Kurohanayome - A Noiva de Negro escrita por Min Lunera


Capítulo 2
Dama Espadachim


Notas iniciais do capítulo

Olá novamente, leitores e leitoras! Aqui está o 2º capítulo de Kurohanayome como o prometido. Espero que gostem dele e comentem se possível, por favor. >.< Agradeço aos comentários do capítulo anterior, isso me deixa feliz de verdade por saber que há pessoas que gostaram. :3 Enfim, boa leitura. ~



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-Bom dia, lady Elizabeth. – escutei vagamente a voz de Paula e, logo em seguida, meus olhos foram agredidos pela luz de outro amanhecer vindo pela janela de cortinas recolhidas.

            Não quis responder. Virei para o lado oposto da cama e tampei o rosto com o braço: estava me sentindo mais cansada do que o normal e não era para menos, afinal a noite passada havia sido agitada.

            Entretanto, Paula não sabia disso e nem poderia saber. Ela caminhou para o lado que eu virei e disse gentil:

            -Senhorita Elizabeth, já está na hora de se levantar. Hoje o dia será cheio.

            “Eu não quero, estou me sentindo mal” eu tentei falar, porém o sono me emudeceu. De repente, tossi bruscamente. Ela pôs o dorso da mão em minha testa e perguntou com preocupação:

            -A senhorita está bem? – alguns segundos depois, concluiu: - Meu Deus, lady Elizabeth está em estado febril!

            Eu havia ficado doente. Maldito anjo que me arrastou pelo frio cortante! Deus me perdoasse por blasfemar contra uma criatura daquelas, porém Ciel estava certo: ele causaria muitos problemas agindo daquela forma.

            Após se convencerem de que eu realmente estava debilitada, mamãe e Paula se olharam e concordaram que deveriam me deixar de cama aquele dia. Internamente, fiquei feliz por não precisar sair com a família e visitar o velho barão que morava quase na saída de Londres – os filhos dele eram irritantes e, de acordo com algumas fontes, eles estavam me analisando para ver com qual dos três rapazes eu deveria me casar.

            “Apesar de que isso não irá mais me atingir...” eu pensei confiante, logo após saírem do quarto. Me levantei e caminhei até a janela para observar o jardim coberto por uma fina camada de neve e o céu nublado. “Ciel está de volta” eu sorri para o nada.

            Um bom tempo depois, quando terminei de ler o último livro que havia pegado na biblioteca, comecei a ficar entediada. Vesti meu roupão, amarrei o cabelo num desajeitado rabo de cavalo e saí do quarto com o livro embaixo do braço.

            Quando eu virei o corredor e avancei a mão na aldrava da porta da biblioteca, Paula passava por ali carregando uma bandeja com chá e biscoitos. Nós duas nos encaramos e, antes que ela me passasse um sermão por sair da cama, ergui o folheto:

            -Vim pegar outro. Já terminei de ler esse.

            -A senhorita lê bastante. – Paula sorriu. Continuou andando para meu quarto: - Deixarei a bandeja ao lado de sua cama. Cuidado para não se machucar e nem agravar seu estado de saúde.

            -Pode deixar. – eu respondi e entrei.

            Todos tinham medo que eu me machucasse naquele cômodo pelo fato de que eu tinha preferência em pegar os livros das prateleiras mais altas. Fazia isso porquê parecia que eles estavam abandonados ali. Porém, como aquele dia eu estava me sentindo tonta e fraca, me contentei com um pequeno livro de poesia de capa vermelha em uma das prateleiras baixas.

            Ao retornar para o quarto e entrar debaixo das cobertas, tomando cuidadosamente meu chá afim de não derrama-lo em meu leito, Paula bateu suavemente na porta e entrou após meu consentimento.

            -Sim? – eu perguntei a encarando.

            -Seu irmão está aqui. – ela sorriu.

            -Ah, pode deixar que já descerei. – fiz menção de me levantar da cama.

            -Mas, a senhorita não está se sentindo bem. – ela franziu as sobrancelhas e disse hesitante.

            -Não há com o que se preocupar, Paula. – eu a garanti, empurrando o cobertor com os pés e depois sentando na cama. – Não irei sair de dentro de casa hoje e não farei muito esforço físico. Aliás, obrigada pelo chá, estava uma delícia.

            Paula continuou me olhando de jeito apreensivo, porém cedeu e me ajudou a me vestir. Ela murmurou:

            -Que a marquesa não me arranque a cabeça por causa disso...

            -Calma, não somos franceses para ter guilhotinas em casa. – eu ri alto.

            -Lady Elizabeth... Hm... Isso não é arriscado? – a apreensão de minha dama de companhia era quase sólida.

            -Nem é. Edward não me machucaria... – eu sorri e voltei o olhar para ele com tom esnobe. – Nem se ele quisesse.

            -Sua humildade vem crescendo a cada dia que passa, hem Lizzy? – ele disse irônico e divertido.

            -Mas... Mas... E se os pais de vocês chegarem? – Paula perguntou insegura.

            -Quando eles vão para a casa do barão, geralmente voltam bem tarde. Ainda temos tempo. – Edward a garantiu. – Depois, Paula, fique tranquila. Quem levará advertência seremos nós dois e não você.

            Paula suspirou:

            -Tudo bem. – sentou-se no sofá e cruzou as pernas e braços.

            Quando soube que eu estava doente – através de mamãe, pois, coincidentemente, os tílburis dos dois cruzaram uma avenida que estava com o movimento congestionado devido a uma carroça capotada no meio da rua e conseguiram conversar um pouco -, Edward pediu ao cocheiro para trazê-lo até a minha casa. Após brincar comigo dizendo que isso era farsa minha apenas para não acompanhar a família, ele se revelou preocupado com a minha saúde.

            Então, após recordarmos que fazia tempo que havíamos disputado em esgrima – algo que ele mesmo me ensinou, embora meus pais desaprovassem isso para mim – e que eu havia melhorado meu desempenho sem a ajuda dele, fomos por isso à prova.

            -Paula, nos ajude para ver se ninguém está trapaceando. – eu a pedi.

            -Para ver se você não estará trapaceando, né? – Edward riu.

            -Podem deixar. – Paula respondeu.

            Após o sinal de minha dama tutora, começamos o duelo. Fiquei satisfeita em ver que aquele vestido sem pesadas armações e com a saia à altura de meus tornozelos não atrapalhava meus movimentos. Analisei os passos de meu adversário cautelosamente e consegui impedir que Edward me tocasse por duas vezes. Na terceira, me distraí e ele acertou meu pé levemente.

            -Touchét! – ele gritou.

            Encolhi e mirei minha espada no peito dele, o tocando e ele recuou após isso.

            -Touchét! – eu bradei.

            -Um a um. – Paula disse solenemente.

            -Por favor, eu a deixei fazer isso para não ficar tão mal. – Edward se justificou.

            -Não vem com essa, eu sei que você detesta admitir quando uma garota é melhor do que você em alguma coisa. – eu ri e continuei avançando sobre ele.

            Edward ficou na defensiva, dando pulos semelhantes aos de um cabrito montês. Por fim, o toquei novamente no ombro e gritei “touchét”. Ele me encarou atônito e eu me senti vitoriosa. Entretanto, a fadiga devido à gripe veio me esmorecer.

            -Apenas três toques, sim? – eu disse. – Já estou começando a cansar.

            Paula se demonstrou mais alerta quando eu falei aquilo.

            -Tudo bem. – meu irmão respondeu. – Entretanto, não pense que irei te deixar ganhar só porquê você está doente.

            -A doença não impede de eu demonstrar meu potencial. – eu franzi as sobrancelhas e voltei a lutar.

            Dessa vez, acabei vacilando um pouco enquanto ele se tornou mais ágil. Por fim, ele me golpeou no braço e seu “touchét” ecoou pelo meu cérebro.

            -Dois a um para Edward. – Paula falou.

            Fiquei na defensiva, erguendo a barra da saia do vestido para conseguir esquivar melhor dos golpes do meu irmão. A dificuldade para respirar crescia, porém não quis desistir.

            “Como eu poderia me entregar apenas pelo fato de estar doente...” pensei enquanto tentava atingir e esquivar dos golpes dele “... Sendo que Ciel precisa da minha ajuda mesmo quando eu estiver quase morta? Isso aqui é apenas um patético duelo de esgrima, Elizabeth, mostre seu potencial!” eu pensei enquanto, em minha mente, veio a imagem do anjo com o rosto de Charlie – o “Charlie” que desenhei em minha imaginação, afinal eu ainda não conhecia o mordomo pessoalmente.

Involuntariamente, aquilo acabou me dando forças: mudei meu modo de respirar e avancei contra Edward, soltando a barra do vestido. Reparei que ele deu um pequeno sorriso enquanto se defendia de meus golpes. Finalmente o toquei na barriga emitindo a palavra que sinalizava que o golpe foi realizado e, antes que Paula dissesse o placar, tentei golpeá-lo novamente, porém ele se desviou e mirou a espada em minha cintura. Recuei dando uma volta e agilmente o acertei na perna.

            O duelo estava encerrado. E eu venci.

            Ele me cumprimentou e disse risonho:

            -Que transformação, hem?

            -Bravo! Bravo! – Paula batia palmas e tenho certeza que a empolgação dela se devia mais ao término daquela “brincadeira perigosa” ao invés de minha vitória.

            -Como assim? – eu perguntei ofegante, retribuindo o cumprimento.

            -Antes de as coisas dificultarem, pareceu que você não lutava com interesse. Após correr o risco de perder, de repente se transformou em alguém totalmente entregue à luta. Se tivesse feito isso antes, teria me vencido com mais facilidade, maninha. – ele afagou minha cabeça. – Realmente, você melhorou bastante, parabéns.

            Eu corei e me inclinei ligeiramente:

            -Obrigada, irmão.

            Após Edward partir de volta para seu lar, pois era muito provável que Anna já estivesse retornando da casa de suas irmãs e sentiria falta do esposo, minha cabeça começou a latejar e fui deitar. Porém, estava tão extasiada com a disputa daquele dia e com as palavras de meu irmão que não consegui fechar os olhos: saber que meu potencial não era coisa de minha cabeça me deixava mais confiante.

            Durante aqueles anos que Ciel esteve exilado em seu universo paralelo, eu havia mudado bastante a minha personalidade. Admito que ainda chorava quando ficava muito nervosa e parecia uma criança de tão encantada quando me davam coisas belas e fofas, porém sabia me controlar melhor e tinha idéias mais claras do que eu queria. Parte da autoconfiança se deveu ao fato de reparar que ele deixou aquele anel sob meus cuidados. Isso significou que eu devia desenvolver a responsabilidade e firmeza necessária por nós dois e toda Inglaterra.

            Aonde quer que eu voltasse meus olhos para os cantos de meu aconchegante quarto, mantinha meu pequeno sorriso satisfeito e orgulhoso por mim mesma, me lembrando carinhosamente das palavras de meu irmão e de sua mão quentinha pousando sobre meu cabelo.

            -Eu não irei decepcionar. – pensei alto, roçando meus dedos no lençol da cama.

            Fiquei deitada assim até anoitecer. Embora mantivesse os olhos fechados o tempo todo, estava bem acordada. Por fim, escutei passos pelo corredor e abri lentamente um dos olhos até reparar que mamãe cruzou a porta de meu quarto e sentou-se ao meu lado.

            -Boa noite, querida. Como você está se sentindo? – ela deslizou os dedos macios em meu rosto.

            Eu segurei a mão dela com carinho e respondi:

            -Eu estou me sentindo melhor.

            -Que bom. Paula cuidou de você direitinho?

            Eu balancei a cabeça e ri:

            -Ela sempre faz isso.

            Nesse momento, Paula apareceu na porta . Minha mãe olhou para ela, ainda alisando meu rosto, e disse:

            -Você sempre faz um bom trabalho quando se trata de cuidar dela. Muito obrigada por tudo, Paula. Espero que Lizzy não tenha te dado trabalho. – ela brincou voltando os olhos para mim.

            Eu encarei Paula, que olhava para mim com uma expressão que eu traduzi como “Tirando a brincadeira de esgrima, nem deu trabalho, não é?”. Eu sorri para ela e ela retribuiu com esse mesmo gesto cordial. Respondeu a mamãe:

            -Cuidar de Elizabeth nunca foi algo trabalhoso.

            -O jantar já está pronto e quero que você se arrume para comer conosco também. – mamãe disse a mim.

            Eu estava me sentindo enfastiada, porém a obedeci prontamente. Foi difícil comer aquele dia, entretanto eu me forcei um pouquinho para consumir a metade do prato pelo menos. Enquanto isso, papai conversava com mamãe sobre as coisas que ele falou com o barão durante a estada deles na mansão do nobre. Por fim, voltou-se para mim e disse:

            -Acho que Elizabeth já está pronta para honrar a nossa família.

            Engasguei. Ergui os olhos para ele e, após tossir até sentir alívio, perguntei desnorteada:

            -Como assim?

            -O barão adora sua personalidade e pediu que sua mão fosse dada em casamento ao filho mais velho dele. Eu consenti e já estamos começando os preparativos para sua união com ele no final do próximo verão.

            -Casamento? Com o filho mais velho? – acabei me alterado sem querer, largando os talheres sobre a mesa e indignada. – Mas, papai, nós já conversamos a respeito disso!

            -Ah, pare, Lizzy. Casamento não é o fim do Mundo. – ele rolou os olhos com impaciência e bebeu um pouco de vinho.

            -Certo! Mas... – “o mais velho ainda por cima... Meu Deus, ele é o pior dos três irmãos!” eu pensei em completar a frase com isso, porém preferi dizer outra coisa, que foi emitida sem sucesso: – Ciel... – emudeci.

            Meus pais se olharam e depois voltaram seus olhares para mim. Eu abaixei a cabeça e olhei para o prato: fiquei em dúvida se devia informá-los que Ciel estava vivo. Apesar de que ele não estava devidamente vivo como humano, porém será que não poderíamos considerar que ele ainda vagava em nosso Mundo, pelo menos?

            -Elizabeth, sei que você foi quem mais sofreu com a morte dele... – mamãe tentava me consolar. – Porém, querida, isso já faz anos. Você está quase chegando à casa dos vinte anos e fica difícil arranjar matrimônio a partir dessa idade. Nós não queríamos fazer assim, mas...

            Reparei que meu pai tinha uma pose de impaciência. Ao reparar que mamãe queria rodear muito o assunto afim de não torna-lo assustador para mim, ele deu um soquinho na mesa e disse:

            -Frances, não tem conversa. Elizabeth se casará no final do próximo verão e já deve começar a preparar tudo o que for necessário para seu novo lar. Nesse meio tempo pode tentar conhecer melhor Richard e até criar empatia por ele. Como eu disse, não é o fim do Mundo.

            Não sei de onde veio tanta rebeldia em meu ser. Eu estava quase irracional naquele momento. Me levantei bruscamente da mesa e acabei derrubando a cadeira. Segurei a toalha de mesa com força e travei os dentes numa tentativa de emudecer um grito de inconformidade. Por fim, ergui a cabeça na direção de meu pai, o encarando friamente e disse obscuramente:

            -Isso que vamos ver. Porque eu sei que Ciel está vivo. – saí da sala de jantar, corri pela escada e bati a porta do quarto com força.

            Algumas horas depois, a vergonha e remorso vieram me visitar. Estava me sentindo péssima por ter me comportado como uma louca, porém não conseguia sair do canto onde me sentei – ao lado da janela – e encarar meu pai. Reparei na neve caindo suavemente pela janela.

            Do lado de fora, entre as passagens do jardim, reparei numa carruagem que chegava à entrada de nossa casa. Fiquei curiosa porquê aquele não era um horário comum para visitas noturnas. Continuei com as mãos apoiadas no vidro, quase tocando o nariz na vidraça e tentando identificar quem era a pessoa que saiu da diligência em meio à nevasca.

            A curiosidade foi maior que a vergonha e andei cuidadosamente até a ponta da escada para ver o movimento do andar térreo. Quando cheguei na metade da escadaria, avistei meu pai diante da porta e, diante dele, Sebastian sorria. Me encolhi nos degraus e observei os dois. Graças ao profundo silêncio, consegui escutar parte da conversa:

            -Boa noite, Marquês Middleford. Espero que eu não o esteja incomodando a essas horas da noite. – Sebastian se dirigiu a ele com sua famosa diplomacia.

            -Claro que não. – papai balbuciou. – O que o traz aqui a essas horas da noite?

            -Meu senhor acabou de voltar de uma longa viagem e perguntou se seria incômodo visitá-lo amanhã.

            -Viagem? – papai não pareceu acreditar. – Espere! Ciel não faleceu?

            Eu não compreendi direito qual foi a história criada pelo meu primo. Apenas sei que meu pai ficou muito surpreso e, no dia seguinte, ele e mamãe tinham expressões assombradas.

            -Lizzy... – mamãe me chamou num canto após o café da manhã. Meu pai tinha acabado de se dirigir ao escritório dele. – Você sabia que Ciel estava vivo esse tempo todo?

            Nos olhos dela havia um brilho de desconfiança. Omiti:

            -Não. Apenas deduzi. Também estou muito surpresa com o aparecimento dele. – eu fingi estar perplexa, torcendo que minha interpretação estivesse convincente.

            -Ah... – ela murmurou olhando para o chão. Depois voltou a me encarar e pediu: - Nunca esconda nada de mim, entendeu?

            -Sim, senhora. – eu sorri e balancei a cabeça.

            “Desculpe, mamãe...” lamentei internamente quando ela virou as costas e se afastou “... Mas, dessa vez terei que deixar de ser uma boa menina por uma causa maior, afinal não tem condições de te explicar tudo o que eu sei... Mais o que saberei em breve” sentei-me confortavelmente no sofá, com meu livro de poesia em mãos. Ler naquele momento seria uma ótima distração para não ver as horas passarem e Ciel chegar logo.


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Notas finais do capítulo

E aqui termina o 2º capítulo. Espero que tenham gostado. ^^ Até o próximo! o/



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