Era uma manhã de outono muito gelada, o sol queria mostrar seu poder, mas a nada aquecia, nem mesmo as minhas lembranças de um passado ruim. Estou em um país que não é meu, não conheço ninguém e a cada passo me sinto mais estranha, não me encaixo a este local. Fugi do meu país porque não aguentava a vida que eu supostamente tinha, não deveria chamar de "vida" algo tão ruim. Hoje tenho 14 anos e finalmente conquistei minha independência. Vim para Framlingham na esperança de descobrir o que é viver, porque até ontem, apenas sobrevivi. Já me matriculei em um colégio, o Thomas Mills High School, e espero que não me tratem como a "menina estranha", afinal, eu vivia isolada de tudo e todos nos meus cinco antigos colégios. Isso mesmo, cinco, fui expulsa de três por mau comportamento, e dois meu pai me tirou por livre e espontânea vontade, não quero entrar em detalhes do porque odeio tanto minha sobrevivência anterior, apenas queria apagar e enfim, viver.

Cheguei aqui em um domingo e hoje já é segunda, não queria perder tempo conhecendo a cidade, quero estudar, algo o qual não tive muita oportunidade, eu apenas tinha um caderno, já todo rabiscado, o qual usei na escola anterior, e tinha uma caneta e um lápis, somente isso, eu ainda ia ganhar meus livros. Coloquei a roupa mais bonita que eu tinha, para passar uma boa impressão, porém ela não era tão bonita assim, um shorts jeans muito desgastado, uma blusa xadrez vermelha, bem desbotada, e um tênis totalmente sujo, mas eu me sentia bonita, amarrei um rabo de cavalo alto, peguei meu caderno e fui andando. Morava a quatro quadras da escola, eu ainda não estava inscrita no ônibus escolar.

Esqueci de mencionar, que não moro sozinha, moro no quarto extra da casa de uma senhora, Mary Lane, de 54 anos, sem filhos, sem marido, parecia ter me adotado, nunca ninguém havia me tratado e me recebido tão bem quanto ela. Loira, com os cabelos já tingidos para esconder os brancos e olhos verdes, como eu queria ter nascido dela, sou tão comum, morena dos olhos castanhos escuros, os olhos verdes dela pareciam passar mais a alma do que os meus, aliás, eu buscava a minha alma, me sentia um vazio...

Chegando a Thomas, a escola, estava muito cheio, várias pessoas lindas e grupos de amigos, eu parecia a única sozinha, o ano letivo estava começando, poderiam ter pessoas novas que nem eu, eu me sentia melhor pensando assim.

Não parei para observar ninguém em especial, não gravei rostos e as pessoas pareciam muito iguais umas as outras, mas eu avistei um menino ruivo, sentado na escada principal da escola, tocando seu violão, conforme eu fui andando para a porta, pude reparar completamente tudo sobre esse menino. Parei um pouco para observa-lo e pessoas começaram a me empurrar. O som que ele fazia era limpo, fazia um bem para meus ouvidos. Ele olhou para mim, enquanto eu observada seus dedos tocarem o violão, quando reparei que ele me olhava, abaixei a cabeça e continuei andando.

Eu não fazia ideia de onde era meu armário, para pegar os livros, que de acordo a diretora, já estariam lá, eu olhava o pequeno pedaço de papel escrito "armário 287 B - senha 20079393", mas nada fazia entender onde era esse armário.

"Perdida?" - uma voz vinha atrás de mim.

Era o menino ruivo, com o violão pendurado nas costas, amostrei o papel para ele, sem nem lembrar que no mesmo havia a senha, ele não disse nada e me devolveu o papel, fez um sinal para que eu o seguisse, e gentilmente, ele me levou até o meu armário. Conferi o número e quando me virei para agradecê-lo, ele já havia ido embora. Ele me fez sentir algo que já estava perdido dentro de mim "esperança" de ser feliz.