1: Beijo na testa: indica proteção, suporte, afeição.

“Eu estou aqui para você.”

A garota soluçava baixinho, escondida de tudo e todos num banco do lado de fora do prédio alto do concurso Pokémon. Ela tinha se esgueirado pela porta assim que conseguira, não parando nem para ver seu adversário comemorar a vitória.

May tinha perdido. Sua última chance de entrar para o Grande Festival escapara por entre os seus dedos, e logo para Harley de todas as pessoas.

Sempre conseguia sua última fita nas vésperas da competição, então o que tinha feito de errado dessa vez? Sentia-se cansada, traída e, principalmente, humilhada. Também, como não? Só faltara rirem da sua cara quando o relógio parou e anunciou sua derrota.

E agora, como eu vou olhar na cara dos outros? - Ela mordeu o lábio inferior, tentando controlar as lágrimas que caiam. Como vou voltar para casa assim, desse jeito?

Imaginou seu irmão, seus pais, seus amigos, seu rival - com um olhar de desapontamento enquanto ela tentava e tentava insistir que não fora sua culpa, que ela estava fora de si, que aquilo não tinha acontecido.

Mas tinha. E ela não iria para o Festival. Sua chance de ganhar, novamente, fora por água abaixo.

Uma viagem inteira por nada.

E, mediante a todos esses conflitos em sua cabeça, a jovem coordenadora nem percebeu a figura que tinha a seguido até que uma mão tocou-lhe o ombro.

Ela estremeceu, fugindo daquele toque como um seviper de um zangoose - reconheceria aquele cheiro de rosas em qualquer lugar.

- Me deixe em paz. - Murmurou com uma voz rouca e os olhos no chão. Pôde ouvir um suspiro baixo, seguido de um barulho de folhas amassando.

- May, olha para mim. - Ele pediu - o que era até estranho vindo de Drew, ele chegava a ser mais teimoso do que ela, tendo agachado ao seu nível.

- O que você quer? - A garota virou para o lado oposto, ainda teimando em não obedecê-lo. - Falar de como eu fui horrível na final? De como é humilhante perder para um garoto com roupa de cacto quando eu estava em vantagem no começo da partida?

Ela sentiu os olhos marejarem outra vez, e comprimiu-os, não deixando as lágrimas escaparem. Droga, isso não, sua mente gritou, não quero parecer uma fraca na frente dele!

Afinal, ele era seu rival... Só por isso mesmo. É.

A mão dele em seu rosto interrompeu seus pensamentos, e ela foi forçada a olhá-lo. Não encontrou com um sorriso mesquinho, e sim com orbes sérios, e... Era impressão, ou tinham uma ponta de preocupação neles?

- May, você não foi mal. Você foi ótima, para falar a verdade. Por que eu falaria algo assim para alguém que acabou de perder? - Inquiriu ele, mantendo sua posição.

Por que você é um idiota, ela quis falar. Um idiota, metido e que vai participar do Grande Festival.

A garota então se lembrou de que ele tinha ido até lá só para ver como ela estava e optou pelo silêncio. E tudo porque ela perdeu a maldita batalha.

Argh! Pare de pensar nisso!  Ela estava realmente ficando irritada com seu cérebro.

- E, além disso... - Drew levantou do chão, sentando-se ao lado dela no banco. Só aí que a garota percebeu a Roselia que espiava timidamente por trás das pernas dele e que ela devia estar com o rosto horrível - e agradeceu ao céu por já estar de noite.

- Eu também não consegui passar para o meu primeiro Grande Festival, sabe.

Isso era novidade. May olhou para o lado rapidamente, sua frustração com o rosto horrível e vergonha há tempos esquecida.  Limpou os olhos com uma das mãos, piscando com curiosidade.

- Você não passou?

- Não.

- Você?

- É, May, eu.

- Estamos falando do mesmo Drew?

- Dá pra parar?

Opa, ele estava irritado. A garota abriu um sorriso, colocando uma mão na boca para abafar o riso.

- Desculpa. Eu não consigo imaginar você perdendo tão feio assim. - Ele suspirou, mas sorriu em seguida também.

- O que eu posso dizer? Todos têm momentos ruins. - E jogou o cabelo para o lado, como habitual. - Pelo menos você está melhor agora.

May arregalou os olhos, um tom de vermelho leve tingindo suas maçãs do rosto. Ele tinha feito aquilo por ela? Lentamente, um sorriso pequeno abriu-se nos seus lábios delicados, e ela lhe dirigiu o olhar.

- Obrigada, Drew.

Ele corou; ou pelo menos pareceu corar, não deu para ver direito, virando para o lado oposto e fingindo olhar para o prédio.

- De nada. - Ele deu de ombros. - Não podia deixar minha rival desistir de tudo, seria sem graça.

- Como assim? - Ela fez um muxoxo. - Eu não vou para o Festival, Drew. Não tem mais nada do que “desistir”.

- Quando eu perdi a oportunidade de participar da primeira vez, eu fui para estudar. - O coordenador comentou. - Observar o jeito dos participantes, e tentar melhorar meus próprios defeitos. Também tive um tempo para treinar.

- Hmm... - May fitou o chão. - Talvez eu possa fazer isso.

- Podia aproveitar e ver as minhas apresentações, eu gostaria de ter outra fã torcendo por mim. - Continuou, jogando a franja para o lado. Ela bufou.

-Você não consegue ser legal por um minuto inteiro, não é? - Reclamou, irritada. Depois, suspirou. - Ah, que seja. Vou ver sua apresentação sim, mas só por que estarei lá. Nada mais!

- Tudo bem, tudo bem. - Ele riu um pouco, e só aí pareceu ter se lembrado de algo. Virou-se em direção de sua Roselia, que observava a conversa com curiosidade, e abaixou para cochichar em seu ouvido.

A Pokémon riu um pouquinho, aceitando o pedido do mestre. Em poucos segundos, ele tinha uma rosa nova e sem espinhos nas mãos.

Então é daí que ele tira as flores. Ela arqueou uma sobrancelha ao ver que a rosa vermelha era, de fato, para ela. Ela aceitou o presente um pouco hesitante, não sabendo o que dizer.

- Drew... É gentil de sua parte, mas... - Ela observou a flor de perto, rodopiando-a com os dedos. - Eu não acho que mereço um presente dessa vez.

- Por que não? - Ele cruzou ou braços. - May, você não precisa ganhar sempre para ter um bom desempenho. Você é a minha rival, não se rebaixe a esse ponto. - E bufou.

Ela sorriu outra vez, olhando para a flor vermelho sangue. Mais uma vez tentando animá-la, sem deixar de ser convencido. Típico.

 O que seria ela sem ele e suas rosas para mantê-la seguindo em frente, hein?

- Está melhor agora? - O coordenador perguntou, depois de um tempo.

- Um pouco. - Ela respondeu, limpando do rosto qualquer rastro de lágrimas que teria sobrado. Estava triste por não poder participar do Festival, claro, mas sabia que ficar insistindo em pensamentos ruins não iria mudar em nada sua situação.

Sentiu sua barriga roncar, e acrescentou, - Também estou com fome.

Ele a fitou por alguns segundos, e irrompeu em um suspiro. Levantou do banco, chamando sua Pokémon que o aguardava para a segurança de sua pokébola.

- Vamos, tem um café bom perto daqui.  - Ele estendeu uma mão para a jovem, surpresa com o gesto cavalheiro.

- É sério isso? - Quis saber ela, surpresa.

- Prefiro pagar para ver sua falta de modos comendo do que te ver se esgueirando para chorar em qualquer lugar por aí que nem uma desesperada outra vez.

- Humph. - May arfou, usando a mão estendida para se levantar. É, não tinha mesmo como ele ser gentil com alguém; aquilo de antes deveria ter sido uma ilusão ou algo assim, só isso. E já estava de pé, quando-

Quente. Uma sensação quente e agradável em sua testa.

E tão rápido quanto começou, terminou. 

Ela observou-o se afastar como se nada tivesse acontecido, levando uma das mãos à parte de sua testa em que sua pele pinicava. Ele tinha...?

Tinha acabado de...?

- Ei, você não vem não? - Ele virou-se já um pouco à frente, olhando-a com certa curiosidade.

Um vermelho vivo invadiu suas maçãs do rosto, assim como um sorriso pequeno. Ela assentiu, disparando numa corrida até ele, todas as tristezas do dia esquecidas e a rosa vermelha segura em suas mãos.

- Estou indo!

Talvez ter seus altos e baixos não fosse tão ruim, afinal.