Persona escrita por Bidinha


Capítulo 4
Capítulo 2 - Confusão


Notas iniciais do capítulo

Buhhh Buhhh.... Estou cansada... No próximo capítulo eu deixo uma nota...
Boa Leitura.



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Confusão

Grandes olhos castanhos e redondos, pele levemente corada aparentando uma textura macia, cabelos escuros e brilhantes repartidos de lado com algumas mechas caindo suavemente sobre o rosto, silhueta esguia e aquela expressão adoravelmente confusa. Ninguém podia negar que Alex tinha uma beleza impar, estando até mais bonito do que nas lembranças que Leonardo guardava. O problema é que não importava o quanto ele olhasse para Alex não conseguia deixar de ver uma criatura do sexo masculino. Não que ele fosse o ser mais másculo do mundo, mas com certeza havia um cromossomo Y em seu DNA.

_ ... Leonardo? _ Disse Alex depois de examinar o estranho que havia lhe chamado.

Leonardo não respondeu. Aliás, não fez nada. Não estava em condições de reagir à atual situação. Era como se seu cérebro fosse um computador com interface Windows 98, que no momento mais inoportuno de todos trava, te deixando apenas com seu desespero e uma maldita tela azul.

_ Leonardo é você mesmo? _ Repetiu Alex estranhando a falta de resposta.

_ A-Alex... Você.... _ Disse Leonardo ainda atordoado. _ ...Você é um cara!

Essa resposta não foi exatamente o que Alex esperava. Fitou Leonardo com um olhar perplexo, sem saber exatamente o significado de suas palavras.

_ Como assim eu sou cara? Espera, é você mesmo Leo? O Leo que morava no orfanato do convento? Mas... cara, eu não to entendendo nada!

Novamente nenhuma resposta veio de Leonardo, este apenas continuava a olhá-lo dos pés a cabeça, absolutamente atônito. Ao perceber o estranho “padrão” das respostas dadas por Leonardo a perplexidade sumiu de seu rosto, dando lugar à expressão de quem teve uma luz acesa em sua mente.

_ Ah não... Aaaah não! _ Alex levou as mãos ao rosto, parecendo meio frustrado e meio irritado. Soltou alguns palavrões enquanto baixava a cabeça. Depois a levantou rapidamente e fez menção de falar alguma coisa, mas pareceu mudar de idéia e novamente levou a mão ao rosto como que pensando no que iria falar.

_ Cara... Você ta me dizendo que não sabia que eu era homem?! _ Sussurrou Alex, parecendo bem irritado.

_ Como você queria que eu soubesse?! _ Replicou Leonardo finalmente recuperando a fala. _ Você tinha o cabelo até a cintura e era tão... tão... bonitinho...

_ NÃO DIZ QUE EU ERA BONITINHO!! _ Gritou chamando a atenção de todos os que estavam a sua volta. Percebendo o efeito de sua explosão, Alex ficou com o rosto completamente vermelho. Olhou nervosamente para os passantes o fitando com susto e interesse até que, do nada, segurou firmemente o pulso de um ainda desnorteado Leonardo, levando-o para uma parte menos tumultuada do pátio.

 _ Mas como você não sabia?! _ Sussurrou irritadamente enquanto ainda arrastava Leonardo por entre os alunos. _ Eu me lembro de você me chamando de “ele” e... você sabe, usar o pronome masculino!

_ Mas eu sempre achei que isso era uma coisa sua! Você sempre andava com os garotos e eu pensei que você era aquele tipo de menina que...

_ NÃO... me chame... de menina. _ Disse Alex terminando a frase de maneira sibilante e ameaçadora.

Aparentemente esse era um assunto muito sensível.

Chegando às proximidades da piscina esportiva, Alex pareceu satisfeito com a distancia que estavam do resto dos alunos. Brutalmente soltou o braço de Leonardo, colocou alguns paços de distância entre os dois e se virou para fitar o amigo de infância com os olhos faiscando de ódio. Seguiu-se então um momento de silêncio que foi extremamente constrangedor para Leonardo. Ele não ia falar nada? Será que ele estava esperando que ele falasse alguma coisa? Mas o que ele poderia dizer em uma situação como essa? “Desculpa por ter passado mais da metade da minha vida achando que você fosse uma garota”?

_ Então... _ Começou Alex enquanto massageava a têmpora em uma tentativa de acalmar a própria raiva. _ Você ainda não me respondeu nada direito dês de que essa “conversa” começou, mas já posso assumir que você é mesmo o Leonardo que morava no convento não?    

Leonardo acenou afirmativamente com a cabeça, ainda um pouco constrangido.

_ Puta que pariu...

_ Ei! Não faça como se eu fosse o culpado por isso! O seu nome já não ajuda e se você odeia tanto ser confundido porque não cortou o cabelo quando era criança?

_ Aquilo foi uma promessa!

_ ....Promessa?

_ Você sabe... Tipo... minha mãe têm uma deficiência no útero e por isso era muito difícil para ela ter um filho. Ela já tinha perdido dois antes de mim. Então, quando ela ficou grávida da terceira vez ela fez uma promessa para Nossa Senhora, mas... Sabe quando a mãe cisma em dizer que sabe o sexo do filho por causa do “instinto materno”? Então. Ela tinha certeza de que iria ter uma menina então prometeu deixar o meu cabelo crescer até os dez anos de idade. Ai eu nasci, ela ainda ficou meio indecisa, mas como achou que não seria legal mudar a promessa na ultima hora e muito menos queria deixar de pagar, ela cumpriu o que disse mesmo com eu e meu pai reclamando sobre isso todo santo dia.

Wow... Bem, a única coisa que Leonardo conseguia computar naquele momento é que esse fora um desfecho completamente inesperado para o seu primeiro amor.

_ Humm... Bem... Acho que agora ta explicado... _ E? E mais o que ele deveria falar? Pedir desculpas? Rir de tudo isso? Segundo as regras básicas da conversação agora era sua vez de falar alguma coisa, de preferência, uma frase completa para compensar as palavras soltas que ele tinha balbuciado até então, mas como ele poderia ter uma reação se todo aquele monte de informação ainda não havia sido digerido pelo seu cérebro?

_ Nesse caso acho que já estamos entendidos. _ Adiantou-se Alex, virando a cara de maneira não muito amigável. _ Vou indo para minha sala, o sinal deve tocar daqui a pouco.

E foi dizendo isso que Alex deu meia volta e foi em direção à entrada do colégio. Leonardo ainda pensou em fazer alguma coisa para impedi-lo _ o que quer que fosse _ dês de que não deixasse uma de suas maiores amizades e primeiro amor terminar de uma maneira tão confusa e idiota. Só que, o que ele poderia fazer? Tinha medo de piorar ainda mais a situação. Além do mais, Alex não parecia muito receptivo a um diálogo naquele momento. Pensando nisso Leonardo caminhou até os portões de entrada, dirigiu-se ao ponto de ônibus e pegou a primeira condução que o levasse para casa.

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Chegando a sua casa, Leonardo concluíra que, não é que os deuses do amor tivessem se esquecido dele, eles estavam é trollando sua existência. Não tinha outra explicação. Todos aqueles anos que ele passara sonhando com o dia em que finalmente reencontraria seu grande e primeiro amor terminaram em um desfecho tão tragicômico que só podia ser explicado por um suposto momento de monotonia do Destino que o levou a pregar uma peça em sua inocente alma romântica apenas por entretenimento. O desgraçado deve estar se curvando de rir agora.

A primeira coisa que Leonardo fez ao entrar no apartamento foi verificar se Igor estava em casa. Não estava. Ótimo, não queria ter que dar explicações para o irmão sobre o motivo de ele ter faltado logo no primeiro dia. Aliás, nem ele mesmo sabia exatamente o que estava fazendo ao tomar o caminho de volta para casa, apenas se lembrava de estar se sentindo completamente indisposto para ter aulas e socializar com novos colegas. Estaria ele exagerando? Não, ele se via com todo o direito de entra na crise emocional que fosse, afinal, tinha acabado de descobri que sua Alex era um... um...

Leonardo correu para o quarto, jogou a mochila sobre a cadeira da escrivaninha e se deitou em sua cama pesadamente, com a cara no travesseiro. Ainda não conseguia aceitar que passara oito anos de sua vida apaixonado por um homem. Um homem! Isso fazia dele gay? Não! Não podia ser. Alem do mais, ele tinha certeza de que Alex era uma mulher quando ele gostou dela, portanto, ele havia desejado a imagem de uma mulher. Então ele não gostava mais de Alex? É CLARO QUE NÃO!!! Se ele gostasse ai sim ele não poderia negar que era gay! Bem... nem tanto. Pelo que ele ainda se lembrava da imagem do Alex que ele vira na escola podia dizer que ele tinha certa beleza feminina, com seu porte esguio e traços suaves. Talvez gostar dele não fosse a coisa mais gay do mundo. E por que diabos ele estava pensando nisso?!

Afundando sua cabeça no travesseiro, soltou um grunhido de raiva. Não podia se permitir a continuar gostando de Alex, mas “desgostar” de alguém não é algo que se possa fazer de uma hora para a outra. Pelo menos era isso que um crente no amor como Leonardo pensava. Tal natureza tornava toda aquela questão algo ainda mais complicado. Se ele deixasse de amar Alex de uma hora para outra, o que seria de todo aquele sentimento que ele nutrira por tantos anos? Ele era assim tão superficial? Mas não era exatamente de uma hora para outra, ele tinha um bom motivo para deixar de gostar de Alex. Mas ai onde entra toda aquela história de um amor “puramente entre almas” que ele sempre defendera? Bem... quando ele falava sobre o assunto ele se referia apenas a possibilidade de amar outra pessoa sem se importar se ela era feia, bela, gorda ou magra... Ele nunca havia aplicado esse raciocínio para questões como sexualidade. Se o seu problema se resumisse à aparência física tudo seria muito mais fácil, pois era inegável o fato de que Alex era muito bonito então nem haveria problema... Chegando nesse ponto da reflexão Leonardo já não tinha certeza se ainda seguia por um raciocínio lógico ou se estava trocando as bolas. Tudo isso era tão complicado!

Levantou-se em um pulo e jogou o travesseiro no outro canto do quarto com violência. Frustração, raiva e medo borbulhavam dentro de seu corpo, impedindo que seus pensamentos se desenvolvessem em sua cabeça. Seus dedos se enterraram nos lençóis involuntariamente enquanto ele procurava alguma coisa que pudesse o ajudar a extravasar essas emoções. Não achou nada. Deu um soco na parede a sua direita. Tentou respirar. Procurou em sua cabeça qualquer outro pensamento que pudesse afastar de sua mente todos os acontecimentos daquela manhã. Não conseguiu ir muito longe do assunto e acabou parando nas lembranças de Alex. O orfanato. A Rua do Convento. Aquele cheiro verde e adocicado. Lentamente, Leonardo se virou de lado, levou os joelhos para junto do peito, os envolveu com os braços e voluntariamente se perdeu nessas lembranças.       

X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X

Quando o sinal tocou no Colégio FA, boa parte de seus alunos ainda estava conversando pelos corredores. Dentre eles, os alunos da turma 211 do 2º ano do ensino médio estavam especialmente barulhentos. Acontece que haviam anunciado a chegada de um novo aluno que deveria ter chegado no dia anterior. A chegada de alguém novo no meio do semestre já era por si só um assunto digno de muita fofoc... Digo, especulação sobre o colega, acrescentando a isso à ausência do dito cujo no dia definido para a sua aparição deixava as línguas dos jovens ainda mais ariscas.

Chegando a sala, o professor precisou agredir violentamente a pobre lousa, que não tinha nada a ver com a história, para conseguir a atenção da turma. Passou o olhar por sobre as cabeças dos alunos para verificar se não sobrara mais ninguém cochichando. Confirmando o silêncio, começou:

_ Muito bom dia senhoras em senhores, hoje teremos o prazer de receber um novo colega em nossa sal...

O professor não pode terminar a frase antes de ser interrompido por uma explosão de vozes que lutavam anarquicamente para chegar aos ouvidos de seus respectivos colegas. Um pouco atordoado pela reação inesperada, o professor teve que esmurrar a lousa mais algumas vezes para retomar o controle da turma. Depois de restabelecer o silêncio esperou alguns momentos, como se esperasse mais alguma reação exagerada da turma. Finalmente pigarreou.

_ Então como eu estava dizendo, hoje receberemos um novo colega em nossa sala. _ Ele andou em direção da porta enquanto seguido atentamente pelos olhares dos alunos. Abriu-a. _ Por favor, se não se importa de se apresentar em frente da turma. _Disse ele a alguém do outro lado porta.

Após esse pedido, o aluno novo entrou na sala, foi para o meio do tablado e se virou para turma. Ele era alto e tinha uma postura imponente, com o queixo levemente levantado, o que o dava certo ar aristocrático. Os cabelos eram loiros e lisos, divididos para o lado esquerdo e o rosto tinha traços finos, mas firmes e proporcionais.  Apenas o dorso do nariz que era um pouco mais longo que o ideal, mas junto ao resto da composição de seu rosto isso até que era elegante. Os olhos eram verdes e miravam o resto da turma sem medo, mesmo estando em uma posição tão temida por estudantes em geral. 

_ Bom dia, meu nome é Leonardo Targino. _ Disse em voz clara e firme. _ Eu estudava no Colégio Pentágono no Rio de Janeiro e me mudei para cá com o meu irmão que veio estudar na universidade. Espero que não esteja atrapalhando, chegando assim, do nada. _ Terminou a fala com um sorriso e foi procurar um lugar para se sentar.

Todo esse lance de chegar à frente da sala e falar para um grande grupo de pessoas não era nenhum tipo de desafio para Leonardo, já que ele fora por muitos anos um integrante do grupo de teatro de sua escola e, modéstia a parte, uma de suas maiores estrelas. Sem contar que ele até que gostava dos olhares admirados que caiam sobre ele enquanto se apresentava.  Sentia os olhos a sua volta acompanhando seus movimentos (especialmente os olhos das garotas) enquanto fazia seu caminho por meio das carteiras até um lugar vazio mais ou menos no meio da sala. Acomodou-se e foi logo abrindo a mochila, retirando o material e organizando-o na mesa. Enquanto fazia o movimento de se virar para a mochila e depois para a carteira, aproveitava para examinar os rostos a sua volta. Do tablado já pode ter uma idéia dos colegas que o acompanhariam pelo o ano, então se preocupou apenas em verificar quais deles estavam a sua volta. Isso e procurar mais uma vez por Alex.

Logo que entrou percebeu que o amigo de infância estava coincidentemente em sua sala. Talvez aquilo realmente fosse o destino. Não exatamente um destino bom ou ruim, mas destino de qualquer maneira. Viu que o outro sentava bem distante, na terceira fileira do lado extremo direito da sala. Diferente dos outros ele não se virava para examiná-lo. Pensando bem, parecia até um pouco tenso, com a postura ereta demais para um estudante em sala. De qualquer maneira, esse era um assunto que ele iria resolver em pouco tempo, mas não agora. Terminou de arrumar suas coisas na mesa a sua frente e levantou os olhos para o professor que, mais uma vez, lutava para conseguir a atenção da turma. 

X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X

Toca o sinal do intervalo. Imediatamente aqueles que se sentavam em volta de Leonardo voltaram-se em sua direção e tentam criar uma conversa. Leonardo tentava responder a todos o mais igualmente o possível, tomando cuidado para não ficar preso a uma única pessoa. Como já comentamos antes, o primeiro dia de aula é essencial para a formação da imagem que se vai ter no resto do ano letivo e ele não queria passar a impressão de ser negligente para ninguém.

_ Gente! Gente! Deixem o garoto novo respirar! _ Disse uma voz que surgia de traz do grupo cercando Leonardo.

Com o comando, algumas pessoas se deslocaram de seu lugar, permitindo que a dona da voz fosse vista. Era uma garota baixa, de cabelos negros e lisos que chegavam pouco abaixo dos ombros. Tinha a pele bem branca e rosto redondo. Não era especialmente bonita, mas os gestos doces e o sorriso amigável lhe acrescentavam certo charme.

_ Olá, meu nome é Raiane e eu sou a representante da turma. _ Disse sorridente, estendendo a mão para Leonardo. Sua boca se curvava de uma maneira diferente e adorável quando ela ria.     

_ Prazer, Leonardo. _ Retribuiu apertando a mão da garota e sorrindo de volta.

_ Como você chegou ao meio do semestre acho que não deve ter participado da apresentação da escola do começo do ano. Se quiser eu posso te mostrar algumas partes do colégio e os lugares que serão mais importantes para você nesse próximo ano que você passará aqui. 

Cristo! Como ela era formal!

_ Eeeeei! O que é isso! _ Uma das garotas que se encontrava entre o grupo que tentavam conversar com Leonardo levantou e se dirigiu à Raiane um pouco provocativa, um pouco brincalhona. _ Mal o garoto chega e você já vem querendo monopolizar ele? O que é que o Abel vai pensar disso?!

_ Laura! _ Gritou Raiane como quem repreende uma criança mais nova. Elas pareciam ser amigas.

_ Me desculpe, mas eu não posso permitir esse tipo de comportamento obsceno vindo da representante da turma. O que é que os outros vão achar da gente se até a representante ficar agindo desse jeito? Não, eu não posso permitir isso! Só porque o Abel faltou! Que absurdo! Pelo bem dele e de toda a nossa turma eu vou ter que acompanhar vocês para ter certeza de que você não vai tenta abusar da inocência do aluno novo.

As pessoas em volta riam da atuação dramática de Laura enquanto Raiane a olhava com uma expressão de reprovação que a deixava dez anos mais velha. Aproveitando que não era mais o centro das atenções, Leonardo se virou em sua carteira tentando procurar por Alex, mas como era de se imaginar, ele já havia saído de sala. Nesse momento, não fazia muita diferença. Pelo rumo que tomara a conversa tinha ficado certo que, querendo ou não, Leonardo teria a escola apresentada para ele.

Quando se deram conta, o que deveria ter sido Raiane apresentando a escola para Leonardo virou uma verdadeira excursão que contava com quase um terço da turma. A representante parecia mais uma professora tentando controlar um grupo de alunos do primário. Embora a grande maioria estivesse mais interessada em saber da vida de Leonardo do que apresentar a escola para o calouro, ele ainda conseguiu captar algumas das palavras que Raiane gritava em sua direção por cima das cabeças dos alunos, como a localização da cantina e as escadas que levavam à quadra coberta. O que mais pareceu chamar a atenção de seus colegas foi o fato de que ele nascera na cidade. Depois do grande momento de comoção gerado especialmente entre as meninas ao revelar que era filho adotado, o tour pela escola se tornara tour de procura pelos antigos colegas de Leonardo.

Pela informação que obtivera de Ana Júlia há dias atrás, Débora e Teobaldo estavam estudando ali. Não foi difícil de achá-los, estavam juntos como sempre. Débora estava muito diferente, bem maior, um pouco mais gorda e não usava mais as suas características trancinhas, deixando seus cabelos negros soltos por cima dos ombros. Enquanto isso Teobaldo ainda tinha a mesma cara de um filho da puta que é ruim por dentro, com os cabelos muito pretos e finos escorridos pela sua pele morena e os olhos sempre meio serrados em uma expressão de desconfiança. O que mudou foi sua reação ao ser chamado pelo seu odiado primeiro nome. Ele apenas arqueou as sobrancelhas.

_ Por um minuto pensei que você parecia tão mais velho, mas parece que a sua idade mental não progrediu muito.

O ódio que ardeu dentro do peito de Leo foi quase que nostálgico.

Mal terminara de se despedir dos velhos amigos, Leonardo foi logo sendo atacado por novas perguntas sobre seus conhecidos dos tempos do orfanato. Estrategicamente, omitiu informações sobre Alex. Não porque seria complicado explicar qual o tipo de relação que eles tinham (Tá... Um pouco por causa disso também.), mas porque ele não queria ser arrastado para ter sua conversa com ele naquele momento. Não era a hora e muito menos a situação ideal para aquilo. Na noite passada Leonardo finalmente conseguira esfriar a cabeça e pensou seriamente sobre o que Alex era para ele e nas consequências que isso poderia levar. Dessa vez estava preparado para ter uma conversa de verdade com Alex e ele teria essa conversa ainda hoje. Talvez não naquele exato momento, mas tinha que ser hoje.  

X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X

Hora da saída. Novamente os alunos sentados em volta de Leonardo tentam puxar conversa, só que dessa vez, ele já estava preparado. Tinha arrumado o material dez minutos atrás e mal o professor concedeu a permissão para a turma sair Leonardo já se levantava de sua carteira.

_ Desculpa gente, é que eu fiquei de entregar uns papeis para o meu irmão depois da aula e se eu chegar atrasado ele me mata!

Disse isso e saiu quase que correndo para fora da escola. No pátio, desacelerou o paço e observou os rostos a sua volta. Parecia que ele era o único de sua turma naquele lugar. Deu meia volta e caminhou vagarosamente até a máquina de refrigerantes ao lado do portão que dava acesso ao prédio da escola. Chegando lá olhou discretamente para as pessoas que saiam afobadas pelo portão. Já reconhecia alguns rostos. Pegou uma nota de dois reais do bolso e a alisou cuidadosamente para que pudesse ser aceita pela maquina, isso sem perder de vista os rostos que passavam na periferia de seu olhar. Quando estava pronto para inserir a nota, ele apareceu.

_ Alex! _ Gritou instintivamente enquanto se virava em direção ao outro garoto.

Alex parou imediatamente, como se tivesse tomado um susto. Não um susto de surpresa, mas de antecipação. Ele sabia que Leonardo ainda iria querer falar com ele. As pessoas que acompanhavam Alex até a porta _ aparentemente seus amigos _ viraram-se rapidamente e examinaram Leonardo com curiosidade. O que será que o cara novo queria? Mais lentamente, Alex também se virou e mirou Leonardo de maneira nervosa.  

_ Ok, vejamos... _ Leonardo cruzou os braços enquanto buscava as palavras certas. Vamos Leonardo! Você consegue! _ A nossa conversa ontem não foi lá muito boa e eu admito que agi como um completo retardado no momento. Se você não se importar eu gostaria de tentar explicar o que houve ontem com... melhores palavras.

Os colegas de Alex corriam os olhos entre ele e Leonardo. Estavam curiosíssimos para saber sobre o que os dois falavam, mas não sabiam como perguntar. Alex, por sua vez, ficou quieto uns instantes até que se virou para os garotos que o acompanhavam e disse: _ Olha, isso aqui pode levar um tempinho, acho melhor vocês irem sem mim.

Contrariados, os garotos que acompanhavam Alex se retiraram. Leonardo não tinha certeza se isso era bom ou ruim. Deveria ser bom, já que imaginara sua conversa com o velho amigo só com os dois, mas agora que tudo acontecia na vida real e não no universo de suas suposições, isso o deixava nervoso.  

_ Muito bem... _ Leonardo preparou-se. _ Primeiro, desculpa por ter dado uma de imbecil ontem, digamos que aquilo foi um choque para mim e na hora eu não estava pensando direito. Em segundo, me desculpe por toda a confusão que eu fiz. Sério, parece que esse é um assunto meio complicado seu e eu tropecei feio em cima dele. Se ajudar em alguma coisa saiba que mesmo achando que você era uma menina, você sempre que foi meio que um menino, se é que me entende...

_ Ah... Esquece isso. _ Disse Alex sem olhar diretamente para Leonardo. Tinha um braço cruzado sobre o peito de maneira defensiva e estava claramente acanhado com a situação. _ Como você mesmo disse não é sua culpa que você tenha se confundido. É que coisas do tipo já aconteceram comigo tantas vezes quando eu era mais novo que eu fiquei meio que com um trauma... Acho que eu também tinha que pedir desculpa por gritar com você daquele jeito.

Até que aquilo estava indo melhor do que Leonardo esperava. Por algum motivo, perceber que Alex também estava nervoso fazia com que ele se sentisse mais confiante. _ Nesse caso o que você acha da gente deletar tudo o que aconteceu ontem e começar isso de um outro jeito? É que aquele foi um jeito tão chato de dois amigos de infância se reencontrar.    

_ É, realmente... E bem que eu achei muito legar ter encontrado você de novo. Se não fosse tudo aquilo acho que eu teria dito isso logo de cara.

Alex sorriu. Um sorriso meio envergonhado, com as maçãs do rosto meio vermelhas enquanto ele coçava a parte de traz da cabeça apenas por não saber o que fazer com as mãos. Ele estava tão adorável que Leonardo chegou a pensar por um segundo sobre como ele poderia ter cogitado abrir mão de uma história de amor tão linda quanto a deles por causa de uma besteira ou outra. Está bem, agora ainda não era uma história de amor, ele acabara de receber sinal verde para uma amizade e nada mais que isso, mas todo bom romântico sabe que não se deve ir se declarando logo de cara. Você tem que arrumar as coisas, aproveitar cada momento daquela doce ambigüidade que é o jogo da conquista onde ninguém sabe direito a intenção do outro. Bem que o caso dos dois exigia ainda mais cautela. Confessemos, declarar para um amigo de infância que você não vê há anos que você gosta dele dês de sempre e da maneira mais pura, completa e gay o possível não costuma dar certo. Leonardo sabia disso e sabia que para conseguir Alex ele teria que ter cuidado, mas ele conseguiria. Com certeza. Porque Alex era o amor de sua vida e se o que Leonardo sentia em seu peito não era o mais puro e genuíno sentimento de empatia que só pode ser trabalho do destino, então ele não sabia de nada sobre amor.     


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