Cárcere Das Almas escrita por Wendy


Capítulo 8
Capítulo 8 - And now the final frame




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Ela os fez tomar banho de bucha, vestir roupas antigas de seu pai e depois comer até não sentir mais fome. Estava com as mãos na cintura vigiando-os aconchegar-se no quarto de hóspedes, prometendo uma bela surra se não os visse em casa quando acordasse.

Explicou mais uma vez onde ficava o banheiro e que estavam livres para comer o que quisessem se prometessem procurar um emprego na manhã seguinte. Já que ela estava fazendo caridade, mas que cobraria mais tarde o investimento.

Os homens riram e concordaram com tudo. Disseram também que ela não precisava tomar a posição de suas mães porque já eram bem grandinhos e sabiam se cuidar.

- Ah, sabem. E como sabem... Boa noite e durmam com os anjos. – Disse apagando a luz.

Hatim e Oscar esperaram que ela se afastasse e puseram-se a fofocar sobre o destino que tomariam. Permanecer naquela casa com a órfã era uma boa oportunidade de voltar a ter uma vida digna, a pergunta que pairava sobre suas cabeças era: O que ela tinha a ganhar com a estada daqueles dois em sua casa?

- Será que ela quer mesmo lhe usar como disse ao lanterneiro? – Perguntou Hatim desconfiado – Se bem que não seria assim tão ruim, hein, Oscar? Ela até que é jeitosinha...

- Não comece com suas maldades. Ela só quer um pouco de companhia. É muito sozinha... – E bocejou.

Hatim preferiu permanecer calado. Virou de bruços e fechou os olhos. Espantou os pensamentos para longe de sua cabeça, aquela oportunidade era mesmo muito boa para desperdiçá-la e se Marie queria apenas que eles trabalhassem para pagar no que gastassem era isso que ia acontecer.

- Oscar. – chamou – Só mais uma coisa.

- O que é, Hatim?

- Devemos dizer a Marie que aquela garota que saiu da casa dela estava a vigiando?

O inglês calou-se por um segundo relembrando do momento em que a viram. A jovem morena ficou escondida atrás da mercearia e só saiu de lá quando o espetáculo acabou, segurando o vestido. Certamente morrendo de medo de ser vista por alguém.

- Acho melhor não. Talvez fosse como as outras pessoas e só estivesse achando estranha a atitude de Marie nos pôr para dentro de casa.

- Hum... Sei não. Mas não vamos fazer fofoca.

Enquanto isso Marie escrevia no seu diário, deitada na cama, imaginando o tal véu azul sobre sua cabeça. Naquela época chamavam aquilo de cama de dossel.

- Talvez seja bom para me proteger dos mosquitos. – Pensou alto.

Escreveu mais dois parágrafos falando sobre seu feito corajoso com o homem que queria recolher Oscar. “Ele me pareceu tão grato, tão feliz com as poucas roupas surradas de meu pai que até conseguiu me convencer de seu caráter.

Dormiu pensando que nem todos os homens eram de fato completamente ruins e que as mulheres estavam surpreendendo-a cada vez mais. Essa mania extravagante de Claire a... Perturbava? Intrigava. Mas que bom que mostrava suas opiniões sem delongas. Essa era uma característica de alguém de quem não vale a pena desconfiar. Sinceridade. Talvez fosse disso que precisava dali para frente.

Os encontros tornaram-se muito frequentes depois que Claire soube que Marie adotou, de certa maneira, os dois mendigos. A mulher não se reprimia ao expor seu ciúme, mas foi esperta quando resolveu parar de criticar a escolha da amiga. Já tinha avisado de todos os perigos – feito escândalo suficiente no primeiro dia – e mesmo assim Marie não voltava atrás.

Do dia da descoberta nada demasiadamente importante aconteceu. “A única coisa que vale recordar é da expressão facial de Claire ao dar-se conta da realidade.” – Escreveu Marie nas primeiras folhas do diário.

“Estávamos voltando para casa, ela estava decidida a me ensinar a posar de uma vez por todas. Disse que perdeu muito tempo falando no dia anterior e que a culpa também era minha por dar ouvidos a toda sua ladainha. Convidei-a para um chá para analisar com mais cuidado o papel com os tais argumentos revolucionários em casa.

Ter a presença de Oscar e Hatim dentro de casa já me era tão familiar que esqueci de comentar durante todo o dia. Lembrei-me apenas quando abri a porta e vi Oscar trepado num banco – vestindo apenas as calças – limpando as curvas de madeira da escada.

- Ah, oi, Marie. – Disse ele ruborizando, descendo da escada – Hatim foi ver se Manuel precisa de ajuda na padaria, tomei a liberdade em ajudá-la na limpeza... Não sabia que voltaria tão cedo do trabalho. Posso fazer alguma coisa para comer, se quiser.

- Não, não. Obrigada, Oscar. – Respondi – Pode parar de limpar isso, não é meu empregado e volto a dizer que vai pagar sua dívida comigo arrumando um emprego.

- Vou para o meu quarto. Deixarei as senhoritas à vontade. – Disse retirando-se rapidamente do recinto.

E foi aí, quando comecei a trancar a porta que percebi Claire parada. Ainda fitando o portal por onde ele havia passado. O queixo pendia ditando três centímetros da boca. Qualquer dentista ficaria arrepiado. Segurei o riso – estranho como isso me ocorre mais vezes quando estou na companhia dela – e respirei fundo, procurando palavras para explicar o que estava acontecendo.”

As moças sentaram-se na poltrona e dali não saíram até esclarecer o assunto. A morena negava-se a acreditar que Marie tinha feito tal loucura. Pois só poderia ser trabalho de uma embriagues muito forte, por dois homens desconhecidos dentro da própria casa.

- Você bebeu? Encheu os cornos de vinho quando saí daqui, foi isso? Deveria ter deixado o homem da carroça levá-los! – Exasperou.

- Claire! Um pouco mais de respeito, por favor.

- O que é? Aquele inglês vai aparecer aqui com meio quilo de pólvora para jogar na minha cara só porque estou falando mais alto? – e voltou a sentar-se no sofá.

Pegou as mãos de Marie e levou-as até o rosto, deitando as rosadas maçãs ali.

- Preocupo-me com você, querida. É muito inocente... Eles podem te roubar, violar sua intimidade! Deus que me perdoe se algo acontecer à você, não sei o que faço!

- Claire... Como pode? Nos conhecemos a pouco...

- Admiração! – Gritou Manuel adentrando a porta – É isso que tenho pela sua pessoa!

Mas antes que ela se perguntasse o que o padeiro estaria fazendo entrando em sua casa pode ver Hatim em seus calcanhares clamando por um pouco de silêncio e outras coisas que a etiqueta ensina.

- Sr Manuel? No que devo a inesperada visita? – Perguntou Marie retomando a ereta postura de pé.

- Esse rapaz veio me trazer uma notícia muito boa pela manhã. Adivinha só! Veio perguntar se eu precisava de ajuda na padaria! Se precisava de um carregador, um entregador... Qualquer dessas coisas. Contou-me sobre sua coragem e generosidade ao abrigar no seio de seu lar esses dois pobretões que não tem onde cair mortos.

- Alá há de guardar uma varanda bem grande no paraíso com muitas almofadas e uvas para Marie! – Comemorou Hatim.

- Oh, eu agradeço os elogios, mas não faço questão nem da varanda, das almofadas ou das uvas. Na verdade, prefiro morangos. E o que me diz? Vai tomar Hatim como aprendiz da padaria? Veio pessoalmente brindar-me com essa boa noticia?

O velho baixou os olhos até Claire, que era de mais baixa estatura, e estudou-a com cuidado. Mexeu nos bigodes e ajeitou os suspensórios, acomodando a enorme barriga redonda.

- Sim, sim. E avisar também que hoje mesmo pela manhã um enviado do rei perguntou se eu conhecia algum jovem que se dispusesse ao exército. Dei o nome de Oscar, já que Hatim trabalha comigo.

Ouve-se um barulho de vidro quebrando. Era o abajur da mesinha ao lado do portal. Oscar tinha acabado de chegar na sala e aparentemente não havia gostado da noticia.  


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