In Love With Her escrita por naty


Capítulo 38
Revelações


Notas iniciais do capítulo

Queridxs, primeiro eu quero agradecer pelos comentários, eles significam demais pra mim! ONG a todos que comentam, valeu pelo carrinho
E em segundo lugar, eu quero pedir desculpas por não estar respondendo aos comentários. Tenho postado pelo celular e responder por aqui é um saco! Mas prometo que respondo todo mundo na primeira oportunidade que tiver.
Beijos e boa leitura!



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EDUARDA

 

Você já teve a sensação de que quando você deve fazer uma coisa, mas não quer, essa coisa te persegue?

Bem, eu me senti exatamente assim quando o meu celular tocou na tarde de segunda-feira. Era a Karina.

Não atendi. Será que ela sabia que eu havia descoberto algo?

Não era provável, mas eu não queria pagar para ver. Desde sábado, eu estava tentando me preparar para a conversa que teria com a minha irmã. Só não tinha ideia de como faria isso.

 

Droga, Eduarda! Da próxima vez que mandarem deixar as coisas como estão, você deixa as coisas como estão.

 

Karina era insistente pra burro! O celular não parava de tocar, mas se ela era teimosa, eu era mais.

Saí do quarto, deixando o aparelho sobre a cama, e fui para a cozinha procurar algo para comer. Não tinha almoçado, mas agora estava com fome, e a parte boa era que não havia nada na geladeira que eu soubesse preparar.

Jéssica tinha dormido na casa da vovó, a sortuda já estava de férias. Como só teria eu em casa, falei com a minha mãe que não precisava se preocupar com meu almoço, eu me virava.

Depois de analisar tudo ali, fui até o armário, onde encontrei um pacote de biscoitos, e fiz deles a minha refeição, acompanhados de um copo de suco de laranja.

Não tinha nada para fazer em casa, ou seja, fui jogar videogame. Estava jogando Street Fighter no meu Nintendo quando algum apressadinho tocou a campainha várias vezes seguidas.

Dei pausa no meu jogo, me levantei de má vontade e fui ver quem era.

Qual não foi a minha surpresa ao ver, parada ali no portão, ninguém menos que Karina, com uma expressão nada satisfeita no rosto.

Pelo visto, não era só impressão: as coisas que não queremos fazer realmente nos perseguem!

Não trocamos nenhuma palavra até ela estar acomodada no sofá e me pedir um copo com água.

Eu admito, estava com medo de falar com ela.

— Aqui – entreguei-lhe o copo, e ela bebeu tudo de uma só vez – Mais?

— Não, obrigada

— Então… - tentei iniciar uma conversa, mas ela foi mais rápida

— O papai sabe que eu estou na cidade – não era aquilo que eu esperava que ela dissesse, mas era igualmente assustador

— O quê? Como? – perguntei, espantada

— Eu comecei a trabalhar em uma agência de publicidade lá do Centro e estava almoçando em um restaurante quando ele entrou com mais dois homens, provavelmente colegas de trabalho dele. Tentei sair dali antes que ele me visse, mas ele me reconheceu

— Mas ele nunca te viu depois que você fez a transição, como pode ter te reconhecido?

— Eu não sei, Duda. Mas ele veio até onde eu estava e… E eu tenho que sair de Belo Horizonte, o mais rápido possível.

— O quê? Não! Você não pode ir embora de novo! – falei, com medo de perder a minha irmã novamente

— Você não entende, Duda, eu tenho que ir. Não tem outra escolha – Karina estava determinada a ir embora novamente, mas eu não podia permitir isso

— Sempre existe outra escolha

— Não nesse caso, eu tenho que proteger vocês

Minha irmã estava muito agitada, olhava de um lado para o outro rapidamente e depois fixava seus olhos na TV, que ainda estava com o jogo em pausa.

— Você ainda tem essa velharia? – falou, provavelmente lembrando-se do tempo em que jogávamos juntas

— Claro que eu tenho! Ganhei um X-box no último Natal, mas nada supera nosso Nintendo. É o melhor videogame do mundo – comecei a falar, mas me interrompi, vendo a mudança brusca no assunto – O que tá acontecendo, Karina? Por favor, me diz a verdade, eu já sei por que você saiu de BH

— S-sa-be? Sabe como? – ela me olhou atônita, e pedi que esperasse enquanto fui ao meu quarto buscar o documento que tanto estava me atormentando

A hora de ter a tal conversa com Karina tinha chegado e não poderia ser adiada.

Desci as escadas devagar, com medo do que estava por vir. Cheguei à sala e entreguei-lhe a Certidão de Nascimento que eu havia encontrado no meio das coisas de mamãe.

— É… É verdade isso? – perguntei com a voz trêmula – Você não é mesmo filha do papai?

 

MANUELA

 

Cheguei em casa, e mamãe já me esperava para o almoço. Estranhei a presença dela ali.

— Pensei que a senhora só fosse ficar em casa a partir de sexta – falei depois de tomar um banho e me sentar à mesa ao lado dela

— Só fui hoje de manhã terminar de ajeitar minhas coisas para o tempo em que ficarei fora, a partir de agora, Manuzinha, sua mãe é toda sua! – falou de um jeito engraçado que me fez rir

— Que bom então... Sinto a sua falta – confessei quase em um sussurro

— Eu também, minha filha. Mas pretendo recuperar o tempo perdido... se você me permitir, é claro

— É claro que eu quero, mãe! – eu estava realmente alegre

— Que bom que você pensa assim, porque, querendo ou não, vai ter que me aguentar dentro de um carro por umas boas horas. E você sabe que junto com essa velha aqui, vêm as músicas mais velhas ainda e as cantorias desafinadas – rimos às gargalhadas, o bom humor de mamãe estava realmente restaurado em sua totalidade, e eu estava adorando isso.

Tínhamos decidido ir de carro em vez de pegar um avião. A viagem seria bem mais longa, mas eu sabia que nós duas precisávamos daquele tempo juntas, para consertar o que foi quebrado no fatídico dia em que me assumi impulsivamente.

Na festa da Camilla, quando eu tinha deixado aquelas asneiras escaparem da minha boca, a minha relação com os meus pais já estava bem frágil, devido ao que eu andei aprontando depois que terminei com a Natália. Acho que foi por isso que eles se enraiveceram tanto quando me assumi.

Essa viagem era a oportunidade de colocar tudo de volta em seus devidos lugares. Pelo menos com a minha mãe, já que nem sabia quando voltaria a ver o senhor Armando de Oliveira Fernandes, a quem eu costumava chamar de pai, mas nem sabia mais se ele ainda gostava de ser chamado assim.

— Mãe… - falei com aquela típica voz de quem quer alguma coisa

— Se for dinheiro, pode desistir – ela respondeu-me com uma falsa careta de brava

— Não, dona Marina, é que… eu queria… chamar uma pessoa para viajar com a gente para o Rio… - falei hesitante

— A Isa? Claro que você pode chamá-la minha filha, eu não escondo de ninguém o quanto gosto dessa sua amiga

— Ei, ei, calma aí! Não é a Isa, até porque ela vai trabalhar durante as férias, você sabe, a empresa que o pai deixou para ela e o irmão e tudo mais – falei rapidamente

— Quem é então, filha? Uma de suas amigas da escola?

— Sim, é a Duda!

— Ah sim, a Eduarda

— Então… posso chamá-la para ir conosco? É que ela tá passando por uns problemas, e eu pensei que talvez fosse bom respirar novos ares, isso sem contar na minha promessa… - falei essa última parte mais para mim mesma, mas mamãe ouviu e quis saber do que se tratava, então continuei – Nada demais, é que a Duda não conhece o mar… E quando a gente se conheceu, eu prometi que um dia a levaria para ver o mar – falei observando as reações de mamãe, que primeiro pareceu pensar em algo, mas logo abriu um sorriso concordando.

Bem, ao menos essa parte já estava resolvida, só faltava o mais difícil: decidir se iria ou não chamar a Duda para ir conosco.

Nesse caso, eu não poderia nem ao menos me sentir dividida entre razão e coração, uma vez que eu queria e não queria ao mesmo tempo, mas por razões e motivos distintos.

Eu queria a Duda por perto, mas não tinha tanta certeza que conseguiria resistir a ela por tanto tempo assim. E sei muito bem o que aconteceria se eu cedesse sem antes conseguir perdoá-la: seria lindo, por uma noite eu deixaria a paixão avassaladora que sinto por ela falar mais alto. Mas então, no outro dia, a consciência estaria pesada, e, mais uma vez, eu a expulsaria, causando mais uma dor desnecessária em ambas de nós.

Por um lado eu tinha uma promessa a cumprir e sabia que um tempo fora de Belo Horizonte e longe dos problemas com a família faria um bem danado para Eduarda. Mas, por outro lado, o lado pessimista da coisa, eu sabia que se ela fosse para o Rio, talvez, traria mais problemas para a sua vida.

No entanto, o que mais pesava entre prós e contras, era a possibilidade de ter a Eduarda de volta e pertencer a ela novamente. Mas isso só aconteceria se nesse tempo eu conseguisse me livrar dos meus fantasmas.

 

Mamãe e eu sairíamos de BH na sexta-feira depois do almoço, mas se a Duda fosse mesmo com a gente, eu teria que chamar com antecedência para que ela pudesse pedir autorização aos pais e também arrumar as coisas. O que me deixava o angustiante prazo de, no máximo, um dia para me decidir.

Mas isso era só o que eu gostava de pensar, pois a minha decisão já estava tomada, eu sabia muito bem disso. Agora só dependia da Duda.

 

EDUARDA

 

— Como é que é? Você sabia disso o tempo todo?- Perguntei incrédula, me deixando cair sobre o sofá

— Eu sei que é difícil para você entender, Duda, mas eu sempre soube. Mamãe nunca escondeu a verdade de mim, desde criança eu sabia que você e a Jéssica eram só minhas meias-irmãs.

— Ainda não consigo acreditar que o tal Eduardo, de quem nós tanto ouvíamos falar, o cara que deu origem ao meu nome, era o seu pai

— Eu só tinha cinco anos quando ele morreu e acabei bloqueando as lembranças que tinha dele, mas a mamãe sempre fez questão de me dizer quem era o meu pai biológico – Karina tinha uma calma na voz que não transmitia em nada o seu verdadeiro estado de espírito.

— Se você sabia, então por que escondeu isso de mim e da Jéssica esse tempo todo? Nós merecíamos saber

— Que diferença isso faria, Duda? Para mim, não faria diferença nenhuma, o pai de vocês, até descobrir sobre a minha identidade de gênero, sempre me tratou como se fosse filho dele, disso eu não posso reclamar nunca. O problema começou quando eu fiz dezoito anos e resolvi me assumir, foi só então que a minha ficha caiu, e eu percebi que o homem que me criou não era o meu pai.

— Espera um pouco… Pelo que eu sei, - ou acho que sei, porque agora ficou tudo confuso demais – o Eduardo era o melhor amigo do papai, certo?

— Certo

— E ele morreu porque defendeu a mamãe de um assaltante, e o cara “tava” armado e atirou nele, certo? Daí a origem do meu nome

— Sim, é isso mesmo – Karina parecia não saber onde eu queria chegar. E confesso que eu mesma não sabia se queria mesmo concluir o pensamento

— Então… se você é filha dele, e é exatamente cinco anos mais velha que eu, e eu sou filha do papai… Isso quer dizer que a mamãe e o papai eram amantes?

— Não, Duda, mamãe era casada com o meu pai, e quando ele morreu e a deixou com um filho pequeno, seu pai se ofereceu para se casar com ela e me criar como filho dele

— Nossa – eu estava meio tonta com tudo isso – É informação demais “pra” uma cabeça só! – exclamei

Karina ameaçou começar a falar novamente, mas eu a impedi.

— E-eu sei que tem mais coisa aí… Mas só me deixa assimilar antes…

Ela entendeu, e sentou-se no sofá, me olhando em silêncio, como se esperasse que a qualquer momento eu fosse sair correndo dali como uma louca varrida, gritando que nada que ela tinha me contado era verdade e chamando-a de mentirosa.

Confesso que deu vontade.

Mas eu sabia que não poderia fazer isso e que ainda tinha muito o que ouvir, afinal, ela não veio me contar que não era filha do meu pai, era veio dizer que tinha que ir embora da cidade. Mas por que? Era isso que eu precisava saber e entender, e tinha certeza que boa coisa não viria por aí.

Soltei um longo suspiro e voltei a encarar a minha irmã:

— Continua – pedi com um fio de voz

— Eu já disse tudo que eu sei sobre a minha paternidade. Nunca fui curiosa com isso, sempre achei que era melhor deixar o passado no passado. Mas agora, Duda, no presente, eu tenho que ir embora daqui

— Por que?

— Eu preciso proteger vocês, e, infelizmente, a única forma de fazer isso, é indo embora

— Mas proteger de quê? – eu sabia que não queria ouvir a resposta para aquela pergunta, porque no fundo já sabia qual era, e não gostava nadinha dela.

Minha irmã me olhou com o que eu identifiquei como pena e receio e falou:

— Do seu pai

Eu demorei algum tempo até entender o que Karina tinha falado. Mas quando a ficha caiu, me apressei em dizer:

— Eu não preciso ser protegida do meu próprio pai! – exclamei um pouco indignada por ela insinuar que papai pudesse fazer algo contra mim ou a Jéss.

— Tem certeza?

— Cl-claro que eu tenho, Karina! Não tem cabimento isso que você “tá” falando.

— Duda, eu sei que é difícil, mas eu tenho motivos para temer por vocês, por você principalmente.

Besteira!

Pensei, mas não disse nada, porque Karina continuou falando:

— Você não acredita em mim, não é?

— Sinceramente? Olha, eu sei que você tem motivos de sobra pra não gostar do papai, afinal, ele te colocou pra fora de casa e tudo mais. Mas daí a falar que ele faria algo contra mim ou contra a nossa irmã é demais

Karina levantou-se, em exasperação, desabotoando a blusa de manga comprida que usava por cima de uma regata simples e retirando-a

— Você não está me ouvindo, Eduarda! Seu pai me expulsou de casa? Sim, ele fez isso, mas ele também fez isso – e estendeu o braço esquerdo, onde eu podia visualizar uma cicatriz que ia do pulso quase até o cotovelo.

Fiquei paralisada com aquilo, não podia acreditar.

— No dia que eu me assumi e disse que tinha um namorado, ele não falou nada na hora, apenas saiu de casa. Horas mais tarde, ele voltou bêbado, carregando uma garrafa de cachaça e começou a bater na mamãe, dizendo que a culpa era dela por eu ter virado um “viadinho de merda”. Quando eu entrei no meio para tentar interferir, ele me atingiu com a primeira coisa que viu na frente: a garrafa que estava com ele tinha caído no chão e quebrado quando ele foi bater na mamãe. Uma garrafa quebrada, Eduarda!

— Não… - minha voz saiu fraca, enquanto tentava negar de qualquer forma o que sabia que era a verdade. Minhas lágrimas já escorriam pelo rosto há tempos, mas eu não ligava.

— Duda, eu não posso arriscar ficar aqui. Nunca se sabe quando ele pode tentar algo de novo. E, para piorar a situação, a mamãe protege o canalha. Ele batia nela! Mas ela continuou protegendo… Ela preferiu ele a mim, Duda, acho que… Acho que ela nunca me aceitou. Não posso continuar em Belo Horizonte, não posso continuar colocando vocês em perigo. Não posso deixar acontecer com você o mesmo que ele fez comigo

— Tem que ter outro jeito! Você demorou cinco anos pra voltar e agora vai embora de novo?

— É o único jeito, Duda

— Quanto tempo? – perguntei, ainda sem conseguir raciocinar direito

Meu pai? O homem que me criou, e que sempre me deu amor? Era quase impossível acreditar naquilo. Eu estava desolada, sem chão.

A primeira coisa que fiz, assim que fechei o portão atrás da minha irmã, foi ligar para Manu.

Não consegui me conter a acabei desabando no telefone, deixando evidente o quanto estava frágil naquele momento.

 


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