O restante da noite foi intenso e maravilhoso. Assim como a manhã seguinte. Assim como os seguintes dias daquela semana. O tempo pareceu passar voando nos momentos em que eu estava com Percy. Por outro lado quando não estávamos juntos os ponteiros do relógio custavam a andar. Mas de certa forma aquilo foi bom. Um pouco de moderação fez com que ficássemos mais “tranquilos”. Os dias em que tínhamos que ficar cada um em seu chalé foram ficando mais fáceis de suportar com o tempo. As horas de treino ficaram mais agradáveis e menos angustiantes.

Aos poucos fui voltando a normalidade. Ainda sentia um imenso desejo de passar todas as noites com meu namorado, mas agora conseguia conviver com aquilo tranquilamente. Parecia que aproveitávamos ainda mais quando estávamos juntos por saber que aqueles momentos não eram mais tão frequentes.

Entretanto havia uma coisa nisso tudo que eu nunca consegui entender. Toda vez que nós íamos para o nosso “falso castigo” e Percy me levava para o nosso Santuário particular, havia alguma coisa nova por lá. Ele sempre dava um jeito de preparar alguma surpresa ou mudar alguma coisa no cenário. Tudo aquilo era muito lindo e romântico, mas eu não compreendia como ele fazia para conseguir essas coisas. Ele passava quase todo o tempo comigo durante os treinos, e também nos horários das refeições. Definitivamente ele estava tendo alguma ajuda. Chegou uma hora que eu queria saber quem é que estava colaborando com aquilo. Mas Percy sempre desconversava quando eu tentava perguntar.

- Onde você conseguiu isso? – falei espantada olhando para uma espreguiçadeira que havia sido colocada próxima a entrada da barrada em uma das noites que fomos para a cachoeira.

- Não importa como consegui, amor – Disse ele ao ir se deitar nela – O que importa é que é super confortável e relaxante, vem cá...

Ele normalmente conseguia mudar de assunto ou então me fazer desistir de conversar me envolvendo nos seus beijos e abraços. Na noite seguinte apareceu um imenso arranjo de flores enfeitando o interior da barraca e numa outra uma pequena televisão havia substituído o rádio na mesinha. Com certeza era alguém muito legal e prestativo que estava dando uma mão para Percy. Mas tecnicamente nenhum dos campistas deveria saber que nós estávamos indo para lá ao invés de cumprir nosso “castigo”. Então quem será que estava fazendo aquilo? No mínimo deveria ser alguém da confiança de Percy.

Era uma sexta-feira quando eu decidi que ia desvendar aquele mistério de uma vez por todas. A última noite havia sido cada um em seu chalé o que significava que hoje nós iriamos para o nosso “castigo”. Resolvi aproveitar para investigar se Percy não estava armando nada para aquela noite. Entre uma atividade e outra os campistas costumavam ir até os vestiários para lavar o rosto e dar uma descansada antes de voltar ao treino. Aproveitei um desses momentos para ir atrás de Percy sem que ele notasse.

Sei que não era certo aquilo que eu estava fazendo. Na vez em que ocorreu a situação invertida eu havia ficado muito desapontada com ele. Mas neste caso era diferente. Eu não estava tentando descobrir uma traição nem nada disso. Só queria saber qual era o seu segredinho. Descobrir se ele estava bolando alguma coisa para nós naquela noite e de quebra descobrir quem era seu cumplice. Esperei que Percy se encaminhasse para os vestiários e então me escondi entre algumas moitas que ficavam ali perto. Fiquei mirando a porta esperando que ele saísse.

Quando Percy enfim saiu do vestiário ele carregava uma mochila nas costas que não estava com ele ao entrar. Meus instintos investigativos me diziam que ai tinha coisa. Continuei oculta atrás das moitas enquanto ele deixava o local em direção aos chalés. Já se aproximava da hora do almoço e ele deveria estar indo para o refeitório como sempre fazíamos. Não tive outra escolha a não ser segui-lo.

Usei toda minha agilidade para conseguir não ser vista enquanto ia atrás de Percy. Ele parou em frente ao chalé de Poseidon. Colocou a mochila no chão e encostou-se à porta. Ficou ali parado como se esperasse alguém. Eu não podia acreditar que seria tão fácil! Logo eu descobriria quem era a pessoa que aparentemente devia muitos favores a Percy. Me posicionei próximo ao chalé de Zeus que ficava ao lado, atrás de uma grande pilastra que me encobria completamente.

Segundos depois vi que uma pessoa se aproximava do local. Ela vinha naquela direção e eu torcia para que ela não parasse para falar com Percy. Não pode ser que seja ela que esteja oferecendo ajuda a Percy naquilo. Não pode ser que ela saiba do nosso santuário e possivelmente das coisas que aconteceram lá. Para confirmar minha suspeita e aumentar a minha indignação, Rachel chegou perto de Percy e o cumprimentou. Eles falaram algumas coisas e eu me arrependi de não ter ficado mais perto para poder escutar o que era.

Percy se abaixou para abrir sua mochila e tirou de lá uma revista pequena que parecia um daqueles catálogos de cosméticos. Ele a folheou e despois indicou alguma coisa ali para Rachel. Eles continuaram conversando e olhando o tal catálogo por mais alguns minutos. Depois ela se despediu e Percy voltou a guarda-lo na mochila. Ele entrou em seu chalé e instantes depois saiu já sem mochila. Ele tomou o caminho do refeitório e eu fiquei lá apenas olhando se afastar, analisando o que eu tinha acabado de ver.

Não dava pra ter certeza de sobre o que eles estavam falando. Eu não tinha como saber se era realmente ela que o ajudava a conseguir aquelas coisas. Mas pensando bem, ela era a única ali que não tinha que treinar. Quando não estava fazendo profecias, passava a maior parte do tempo ajudando Quíron com as atividades e campistas com seus afazeres. Se alguém tinha tempo de sobra para preparar aquelas coisas, esse alguém poderia ser ela. E se não fosse, então o que diabos eles estariam conversando? Eu não queria dar uma de namorada louca e ciumenta, ele podia falar com quem quisesse a hora que quisesse. Mas o problema era essa relação dos dois que eu nunca entendi direito. Ninguém me tirava da cabeça que Rachel sempre esteve afim do meu namorado. O que me fazia temer o fato de ela saber do nosso esconderijo secreto.

Antes de continuar fazendo mais suposições eu decidi que tinha que investigar melhor aquilo. Precisava ter certeza do que estava acontecendo para ai sim tentar encontrar motivos e explicações. Me encaminhei para o refeitório enquanto tentava tirar da minha cabeça a imagem de Percy e Rachel conversando a sós. Chegando lá fui diretamente até a mesa de Percy e me sentei ao seu lado. Ele já almoçava, mas deu uma pausa para me abraçar e me dar um beijo no rosto.

- Onde estava? – perguntou ele depois de me soltar e voltar a comer – Você sempre chega antes de mim para as refeições.

- Eu só fui até o meu chalé deixar umas coisas – disse a primeira coisa que veio a minha cabeça para me livrar daquela pergunta. Mas depois percebi que não fora a melhor escolha, afinal Percy também havia estado lá e teria me visto. A não ser que ele não quisesse me dizer onde esteve e também mentisse.

- Sério? Eu também fui até os chalés, mas não te vi por lá – Ele havia dito a verdade afinal. Sinal que ele não estava temendo que eu pudesse tê-lo visto conversando com Rachel. Minha cabeça parecia que ia dar um nó com todas aquelas deduções.

- É que acabo de voltar de lá, fui bem rápida – tentei parecer o mais convincente possível – Vou pegar algo para comer, já volto.

Esse negócio de investigação era mais difícil do que eu imaginei. Eu não podia chegar e perguntar as coisas diretamente para Percy porque ele poderia muito bem não me contar ou então inventar uma desculpa. Eu também não estava indo bem com a espionagem. Só me restava ir até a minha suspeita e tentar arrancar alguma informação dela. Rachel normalmente comia na mesa com Quíron e os outros moradores permanentes do acampamento. Eu iria ter que esperar até a hora do jantar para ter uma chance de fazer isso. O mais difícil, porém seria despistar Percy saísse do refeitório antes de mim. Ele com certeza acharia muito estranho me ver falando com a Rachel. Mas eu tinha que conseguir. Ia colocar o plano “enquadrando a ruivinha” em ação!

Almocei normalmente e depois fui me despedir de Percy para voltar aos treinos. Com toda aquela história de investigação na minha cabeça, eu não pude me dedicar totalmente aos exercícios. Fiquei contanto as horas, ansiosa para que o dia acabasse. Quando enfim fomos liberados, eu corri para meu chalé, me arrumei e depois corri de novo para o Refeitório.

Percy já estava lá quando adentrei o local. Fui me sentar com o chalé de Atena para comer. Percebi que Percy já havia terminado e ficava olhando na minha direção. Ele estava me esperando para que pudéssemos partir. Tinha que arrumar alguma forma de ele tirar ele dali. Pensei rapidamente em uma desculpa e então acenei para ele o chamando. Ele se levantou e veio até mim ficando parado ao meu lado de pé.

- Amor, pode me fazer um favor? Eu esqueci de pegar uma blusa de frio no meu chalé, e essa noite parece que não vai estar tão quente. Você pode ir lá buscar pra mim enquanto termino de comer? Depois a gente se encontra na arena, pode ser? – falei aquilo tão rápido que nem dei chance de ele perguntar nada.

- Tudo bem, Annie. Vou indo na frente então. Não demore! – disse ele me dando um lindo sorriso e depois se inclinando para me beijar.

O observei se afastando até deixar o local. Esperei alguns segundos e depois deixei o prato de lado com um resto de comida que eu não queria mais. Fiquei enrolando lá por longos minutos até que vi Rachel se levantar para sair. Ela ia se encaminhando para a saída lateral, então eu me levantei e andei apressada para alcança-la. Ela já descia as escadas externas quando eu cheguei até ela e a cutuquei no ombro. Ela levou um susto que a fez pular alguns centímetros. Ela se virou com cara de espanto enquanto eu sorria sem graça.

- Hey Rachel, tudo bem? – ela ainda me olhava com estranheza, não mais pelo susto que eu havia lhe dado, mas pelo fato de eu estar falando com ela amigavelmente.

- Hey Annabeth, estou bem e você? – respondia ela insegura.

- Estou ótima. Você por acaso falou com Percy ultimamente? – Eu queria ir direto ao ponto, mas depois percebi que aquele pergunta tinha sido direta demais – É que ele anda meio estranho e queria descobrir por que – inventei rapidamente para melhorar a minha abordagem.

- Sim, falei com ele hoje - disse ela com tranquilidade – Ele não me pareceu estranho em absoluto. Aconteceu alguma coisa? – disse ela em tom preocupado. Eu não sabia se era sério ou se ela já tinha sacado qual era a minha e estava jogando verde.

- Na verdade, nada. Quer dizer, fora o fato de estarmos os dois castigados, não aconteceu nada de mais recentemente – tentei manter aquela mentira da forma mais convincente possível.

- Não precisa fingir comigo, eu sei que esse castigo de vocês é só fachada! – disse ela soltando um riso debochado. Eu fiquei completamente sem resposta. Então ela sabia que Percy e eu vínhamos passando algumas noites fora dos chalés. O que mais aquela garota sabia? Seria porque ela era o Oráculo de Delfos ou então Percy tinha entregado tudo de bandeja? Queria acreditar que a primeira opção fosse verdade, mas infelizmente as coisas estavam caminhando para confirmar a segunda.

- Como sabe disso? – não pude deixar de perguntar.

- Quíron me contou para que eu ajudasse a manter o segredo – disse ela com confiança. Mas mesmo assim eu não engoli muito aquela história.

- E está sabendo de mais alguma coisa em relação a isso? – eu precisava saber se era ela quem providenciava todas aquelas coisas que Percy levava para o nosso santuário. Não sabia se ela diria a verdade, mas resolvi arriscar.

- Não Annabeth, não sei de mais nada – ela dizia com voz séria enquanto me analisava de cima a baixo com atenção – Não gosto de ficar me metendo na vida dos outros.

Era tão estranho que ela tivesse dito aquilo sendo que dias atrás eu estava dizendo que ela fazia exatamente aquilo. Pensei por um momento se ela não sabia disso. Não era possível. Por mais que Percy fosse seu amigo ele nunca diria isso a ela. Resolvi que já tinha averiguado o suficiente par aquela noite. Dei por encerrado o plano.

- Então até mais, Rachel. Boa noite.

- Boa noite, Annabeth.

Nos despedimos assim, de forma bem cordial sem deixar de lado aquele ar de disputa que havia entre nós. Eu segui para a arena para encontrar Percy. Eu já estava ficando sem graça de ter que olhar para ele sabendo que eu o estava “investigando”. Se eu não descobrisse logo tudo por mim mesma iria abortar a missão e perguntar diretamente a ele tudo o que eu queria saber.

Mas naquela noite decidi não pensar mais nisso. Apenas acompanhei Percy até a cachoeira e desfrutei dos momentos ao seu lado o máximo que pude. Fizemos uma fogueira. Nadamos um pouco. Depois rolamos pelas pedras e deixamos que a calor do fogo secasse a água em nossos corpos. Fizemos amor sob a luz das estrelas e mais tarde sobre a luz de um lampião de iluminava a nossa barraca. Eu me aferrei a ele quando já estávamos deitados no colchão e exaustos. Segundos depois cai em um sono profundo.