Colecionadores De Segredos. escrita por Lioness


Capítulo 26
Capítulo 24


Notas iniciais do capítulo

Hey, hey! Sem muitas explicações, temos um longo capítulo pela frente.
DOIS ANOS DE FIC!!! YEEEY!!!! Quem diria, é clichê, mas parece que foi ontem!
Enfim, espero que gostem.



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“Sem saber exatamente o motivo, Ino confiava em Naruto. Ele emanava esse ar simpático de uma confiança segura. Talvez pelo seu jeito bobo. Então ela só podia confiar nele. O lobo “menos mau”.

Seu momento de reflexão não durou muito tempo. Apenas até seu celular tremer em sua mão. Olhou a tela de relance e o nome mãe brilhava no escuro.

Deveria, tinha e só podia confiar no loiro. Deixaria Sakura a seus cuidados e confiava que ele não iria deixar Sasuke fazer algo errado.

Apesar de não sentir suas mãos lavadas, apenas preocupações, bateu a porta sem fazer barulho."

Capítulo 24

Seu semblante preocupado desmanchou ao ver o pequeno amontoado que ela formava, emaranhada em lençóis, ressonando como um gatinho adormecido. Arquejou profundamente, aliviado, permitindo-se encostar-se ao batente da porta por alguns lentos segundos. Era como se um peso houvesse caído de suas costas e agora, depois de toda a adrenalina, ele finalmente se sentia cansado.

Escorreu os dedos cálidos pelos cabelos loiros em um afago calmo enquanto caminhava até ela, ainda fitando-a ligeiramente inerte, rindo de si mesmo com os lábios abobalhados rasgando o rosto. Agora todo aquele desespero começava a dar lugar a sensação cômica de estupidez que ele sentia entre o estomago e os pulmões. Cada fio macio que transpassava os vãos de seus dedos, cada passo silencioso de suas botas mediava os pensamentos de resolução que começavam a brotar em sua consciência, mas ele decidiu deixar essas reflexões chatas para depois. Agora, tudo que ele queria era olhar o rosto dela, checar sua respiração e garantir-se de que ela estaria realmente bem, tornando o que viu encostado àquele batente mais real, literalmente palpável.

No entanto, há certos pensamentos que são terrivelmente difíceis de afugentar – o que ele sabia amargamente bem.

Era uma distancia curta até a cama posicionada ao centro do quarto. Cerca de dez passos largos. Poucos segundos. Mas ele sentia aqueles segundos se desvanecerem entorpecidamente devagar, mórbidos, “Estão de sacanagem comigo” como ele julgava parecer. E, flutuando como uma pena entrecortando o ar, um comum “por quê?” insistia em cutucar seu cérebro com uma “Varetinha bem da afiada, viu?!” – novamente, em sua opinião.

Estava a cinco passos dela.

Seu braço esquerdo ainda arqueado em 45 graus erguia sua camisa de flanela dando abertura para que a brisa um tanto quanto quente entrasse por aquela brecha e fizesse a curva em suas costelas, alojando-se ali na espinha, arrepiando-o com seu toque cálido.

Por quê? Sem nenhum tom de ironia ou qualquer outro artifício de entonação que não seja a simples sinceridade.

Por quê?

Estava a três passos dela.

Seus dedos pararam de deslizar por sua cabeça e instintivamente fecharam-se em um grande tufo loiro, puxando-o sutilmente.

Por que todo aquele drama – que por sinal agora o acusava e o fazia sentir-se mais estúpido que o comum – por uma garota quase desconhecida? Por que afetava e incomodava tanto?

Crispou o cenho e o lábio.

“Deve ser porque somos amigos.” Concluiu mentalmente, do jeito mais simples possível. “E nós queremos ver nossos amigos bem. É, é por isso...”.

Ele sabia que isso era infantil e simplista até demais pra sua cabecinha. Mas como mencionado anteriormente, pensar não era o que ele queria agora, então se deu uma desculpa esfarrapada para que sua massa cinzenta se contentasse logo de uma vez, ao menos momentaneamente. Afinal, tinha a completa consciência de que logo, logo esses mesmos pensamentos iriam o confrontar mais uma vez – mesmo que fosse um saco.

Mas agora não havia mais passos que o distanciavam dela e Naruto se deu conta disso ao dar uma topada com a cama. A breve dor exasperada estampada em seu rosto logo foi esquecida por mais um novo sorriso afável e macio que ele soltou enquanto seus dedos se desprendiam vagarosamente de seus cabelos e seu braço despencava de rompante rente ao seu tronco.

Os orbes azuis cintilavam singelamente na penumbra. Ela dormia com mais da metade do pescoço fora do travesseiro – o que daria um futuro torcicolo por isso ele fez uma nota mental de consertar aquilo – em um sono pesado como chumbo que mais parecia um coma – mas não era, já que ele checou os sinais vitais dela assim que bateu os olhos – com a maioria do corpo coberto por um lençol.

Agachou-se até o nível da cama soltando um gemido abafado entre os dentes – os efeitos da briga estavam surgindo agora e, bom, depois um tempo suas costas também doeriam se levasse uma cadeirada nelas – e, quando se sentiu equilibrado sobre as pernas dobradas arregaçou as mangas da camisa de flanela, dispersando aquela expressão descontraída para uma dedicada e séria quando começou a examina-la. Cuidadosamente depositou as costas de sua mão sobre a testa cálida de Sakura. Uma febre baixa, bom sinal, seu corpo já estava se recuperando. Escorreu o dedo médio e indicador emparelhados até a jugular. A pulsação estava um pouco lenta, mas nada de preocupante. Apoiou a mão livre no colchão e sentiu algo lhe espetar. Franziu o cenho. No escuro viu a agulha da seringa resplandecer em um lampejo. Devia ser a seringa de glicose que Ino aplicara na garota. Pegou o objeto enquanto se erguia – com um novo gemido sofrido, diga-se de passagem – para tira-lo dali. Não sabia e nem queria saber de onde a colega havia arranjado uma seringa com glicose, era melhor deixar quieto. Depois de guardar o objeto, ele voltou para o lado da garota. Com toda a delicadeza e concentração que ele conseguiu reunir, encaixou seus dedos grosseiros no pescoço macio dela e o ajeitou sobre o travesseiro macio e gostoso. Afastou os cabelos róseos dos olhos cerrados e a cobriu melhor. Estava encurvado sobre ela e suas costas doíam como as de um velhinho – o que ele relutava em aceitar – mas se deixou levar quando as pontas de seus dedos terminaram de aninhá-la. A minguante luz da lua mantinha a penumbra aconchegante e o silencio como cúmplice. Um silêncio sorrateiramente amigável, sendo interrompido apenas pelo barulho de sua respiração nasal pesada e um tanto quanto ofegante, às vezes arfada pela boca. Os olhos azuis estavam hipnotizados. Compenetrados na maneira suave como ela respirava adormecida, em como os traços finos de seu corpo pareciam tão leves, tão serenos... Seus olhos não conseguiam não a admirar. Ela havia o pego e não tinha escapatória daquela genuína e lhana singeleza que emanava e isso o fazia engolir em seco na quietude da noite pálida, entre gritos de protestos de sua espinha e um coração batendo retraído sob sua caixa torácica.

Sorriu. Seus lábios se arquearam calmamente pelos cantos de sua boca e Naruto sorriu prazerosamente com todo aquele ar pacifico que recaia gentilmente sobre o quarto. Seus dedos se desapegaram dos lençóis lentamente e, em parte, ele compreendeu a resposta para o “por que” anterior.

Queria deitar ali, ao lado dela e quem sabe adormecer também, mas o bom senso falou mais alto e o fez se resignar a sentar numa poltrona próxima – todo esparramado, claro – para iniciar a espera pelo despertar da garota.

Naquele resto de noite ele cruzou as mãos sobre a barriga e pode ouvir um suspirado “Ah... Valeu, cara!” vindo de suas costas quando relaxou, sentado. Observou alguns detalhes do quarto, olhando inocentemente ao redor, reparando curioso numa senhora muito simpática e parecida com a garota em um porta-retratos, sem deixar suas rápidas olhadelas em Sakura ocasionalmente. Um pouco mais tarde, depois de brincar com alguns objetos que encontrou e quase quebrar outros, ela acordou para vomitar. Parecia confusa e perdida, contorcida em dor e ele logo se desesperou novamente. Se xingou depois de prometer trazer remédios sem fazer um pingo, um milimetrozinho de ideia de onde poderia encontrar naquele apartamento gigante, o que fez seus desespero aumentar para um nível alucinado de afã. Quando encontrou se pegou no meio do caminho de volta sem água. Praguejou novamente, dessa vez alto. Enfim com o copo e o remédio em mãos, foi mais uma vez impedido de prosseguir até o quarto dela porque, desta vez, se deparou com vozes exaltadas numa saleta que ainda não tinha reparado – mesmo passando por ela centenas de vezes. O que viu foi seu amigo Sasuke torturando Sakura com palavras. Crispou o cenho e a boca em exasperação, soltando pequenas exclamações sem som. Por um segundo se sentiu absorto, sem ser capaz de processar mais nada, sem entender mais nada. Surpreendeu Sasuke, que apesar de disfarçar, se sentiu pego em flagrante e surpreendeu ainda mais Sakura, dividido entre uma discussão com o amigo e explicações para a amiga. Já nem tinha mais coordenação motora para falar. Começou a trocar os assuntos com as pessoas resultando em indignações de Sakura e avisos de Sasuke que já estava fazendo tudo errado.

–- Ah, chega! – vociferou – Sakura-chan, toma – entregou o copo e a aspirina – Foi difícil pra caramba encontrar essa porcaria, então bebe para poder melhorar – percebeu que ela o encarava nervosa, se deu conta de que estava sendo um babaca – Por favor – terminou se esforçando na gentileza.

Virou-se para o amigo, sem medo de vociferar de novo.

–- E quanto a você, seu babaca idiota cretino filho da... – Sasuke franziu o cenho para ele, como se mandasse ter cuidado com o final dos adjetivos carinhosos – Vamos embora seu imbecil!

Deu breves explicações para Sakura – agora era a vez de ela ficar atônita diante aquela situação peculiar, ainda segurando o copo – e extensos pedidos de desculpas. Não esperou que ela o acompanhasse até a porta e acertou dois tapas fortes com as costas da mão no peito de Sasuke chamando-o para ir, virando-se rapidamente pelo batente da porta, deixando a saleta, Sakura e o piano. Pegou sua jaqueta na sala e, assim que deu o primeiro passo para fora do prédio suspirou envergonhado, com uma tremenda vontade de acertar seu punho bem cerrado com bastante força na cara daquele presunçoso amigo que caminhava bufando ao seu lado. Sua têmpora latejava. Seu coração batia rápido e meio apertado. Era isso que o fazia se incomodar tanto.

Mais tarde, enfim em seu dormitório no colégio – teve de dar boas explicações aos seguranças para poder entrar coberto de hematomas que afloravam – recostou sua cabeça no travesseiro, que não era tão macio como o dela, e depois de bufar pelas narinas fuzilando o teto com uma carranca engraçada ele desabou a gargalhar gostosamente de tudo que ocorrera. Recebeu um “cala a boca” fulminante de Sasuke, entretanto não conteve o riso. Deixou que o som ecoasse por todo o quarto até que os músculos de seu rosto começaram a pungir. Então se deu o gosto de deixar aquele sorriso de lábios finos pregado no canto da cara. Suspirou rapidamente enquanto encaixava um braço sob o travesseiro e o outro depositava sobre o peito desnudo, apertando a barra do cobertor, sentindo-o imergir e emergir conforme respirava. Apesar de tudo, das dores, das discussões, aquela noite havia lhe proporcionado boas memórias que agora revivia. Não mais fuzilava o teto e sim olhava. Olhava com seu coração pulsando estranho no peito enquanto todas as cenas revolviam por sua mente.

Aquilo incomodava um pouco. Aquelas batidas estranhas.

Mas ele estava cansado do dia turbulento. Suas pálpebras escorregavam pelos orbes celestes insistentemente, sutilmente trazendo um escuro sonolento. Sua boca estava cálida e úmida e ele sentia sua respiração desacelerar gradualmente até que então permitiu que o sono o acobertasse.

De qualquer maneira, Naruto não queria reviver aquelas cenas demais. Não queria deixa-las gastas, pois sabia que as melhores memórias, se vividas exageradamente, perderiam a deliciosa sensação de realidade e seriam esquecidas como réstia de duvidas sobre se realmente aconteceram ou se não passam de meros devaneios ilusórios.”

–------------- xx --------------

Sasuke estava lá, pressionando Sakura enquanto afundava em seus olhos, emergindo gradualmente das lembranças que não pôde evitar lembrar e do atrativo verde jade. Quando voltou a si ela o fitava fulminante, começando a se debater. Seu braço automaticamente a comprimiu mais contra a parede enquanto revivia a noite de sábado e devia estar a incomodando demais para ela relutar.

–-Me solta, Sasuke! – ela rosnou entredentes com veemência, se esforçando para se separar do braço dele.

Ele se desprendeu dos olhos dela e analisou a garota por completo. Estava corada e as narinas ainda bufavam. Os dentes bem cerrados e agora ela já não mais o encarava. Provavelmente havia a constrangido. Empurrava-o com uma força considerável, meio desconcertada. Ainda estava furiosa.

–-Pode parar de se debater. – ele disse finalmente, voltando a fuzilar com um aspecto de superioridade, atraindo toda a atenção dela com o rosto retorcido em cólera – Eu já vou te soltar, mas já que se deu o trabalho de invadir a ala masculina e atrapalhar minha leitura só para descontar sua raiva em mim eu vou te dar a minha resposta pra essas suas perguntas. – ele tentava manter todo o desdém e desaforo longe do tom de sua voz, queria manter a seriedade, mesmo que uma hora ou outra não conseguisse evitar – Eu te chamo de covarde porque você é uma covardezinha. Bem imatura por trás dessa pose toda de garota inteligente responsável sem mãe. Eu não tive família e posso te dizer que essa desculpinha medíocre que se dá por culpa da tua mãe é patética. Usa isso pra poder se perdoar por seus erros, por ter medo de crescer e por não querer crescer. Usa isso pra poder se perdoar por não tomar atitudes e arriscar. Por ser a fraquinha e cansativa que se vive se escondendo, acobertando o que faz. Aliás, você deve ser bem masoquista por que ama viver de seus medos. – notou os olhos marejados dela. À medida que as palavras surgiam sua indiferença contundente aumentava – É ridícula. Um estorvo. Dá pra julgar isso facilmente, só de ver algumas poucas vezes. Uma adolescente mimada típica e chorona. Admito que me diverti um pouco, te torturando, mas isso não é do meu feitio e não tenho paciência mais pra isso. – rolou os olhos exasperados para o canto dos olhos. Ela estava paralisada com o que ele disse, um pouco em choque, absorvendo tudo. Como ele a prendia, pode sentir a respiração dela diminuir, na tentativa de não chorar em sua frente. Soltou-a, escorrendo seus braços lentamente e colocando sua mão na maçaneta, olhando os lábios crispados dela de relance – É irritante – ela estava atônita, apoiando as palmas das mãos na parede atrás de si, como se isso a ajudasse a manter-se de pé, inteiramente vulnerável. Não teve coragem de continuar o fitando. “Fraca.” ele pensou – Agora, se me dá licença – as palavras saíam como sopro de seus lábios. Passou seu corpo para dentro do quarto. Seus dedos deslizavam pela maçaneta, a puxando consigo lentamente.

Quando a porta bateu atrás de si ele arquejou pela boca, esparramando o olhar por seu quarto languidamente. A mão ainda roçando no metal. Sentiu-se ligeiramente atônito, assimilando o que tinha dito. Seu coração voltou a bater sutilmente mais rápido e sua mente começou a trabalhar em pensamentos. Porém ele tratou logo de afasta-los e com a indolência habitual retomou sua leitura.

Entretanto, hora ou outra o que tinha dito voltava para perturba-lo e, ainda que reprovasse a si mesmo, no fundo estava curioso para ver qual seria o próximo passo da garota. Afinal, quando a deixou, escutou que ela precisou de alguns minutos para se recuperar e depois os passos dela ecoaram em seu ouvido até dissiparem-se pelo corredor.

Bem no fundo, num lugar inóspito de seu peito, a sensação de que a carapuça também lhe servia borbulhou durante a noite toda. Isso o fez displicentemente ler todo o livro e acabou insatisfeito com a historia. O levou ao refeitório em busca de um leite quente durante a madrugada – embora não acreditasse que esses métodos funcionassem com ele – e uma parada casual e despretensiosa num banco no caminho de volta. Apenas bebericou e deixou a caneca de lado, fumegando.

Olhava a lua.

–------------- xx --------------

Estava mal. Estava sentindo-se mal e ainda ligeiramente incrédula com as palavras impiedosamente sinceras que Sasuke havia lhe dito, ou melhor, que havia lhe jogado. A água quente do chuveiro espalhava-se sobre seu corpo nu, as gotas caindo pesadas sobre a carne de seu ombro como se quisessem perfura-la. Sua cabeça estava baixa, olhando o piso branco e antiderrapante, permitindo que a água criasse um viés para cada lado de seu corpo. Os curtos fios róseos não estavam completamente molhados e grudavam no contorno de seus olhos. Sakura suspirou. Uma parte de si ainda se perguntava com cólera – e, admitamos, um pouco de direito – quem era Sasuke para dizer, julga-la e acusa-la com tanto desplante. Ainda mais em sua própria casa. Mal conhecia o garoto! Tudo bem, Ino depois havia lhe explicado a situação toda e ela entendera o que eles estavam fazendo na sua casa, sabia que deveria ser grata a eles – apesar de alguns detalhes terem sido omitidos como o fato de Sasuke tê-la carregado e outros minimizados, como a preocupação ardente e obstinação de Naruto de cuidar dela e vê-la bem. Não queriam se vangloriar – e a própria Ino que ficara no pub pra acertar as contas da quebradeira, junto com Naruto – precisou dele como um incentivo a um acerto mais conveniente – só que agora tudo parecia tão intenso e rápido. Era incrível como os dois novatos apareceram em sua vida, como se não houvesse acabado de conhece-los, como se convivesse com eles há um ano. Ainda mais como Naruto...

O estomago dela se contorceu e ela involuntariamente corou ao pensar nele. Definitivamente, sua sensação – e tinha quase certeza que a dele também – era de que se eram amigos de longo prazo. A afinidade deles era incrível, a companhia um do outro era confortável e a maioria das vezes sentiam-se relaxados quando estavam com o outro. Porém, uma insegurança batia junto com um coração mais acelerado quando ambos pensavam um no outro ou quando a proximidade aumentava. Ela tentou imagina-lo ao seu lado no quarto, cuidando de si e esperando que ela acordasse. Sorriu sem perceber, abraçando-se. Como ele era desajeitado e bobo! Havia ficado um pouco incomodada com o jeito que ele saiu de sua casa, afinal, não estava entendendo absolutamente nada, entretanto, agora entendia. Apertou seus braços por sua cintura. Pensava em agradecê-lo, mas não tinha jeito de conversar com ele agora. Era profundamente grata, porém ao mesmo tempo não deixava de estar inquieta de vergonha. Bom, o que ela pareceria pra ele? Uma doida varrida, alcoólatra e com sérios problemas.

Isso a retomou ao que Sasuke disse. As palavras vinham e voltavam em sua mente, numa nuvem tortuosa e martirizante. Sentiu seu coração contrair, mas não por motivos agradáveis como quando era com Naruto. Sua outra parte, embora fosse duro de admitir, considerava com bastante atenção ao que escutara. O pior de tudo era que ela se sentia daquela forma. Covarde. Lastimavelmente medíocre, hipócrita. Certa repugnância de si mesma brotava em seu estomago. Sentia-se idiota. Sentia-se fraca. Cerrou os olhos bem apertados, deixando que as gotas do chuveiro formassem rastros por entre eles, escorrendo de seu rosto.

Não conseguiu respirar por dolorosos e mórbidos segundos. Tudo que conseguia enxergar era a raiva por si mesma que nascia e deleitava-se sadicamente dela.

Sentiu uma leve asfixia. Então botou a cabeça para fora da água e golfou ar euforicamente de sua boca, engasgando com o desespero, tossindo convulsivamente e depois inalando tão ofegante que mal saciava sua necessidade de oxigênio. Tossiu por mais um pouco, até conseguir estabilizar o chio do peito e controlar a convulsão.

Pensou em Gaara. Seus olhinhos verdes já lacrimejando pelo acesso de tosse derramaram mais algumas lágrimas. Sakura sentiu-se ainda mais idiota. Ergueu a cabeça e afagou vagarosamente os cabelos, sentindo dor e secura na garganta.

–-Onde será que ele está? E como ele está? – perguntou-se baixinho e melancólica, com um novo aperto no peito. Crispou os lábios e as sobrancelhas.

Quando saiu do banheiro encontrou suas amigas se preparando para dormir.

–-Está se sentindo bem, Sakura-san? – Hinata afavelmente lhe perguntou, estendo o cobertor.

–-Sim, sim, obrigada. – sorriu do mesmo jeito afável.

–-Encontrou Kakashi-sensei?

–-Não, acho que ele já devia ter saído.

–-Ah, eu te ajudo depois então!

–-Ok, obrigada. – estendeu a toalha perto da janela e ajeitou sua própria cama.

Ino, que estava sentada na cama escutando música, analisava a amiga com seriedade. Tirou os fones e se manifestou, interferindo:

–-Você demorou. – tinha um tom de desconfiança e uma sobrancelha arqueada.

–-É, eu demorei. – amava a amiga e sentia que devia muito a ela, sabia que não deveria trata-la com essa secura, mas não estava com muita paciência para o tom de desconfiança de Ino, mesmo sabendo que ela tinha o direito.

–-Por que...?

–-Por que eu quis dar uma volta. – rebateu insípida.

–-Tudo bem, então.

Ino a fuzilou com o olhar de “Ainda vamos ter a nossa conversinha, dona Sakura” que Sakura sabia ler muito bem. Era um olhar quase universal.

–-Tudo bem.

E Sakura rebateu o olhar com certo pedido de clemencia para a amiga.

–-Boa noite, Hinata.

–-Boa noite, Ino-san. Boa noite, Sakura-san.

–-Boa noite, Ino. – Sakura disse, ainda com o tom insípido.

–-Boa noite, Sakura. – a loira lhe respondeu, ainda com o tom de desconfiança.

Quando o silencio e o escuro se instalaram no quarto, alguns bons minutos depois, Sakura ainda não tinha conseguido cair no sono.

–-Ei... Ino-porca – chamou-a murmurando, rezando para que não acordasse Hinata. Não obteve sucesso – Ino. Ino! Ino! – tentava cada vez com mais força, transformando o murmúrio em uma voz rouca – Tá acordada, porca?!

–-Hmm...? – a loira finalmente respondeu, completamente sonolenta.

–-Eu te amo, viu porquinha? – apertou a barra do cobertor, deixando apenas os olhos de fora.

–-Eu sei disso, testuda. Tudo bem, eu também te amo, agora cala essa matraca e dorme. – virou-se, sem consciência plena do que tinha dito. Estava sonolenta demais.

Os lábios secos de Sakura se expandiram sutilmente. Era a melhor amiga que podia desejar.

Fechou os olhos.

–------------- xx --------------

Mais cedo, naquele crepúsculo de dia de semana ele caminhava lentamente a passos leves pela calçada, carregando sua pasta cheia de exercícios por corrigir que, volta e meia, trombava em suas pernas. O olhar pesado mesclado entre languidez e perturbação recaía sobre o horizonte. Estava cansado. Estava preocupado.

As pessoas que passavam por ele na ampla calçada podiam sentir um leve odor de sake exalado de sua camisa social branca. Algumas eram idosas fazendo caminhada, em geral eram adultos voltando para casa, outros eram jovens regressando da escola. Ele prosseguia caminhando despretensiosamente com os olhos no horizonte. Estava sendo um belo pôr-do-sol, agradável e ameno. Ainda havia uma réstia de luz por entre as nuvens, trazendo a harmonia do tom anil escuro com o alaranjado no céu. Sua respiração estava lenta e branda. Pena que seus pensamentos não.

Pela sua visão periférica conseguia ver a ponta dos seus mocassins aflorando em movimentos tortuosos, entretanto, o ritmo permanecia compassado. Seus ombros estavam relaxados e a visão levemente dúbia.

A visão de sua aluna mais cedo o afetou. Sakura não era comum e não dizia isso por ela ser inteligente ou qualquer outra característica do tipo. Estava claramente perturbada. Já havia notado que ela tinha seus momentos de introspecção e sabia por seu histórico sobre seus problemas psicológicos – embora aparentemente superados – e a perda da mãe. Como todos do colégio sabiam, embora Hisashi tentasse manter a imagem de integridade de sua pequena família, ele não era o melhor dos pais. No entanto, não parecia ser o caso. Naquele momento foi diferente. Ela parecia vazia. Não apenas triste, cabisbaixa, introspectiva ou qualquer outra coisa do gênero. Era mais grave. Era como se ela não estivesse ali. Sem emoções palpáveis como ela costumava ter já que seu gênio era bem forte, ao mesmo tempo, parecia conturbada, parecia estar com problemas que não fossem os levianos do cotidiano.

Devia ter falado com ela. Comentado qualquer coisa, a distraído mesmo que não fosse a solução. Era horrível vê-la naquele estado. Gostava dela. Era uma boa garota. Mas foi incapaz de ajudar e ele queria ajuda-la! Oh Deus...

Arquejou novamente.

Precisou de uma bebida casual para relaxar. Uma ou um pouco mais. Depois uma caminhada para espairecer. No meio do caminho decidira visitar uma velha amiga da qual via quase todos os dias da semana, porém perdera o contato. Estava quase chegando, faltavam poucos metros. Podia ver a casa dela apontando por dentre as outras. Isso o deu tempo para mais uma análise. Desde que os dois alunos novos chegaram Sakura pareceu mais agitada. Uzumaki Naruto e Uchiha Sasuke. Pigarreou. Sentia simpatia pelos dois, principalmente pelo primeiro, mas era coincidência demais que os fatos se dessem tão perto do outro. Eles também não eram alunos normais, por mais que tentassem. Kakashi sabia.

Ao parar de frente ao portão de ferro da casa sentiu uma breve latejada em sua cabeça. Teria de aulas com ressaca amanhã. Prestes a bater a campainha o professor escutou resmungos e reconheceu a voz enfraquecida e rouca.

–-Olá, Chiyo. – acenou com a mão livre meio cambaleante, sorrindo por baixo da máscara.

A senhora que regava as flores com a mão apoiada nas costas teve um sobressalto e se virou instantaneamente. Ao ver o colega de trabalho não pode evitar que a surpresa a envolvesse e arregalou os olhos.

–-Kakashi... – pensou alto, prontamente deixando o regador e se direcionando a ele – O que está fazendo aqui?! – exclamou irritadiça.

–-É sempre bom te ver fora do colégio também, Chiyo-baasan.

Ela o fitou, dos cabelos acinzentados aos mocassins, ainda surpresa. A reprovação começava a surgir.

–-Oh, me poupe seu cachorro branco! Diga logo o que quer, não está vendo que estou ocupada?!

Kakashi gargalhou brevemente.

–-Certo, certo. Eu só estou preocupado.

–-Com o que? – a senhora o fitava de soslaio, achando-o suspeito.

–-Sabe, eu só acho que as coisas estão interferindo demais na vida dela.

Chiyo arregalou os olhos e entreabriu a boca, sem conseguir dizer alguma coisa a primeiro instante por tamanha perplexidade.

–-Hatake Kakashi! – vociferou em voz baixa – Você não devia achar nada. Não devia nem comentar sobre isso.

–-Eu sei, Chiyo. Mas as coisas parecem estar tomando outros rumos. Está me preocupando.

A velha senhora desfez a carranca de cólera e teve de concordar com o professor.

–-Se continuar neste ritmo, então tudo estará fora do controle.

–-Se contar só a fará sofrer mais. Definitivamente não será bom pra ela. – sua voz, assim como seu semblante, tinha uma expressão apreensiva e igualmente preocupada.

–-Isso é o que mais me aflige. Compreendo perfeitamente a situação e estou tão sujo quanto os outros – suas palavras saíam trôpegas e embaraçadas – mas, em alguns momentos, penso que ela tem o direito de saber.

–-Eu te compreendo, Kakashi, mas isso é teoria. Em prática seria um desastre! Não estamos mexendo com brincadeiras. É muito sério. Só continue com seu trabalho, seu pulguento branco. E mantenha o segredo! – sua voz tomou um tom ameaçador – Não quero ter que enfrentar as consequências disso.

O professor afagou os cabelos entre um profundo suspiro. Mantenha o segredo. Estava ficando difícil. E ele não gostava nem um pouco daquela situação.

–-Sim, eu vou manter, Chiyo-baasan. Nem eu quero. Só vamos ser mais cautelosos, pelo bem dela e o nosso. – a senhora assentiu com a cabeça. Houve uma pausa. Kakashi arquejou – Boa noite, Chiyo-baasan.

–-Boa noite, Kakashi.

Então ele voltou a caminhar, possivelmente para algum bar e restaurante mais vazio, iria sentar-se, comer, beber mais um pouco e corrigir os exercícios. Talvez tivesse alguma diversão aquela noite, para distrair. Mas até lá, continuaria caminhando.

Seu olhar no horizonte.

–------------- xx --------------


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Notas finais do capítulo

Parcialmente revisado, qualquer erro me avisem por favor. Assim que termina a parte do Naruto - a primeira - eu retomo a parte em que Sakura confrontava Sasuke - que aconteceu no capítulo 22 - só explicando pra quem não entendeu. Sem dizer muitas coisas mais, espero mesmo que tenham gostado. Eu gostei desse capítulo. Por favor, por favor mesmo, não esqueçam os comentários. São de extrema importância.
As coisas vão começar a se esclarecer a partir de agora, hmm...
Até o próximo capítulo! E que a história termine antes de um terceiro aniversário!



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