Olhando mais uma vez os portões do hospital logo atrás do relógio mais importante desse estado, as lembranças ficavam cada vez mais nítidas na minha mente. Da primeira consulta no médico, onde eu nem tinha certeza de que estava grávida, passando por todos as vezes que eu e Finn entramos por aquela porta para outro exame, até a última vez que eu estive naquele hospital -e nisso eu quero dizer a última vez realmente viva-, quando Cory e Sophie nasceram. Lembranças, eu estou perdida em lembranças e elas são tudo que eu tenho pra acreditar que eu existo de verdade.

“-Srta Berry, você sabe que é uma gravidez de extremo risco.”

“Nós vamos ter nossos filhos, Rach, juntos, como uma família”

“São gêmeos!”

“Não precisa se preocupar com nada, Hobbit, eu to aqui pra cuidar de vocês três e Finnocense não seria tão idiota a ponto de fugir”

Apertei meus olhos e respirei fundo. Sem drama, Rachel Berry. Eu ainda vou ter mais uma ótima lembrança desse hospital, eu vou sair daqui, com Finn, Santana, Cory e Sophie e principalmente com o meu corpo de volta.

Olhei em volta e pude observar cada detalhe, cada pessoa, cada rosto, sabendo que eles não iriam notar isso e me olhar como se eu fosse maluca. Que irônico, não? Eu sempre sonhei em ser invisível, poder observar sem ser observada... E agora eu sou invisível e isso não me parece nem um pouco convidativo. Merda! Por que sempre queremos as coisas que não podemos ter? Por que o impossível é tão atraente?

Agora que eu sou invisível eu não vejo lado bom nisso, sendo que quando eu não era eu não conseguia ver um lado ruim. Isso serve de lição, sabe? Nada é tão bom quanto parece ser. Tudo pode piorar. Nossa, tudo simplesmente parece tão ruim! Por que eu não consigo achar o lado bom dessa coisa toda?

Sabe, “As vantagens de ser invisível” é totalmente propaganda enganosa, não existem vantagens e eu sou a prova viva disso (não que eu tenha lido o livro ou visto o filme, porque eu não fiz nenhum dos dois (N/A isso serve pra mim também kk) ).

Enfim, foco, Rachel, foco. Entrei no hospital e fui direto para o meu já conhecido quarto, tentando não olhar muito para os lados e acabar me perdendo em pensamentos de novo.  E quando eu cheguei no quarto, realmente me surpreendi ao ver Finn lá encostado na parede e olhando para o meu corpo.

Não sei por quanto tempo eu fiquei ai na porta, observando meu noivo se perder em alguma coisa dentro da mente dele, assim como eu. Mas será que ele também estava perdido em lembranças? Será que ele também repassava cada momento vivido em sua mente como se estivessem acontecendo agora?

“Você pode me beijar se quiser”

“Sabe, eu gosto de pensar que isso vai durar pra sempre, pequena, é mais confortável e fácil pensar assim do que pensar que um dia nós vamos nos distanciar e eu não vou mais me sentir confortável e completo perto de você.”

“-E então, qual foi o resultado? -Deu positivo Finn”

“Nós vamos até o final, Finny, custe o que custar”

Um movimento brusco de Finn me despertou das lembranças que insistiam em bombardear minha cabeça e quando eu vi ele já estava sentado ao lado da maca do meu corpo e segurava “minha” mão.

-Ah, pequena... Lembra quando você me confrontou pela primeira vez sobre fé?

Imediatamente meu cérebro me traiu e puxou uma lembrança lá bem do fundo do baú, direto do nosso primeiro encontro oficial.

-Finn, eu sei que você não acredita em Deus, religião e essas coisas, mas você precisa acreditar em alguma coisa. Você não pode simplesmente não ter fé em nada!

Falei rindo e empurrando levemente o ombro do grandão, que só deu de ombros.

-É sério, Finny, você não acredita em nada maior que você? Nada superior que todos nós? O que te conforta quando você pensa que tudo ta uma merda?

-Eu simplesmente não consigo acreditar que alguém tão bom tenha criado um mundo tão cruel.

Neguei com a cabeça e sorri.

-E eu não consigo acreditar que alguém tão fofo não tenha nem um pouco de fé nesses dois metros de altura aí!

-Sabe Rach, você tava certa... Eu tenho fé sim. Eu tenho fé em você, eu acredito em nós dois e eu acredito que você vai levantar dessa cama e vamos ver nossa vida passar correndo juntos.

---------She---------loves---------me---------she--------loves---------me--------not---------

Saí do hospital bem pior do que eu entrei. Nossa, que ironia, supostamente hospitais não servem para ajudar?

Mas o problema não foi esse, o problema foi quando eu dei de cara com o grande calendário pendurado perto da mesa de algum secretário ai bem no centro do hospital. 20/12/13. O que para mim foi uma semana, no tempo “real” foi um ano. Um ano. Eu perdi um ano da vida dos meus filhos, eu perdi um ano que eu poderia correr atrás dos meus sonhos, eu perdi um ano inteiro da minha vida deitada em uma cama de hospital ridícula!

E eu não posso fazer absolutamente nada pra reverter essa situação. Eu não posso me tirar da coma, eu não posso voltar para o meu corpo, eu não posso voltar no tempo, e nem sequer posso fazer o tempo parar de andar tão rápido. Eu to presa aqui e não tenho alternativa a não ser esperar sentada.

Ou isso, ou eu posso literalmente correr contra o tempo, agir, fazer alguma coisa. Talvez salvar eu mesma da morte e finalmente poder voltar a falar com as pessoas que eu amo, finalmente poder viver uma vida normal como uma pessoa normal. Ter minha família, meu emprego, meus sonhos, meu marido, minha melhor amiga, meus amigos de escola...

É isso. Tudo que eu quero é ter uma vida normal e não do dia pra noite ter que assistir as coisas e pessoas que costumavam ser “minhas” se dispersando e se acostumando a viver sem mim.

Tudo que eu quero é poder construir mais lembranças, ao invés de simplesmente revive-las na minha mente a cada segundo.