Capítulo X

Seus dois grisalhos

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Talvez eu seja louco,

Mas é loucura e é verdade,

Eu sei que você pode me salvar,

Ninguém mais pode me salvar além de você.

I'd do Anything For Love, Meat Loaf.

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Jun pensou que fosse morrer. A jovem viu gradativamente a mudança nas feições de Kakashi. Passou de incredulidade, para choque e por fim para raiva.

Ela falou antes que ele tivesse chance de falar.

- Mas isso foi a muuuitos anos atrás! – Deu ênfase na palavra muito. – Sem contar que o Hidan é um amigo de infância. – Se apreçou a completar quando viu que a primeira frase não havia tido muito efeito.

- Sim! – Exclamou o albino e passou o braços novamente ao redor dos ombros de Jun. – Somos bons amigos de infância e ex-namorados. E alias... – O sorriso dele se ampliou mais ainda. – Você me odiava.

Kakashi estava sem palavras.

Estava morrendo de ódio, e agora entendi a sua antipatia por Hidan. Em algum lugar da sua mente, seu sentimento de aversão por aquele homem continuava. E ele realmente queria acertar um soco na cara dele, mas ele começaria por tirar Jun de perto dele.

- Eu odeio. – Corrigiu e se aproximou, alcançando o braço de Jun e a puxando para ele. – E faça o favor de tirar as suas mãos da minha esposa.

- Oh...! – Exclamou Hidan, um pouco surpreso. Fontes confiáveis haviam lhe dito que a relação entre Jun e Kakashi não estava muito boa, talvez tivessem se enganado. – Ela é toda sua man.

- Sim, ela é... – Kakashi cerrou os olhos e passos seus braços protetoramente ao redor de Jun.

A jovem encarava a tudo um pouco surpresa. Não sabia o porquê de Hidan ter aparecido daquela forma para confrontar Kakashi, realmente não entendi isso. E outra coisa que não entendia era aquela reação exagerada de Kakashi. Afinal, ele não se lembrava de nada.

- Enfim! – Exclamou Jun e saiu de perto de Kakashi, se encaminhando para o meio da sala. – Já que você está aqui Hidan, afine meu piano!

- Ok, ok... – Murmurou ele. – O piano está no seu quarto, não é? – Jun assentiu. – Então me leve até ele!

- Eu levo! – Kakashi se ofereceu, surpreendendo a todos, e até a ele mesmo. Que raios de ciúmes era aquele que ele estava sentindo? Talvez com a mémoria do sentimento de antipatia que tenha vindo com Hidan, o ciúmes que ele sentia dele também tenha retornado. Não entendia muito bem, então esqueceria isso por enquanto.

- Eu vou junto, não deixarei vocês juntos e sozinhos nem por um segundo! – Um sonoro suspiro foi seguido e Jun se encaminhou para o quarto, sendo seguida de perto por Kakashi e Hidan.

- Bonita casa... – Hidan disse, olhando os cômodos. – Nunca havia entrado aqui antes, só havia visto fotos.

- Fotos? – Kakashi perguntou.

- Sim, algumas fotos que a Jun me mostrou.

Kakashi ia perguntar mais uma coisa, mas se calou quando Jun abriu a porta e deu passagem para eles. Aquela seria a primeira vez que ele entraria naquele cômodo. Engoliu em seco e transpassou a soleira.

Seu queixo caiu um pouco com o que viu. Aquele quarto era imenso. Quase do tamanho da cozinha e sala juntos. Mas não era para menos, já que o piano de cauda e uma estante de livros e partituras ocupavam boa parte do cômodo.

Uma imponente cama king-size tinha seu espaço e uma arara de roupas também.

Uma coisa curiosa que Kakashi notou foi que todos os porta-retratos estava abaixados. Aquilo doeu um pouco, pois ele tinha uma ideia do porquê disso. Provavelmente aqueles porta-retratos continham fotos deles, mas deveria doer muito em Jun ver aquelas fotos. Suspirou e rodou um pouco a cabeça, vendo por fim o único porta-retrato que não estava abaixado. Se aproximou e pegou o objeto na mão, ignorando Hidan que havia seguido o seu olhar.

Na foto, havia uma Jun ainda na pré-adolescência e outros dois adolescentes sorridentes. Um deles ele reconheceu como Hidan e o outro era a cara do Sasuke. Aproximou mais a foto do rosto mais uma mão roubou o retrato dele.

- Com licença... – Jun levou o objeto para longe. Não queria arranjar mais problemas, e aquela foto poderia significar algum problema. Suspirou. Queria matar Hidan da maneira mais lenta e dolorosa que podia. – Hidan, por favor... – Disse a jovem apontando o piano.

- Ok, ok, não precisa me apressar! – Hidan se encaminhou para o piano e Jun se sentou na ponta da cama. Já Kakashi não sabia muito bem o que fazer.

O grisalho deixou os olhos correrem mais uma vez pelo quarto. Ele tinha vontade de levantar alguns daqueles porta-retratos, mas tinha medo do que ia encontrar. Abanando a cabeça, desviou seu olhar para a arara de roupa, vendo algumas roupas masculinas, provavelmente dele, penduradas ali. Reconheceu uma gravata e se aproximou, sendo observardo pelos orbes verdes de Jun ao longe.

- Essa gravata... – Kakashi levantou a gravata vermelha. Era sua preferida, mas agora ela estava velha e desfiada. Pela primeira vez ele teve ideia do tempo que se passou. Se lembrava dessa gravata nova em folha a pouco tempo atrás, mas agora ela estava velha e desfiando. Nenhum dos rostos conhecidos que viu havia tido esse efeito em Kakashi. Mas aquela simples gravata... Aquela gravata havia mostrado para Kakashi que o tempo havia passado, que muito tempo havia passado.

- Você não se quis desfazer dela. – Jun sorriu. – Foi a gravata que você usou no seu primeiro dia de trabalho no cursinho de inglês.

Kakashi assentiu. A dois anos atrás... Ou melhor, se corrigiu, a sete anos atrás ele usou essa gravata pela primeira vez.

Finalmente, depois de um mês, ele estava conseguindo ter ideia do tempo que ele não se lembrava. Eram cinco anos. CINCO ANOS. Não cinco dias ou cinco meses. Cinco longos anos, onde ele havia envelhecido, terminado um relacionamento, começado outro e se casado, terminado seu mestrado, começado e terminado seu doutorado, deixara de ser professor no cursinho e começara a dar aulas na faculdade, vendera seu apartamento para comprar uma casa. Muita coisa tinha acontecido. E era a primeira vez desde que acordara que percebia isso.

Meio zonzo ele rumou para onde Jun estava sentada e se sentou ao lado dela. Tinha o olhar desfocado e estava um pouco enjoado. Chegar aquela conclusão o havia deixado mal.

- Jun-chan! – Hidan chamou e Jun se levantou. – Eu esqueci minha bolsa na porta, pode pegar para mim?

- Sim... – Jun ficou dividida. Não queria deixar Kakashi e Hidan sozinhos, mas se pedisse para Kakashi ir pegar a tal bolsa, ele ia ficar sentido e talvez se recussasse a ir. Suspirando a jovem se encaminhou para a porta, e com uma última olhada para os rapazes, saiu do quarto orando para que eles não se matassem nesse meio tempo.

- Oe Kakashi... – Chamou Hidan e levantou a cabeça do piano, olhando por sobre o ombro para Kakashi. – A Jun está bem de saúde?

- Como? – Kakashi não havia escutando, estava perdido em pensamentos.

- A Jun está bem de saúde? – Repetiu impaciente. Queria receber a resposta antes que a jovem voltasse.

- Não sei... O útero e os pulmões dela estão bons, mas ela anda de segredos com a médica. – Deu de ombros.

- Mas você não sabe nada sobre... – Hidan escutou os passos de Jun e tratou de se calar, fingindo que nada havia acontecido.

- Aqui está a sua bolsa Hidan... – Jun entrou no cômodo e entregou de uma vez por todas a bolsa de Hidan. E se virando para Kakashi, disse. – Kakashi, isso aqui ainda vai demorar. Mais de duas horas, talvez, por que você não vai descançar?

- Faço das suas palavras as minhas. Por que você não vai descançar? – Ele não a deixaria sozinha com Hidan nem que lhe pagassem.

-  Yare, yare... – Resmungou o albino. – Por que ambos não me deixam sozinho e vão descançar? Quando eu estiver terminando eu vos-lhe chamo! – Aquela briguinha estava começando a irritá-lo, e trabalhar daquele jeito não dava.

- Que seja então... – Jun deu de ombros e puxou Kakashi pela mão para fora do quarto.

Kakashi queria continuar naquele cômodo e dar mais uma olhada. Havia visto um violão num dos cantos, violão esse que ele poderia apostar que o pertencia. Mas por outro lado, ele também queria sair daquele quarto. Haviam tantas lembranças ali dentro que ele havia começado a se sentir sufocado.

- Ei Jun... – Quando a jovem o puxou para fora do quarto ele havia percebido uma coisa. – Você está quente! – Kakashi se aproximou e pôs a sua bochecha na testa dela. Jun estava realmente bem quente, provavelmente com febre.

- Não é nada! – Jun se sobressaltou com a proximidade de Kakashi e saiu de perto dele. – Deve ser apenas uma reação normal pós-cirurgico.

Kakashi não se contentou com aquela resposta. Mas, vendo o quão arisca Jun estava, ainda mais depois daquela proposta descabida de divorcio, ele deixou para lá. Talvez, depois que Hidan fosse embora, ele tentasse outra investida.

O grisalho foi para o sofá e ligou a televisão, enquanto Jun foi para o cozinha, provavelmente arranjar alguma louça para lavar, como ela sempre fazia. Kakashi ainda queria saber da onde ela conseguia arranjar tantas coisas para lavar.

Se passaram quase duas horas antes que Hidan desse as caras de novo.

- Jun-chan! – O albino apareceu na sala, se espreguiçando. – Terminei!

- Oh! – Jun veio correndo da cozinha, animada. – Sério?

- Super sério. Por que não experimenta e vê se gostou? – Hidan sorriu e estalou os dedos. Estava todo dolorido por causa da posição que havia ficado para afinar aquele bendito instrumento, mas ao mesmo tempo estava satisfeito. Amava seu trabalho.

- Mas é claro! – Jun não pensou duas vezes, passou por Hidan e se meteu no quarto. Kakashi a seguiu, desligando a TV e entrando no cômodo seguido por Hidan.

O grisalho encontrou Jun debruçada sobre o instrumento, o avaliando e tocando algumas teclas a esmo. Sons claros e puros preenchiam o ambiente.

- O som está ótimo Hidan! – Disse Jun alegre.

- Toque alguma coisa para nós, então.

- Yosh! – Concordou e a jovem se posicionou no instrumento. Mas antes de começar a tocar, Jun amarrou o cabelo, que era na altura dos ombros, em um alto rabo de cavalo com um elastico que ela trazia o pulso e pôs a franja atrás das orelhas. Inspirou fundo e abaixou as mãos de dedos longos no instrumento, fazendo a música ressoar nas paredes.

- Ah... – Murmurou Hidan fechando os olhos e apreciando a boa música. – Beethoven!

- Beethoven? – Perguntou Kakashi em voz baixa, com medo de atrapalhar a Jun, que parecia tão absorvida na música que tocava.

- Sim... – Hidan também falou baixo. – Sonata No. 20 em G Maior, Op. 49, No. 2. – Sorriu. Aquela era uma ótima composição, e sendo Jun a tocar, ficava melhor ainda. – Você tem sorte por ter uma esposa tão bonita e talentosa quando a Jun. Deveria cuidar melhor dela!

Kakashi ia abrir a boca para protestar, dizendo que da vida dele cuidava ele. Mas ele percebeu que as palavras de Hidan eram sinceras. O albino parecia realmente preocupado com Jun, e ele tinha um olhar de carinho enquanto observava a sua esposa.

O grisalho, em vez de responder a Hidan, desviou seu olhar para Jun, que continuava a tocar divinamente. Ela tocava muito melhor agora do que em todas aquelas gravações que ele havia visto. Ver ao vivo era algo totalmente diferente que vê-la tocar naquelas gravações. A música dela tinha alma, tinha vida. Era algo realmente muito bonito.

Pela primeira vez Kakashi realmente viu a Jun. Ele nunca havia percebido o quão bonita ela era. A jovem tinha um magro, mas bem torneado corpo. Tinha pernas longas e cintura fina. Ela ficava ótima mesmo com o short e a regata que estava usando. O Hatake não tinha palavras para descrever o que ele  estava sentindo. Ele havia dividido aquela casa durante um mês com aquela jovem e nunca havia percebido o quão bela ela era.

Ele só poderia estar cego para não perceber uma coisa dessas.

Balançou a cabeça descrente.

- Eu vou cuidar bem dela. Não precisa se preocupar... – Murmurou para Hidan, finalmente o respondendo.

- É bom que cuide mesmo, ou eu a roubarei de você! – Hidan deu uma pequena gargalhada e sorriu. – Ela é muito importante para mim, quero que ela seja feliz, ela é tão jovem e bonita. Já sofreu demais, merece ser feliz.

- Sim, ela merece. E eu a farei feliz! – Kakashi disse com mais convicção do que realmente tinha, mas as suas palavras eram verdadeiras. Manteve seus olhos focados no perfil de Jun, uma tenue luz entrava pelas janelas e lhe dava um contorno luminoso, deixando seu cabelo e olhos mais claros do que realmente eram. A luz refletia na pele clara e lhe dava um aspecto divinal. Era a cena mais bonita que Kakashi já havia visto na vida.

Se perguntava como não havia percebido a beleza da esposa antes.

Suspirou.

Ele havia estado cego, mas agora enxergaria o que realmente lhe era importante. Não deixaria que um sentimento que já deveria ter sido esquecido por ele atrapalhasse seu futuro. Afinal, seu futuro era ao lado de Jun e não de Anko. Ele deveria esquecer aqueles sentimentos contraditórios e se focar na menina que estava na sua frente.

Finalmente ele estava começando a enxergar o que deveria enxergar.

Continua...