Premonição 6: Inferno escrita por Lerd


Capítulo 4
Espectro


Notas iniciais do capítulo

Bom, capítulo 4 postado, espero que gostem :D



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/307364/chapter/4

            Já era de manhã quando René recebeu a sua primeira visita. O iPod dele tocava uma música num volume baixo, para não atrapalhar ninguém. O rapaz esquecera seu fone de ouvido no quarto de Jill, e se arrependia amargamente por isso. Mas ele não podia ir buscar, ou eles o obrigariam a sentar e conversar sobre o ocorrido. E essa era a última coisa que René queria.

Say my name

And every colour illuminates

We are shining

And we will never be afraid again

            — René, aqui é a oficial Marina Portilla, eu preciso que você abra a porta. Nós precisamos ter uma conversa. Seus amigos estão aqui fora comigo. — Ele ouviu uma voz de mulher dizer, do outro lado.

            O rapaz ignorou, aumentando o volume da música.

Say my name...

            — É verdade René, abre a porta, por favor... — Jill pediu, choramingando, como sempre fazia. Mulherzinha...

            — Vamos lá, campeão! — Hank falou.

            Por vários segundos não houve resposta. A policial então cochichou alguma coisa com Jill e Hank, e disse para René, em voz alta:

            — Se afaste da porta que eu vou arrombá-la.

            Contou:

            — Um...

            E a porta se abriu. René ficou parado segurando o batente por vários segundos, sem ninguém saber direito o que dizer. O ruivo então quebrou o silêncio:

            — Entrem.

            A oficial Marina foi a primeira a entrar, observando todo o cômodo. Ele estava incrivelmente bem arrumado, com a cama feita e nenhuma coisa fora do lugar. René observou que a mulher tinha uma arma em sua cintura, e que era também muito bonita, morena, com a pele escura e os cabelos cacheados. Ela usava um elegante terno feminino de cor grafite.

            — René, nós precisamos conversar. Sente-se, por favor.

            O rapaz obedeceu prontamente a mulher. Não era por medo. Ele não tinha receio de policiais, já que estudava em um colégio militar. Mas a situação era diferente: em sua escola ele era um aluno, era parte deles. Ali, no quarto de hotel, ele era só mais um, e Marina não tinha motivo algum para ter alguma simpatia especial por ele. A mulher continuou:

            — É sobre o seu guardião. O guardião de vocês três na verdade. O senhor Vladmir.

            — Ele está morto. — René respondeu, desinteressado.

            Marina ajeitou seu paletó e puxou uma cadeira para se sentar.

            — Eu sei meu querido. Eu sei. Uma mulher chamada Pamela Price me avisou disto, de que vocês estavam sozinhos aqui. De que o seu guardião legal tinha falecido naquela tragédia nas ruínas. Eu sinto muito pela perda de vocês.

            — Ele foi esmagado por uma pedra. — O ruivo respondeu, enquanto brincava com uma pulseira colorida que tinha no braço. — As tripas dele ficaram para fora.

            René queria provocar a oficial, ao dizer aquilo. Deixá-la desconfortável. Era uma espécie de mecanismo de defesa, mas, aparentemente, não funcionara. Não com aquela mulher, com certeza acostumada a ouvir coisas piores.

            Jill deu um gritinho e correu para o banheiro. Foi vomitar. Ela não aguenta nada mesmo... Hank fez uma expressão de desapontamento, mexendo a cabeça negativamente, e Marina falou, ignorando a provocação:

            — Eu também sei disso. Eu vim conversar com você a respeito do que nós faremos para garantir a sua chegada em segurança em casa. Eu faço parte da equipe que trabalha na embaixada norte-americana aqui em Cancun, e eu posso garantir que farei o possível para tornar essa experiência a menos traumática possível para você e para os seus amigos. Eu suponho que vocês já tenham falado com seus pais, certo?

            Hank ergueu a mão, como a pedir licença para falar.

            — Eu... Eu falei com os nossos pais. Com os meus, os da Jill e os do René. Eles estão cientes do que aconteceu.

            Marina assentiu com a cabeça, e continuou:

            — Certo, ótimo. Se não se importasse, eu gostaria que você me passasse os números deles. Vai ser necessário que nós mantenhamos contato com seus pais. Para que tudo corra tranquilamente.

            O mágico mexeu a cabeça afirmativamente. A expressão de Marina mudou um pouco e ela disse, então:

            — Só tem um problema...

            René arregalou os olhos, mantendo a cabeça abaixada. A visão, ela vai me perguntar sobre isso... Ela vai querer saber como eu previ o acidente... Droga, eu estou muito encrencado!

            — E qual seria o problema oficial Portilla? — Hank perguntou.

            — Pode me chamar só de Marina. — A mulher garantiu. — E o problema é algo simples, de certa forma. Nada alarmante, mas... Vocês não vão poder sair daqui nos próximos dias. Existe um furacão vindo nessa direção, e nenhum avião está autorizado a sair da terra na próxima semana, pelo menos. Eu sei como vocês gostariam de estar com seus pais nesse momento, mas eu receio não ser possível...

            Hank estava desolado. Lentamente ele sentou-se na cama ao lado de René, que se mantinha imóvel.

            — Até lá eu fui nomeada como a guardiã legal de vocês. Qualquer problema que tenham, vocês podem ligar para mim. Eu deixei meu número com o Hank, e eles também têm o meu número na recepção. Não hesitem em telefonar, não importa quão pequeno seja o assunto. Pensem em mim como uma tia. Eu sou meio chata, e posso pegar no pé de vocês, mas tudo o que eu quero é a sua segurança. Levá-los até em casa inteiros, da maneira como chegaram. — E, após uma pausa: — Eu realmente sinto muito pela perda de vocês.

            René nada disse. Hank então sorriu de canto de rosto e respondeu:

            — Obrigado, ofi... Marina. Muito obrigado.

            A mulher retribuiu a fala com um aceno e saiu do quarto.

x-x-x-x-x

            Amanda almoçava tranquilamente, com a cabeça nas nuvens. O motivo, claro, era Hank. Ela não conseguia esquecer a noite anterior. Fora, de certa forma, a coisa mais agradável que acontecera à mulher o ano todo. O rapaz era o primeiro homem com quem ela saía em muito tempo, e ele não poderia ter sido mais gentil. Pagou o drink, foi educado, e não tentou nada inapropriado com ela. Nem mesmo um beijo. Mas ele já tinha conseguido um beijo, uma recompensa por ter salvado a minha vida.

            — Com licença... A senhorita está sozinha?

            Pensamentos interrompidos. Amanda levantou o olhar, e assustou-se com quem estava à sua frente. Deus, tudo menos ele.

            Era Falcon. Alto, musculoso, com os cabeços grisalhos e a pele bronzeada. O homem vestia-se da mesma maneira elegante de sempre, com um par de óculos na cabeça e um relógio caríssimo no braço. Amanda ainda se lembrava da sensação de ter as asquerosas mãos ásperas dele em seu corpo. Roupas de um conde, mãos de um ferreiro. Era o suficiente para fazer com que ela perdesse o apetite.

            — O que você está fazendo aqui? — A garota perguntou num rompante, colocando sua salada de lado.

            Falcon sorriu seu clássico sorriso debochado.

            — Eu pensei que você ficaria mais feliz em ver um velho amigo.

            — Você não é um amigo.

            — É rude de sua parte dizer isto. Principalmente levando em conta o assunto de que vim tratar com você.

            — Não estou interessada. — Amanda disse, decidida.

            — Você não sabe o preço.

            — Não importa o preço. Eu não estou interessada.

            Falcon riu. Ele então ergueu a mão e pediu um drink ao garçom. Cosmopolitan, Amanda sabia antes mesmo de o homem dizer. Falcon continuou:

            — Qual é Cherry, não seja tão durona.

            Amanda estava extremamente furiosa naquele momento.

            — Meu nome é Amanda. Amanda Rojas, não Cherry Fox.

            — Que seja. O seu nome não importa para mim. Apenas os seus... Atributos.

            — Chega Falcon! — Amanda exclamou, batendo os punhos na mesa. Suas pulseiras de madeira balançaram com o gesto. — Me deixa em paz, por favor. Eu abandonei esse barco há muito tempo. Eu quero continuar a minha vida longe disso. Longe dos seus filmes e do seu mundo podre.

            O homem parecia estar alheio às críticas e às recusas da garota.

            — Sabe qual é o seu problema... Amanda? — A mulher não respondeu. — O seu problema é que você se acha superior. Superior a todos nós. Você nos julga. Nós somos os promíscuos, os devassos, os libertinos... Você é a pobre virgenzinha indefesa que foi corrompida pelos caras maus. Você é a vadiazinha que acha que tem uma boceta especial, uma relíquia... Mas deixa eu te contar, princesa: você não tem. A sua boceta é tão comum quanto a de qualquer outra garota.

            A garota teve de se segurar para não desabar em lágrimas. Falcon sabia exatamente como lhe ferir. Amanda engoliu em seco e ergueu o queixo altivamente antes de dizer:

            — Se isso é verdade, então por que você veio atrás de mim? Existem muitas outras garotas por aí com bocetas melhores do que a minha.

            — Isso é verdade. — Falcon confirmou. — Mas, apesar dos seus defeitos que eu citei anteriormente, você é valiosa. Quando você era a estrela da nossa produtora, nós tivemos o maior lucro desde que a internet e a pirataria surgiram. Algo relacionado à sua ingenuidade, que nós sabemos ser falsa, talvez, atraía o público. Chame de fetiche.

            Amanda estava cansada daquela conversa.

            — Olha Falcon...

            — Se mudar de ideia, me ligue. — O homem interrompeu-a. — Eu não posso te adiantar muita coisa, mas posso garantir isto: se você aceitar, essa semana vai ser a última em que você precisará dançar em um poste. Seu cachê será suficiente para que você torre seu dinheiro na gravação de uma música ou qualquer coisa assim, que, ambos sabemos, vai ser um fracasso. Mas você pelo menos terá a chance de tentar. Um último sacrifício para garantir o resto da sua vida. Pense bem.

            E então o homem deixou um cartão na mesa. Amanda não precisava dele, ela ainda tinha o número salvo em seu celular. Talvez por segurança. Ela sempre podia voltar a ser Cherry Fox, nos filmes. E isso era o suficiente para que ela estivesse considerando minimamente a proposta de Falcon.

            Um último sacrifício para garantir o resto da minha vida...

x-x-x-x-x

            Pam estava em um campo com uma amplitude assustadora de grama verde por todos os lados. O cenário lembrava um pouco a fazenda onde fora criada com seus avós. Mas eles já estavam mortos há muitos anos, e o local fora vendido há muito tempo também... Ambos eram coisas do passado, coisas que ficaram para trás. Memórias...

            Mas havia uma árvore ali, no topo de uma pequena colina. O sol estava escaldante, e o local parecia oferecer uma sombra fresca, então Pam caminhou até lá. Ela estava usando um vestido florido colorido, coisa que não usava há muitos anos. As flores continuavam em sua vida e em seu guarda-roupa, mas agora elas eram todas em cores frias. Agora eu sou uma mulher. Eu não sou mais uma menina.

            — Você é uma menina sim. Uma doce e meiga menina. — Uma voz disse.

            Pam havia chego ao topo da colina.

            — Quem foi que disse isso? — A mulher perguntou. Ela tinha lembranças daquela voz, mas não sabia dizer de onde era. É uma voz do passado.

            — Eu. — Ele respondeu.

            A mulher então deu a volta na árvore, e encontrou o rapaz sentado com as costas apoiadas nela. Ele usava uma camisa xadrez azul aberta, e uma calça jeans. Estava descalço. Em sua boca havia um pedaço de palha, e ele sorriu de maneira doce. Apesar do visual caipira, Pam reconheceria aqueles olhos azuis em qualquer lugar do mundo.

            — Adrian. — Ela exclamou, suspirando.

            Havia tantas coisas que Pam gostaria de dizer ou fazer. Ela gostaria de abraçá-lo, de beijá-lo, de dizer que sentia a falta dele. Gostaria de se declarar para ele, de sentir o seu toque, o seu calor. Gostaria de passar as mãos pelos cabelos dourados dele, de tocar em sua mão, em seus braços. Gostaria de amá-lo, e gostaria de muito mais... Mas ela não podia, porque Adrian estava morto.

            — Isso não é real. Você está morto. Isso é um sonho. — Pam declarou, decidida.

            Adrian abriu um sorriso e olhou para a garota. Disse:

            — E faz diferença?

            Não, não faz. Oh, Adrian. Você não podia ter sido tirado de mim...

            — Você precisa ser forte, Pam. Você tem grandes lutas pela frente. Grandes batalhas. Você não vai poder ser mais uma menininha indefesa. Você precisará enfrentar tudo como a forte mulher que se tornou.

            Eu sei, Adrian. Eu sei.

            — Eu sei que você sabe. — Ele disse, novamente lendo seus pensamentos. — Eu só quero que você saiba que eu vou estar com você. Cada arrepio que você sentir, cada vento, cada sinal que você perceber... Sou eu. Eu estou morto, mas eu ainda posso ajudá-la. Eu posso e vou te ajudar a deter essa maldita lista. E então você estará definitivamente salva. Para sempre. É o meu dever.

            E então o rapaz se levantou.

            — Oh, não vá embora! Adrian! Por favor, fica comigo. — A mulher disse, implorando.

            Adrian sorriu, e os dentes dele brilharam. O rapaz então a abraçou, e ela sentiu o calor do peito dele contra o seu. Aquilo era o suficiente para que não existisse mais nada no mundo, apenas os dois. Apenas eu e o meu príncipe chato...

            Pam ficou nas pontas dos pés e tocou os lábios de Adrian com os seus próprios lábios. Um sabor doce invadiu a sua boca, e a garota sentiu-se flutuando...

            E então acordou.

x-x-x-x-x

            — Então você é uma atriz? — Brody perguntou, comendo uma colherada de seu sundae.

            Melissa negou com um aceno de cabeça, explicando:

            — Eu sou uma estudante de teatro. Eu estou no segundo ano do curso ainda. Falta algum tempo antes que eu possa me considerar uma atriz. Além disso... Esse não é o meu objetivo. Meu sonho é escrever peças de teatro... Sabe? Musicais, dramas, comédias, qualquer coisa.

            Brody ergueu uma sobrancelha.

            — Então você quer ser uma roteirista? Uma dramaturga?

            — É, é por aí. — Melissa concordou, sorrindo levemente. Ela tentava conduzir a conversa da maneira mais informal que podia, sem deixar transparecer sua preocupação. Nada tirava da sua cabeça que eles deveriam forçar o tal visionário ruivo a abrir a porta do quarto para conversarem. Eles estão perdendo um tempo precioso...

            — Uau, isso é diferente. — Brody respondeu, sorrindo largamente.

            Melissa meneou a cabeça positivamente, e então perguntou:

            — E você? — E quando o rapaz abriu a boca para falar, Melissa o interrompeu: — Deixa-me adivinhar: acabou de se formar no ensino médio.

            O rapaz ficou acanhado.

            — Sim. Eu fiquei um ano atrasado por conta de uns problemas pessoais. — Por conta da maldita dislexia, isso sim.

            — Todos nós temos problemas pessoais, não é motivo para se envergonhar. Eu acabei tendo sorte de pular uma série devido a minhas boas notas. Eu tenho dezenove anos, não sou tão mais velha que você. — A loira falou. — Mas o que você pretende fazer agora? Já tem ideia?

            Brody pensou por alguns segundos.

            — Na verdade eu tenho sim. Eu quero ser cineasta.

            — Cineasta? Isso é original.

            — Pois é.

            E então Melissa teve um estalo:

            — Espera, você está aqui por causa do festival de cinema?

            O rapaz concordou com um aceno de cabeça, e a garota então falou:

            — Nossa, isso é fantástico! De verdade mesmo. Esse festival não é para qualquer um não. Os caras da minha faculdade não conseguiram fazer o curta deles ser aceito. E olha que o tema era o Massacre da Babilônia, e os críticos adoram elogiar películas sobre grandes tragédias.

            Brody estava vermelho de vergonha.

            — Qual o tema do seu filme? — Melissa perguntou.

            O rapaz não sabia se deveria entrar naquele mérito. Melissa parecia ser uma ótima garota, era divertida, inteligente, linda... Mas Brody não tinha certeza se gostaria de deixá-la a par de um detalhe tão íntimo sobre si mesmo. Seu idiota, todos vão ver esse filme. Se você não conseguir falar sobre ele pra essa garota, como espera que todo o resto do mundo o veja?

            — É um curta a respeito do meu irmão. Ele morreu quando era um bebê ainda. O nome dele era Adrian.

            Melissa não esperava por aquela informação, e a fala do rapaz foi como um soco em sua barriga.

            — Oh, me desculpe, eu não deveria...

            — Não, não tem problema. — Brody garantiu. — Já faz mais de quinze anos que isso aconteceu. Eu tinha dois anos na época, então eu nem cheguei a conhecê-lo direito. Lembro-me vagamente do garoto. Mas a minha mãe... Ela nunca se esqueceu do Adrian.

            — É impossível uma mãe esquecer-se de um filho morto. — Melissa respondeu, pensando em sua própria mãe e na maneira devotada com que ela falava de Bobby mesmo quatro anos após a sua morte.

            — Você tem razão. — O rapaz concordou.

            E o silêncio começou a reinar. Foi quando o rapaz tomou a iniciativa:

            — Posso te perguntar uma coisa, Melissa?

            A garota meneou a cabeça afirmativamente.

            — Como você consegue ser tão... Não sei... Tão doce? Você passou por coisas horríveis. Quero dizer... Você perdeu o seu irmão, e os seus amigos... Por Deus, você sobreviveu ao Massacre da Babilônia! Eu não sei... Se acontecesse comigo eu acho que pirava. Isso é mais do que qualquer pessoa pode aguentar.

            Melissa levantou o olhar e fixou seus olhos nos de Brody por vários segundos. Os olhos dele são como duas piscinas de ouro derretido. O rapaz não desviou o olhar, e a garota gostou disso. Demonstrava sinceridade, franqueza.

            — Obrigada pelas palavras gentis. Mas se quer saber como eu posso ser tão “doce” mesmo depois de todas essas coisas... Pergunte pra sua mãe. Ela superou coisas tão ruins quanto as que eu superei. — E deu uma pausa. — Na verdade... Não. — Melissa refletiu por alguns segundos. — Coisas piores. E mesmo assim sobrou a ela amor suficiente para criar um filho tão... Gentil.

            Brody queria enfiar a cabeça em um buraco, de tão envergonhado que estava.

            — Me desculpe, eu...

            Melissa então sorriu, e tocou na mão dele em cima da mesa. A mão dela era quente e macia. As unhas verdes contrastavam com a pele rosada, e a garota era doce como ninguém mais parecia ser capaz de ser.

            Antes que Melissa pudesse continuar a conversa, eles ouviram um burburinho vindo do hall do hotel. Brody levantou-se sem pedir licença, e a garota o seguiu. Os dois correram alguns metros, e quando chegaram ao local, viram uma maca sendo levada para fora em direção a uma ambulância. A pessoa estava morta, isso era certo, já que um pano branco cobria o corpo.

            — Mas o que...?

            Eles nem precisaram perguntar, porque uma velhinha ao lado deles comentou:

            — Pobre garota... Eles encontraram o corpo dela essa manhã, coitadinha. Parece que ela caiu em cima de um esqueleto de brinquedo... Que coisa horrível, não? Morrer assim...

            Melissa estava congelada de medo. Brody arriscou:

            — E a senhora sabe quem era essa garota? Digo, qual era o nome dela?

            A velhinha pensou um pouco, e então falou:

            — Eu acredito que era Christy. Não, me perdoe. Chrissie. Isso, era Chrissie. Eu ouvi os bombeiros comentando com os homens da recepção. Chrissie. Era esse o nome dela.

            Brody então teve um flashback do acidente nas ruínas. Da garota com a camiseta do time de vôlei, escrito nas costas “Chrissie”. Essa garota que morreu tinha saído conosco das ruínas. A lista da qual minha mãe falou... A lista da qual ela sobreviveu... Está realmente acontecendo.

            — Melissa, nós precisamos falar com o garoto ruivo. Não importa que ele não queira conversar conosco. Nós derrubaremos aquela porta se for necessário. Ele precisa encarar o que está acontecendo.

            Melissa não podia concordar mais com aquilo. Uma parte de si dizia: isso não tem a ver comigo, eu não preciso enfrentar essa batalha. Pra mim já acabou, eu estou salva. Deixa que eles lutem por si mesmos. Mas essa era uma parte pequena, mesquinha e egoísta. Uma parte maior, a parte a qual Melissa sempre dava ouvidos, dizia: ajude-os. Ajude-os como você gostaria que pudessem ter te ajudado. Ajude-os como Bill tentou ajudá-la. Você deteve a lista, garota. Você sabe como se faz. Você sabe sobre os sinais, sabe sobre tudo. Você pode ajudá-los a saírem com vida da lista. Você pode ajudar Pam... E Brody.

            — Vamos. Agora.

x-x-x-x-x

            Hank mal tinha dado dois passos para fora do quarto quando Helena interceptou-o. Ela estava vestida com uma saia bandage preta e uma regata branca, com um colar de pérolas no pescoço. A mulher olhava para todos os lados, esperando que pudesse encontrar o número do quarto do garoto ruivo que estava nas ruínas. Ela queria dar um aviso por Marsellus, pedir que o rapaz aceitasse se encontrar com os dois, para que o homem pudesse oferecer suas desculpas e pagar pelo dente que ele perdera. Se o próprio Marsellus fosse tentar um primeiro diálogo com René, era quase certo que ele seria severamente repelido. Restava à Helena ser a mediadora da conversa.

            — Ei, rapaz... Você é amigo do ruivinho não é? Do garoto das ruínas...

            O mágico olhou a mulher de cima a baixo. Parecia não estar muito contente em vê-la.

            — Sou sim. — E começou a andar para longe. Helena então segurou o braço dele, e Hank deu um safanão nela, se soltando.

            — Me escute...

            — Olha, dona, nós não queremos confusão. O seu marido arrancou um dente do meu amigo, e eu acho que isso é o suficiente. Deixe-nos em paz, por favor.

            — Não, você não entende... — Hank então voltou a seguir para longe, mas Helena o seguiu, e disse: — Nós queremos nos desculpar. O Marsellus quer se desculpar. Ele está arrependido pelo que fez ao seu amigo, ele quer reparar os danos.

            Hank riu sarcasticamente.

            — Oh, mesmo? Então por que ele mandou você aqui? Por que ele não veio por si mesmo?

            — Ele temeu que vocês pudessem não querer ouvi-lo. — Helena explicou.

            — Como qualquer pessoa sã faria...

            — Por favor... — Helena pediu uma última vez, voltando a segurar o braço de Hank. Daquela vez o rapaz não a reprimiu, apenas parou. Ele então se virou, e encarou a mulher por alguns segundos. Apesar da idade, ela era muito bonita. Talvez mais bonita do que Amanda. Ali, tão perto, Hank não conseguiria dizer “não” a ela. Ele estava hipnotizado. Malditas mulheres, sempre foram o meu ponto fraco.

            — Tudo bem. As oito, no bar do hotel. Pode ser?

            Helena esboçou um sincero e tímido sorriso.

            — Perfeito.

            E Hank voltou a caminhar para longe, descendo as escadas. Foi quando Helena chamou-o mais uma vez:

            — Rapaz! — E o mágico se virou. — Qual o seu nome?

            Hank sorriu um sorriso debochado e malicioso. Disse:

            — Hank. — E sumiu da vista da mulher.

            A loira não teve tempo de se apresentar, e acabou com as palavras entaladas na garganta. Disse, murmurando para si mesma:

            — E eu sou a Helena...

x-x-x-x-x

            — Ele não vai poder ir embora nem se quiser. — Melissa disse, dentro do elevador. Pam estava ao lado dela e do filho. — Tem um furacão vindo nessa direção e nenhum avião está saindo do chão. Eles estão até pensando em cancelar o festival de cinema... — Brody manteve a expressão séria, e Pam nada disse. — Ah, como se você pudesse se importar com isso numa situação como esta.

            E então o elevador parou e a porta se abriu.

            — Chegamos.

            Eles estavam no décimo terceiro andar. Sabiam exatamente qual era o quarto do tal garoto ruivo, após perguntarem na recepção. Ao lhes dar a informação, o homem dissera que estava farto de lhe perguntarem sobre “o garoto ruivo”, e que aquela era a quarta vez que ele dava aquela informação só naquela tarde. Esse rapaz está ficando famoso.

            Toc, toc. Pam respirava com dificuldade, nervosa. Ajeitou sua flor no cabelo enquanto esperava que alguém viesse abrir a porta. Não demorou muito tempo, e Hank abriu.

            — Olá... Será que nós podemos falar com o... René? — Pam disse, lembrando-se do nome do rapaz.

            O mágico assentiu com a cabeça, e os três entraram. Pam espantou-se tremendamente com o que viu.

            O quarto estava cheio. René estava sentado no chão, de pernas cruzadas. Do lado esquerdo dele estava uma garota que Pam lembrava-se de ser a namorada dele. Hank continuava ao lado da porta, e havia mais três outras pessoas ali. A primeira era uma garota tatuada ruiva com um pequeno macaquinho no ombro. Ela estava sentada num sofá ao lado de um rapaz loiro de boné que mantinha uma expressão de dúvida e apreensão. De pé, ao lado dos dois, estava um homem negro com uma câmera no pescoço. Brody subitamente lembrou-se de ver os três nas ruínas.

            — Mais visitas para você, René. — Hank introduziu-os.

            O ruivo sorriu de canto de rosto, e disse, em um tom misterioso e enigmático:

            — Juntem-se ao clube.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Então, um capítulo sem mortes. Era necessário, afinal em três capítulos já morreram três sobreviventes (Vladmir, Aaron e Chrissie). Além disso NÃO se assustem com o ritmo mais lento dessa fic, ela não terá apenas 10 capítulos. Bom, deixa eu ver se tem algo mais que preciso comentar...Ah, sim. O foco de novo não esteve em René, como vocês puderam perceber. Mas é como disse: com tantos personagens na fanfic (e tantos IMPORTANTES), cada um tem o seu momento. Acreditem em mim quando digo que até o fim da história cada personagem terá tido seu momento de brilhar :D
Abração, e comentem! o