Jogos Vorazes por Cato escrita por AmndAndrade


Capítulo 9
Capítulo 9 - Sensação térmica: colinho do Cão


Notas iniciais do capítulo

Clato começando HAUHAUAH ♥



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            Depois de andarmos sem sucesso por mais algumas horas, começo a desconfiar de que o Conquistador está nos enganando em relação ao paradeiro da Doze. Só desconfio, já que estamos todos exaustos e a noite acabará em poucas horas.

            Sinto que estou suando e começo a tossir repetidas vezes, uma vez que pareço ter fumado um maço inteiro de cigarros. A camisa está encharcada e me sinto ficar mais ofegante a cada tragada. Um estalido. Dois estalidos. Três estalidos, vindos de longe. Abro os olhos e examino o céu: ainda está escuro. Ao longe, vejo uma luz consumir parte da floresta em questão de segundos. Ouço Glimmer gritando “fogo!” num instante e no instante seguinte estamos todos correndo pela floresta, desesperados por abrigo.

            A floresta inteira parece estar sendo engolida e vejo os animais fugindo de galhos que caem a todo instante e fagulhas, lutando para não serem engolidos também. Divido toda a energia que tenho entre respirar e correr, o mais rápido que posso. Glimmer está à direita e Marvel à esquerda, correndo como cervos. Enquanto me desvio de um galho que cai em chamas, dando uma breve trégua, vasculho o lugar em busca de Clove. A Quatro está logo atrás de mim, e mais atrás, a apenas cinqüenta metros do galho que queima e não parece parar de queimar está Clove. Ajoelhada, com o corpo arqueado, ela parece convulsionar com o impulso de seu estômago. Ela não consegue vomitar mais e agora está com as mão no chão, escapando de um galho que cai à sua direita.

              – Não há tempo – ouço uma voz rouca que parece ser de Glimmer, que apóia as mãos nos joelhos e luta para respirar.

            Mas tem de haver tempo. A idéia de um canhão e da imagem de Clove projetada à noite simplesmente me dá medo.

            Volto vinte e poucos metros para onde Clove está, agarrando-a pela cintura enquanto seu corpo continua impulsionado em colocar tudo pra fora. Uma pequena bola de fogo passa por nós, espatifando-se em uma pedra grande. Seguimos todos numa direção paralela às bolas de fogo, de modo que em alguns minutos não consigo mais visualizar nenhuma. Clove agora está concentrada em tossir, tão forte que mal consigo segurá-la devido à corrida e ao movimento que ela faz.

            Uso a gola da camisa como proteção, uma vez que minha mão está ocupada com Clove e a outra me ajuda no equilíbrio enquanto corro desesperadamente.

            Continuamos correndo até um lugar em que o ar parece subitamente mais fresco. Então olho para trás para conferir que as paredes de fogo gigantescas sumiram. A fumaça se esvai aos poucos e tenho certeza absoluta que isso vem dos Idealizadores idiotas. Que querem jogar conosco. Como peças descartáveis. O sentimento de raiva é substituído quando o ar fresco parece me sufocar, depois de um tempo engolindo mais fumaça que água no dia de hoje. Solto Clove no chão e ajoelho, tossindo e arqueando o corpo a cada vez que tento vomitar.

            Ficamos nessas posições desagradáveis, usando o que restou de nossos pulmões para respirar. Quando escuto a voz das garotas, sinto que estou conversando com um travesti, mas não me importo muito. Clove se recupera mais rápido que o resto de nós, o que é óbvio já que ela correu apenas metade do caminho. Não tenho fome e não como desde muito antes, mas até mesmo a água que tomo parece ter gosto de carvão.

            O sol arqueia-se lentamente no céu até que todos consentem que tenham condições de seguir caminho. Em menos de uma hora, com os últimos raios de sol, enxergamos um riacho.

            E ali, como um presente dos Idealizadores, está a brasinha. Deitada no lago, com o cabelo chamuscado e claramente cansada. Imagino como ela se sente agora, tendo contato com fogo de verdade. A fumaça ainda embaça a visão, mas nada mais do que uma neblina faria. Gritamos uns com os outros para que corram atrás dela, o que em seguida me faz sentir idiota. É claro que iríamos persegui-la.

            De longe, percebo o quanto ela manca enquanto corre como uma corsa assustada. É uma pena que a fumaça tenha detonado tanto nossa respiração, uma vez que em condições normais a alcançaríamos em menos de cinco minutos.

            Ela começa a se embrenhar na floresta. Seguro o cabo da espada enquanto corro, e sinto com cada nervo que estou doido pra usá-la. E então, a maldita Doze começa a subir numa árvore. Não que eu não tenha aprendido a escalar, mas aquela árvore possui galhos finos demais para os meus noventa e poucos quilos. Cercamos a base da árvore e a encaramos.

            Ela sorri e seu tom de voz possui um entusiasmo que me faz ter vontade de vomitar tudo de novo.

            – E aí, como vocês estão?

            Ela só pode estar brincando.

            – Estamos bem. – Sorrio, erguendo uma sobrancelha. – E você?

            – Está um pouco quente para o meu gosto. – Ela torce o nariz e fico dividido entre expressar o nojo que sinto dela e admitir que a piada foi boa. – O ar é bem melhor aqui em cima. Porque vocês não sobem?

            – Acho que eu vou.

            – Aqui, Cato, pega isso. – Glimmer me estende o arco e a aljava.

            – Não. –Paro por alguns segundos e os empurro, passando a mão sobre o cabo da espada presa em meu cinto. Não o havia soltado, de qualquer forma. – Farei melhor com a minha espada.

            Tento escolher os galhos mais firmes, mas até mesmo eles quebram sob meus pés. Quando estou a alguns metros do chão, os galhos que sustentam meus pés e mãos quebram ao mesmo tempo e eu caio com tudo no chão. O pouco ar que eu retivera agora me escapa por completo dos pulmões, de modo que consigo ver a expressão preocupada e irritada de Clove quando estou no chão. Levanto e sei, quando me ouço xingando, que se eu morresse ali certamente iria para o inferno.

            Observo Glimmer tentando escalar e ela é bem mais leve que eu, mas ainda assim é muito pesada para os galhos. Ela para antes mesmo da altura que atingi e desce, quando alguns galhos quebram.

            Discutimos sobre o que fazer. Clove não faria muito estrago atirando de baixo para cima, e a garota já está ruim da perna. Glimmer é absolutamente estúpida com aquele arco e flecha, e me pergunto se ela realmente tem esperança de vencer aquilo com nada mais que músculos e um rostinho bonito.

            – Ah, deixa ela ficar lá em cima mesmo – o Conquistador diz. – De lá ela não vai poder sair.

            Bem, ele tem razão. Ela precisará comer em algum momento, e seu suprimento de água não será tão racionado depois de termos quase todos virado churrasco. Glimmer disse que montaria guarda, mas já faz alguns minutos que ela está adormecida na base da árvore. Acendemos uma fogueira para cozinhar alguma carne, uma vez que não precisamos nos preocupar se alguém aparecer por causa do fogo. Somos maiores e melhores.

            Marvel está dormindo ao lado da Quatro, e eu estou a caminho enquanto fico observando Clove acertar um lagarto grande a alguns metros com lâminas curtas e pesadas. Primeiro a cauda. Depois, ambas as patas dianteiras, de modo que ele agora não pode se mover. Num golpe de misericórdia ao animal que tenta se contorcer, ela acerta a cabeça. Na direção da boca, por cima da cabeça. Bem no meio. Ela sorri por satisfação, e não consigo deixar de emitir um riso abafado.

            – Achei que estivessem todos dormindo – ela diz após identificar a origem do riso.

            – Todos menos você – digo.

            Ela dá de ombros.

            – Seria bom dormir – digo arqueando as sobrancelhas. – O dia deve ser cheio amanhã.

            – Você deve estar mais cansado. Me carregou por metade da corrida contra o fogo. – Ela sorri e sinto a vontade de tocar as covinhas de cada lado de seu rosto. – Obrigada.

            É minha vez de dar de ombros.

            – Vem pra cá – convido, e ela reluta. – Não posso te pedir pra buscar água aqui. É melhor você vir logo.

            Ela assente com um sorriso e se move lentamente ao redor da fogueira até chegar onde estou deitado em meu saco de dormir. O calor me faz usá-lo como esteira, não propriamente como um saco de dormir. Ela se levanta, recolhe as lâminas e as guarda cuidadosamente no casaco e se senta ao meu lado. Incrível como está bonita à luz da fogueira. A cor de seus olhos está mais destacada, não sei bem.

            – Deita – peço, ainda um pouco rouco, revirando uma mochila e estendendo um outro saco de dormir do meu lado. Ela deita virada para mim e sorri, e não resisto ao impulso de encaixar o indicador na covinha formada em sua bochecha. Ela apenas revira os olhos e vira de costas. Seu cabelo está preso, mas ainda roça meu rosto quando ela se move. O cheiro de morango de seu cabelo ainda prevalece sobre o cheiro da fumaça, o que me deixa inebriado. Quero sentir mais uma vez. Aproximo-me devagar e encosto o nariz de leve em seu cabelo, em seguida em sua nuca. Sei que ainda está acordada, uma vez que posso ver todos os pelos de sua nuca se eriçando. O toque de sua pele em meu rosto me lembra de relance da vez em que levei um choque numa tomada de casa. Não doeu, mas fez meu coração acelerar e deixou meus dedos formigando por alguns instantes.

            Corro o nariz, tangenciando a pele e o cabelo. Percebo quando seus ombros se encolhem e ela vira, devagar. A boca semi-aberta, levemente ofegante, os olhos brilhando a luz da fogueira. Me apoio do antebraço e a reação é automática. Sinto meus lábios encostarem-se aos dela enquanto ela termina de virar o corpo, correspondendo ao beijo. Sinto meus músculos se contraindo e estou me esforçando muito – muito – para não acordar os outros.

            Ouço alguns galhos se partindo enquanto segura meu cabelo com a mão livre e me puxa para mais perto. O maldito barulho faz com que ela pare.

            – Acho que devemos parar... E dormir... E... – Ela parece perdida.

            Assinto com a cabeça, mas meu corpo deseja piamente continuar.

            Ela olha em volta. Ainda estão todos dormindo. Vira para mim com sagacidade e me beija mais uma vez, mais demorada e intensamente. Deus, eu não quero parar agora. Não sei se são as circunstâncias, mas ela parece boa demais nisso para mim.

            Ela simplesmente deita, enquanto eu permaneço na mesma posição.

            – Deite, Cato. Agora. E durma. E aquiete-se – ela sussura, de costas.

            Contra a minha vontade, obedeço. E mal me lembro da garota em cima da árvore quando adormeço pensando em Clove.


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Notas finais do capítulo

Especial pra Pietra Mellark Moscovitz, que pediu mais romance HAUEHAUAHU o que achou?