saltou para um banheiro minúsculo ali. Estava completamente sujo com muita urina e algo parecido com vômito. Ele pegou alguns tijolos que apoiavam a pia trincada e os pôs debaixo da pequena janela. Ele subiu e conseguiu escapar.

Estava fora! E ele esperou paciente a polícia ir embora. E assim aconteceu.

Foi por pouco.

Ele se moveu dali e foi para a frente do bar. Avistou um caminhão com chaves e sorriu malicioso.

- Ei, forasteiro! – berrou o velho rouco da calça jeans apertada.

Mattew já ia em direção do caminhão. Virou dando atenção para o velho.

- Aonde pensa que vai?

Mattew não respondeu.

- Você venceu o jogo. Big Jullios foi preso, meu caro. Acharam dois quilos de cocaína na mala dele. – dizia – Isso te faz o vencedor!

Mattew ergueu totalmente a cabeça, mas não demonstrou nenhuma excitação.

O velho tirou várias notas de dez e cinco do bolso amassadas e foi entregando para o forasteiro.

O restante dos bebuns resmungavam algo.

- Aqui está Julie! – disse ele pegando no braço de uma mulher arrogante e sorridente. Mattew se afastou.

- Você vai pra onde? – perguntou o velho rouco.

Mattew o olhou diretamente e tirou um pedaço de papel quase rasgado e amassado do bolso.

O velho o pegou franzindo a testa enrugada e erguendo as sobrancelhas grossas e grisalhas.

“ 4242 Roosevelt Way NE, Seattle.”

- Seattle?! Não posso te ajudar. Mas  esta perto daqui.

Mattew pegou o papel de volta e o enfiou no bolso.

- Boa viagem. – disse o velho estendendo sua mão.

Mattew fingiu falta de atenção e se virou andando em direção ao asfalto da rodovia.

Todos os outros olharam com estranheza o forasteiro e entraram de volta pro bar.

A tal mulher, Julie, observava Mattew parar de andar e se virar para o bar novamente.

Ela sorriu e reparou que Mattew observava o caminhão de cor azul escuro da direita com chave.

- O idiota que deixou a chave foi preso, seu concorrente Big Jullios! – disse Julie mostrando ter uma mancha estranha no dente de baixo.

Mattew subiu no caminhão e o ligou.

Julie também subiu.

Mattew dirigia bem, desde seus oito anos, seu avô tina o ensinado. Ele abriu a porta de Julie e fez um sinal pra ela sair.

Ela, ofendida abriu a boca pra dizer algo mas, foram atingidos por um tiro de espingarda certeiro quase na roda esquerda. Mattew pisou no acelerador dando uma louca e eletrizante marcha ré.

Julie gritou como se estivesse em um parque de diversões.

- Ei! – gritou o velho rouco atirando mais de duas vezes. – Esse caminhão me pertence agora! – resmungava alto, mas, logo Mattew já estava na estrada com cem dólares, um caminhão roubado e uma mulher estranha de axilas escuras.

~~~~~~~
Lorel conseguiu sair sem fazer muito barulho e chamar a polícia.

Logo duas sirenes invadiram o quarteirão da sua escura rua. Quase chovia.

- Sim... – disse um dos policiais, branquelo, alto e com um olhar sonolento.

- Tem alguém na minha residência. – disse Lorel tremendo um pouco a mãe esquerda.

Os dois policiais tiraram suas armas e se posicionaram.

- Vamos dar uma olhada. – disse o mesmo.

Eles entraram tropeçando nas sandálias de Lorel e ligaram a luz.

- Supressa! – gritou a multidão.

Os policiais deram um pulo pra trás mas logo ficaram sérios. Metade da multidão estava com confetes, chapeuzinhos e guloseimas.

Lorel apareceu e suspirou aliviada e sorridente.

Ela ficou no meio dos dois grupos e pegou um pedaço de torta da maça, feita pela sua mãe, claro.

- Aceitam um pedaço de torta, policiais? – Lorel perguntou sem jeito.

Logo eles conversaram e ela se desculpou.

- Não precisava, gente! -  Lorel disse voltando. Pensou em ter visto sua tia Lya por ali.

- Daqui a dois dias minha garotinha fará 21 anos, hein! – disse o pai de Lorel a beijando no rosto.

Ela queria poder dizer, “pai, eu não sou mais uma garotinha”, mas era o que exatamente estava sentindo até aquela tarde com  Dorethe, depois da fracassada entrevista.

Sua mãe, tias, tios... toda a família! Vieram a cumprimentar, beijar e saudar o “exemplo da família Trypuc”. E como Lorel era querida...

- Lion! – ela exclamou sorrindo. Lion era o apelido de Leonard, o irmão do ex-namorado de Lorel. Lion era um super amigo protetor, agora  estava sumido, bem sumido por causa da faculdade e do seu emprego de barman. “Lion é o barman que todo bebum pediu.” Todos diziam. Ele também frequentava às vezes algumas igrejas e era famoso por encontrar conselhos bons para seus amigos. Lion dava a certeza e o conforto para todo conhecido. Ele é alto, loiro e tem as sobrancelhas quase brancas. Seu sorriso é muito sincero e divertido. Suas mãos são sempre cuidadosas.

Lorel nunca entendeu o por que Lion era solteiro. Já passou por um relacionamento difícil, mas isso faz MUITO tempo. Ele sempre tinha garotas o desejando como namorado ou até mesmo  noivo, mas, sempre fez questão de fechar os seus olhos. Diz procurar a Lorel da vida dele. Sempre soube. Mas ela nunca entendeu, garotas maravilhosas haviam passado na sua vida e ainda solteiro!

- Você veio, Lion! – dizia Lorel emocionada.

- Eu precisava vim ver como estava você. – disse.

Lorel tentou sorrir depois que pensou na solidão.

Lion detectou algo em seu rosto.

- Não adianta esconder, dona Trypuc.

Ela sorriu e deu um tapa no braço de Lion.

- Você não me deixa em paz nunca sobre isso.

- Ei. – disse ele se virando e pegando pedaços de torta e dois copos de refrigerantes dando um para ela.  – vamos para fora, acho que há muito que talvez queira me contar.

Lorel sorriu e saiu dali com Lion.

~~~~
John havia sido chamado no hospital. Parece que Bob havia piorado o quadro cirúrgico.

Ele chegou exausto, ofegante e passando a mãe em seus cabelos grisalhos.

Becca, a ex-mulher de John e mãe de Bob, estava sentada com um moletom marrom, cabelo solto, sem maquiagens e o rosto marcado pelo cansaço. Parecia mal-humorada também e bastante triste.

John olhava para o vidro do quarto de Bob enquanto os médicos o trocavam os curativos.

Becca se levantou com os braços cruzados.

- Arrependido, John? – ela perguntou com a voz trêmula e fria. Ele não respondeu, estava em choque e desespero. – Olhe só o seu filho agora! Ele estava bem melhor, em perfeição quando você estava com seu escritório, ações, whikys e com suas secretárias vagabundas! Veja só, John! Seu filho esta morrendo! – ela caiu no choro e desespero também. Tampava o nariz e a boca com vontade de parar de chorar em um minuto pelo menos.

John se virou com os lábios trêmulos.

- Bob não esta morrendo, está me ouvindo sua vadia?! Não esta! – berrou fazendo seus lábios tremerem.

Becca ao ouvir isso, começa a gritar coisas descontrolada.

- Não seja hipócrita! Você não se preocupa com Bob, nem vem mais no hospital! Ao menos estava na hora do acidente! Ao menos foi pai de verdade! – ela dizia.

John em um pulo, a agarrou pelo pescoço e a fez sentar. Ajoelhado pra ela dizia repetitivamente com lágrimas:

- Isso não é verdade!  

Dois seguranças agarraram John e o levaram para fora.

- Seu covarde! Eu te odeio, John, eu te odeio, eu te odeio! – agonizava Becca aos berros enquanto enfermeiras tentavam acalma-la.

Depois que fora expulso, John tentou entrar pela recepção novamente, mas, foi barrado brutalmente.

- Meu filho! Meu filho! – resmungava desesperado com lágrimas escorrendo sem parar.

Ele sentou na escada de entrada do hospital e ficou por lá até se acalmar e ligar para seu advogado para faze-lo entrar novamente.

- Eles chamaram a polícia? – perguntou o advogado pelo telefone enquanto tentava tirar pelos grudados em seu terno e enquanto comia frango frito no balde. Fonks era como o chamavam. Ele e John eram melhores amigos praticamente e da mesma idade, o suficiente pra um sentir a mesma enrascada do outro e ter o mesmo carma do outro.

- Não. – respondeu John mudando o telefone de ouvido impaciente.

- Então tenta entrar pelos fundos, depois se isso continuar no problema, entramos com o caso. – sugeriu enquanto mastigava a coxa sobre coxa.

John limpou o rosto e passou a mão nos seus cabelos grisalhos como de costume. Levantou e foi para os fundos do hospital.

- Adeus, Fonks. – e desligou o telefone.

~~~
- Por que não tenta voltar pra casa de seus pais? – sugeriu Lion para Lorel. Estavam sentados do lado de fora, perto do hall da casa.

- Não. – disse Lorel sorrindo e passando seus dedos em volta do copo descartável cor-de-pele.

- Você não pode ter orgulho agora, Lorel. – ele disse sério.

- Não sei te explicar como, Lion, mas eu já não me sinto bem lá. Como se eu fosse uma filha chata de 40 anos de idade, solteirona da geladeira de meus pais, sabe?

Lion sorriu.

- Se você quiser dividir o apartamento comigo... Lá tem sobrando um quarto.

- Não, obrigada Lion, mas você ainda não casou, não teve aturar uma mulher desse jeito, é melhor você curtir o “intervalo” até enfim ser amarrado.

- De qualquer forma, estou sempre disponível pra você, pode me ligar sempre. – disse passando seu braço sobre ela.

Lorel sorriu e disse:

- Senti saudades. Mas sem muita melação, por favor.

~~~
John conseguiu entrar, mas quando se aproximou do vidro do quarto de Bob, o encontrou deitado, tranquilo e sobre vários aparelhos.

Uma enfermeira que passava o reconheceu.

- Senhor, vá para casa. – disse baixo e gentil.

John se virou limpando as lágrimas no rosto e passou a mão no seu grisalho e saiu.

~~
- Qual é o seu nome mesmo? – perguntou Julie.

Mattew não respondeu, estava atento na estrada escura.

A chuva atrapalhava muito ainda.

- Por acaso é mudo? – perguntou novamente.

Silêncio.

Julie bufou, se esticou e ligou o rádio do caminhão que passava country numa sincronia péssima e cheia de ruídos.

Ela começou a cantar junto.

Mattew freou bruscamente o carro e desligou impaciente o rádio. Abriu a porta do lado de Julie e esperou ela sair.

- Tá maluco??? Acelera esse lixo e vamos logo!

Mattew bufou alto.

- O que foi, meu filho? Tá com falta de ar, tá? Ent... – ela dizia, até ser interrompida por uma pancada forte atrás do caminhão, o fazendo virar para a esquerda e cair, e mais uma vez, e mais uma vez. O bastante pro caminhão sair da pista e invador um terreno frente a uma ladeira.

 O caminhão sem carga azul de Mattew, para.

Completamente destruído.

Mattew sente dores pelo corpo inteiro e não conseguia mover o braço direito. Ele gemeu de dor, muita dor nas coxas e ombros que pareciam estar destroçados.

Ele com dificuldade se moveu e se arrastando, saiu das ferragens. Não sentia sua perna direita.

Então, ao tentar levantar, ele sente um forte cheiro de gasolina e depois...

Uma explosão o impulsa á vários passos que ele poderia dar com as duas pernas e cai entre várias rochas, onde bate a cabeça e apaga. 


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