A Canção De Hohen escrita por MrMartins


Capítulo 13
Cidade Vazia - Parte VI


Notas iniciais do capítulo

Antes de mais nada, esse é o último dia do ano. Provavelmente quando vocês estiverem lendo já será 2013, então quero desejar um ótimo ano para todos vocês.
E é isso aí. Coisas aconteceram e o capítulo dessa semana foi escrito em tempo recorde. Sério. Foi assustador. Mas consegui e isso é o que conta.
Bem, é isso aí.



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“Disseram que era o Cavaleiro Negro”.

Não havia erro algum. Ela havia dito isso. Karl sentiu a cabeça latejar enquanto a ideia lhe corria a mente, lentamente assimilada. Poderia ter começado a rir ali mesmo, rido com vontade a gargalhada mais alta que conseguisse dar. Mas não o fez. Nos olhos da garota de onze, talvez doze, anos havia aquela luz escura, trêmula e desconcertantemente poderosa que ele já via visto tantas e tantas vezes.

Medo. Não o medo racionalizado ou nascido de convenções ou mesmo o medo repentino e pulsante. Era medo em sua forma bruta e pesada, medo instintivo e natural que só aparece no momento em que a certeza da morte é absoluta.

Ela não estava mentindo.

Karl despencou numa cadeira, esfregou com força o rosto. Talvez aquilo tudo desaparecesse se fizesse isso. Não. Nada. Ainda estavam lá a criança e a mulher.

Ele não estava num pesadelo.

A resposta natural era que aquilo era real, que o famigerado Cavaleiro Negro estivera ali.

“A resposta natural”.

Karl não segurou a risada.

— Tudo bem? — Hilde perguntou.

— Claro. Eu só estava pensando em como as coisas são engraçadas. Me diz, garota, sabe por quantos dias você ficou encolhida aí até nós dois chegarmos?

— Acho que… acho que quatro dias.

— Entendo. Encaixa perfeitamente.

— Do que você está falando? — disse Hilde.

Karl se levantou, caminhou até a janela daquele quarto, olhou por ela por alguns instantes e então baixou as persianas. Retirou do bolso um papel e uma caneta, começou a rabiscar algo enquanto se dirigia para a porta.

— Eu estava me perguntando como eles podiam saber que nós iríamos vir para cá já que eles não tinham como saber que tínhamos nos desviado no meio do caminho. Eu fiquei tão preso nisso que não considerei outra possibilidade.

— Outra possibilidade?

— É. Diga-me, Hilde, você já participou da caçada de algum animal muito grande e forte?

— Aonde você quer chegar?

Abaixando-se, Karl colou o papel inscrito na porta, levantou-se e começou a andar pelo quarto, olhando para todos os cantos.

— Quando se tem um inimigo que é muito difícil de derrubar e que sem dúvidas vai fugir do seu primeiro ataque, você faz uma armadilha. O caso é que muitas vezes tem caminhos demais que a presa poderia tomar e então você não sabe onde montar a armadilha. Aí entram as frentes falsas. Você posiciona algumas poucas unidades nas rotas que você quer eliminar da equação, nada muito grande, mas também não pequeno demais, para assim assustar a presa e fazê-la ir por outro lado. De vez em quando ela tenta atravessar pelas frentes falsas, mas quanto mais ela tem a perder, maior a tendência a evitar o risco. E então, no único caminho que resta, você coloca a armadilha. Tudo estava pronto desde o começo. Não houve mudanças no plano, não houve surpresas. Uma vitória certa. Soa familiar?

— O assassino…

— Frente falsa. Nosso inimigo queria que soubéssemos que ele estava atrás de nós e assim mudássemos de rota. E nós caímos.

Subitamente, Karl parou, olhou para um ponto no teto, uma grade, grande o suficiente para um adulto passar. Agarrou-a e começou a puxá-la.

— Eu estou com medo — Fjola falou entre gemidos.

Hilde acariciou o rosto da menina, levantou-lhe o rosto e sorriu-lhe.

— Já disse que vai ficar tudo bem. Confia em mim.

— Mas ele falou de inimigo…

— Falou. Mas agora que a gente sabe que ele está aqui, dá para lutar de volta. Não se preocupa, nós vamos te tirar daqui.

— Eu quero a minha mãe…

Pelas pequenas bochechas inchadas da menina escorreram lágrimas que Hilde não podia calar, tampouco podia ignorar os olhos a gritar e gemer ou o corpo que tremia com desesperada leveza. Nos pequenos gestos e trejeitos, na figura qual a de um pássaro de asas quebradas, brotavam ciprestes encurvados.

A mulher envolveu entre seus braços a criança, sentindo no peito o amargamente familiar peso das lágrimas de uma criança.

A tarde avançou, o crepúsculo se achegou. Enquanto em seu colo Fjola dormia, Hilde voltou sua atenção a Karl.

— O que você está fazendo? — ela perguntou.

— Você não estranhou que de toda uma cidade só uma garotinha tenha conseguido sobreviver?

— Ela estava escondida. E você mesmo falou que esse prédio era o mais seguro da cidade.

— Era mesmo. Mas ninguém está vivo, está? Nem o administrador. E é óbvio que mais pessoas tentaram se esconder. Só que não conseguiram. Mas a órfã solitária que qualquer um poderia ouvir chorando conseguiu.

— Era uma armadilha…

— Muito provavelmente. Eles sabiam que seria natural procurar por alguma coisa aqui e aí preparam tudo para sabe exatamente onde íamos estar.

— Mas se é assim, por que eles não atacaram ainda?

— Não demos chance. Eu lacrei a porta com uma magia. Se alguém tentar entrar vai morrer queimado. As janelas estão encobertas então eles não têm como ver de fora o que estamos fazendo. O quarto tem uma passagem no teto que dá direto para a manutenção. Deve ser usada para acesso de emergência. Provavelmente vigiada também. Estamos cercados.

— Queriam nos separar da Ellie e conseguiram. Já devíamos ter voltado faz horas. Acha que eles estão seguros?

— Difícil. A casa do Herman devia estar vigiada. Fora que podiam ter olheiros em lugares altos. A essa altura eles já devem ter sido atacados. Ou não. Talvez esperem até anoitecer e tentem pegar eles dormindo.

Nervoso, Karl andava de um lado para o outro. O tempo passava, o inimigo se movia, se preparava, logo iria atacar. Talvez Vance já tivesse chegado para dar suporte a Hart. Não. Ele já deveria ter sido atacado pelos melhores com ordens para ganhar tempo. É apenas natural que se elimine o fator mais perigoso da equação. Tudo estava planejado para eliminar qualquer possibilidade de ação.

A garota que dormia também. Um peso a mais, algo que forçaria os que caíssem na armadilha a lidar com mais um problema.

Mas tudo isso era óbvio. A pergunta também: como contra-atacar?

A noite enfim chegou e com ela os primeiros sons das batalhas. Estampidos, explosões. Havia duas frontes de enfrentamento. Quanto tempo até o terceiro surgir? Horas? Minutos? Segundos? Jogar com a tensão e expectativa, forçar o inimigo a ficar nervoso. Estratégias básicas. Eliminar conforto, comida, água. Também. Um cerco.

Um cerco.

Foi súbito.

Com um sorriso aberto e desafiador esticando sua face, o mago abaixou-se e começou a inscrever no chão uma série de fórmulas, uma intrincada rede de caracteres, traços e linhas, enquanto em seus braços se acendiam linhas azuis brilhantes.

— O que você está fazendo? — Hilde perguntou-o.

— Vão as duas para fora. Hora de nós virarmos esse jogo a nosso favor!


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo foi escrito enquanto eu ouvia Strategy (do OST de Fate/Zero) em loop. Exceto pela cena final, que acabou sendo escrita ao som de The Majestic Tale of a Madman in a Box (da trilha sonora da sexta temporada de Doctor Who). Foi uma experiência muito maneira.
Tentei focar o capítulo no Karl, mostrar como ele age, até para delinear as diferenças entre ele e o Hart. De certo modo, um deles é mestre no Indy Plot, enquanto o outro é o Chess Master (TVTropes. Deem uma olhada, é divertido).
As coisas estão se movendo rápido. Como disse, a coisa só vai piorar com o tempo. E digamos que a Cidade Vazia é pouco perto do que está por vir. Ooops... spoilers.
Nos vemos semana que vem.