Holocausto escrita por ashirogi


Capítulo 1
Luzes


Notas iniciais do capítulo

Não posso garantir que você vai gostar, mas posso te desejar uma boa leitura!



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Quando eu era criança, meu pai me levou até a margem do rio. Naquele dia, o vento movimentava calmamente a água, que quase parava de se mover. Ele recolheu uma pedra no chão e a jogou contra o rio, rodopiando. A pedra correu sobre água por alguns segundos, pulando algumas vezes, antes de afundar. Inclinou a cabeça e observou a paisagem. Algumas montanhas se desdobravam ao fundo, poucos quilômetros de água após a parte rasa. Estava meio frio e uma névoa fraca nos rondou. Meu pai expirou, fechando os olhos por alguns segundos. Falou-me sobre um sonho, o sonho de um homem. Disse que um dia chegaria. Mal posso dizer quão grandioso o dia ao qual esperávamos ansiosamente. Desejávamos alcançar a outra margem do rio, ver que surpresas encontraríamos por lá, ou talvez pelo caminho. Eu soube na mesma hora que tentariam me tirar este sonho. Eu precisava ser forte.

Alguns dias depois meu pai partiu, levando consigo uma parte de mim. Sua memória permaneceu fixamente no nascer do Sol naquela manhã de 44. Eu me senti só. Nada mais importava. Nenhuma palavra precisava ser dita. Pelo menos não por enquanto. Os homens se levantaram e se prepararam para a batalha. E o sonho... Eu não me esqueci.

Um piano toca uma melodia suave. Um coro entoa uma canção com vozes elevadas. Ela nos aquece e nos dá esperança. Os soldados marcham, cada lado carrega no peito a sua bandeira. Por trás dos olhos frios do soldado, um gigante se levanta e conduz a multidão para uma descoberta: o caminho que ela quer seguir é cheio de obstáculos, mas se suportados com vontade e perseverança enfim o homem poderá deixar cair o seu disfarce. Antes disso, somos apenas marionetes se equilibrando num pedaço de rocha, esperando um chamado.

Um grito ecoou por entre as montanhas. As pedras sentiram as vibrações e nossos pés começaram a tremer. O comandante pediu para sermos pacientes, mas cada gota de suor que caia na terra atiçava a pressão do chão contra os pés. Já mal podíamos caminhar quando os aviões sobrevoaram os céus e deixaram sua marca entre as nuvens.

"Lights! Turn on the sound effects! Action!", ouvimos. O triste nascer do Sol transmitiu o calor da confusão. A temperatura aumentou rapidamente. Não se ouvia o canto dos pássaros, nem mesmo o céu azul do amanhecer, ouvíamos apenas o piano acelerando os compassos da música.

Mal amanhecera e estávamos empilhados no meio de uma tarde quente, abaixo de um céu escuro coberto por centenas de nuvens cinzentas. Será que vai chover? Sim, gotas cairão. Tinta vermelha cobrirá a terra quando nossos corpos já estiverem virando pó. Quem irá pagar o preço de milhares de vidas comuns?

A seqüência de notas acelera, as teclas são batidas rapidamente. Uma orquestra completa o sentido da música e preenche os espaços vazios entre as notas tocadas pelo piano. As vozes fazem breves pausas antes de uma contínua expressão de desespero, um grito de socorro cantado. Estamos correndo, como se tivéssemos pulado alguma parte. As coisas ao redor acontecem de modo rápido. Soldados caem à nossa frente. Alguns estendem a mão, necessitam tocar em nossos pés. Não é hora de compaixão, precisamos cumprir o nosso dever. Por caso, perder a vida é uma obrigação?

Continuo correndo, velozmente, em direção ao exército inimigo. Prevejo onde ele tentará acertar e desvio dos disparos ainda na corrida. Posso pular rapidamente as cercas de arame farpado, e ainda consigo levantar a minha arma. A mira está balançando muito, a visão está meio embaçada, confusa. Entretanto alguns tiros bem disparados significam algumas vidas inúteis desperdiçadas. Quem se importa? No final, os corpos ainda estarão lá e seus nomes serão facilmente esquecidos.

O tiro de um tanque destrói o cenário no qual me encontro. Homens ao meu lado realizam o desejo do ser humano em geral e levantam vôo por uma pequena fração de segundo. Ninguém comemora, é hora de se conformar com o fim dos sonhos ou enlouquecer e morrer mais rápido.

Longe dali, onde a música não pode ser ouvida, o vapor sai de dentro de uma xícara de café cheia. Pessoas sentadas se olham, dão um pequeno gole em sua respectiva xícara e fazem breves comentários. “Homens morreram como bravos heróis, hoje. Seremos eternamente gratos a eles.” As pessoas disseram. Uma pena para elas, que não sabem de nada. Isto não é um jogo e nem mesmo uma história de heroísmo. Porque você acha que tem o direito de dizer isso sem ao menos estar lá? Sem ao menos presenciar a quantidade de cruzes que cortavam o céu naquele instante? Nesse caso, não sou herói, o que menos quero é a morte. Não fiz nada além de manter-me vivo até aqui, nada além de permanecer com a própria pele “limpa”, nada para merecer esse rótulo.

No mesmo momento sou jogado para longe, onde ainda posso ouvir a música e mais alguns milhares de ruídos e sons estranhos, incômodos. Me levanto e olho para minhas mãos. Estão cheias de sangue. A música cessa e o silêncio toma conta do campo de batalha. Encontro-me parado novamente, de olhos fechados. Sinto uma grande quantidade de corpos correndo ao meu redor. Todos caem. Tiro uma conclusão um tanto verdadeira: fomos deixados para trás. O resto das nossas tropas foi embora e nos deixou aqui morrendo.

Abro os olhos e vejo uma seqüência. As luzes, as marcas, a neve caindo e as bombas junto a ela. O chão se desintegra rapidamente, contorce-se e sobe em chamas - desafia as leis da gravidade -, causando um barulho ensurdecedor, mas eu não quero ouvi-lo. A terra firme vira areia em questão de segundos. O homem que faz uso da força alcança o que tanto almeja. Poder. E depois cai, só para ver a si mesmo arruinado.

“I'm unashamed, I'm gonna show my scar.” Eis uma frase que me lembrei na mesma hora. Saiu de uma das poucas músicas que ouvi durante o decorrer da minha vida e é tudo o que me vem à cabeça agora.

Falta pouco para estar caído, junto a meus fiéis companheiros. Chego a pensar na afirmação anterior, a qual me indignara há alguns segundos. Talvez sejamos mesmo heróis. É bom se sentir assim.

Em algum lugar alguém está escrevendo algo. Um pedido.

Por favor, leve consigo este sonho. Compartilhe-o com quem mais desejar. A esperança ainda é viva. O homem possui o verdadeiro poder, no qual se baseia este sonho, o poder que deveria ter sido usado em favor da paz nos grandiosos dias da guerra. A voz.

“O que você faz hoje pela liberdade?”


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Notas finais do capítulo

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