Sou um homem comum que trabalha na recepção de um hotel comum. Fui casado um dia, mas durou pouco e não tive filhos. Sempre me imagino sendo mil coisas, mas, no fim, acabo pensando que nenhuma delas poderia me fazer feliz um dia. Sou apenas mais um condenado ao tabu de que devemos ser felizes, mas esse fato sofreria uma pequena mudança muito brevemente.

No dia em que minha vida começou a mudar, eu estava atrás do grande balcão de madeira do hotel onde trabalho, esperando o telefone tocar ou qualquer outra coisa acontecer.

– Túlio, tem algo pra você nas correspondências... - Disse Ricardo, um amigo funcionário do hotel, tentando xeretar uma carta sem danificar o envelope.

– É? E o que é? - Eu respondi.

– Não sei. Pega. - Ele disse, me entregando a carta.

No envelope não havia um remetente, apenas meu nome. Eu abri e vi dentro um panfleto vermelho escrito "Bordel Candelabro". Havia um endereço também, mas não li. Ricardo estava apoiado do outro lado do balcão olhando o panfleto comigo.

– Quem manda um panfleto por correspondência?

– Eu conheço esse lugar. - Eu disse, sem prestar atenção no Ricardo.

Isso mesmo. Semana passada, eu peguei um caminho diferente quando estava voltando do trabalho e passei por um casa com aparência antiga e parecida com as que vemos na Bahia. Era um bordel. Quando passei por lá, vi uma mulher de cabelos cor de mel debruçada numa larga janela, me olhando, e então ela sorriu pra mim como se me conhecesse. Virei o panfleto e vi que estava escrito no canto com caneta preta "convite especial". Em baixo, um sorrisinho desenhado e um nome: Angelie.

Com isso, pensei que a pessoa que me mandou o cartão sabia qual era o meu local de trabalho pelo uniforme que estava vestindo no dia que passei pelo bordel.

– Ah, então você gosta de puteiros? - Disse Ricardo, bem alto, sem a menor delicadeza possível.

– Shh! - Retruquei, surpreso. - Você é louco?! A gerente está bem perto de nós, se ainda não percebeu! - Eu estava sussurrando.

A gerente, Yoko, uma senhora descendente de japoneses, estava repassando umas ordens ao responsável pelos elevadores. Ela parou e nos olhou com reprovação, como gostava de fazer.

Quando percebemos, ambos estávamos prendendo o riso.

Como estava no fim do expediente, não demorou muito para que fôssemos para casa. Quando chegou o horário de ir embora, peguei minhas coisas no armário de funcionários, disse "até mais" aos outros do hotel, como sempre fazia, e saí pela porta giratória. Eu sempre fico preso nela por ser distraído, mas não fiquei dessa vez.

x-x-x

5 horas da manhã.

Hoje, por algum motivo, acordei cedo demais. Nem pássaros cantavam e quase não haviam carros na rua, exceto o meu, que deixo estacionado na frente de casa, já que não tenho garagem. Me levantei da cama e coloquei os pés no chão, ainda com os olhos fechados. De repente, senti falta dos dias em que estava desempregado. É uma completa irresponsabilidade, mas senti mesmo assim. Ou talvez não fosse bem de estar desempregado que eu sentia falta.

De qualquer forma, eu não preciso me preocupar com acordar cedo, já que o meu trabalho começa lá pelas 18:00. Levantei para fazer o café e liguei a TV, mesmo sabendo que estaria pensando em outras coisas enquanto assistia ao jornal.

Comecei então a pensar no convite que havia recebido ontem e fiquei com vontade de ir lá. Quero renovar meus dias. Quero muito. E se quero tanto mudar essa rotina, porquê não?

Fim do primeiro capítulo ♔ Continua...