Branco. E lá estava o branco outra vez. Mas dessa vez, não era brilhante como da última vez. Era um branco que estava em tudo à sua volta. Juliana abriu os olhos devagar, se acostumando à cálida claridade que invadia seus olhos. E mais uma vez, lá estava uma outra cor. Uma que ela sabia no seu intimo que deseja ver pelo resto de sua vida. Era azul. E então, o mar azul, cheio de emoções, que parecia transbordar dor, acabou parecendo agitado por uma enorme onda de felicidade. Alivio talvez, e carinho, sem sombra de duvidas.

– Gabriel?... – Ela chamou baixinho devido ao tempo sem usar a voz. Ele sorriu por entre as lágrimas que rodavam livremente por seus olhos.

– Não fale meu amor, não fale. – Ele pediu em um fio de voz enquanto a encarava como se não a visse a anos.

Juliana se perdeu por um minuto na analise que fazia de Gabriel. Ela tinha ouvido alguns sons mais cedo. Não que de fato ela pudesse distinguir o tempo, mas ela sentia que algumas pessoas já haviam passado por ali, a chamando vagamente de volta à sua realidade. Mas ela não queria vir. Na verdade, ela não sabia exatamente. Antes de ver os olhos de Gabriel outra vez, tudo parecia vazio. Ela se sentia em um daqueles sonhos em que se tenta acordar, mas no final, seu corpo parece não obedecer ao seu comando de desejo.

– Juliana, meu amor, você está me ouvindo ainda? Quer que eu chame uma enfermeira? – Gabriel se pronunciou outra vez, e sem saber o por que Juliana sentiu vontade de chorar junto com ele. – Meu amor, você está chorando? – Ele perguntou passando de triste para quase desesperado.

– O que foi que houve Gabriel? Por que é que eu sinto como se tudo estivesse perdido? – Ela usou de sua maior força de vontade para proferir aquelas palavras.

– Não diga isso, meu amor, vai ficar tudo bem. – Ele respondeu tentando acalmar a ela, tanto quanto a si mesmo.

– Como você pode ter certeza disso?

– Por que eu sinto meu amor, eu sinto. – Gabriel disse e Juliana sorriu. Sorriu divertida para ele, e ele lhe devolveu um sorriso. Um sorriso meio incerto e confuso, mas ainda assim, ele sorriu também. Se ela estava sorrindo, já era motivo o suficiente para fazê-lo querer sorrir também.

– Por que é que você está sorrindo meu amor? – Ele disse e ela riu ainda mais abertamente.

– Eu não poderia contar nos dedos quantas vezes você disse essa palavra hoje. – Ela disse e ele a respondeu com um sorriso ainda meio confuso.

– Que palavra meu amor?

– Amor. – Ela disse e ele sorriu. Sorriu em compreensão, e em puro embaraço também.

– Eu senti tanto medo... – Ele disse e ela sentiu que o tom descontraído estava se esvaindo outra vez daquela conversa.

– Eu não me lembro muito bem do que houve. Eu só sei que em um momento eu queria sumir, e no outro isso parecia ter mesmo acontecido. – Ela respondeu agora tendo pequenos vislumbres em flashes do que aconteceu naquela fatídica noite. – EM desculpe... – Ela pediu baixinho e ele a encarou em duvida.

– Pelo que Juliana?

– Por ter feito você passar por isso. Por ter te feito sentir medo, e sofrer...

– Não diga isso, por favor.

– Você me chama de amor, Gabriel, mas o amor não deveria machucar. Se te machuca, não é amor.

– Não é amor? Então o que mais seria? – Ele respondeu e Juliana se sentiu culpada por ver nos olhos daquele garoto, não mais o menino de antes, mas sim alguém que tinha crescido com a dor que gente grande sentia. – Por que eu não penso em nada além de amor. Nenhum outro sentimento poderia ser tão forte para fazer com que alguém se sentasse em frente a uma porta de hospital e pedisse a Deus para que não deixasse a pessoa do outro lado da porta morrer. Eu não conheço um sentimento além do amor, que seja capaz de fazer agente amar mais alguém do pensou que fosse possível. Um sentimento que faz agente pedir para trocar de lugar e sentir a dor que a outra pessoa estava sentindo. E eu pedi Juliana. Eu pedi sim, meu amor. Eu pedi a Deus, para que ele te curasse e que se fosse possível, entregasse para mim a sua dor. Ai eu saberia que você estaria bem, e depois daí, eu saberia, que tudo enfim, estaria bem.

– Como você pode dizer isso? – Juliana soluçou cada palavra como se cuspisse uma parte de seu coração junto com cada uma. – Como você pode pensar que tudo estaria bem sem você? Eu preferia sentir toda a dor que eu senti de novo Gabriel, ao ter que perder você, ou ao menos, ver você sofrer assim.

– Eu não conhecia o amor Juliana. Eu nem sabia se ele existia mesmo. Eu achava que beijos na boca e carinhos eram o mais próximo de amor que alguém como eu poderia conhecer. Mas ai eu conheci você, e descobri que quando agente gosta mais de uma pessoa do que de si mesmo, você está amando. E daí pra frente, é tudo ou nada. Um caminho sem volta. – Ele disse ainda sério e Juliana suspirou.

– Pois eu amo você mais do que a mim mesma, meu amor. – Ela disse com as lágrimas escorrendo seu pudor pelos seus olhos. – Eu te amo tanto, Gabriel, tanto, que quando eu pensei que morrer fosse uma boa opção, bastou encara seus olhos uma única vez, para eu ter certeza de que a morte não valia à pena. Não quando eu estaria condenada a nunca mais me ver dentro do seu olhar.

– O que agente faz agora tampinha, fala para mim? – Gabriel perguntou segurando firme na mão gelada da garota à sua frente.

– Acho que vamos ter que fazer um acordo. – Ela propôs e ele sorriu um pouquinho, só de ouvir no tom de voz dela, a determinação que havia antes.

– Me diga então, que acordo seria esse. –Ele pediu baixinho e ela assentiu. – Por que, o que você me disser, eu faço.

– Aceita o meu amor, e me deixa te dar o meu, pra gente poder compensar um no outro, aquilo que nós não temos. Faça da sua força a minha, e do meu foco o seu. Faça da sua vida, minha vida, e da minha vida, nossa realidade. Faça do seu coração o meu, e do meu coração, o seu. E prometa para mim, que se eu cair, você vai ficar de pé, para poder me puxar de volta para cima. – Juliana disse e o sorriso nos lábios de Gabriel poderia ser a ultima imagem que ela veria, e mesmo assim, ela saberia que teria sido feliz na vida.

– Você dizer uma frase dessas para um cara com TDAH é quase uma sacanagem, mas se você me disser que eu sou capaz de fazer isso Juliana, eu faço. Por mim, pelo meu coração, e por você. E por tudo aquilo que agente um dia vai ter junto. – Gabriel disse sorrindo mais largo e Juliana o acompanhou na risada.

– Você sabe que não vai ser fácil daqui pra frente não é? – Ela perguntou com preocupação aparente, e por incrível que pareça, o sorriso de Gabriel não se abalou.

– E que graça teria se fosse de outra forma? – Ele disse e como um sinal de acordo selado, ele depositou nos lábios de Juliana, um cálido beijo. E ela sorriu. Sorriu sabendo que o amor deles poderia sobreviver. Ambos sabiam que a estrada sinuosa pode conduzir ao melhor destino. E eles estavam dispostos a isso. Dispostos a caminhar. Juntos. Não em busca do pote de ouro no fim do arco iris, mas sim, em busca de belas paisagens pelo caminho. E o que estivesse no final, só assim teria valido à pena.