Opposite escrita por Giovana Marques


Capítulo 15
Surpresas


Notas iniciais do capítulo

Surpresas podem ser boas ou ruins, digamos que nesse capítulo teremos dos dois tipos delas. Não vou falar mais nada.
Desculpem por não ter conseguido postar ontem, mas finalmente o capítulo está aqui.
Espero que gostem!
E mais uma vez: Quero suas opiniões sobre a história.
Beijos e boa leitura! :3



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– Achei que não fosse voltar a respirar mais. – Comento, quase que gaguejando. – Fiquei assustada.

Minhas mãos estão um pouco trêmulas quando solto-me de Luke e sento-me no chão, ao seu lado. Olho ao redor, certificando-me de que os lobisomens não estão mais por aqui. E finalmente respiro fundo, sentindo nada mais e nada menos que o alívio.

Ele parece tão arrasado quanto eu, talvez um pouquinho mais. Toda aquela água certamente o enfraqueceu, afinal, é um feiticeiro negro. Talvez aquela teoria sobre que os poderes de feiticeiros brancos enfraquecerem os feiticeiros negros e vice e versa, seja verdadeira.

Você salvou minha vida. – É tudo o que Luke diz.

Suas palavras me pegam de surpresa, para falar a verdade. Quer dizer, quem sempre me salva é Luke, e não o contrário.

– Tinha que retribuir as outras várias vezes em que você me salvou. – Murmuro. Ainda estou meio em estado de transe e por isso não sorrio.

Estou ensopada, assim como Luke. Um vento gelado sopra em direção aos nossos corpos e tenho de admitir que ele não me incomoda. Apenas roça minha pele fazendo poucas cócegas, tão poucas que não chego nem a arrepiar. Na verdade, isso me faz até bem, como se recuperasse um pouco de minhas energias.

Chego a conclusão que isso se deve ao fato de ser uma feiticeira branca, já que Luke aparenta estar com tanto frio, que chega a tremer. Além disso, seu lábio inferior está levemente arroxeado.

– Temos de sair daqui. Ou você vai congelar.

Luke parece distante e pensativo, além de extremamente exausto. Ele ignora minha preocupação e continua sentado, na mesma situação. Sinto que devo fazer alguma coisa, então coloco-me de pé e recolho nossa mochila jogada próxima à uma moita, onde deixei antes dos lobos aparecerem.

Noto que minhas roupas estão demasiadamente encharcadas, quando as sinto pesar. Abro a mochila procurando por algo que sirva para nos secar, mas logo lembro-me de que deixamos as toalhas dentro da caverna em que acampamos. Seguro minhas roupas com as mãos e torço-as, fazendo com que o excesso de água escorra. Não que isso mude tanta coisa, já que ainda continuo ensopada.

Sugiro que Luke faça o mesmo, mas ele continua absorto em pensamentos.

– Por que eles te querem tanto? – Questiona, como se não houvesse nenhuma explicação plausível em sua mente. – Falo dos lobos. Eles não atravessariam o Shadow Island se não fosse algo realmente importante. E não conseguiriam fazer isso sozinhos. Deve ter alguem por trás disso tudo.

Franzo o cenho pensativa e talvez um pouco nervosa com suas indagações.

Concordo com Luke sobre os lobos terem a intenção de me sequestrar, afinal, é a explicação mais aceitavel para nos perseguirem tanto. Mas por que? O que eu tenho de tão especial que os lobisomens fossem precisar? Provavelmente, estão mesmo sendo líderados por alguém. Alguém que precise de mim.

Por um segundo, fico assustada e me lembro que os lobisomens não são os únicos que têm interesse na minha pessoa... Há um outro alguém, na verdade. Um homem alto e misterioso, com um ar sombrio. Todas as vezes em que o vi, mesmo que não tenha sido real, estava envolto por um manto branco, indiciando ser um feiticeiro branco. Além disso, ele diz ser meu pai.

– Luke. – Decido dizer o que estou pensando, mesmo que Luke não acredite muito nas minhas teorias. – Não faz sentido para você?

– O que? – Ele pergunta, curioso.

– Os lobisomens foram enviados pelo meu pai. Quero dizer, o cara esquisito dos meu sonhos, – Ou devo dizer “pesadelos”? – que menciona dominar Opposite. Ele diz que precisa de mim, dos meus poderes.

Luke recebe a informação e reage de forma bem diferente do que eu espero. Para falar a verdade, pensei que diria que eram apenas sonhos e que não significavam nada, afinal de contas, foi o que disse na primeira vez. Porém agora parece mais meditativo, como se aceitasse minha hipótese e percebesse que ela faz sim um pouco de sentido.

– Pode ser, Emy. – Ele diz, encarando o chão. – O que mais me intriga, se isso tudo for verdade, é como ele conseguiu entrar na sua mente.

Olho para o buraco da caverna inundada e faço uma pergunta boba.

– Será que eu prevejo o futuro ou algo assim?

– Não, feiticeiros não preveem o futuro. – Ele responde quase que imediatamente. – Somente o Oráculo é capaz de fazer isso.

Ele se levanta, mas resmunga de dor quando pisa no chão e é obrigado a se apoiar em uma das árvores. É claro que saio de meu lugar para ajudá-lo, mas Luke com todo seu orgulho, dispensa meu gesto.

– Estou bem, Emy. – Diz, não parecendo muito convincente. – E você já fez muito por mim hoje.

Reviro os olhos diante do seu exagero, afinal, ele mesmo já fez muito mais coisas por mim se fossemos contar para valer. Mesmo assim, deixo que caminhe sem a minha ajuda. Dá para perceber que Luke é cavalheiro demais para aceitar o fato de eu ajudá-lo. Não que eu o culpe por isso, ele foi criado assim e além disso, um pouco de cavalheirismo nunca é demais.

– Sabe de outra coisa que também notei? – Ele pergunta, acordando-me dos meus pensamentos. – Os demônios não estão em lugar algum.

– O que quer dizer com isso? – Pergunto, confusa.

– Em todas as noites que estivemos na ilha, só nos deparamos com demônios na primeira. Mesmo assim não eram muitos e conseguimos nos esconder até encontrarmos a caverna em que estamos acampando. Além disso, nenhum deles nos incomoda naquela caverna, e confesso que pensei que teríamos de sair de lá por conta de invasões demoníacas.

Paro para pensar e percebo o quanto isso faz sentido. Pelo que todos falavam em Kingswood, era de se esperar que Arcanum Island fosse totalmente cheia de demônios. Mas, por outro lado, até agora não vi nenhum.

– Você tem razão. E agora, – Completo todo seu raciocínio. – acabamos de descobrir outra caverna sem demônio algum.

Exatamente. – Ele diz, olhando no fundo meus olhos. – Era de se esperar que demônios vivessem em cavernas durante o dia, para se esconder do sol. Essa caverna era perfeita para ser seu refúgio. Eu tinha certeza que haveria pelo menos um demônio lá embaixo. Tem alguma coisa errada nessa história.

Apesar das reflexões, não deixo de ficar irritada com o que ele acaba de dizer. Luke havia se arriscado não deixando que eu entrasse naquela caverna com ele. Se tinha tanta certeza assim de que existiam demônios lá embaixo, por que não deixou que fosse com ele? Tudo bem, agora, o cavalheirismo exagerado estava me irritando.

– Luke. Gray. Você tem problema?! – Pergunto, ressentida. – Devia ter deixado que eu fosse com você, se sabia que haveria demônios lá embaixo.

– Não mesmo! Você poderia ter se machucado ainda mais. – Ele diz, apontando para meu calcanhar. – E como tinha dito, precisava de ajuda para subir, caso os demônios estivessem em grande número.

Olho imediatamente para meu pé e percebo que as ataduras não estão mais em volta dele. Também encaro a mordida de poisonie e percebo que ela já parece bem melhor do que antes.

Volto a encarar Luke e por um momento nossos olhos se encontram. Mas então ele foge do meu olhar de repreensão e passa a observar o solo.

– Melhor eu machucada, do que você morto. – Rebato com razão.

Luke revira os olhos e está prestes a continuar a nossa discussão quando algo, ou melhor, alguém, se aproxima. Ouço o barulho vindo por trás de mim e me viro rapidamente.

Meus olhos se arregalam e Luke também parece alarmado quando percebemos a presença de algum ser se aproximando de nós. Escutamos passos e estalos de galhos sendo emagados conforme o ser desconhecido pisa.

De novo meu coração acelera-se e eu, involuntariamente, me aproximo de Luke. Ele anda, até ficar em minha frente, como se fosse me proteger. Já está com a espada empunhada em uma de suas mãos.

Desembainho minha adaga suja pelo sangue dos lobos e tento controlar minha respiração acelerada. Estremeço e Luke percebe, já que estende sua outra mão, que não está segurando a espada, para trás até tocar a minha. Nossos dedos se entelaçam e isso me deixa um tanto mais calma.

Ficamos ali, ouvindo o desconhecido se aproximar cada vez mais e esperando pelo seu ataque eminente.

O ruído dos passos cessa e eu aperto a mão de Luke com todo o nervosismo. Então uma voz fina, delicada e familiar diz:

– Oh céus! O que diabos aconteceu com vocês dois?

Me sinto completamente aliviada quando encaro para Nina e Jeremy, que também nos observam com muita curiosidade. Devemos estar realmente muito acabados, devido aos olhares dos nossos amigos, que se resumem em uma mistura de preocupação e repulsa.

Os olhos de Nina passam para as minhas mãos nas de Luke e como sempre, não consegue conter um sorrisinho. Sinto minhas bochechas arderem quando solto Luke, tão imediatamente que ele percebe. Vira seu rosto para mim com as sobrancelhas levantadas, não entendendo minha reação desesperada. Ignoro seu olhar e volto a encarar nossos amigos em nossa frente.

– Inundei uma caverna subterrânea. – Respondo apontando minha adaga para caverna atrás de nós, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Tanto Nina como Jer parecem perplexos e confusos.

– Lobisomens. – Luke responde antes mesmo que nos perguntem. – Apareceram aqui na ilha e tentaram nos atacar.

– O que? Lobisomens aqui? – Jeremy pergunta, indignado.

– Sim. E a única conclusão que conseguimos chegar é que estão atrás de Emily. Quase conseguiram nos derrotar, se não fosse ela. – Luke diz, fazendo me sentir meio sem graça.

Ele explica à Nina e a Jer tudo o que acabou de acontecer, sobre termos encontrado a caverna subterrânea e depois a chegada dos lobos. Conta sobre nossa breve batalha e que eu nos salvei.

– Mas por que os lobisomens iriam querê-la? – Nina pergunta, meio confusa.

– Eles, definitivamente, não chegaram aqui sozinhos. Existe alguém por trás disso. Esse alguém mandou os lobisomens atrás de Emily. – Luke responde com clareza.

– E acreditamos que esse alguém possa ser meu pai. – Completo a afirmação de Luke. – Quer dizer, o cara dos meus sonhos... Vocês já sabem dessa história.

Jer balança a cabeça, como se fosse muita informação para pouco tempo de absorção dos fatos.

– Mas seu pai não pode entrar nos seus sonhos Emy! – Ele me censura outra vez. – Já dissemos isso.

– Eu sei Jer, mas se fossem seus sonhos você entenderia. São reais demais para serem simples sonhos e eles se repetem com frequência. Além do mais é a única conclusão a que conseguimos chegar.

Ficamos em um silêncio repentino, nos encarando e pensando ao mesmo tempo.

– Mas então, por que vocês estão aqui mesmo? – Luke pergunta de repente.

– Ah, claro! Procuramos por vocês por tanto tempo que estava até esquecendo de contar. – Os olhos de Nina se enchem de esperança, para a a minha surpresa.

– O que houve? – Pergunto, meio que interrompendo-a. Estou completamente curiosa.

Um sorriso ilumina o rosto de Nina e isso é algo que não vejo há um certo tempo. Talvez seja sinal de boas notícias. Jeremy também parece estar de bom humor.

Olho para Luke pelo canto dos olhos e percebo que ele também olha para mim, tão curioso quanto eu. Volto a encarar a feiticeira de cabelos ruivos bem à minha frente.

– Encontramos duas pessoas que podem nos ajudar.

– E digamos que você vai gostar de ver uma delas. – Jeremy completa, falando comigo.

***

Seguimos Jeremy e Nina, mata adentro. Eles parecem tão certos da direção a seguir, que eu e Luke decidimos não questionar. Caminhamos em silêncio e, por causa do calor, noto que minhas roupas já estão secas.

Vejo outras pixies voando pelas árvores, mas as ignoro. Não quero me aproximar de nada que possa nos fazer mal e como Jeremy disse mais cedo, essas coisas são diabólicas.

Andamos por quase uma hora até chegarmos perto de uma árvore bem exótica. É grande e assemelha-se a um salgueiro de folhas cor-de-rosa. Bem ao seu lado há uma outra caverna. Noto que a parede de pedras é envolvida por uma grande quantidade de musgo.

Sinto-me receio de ir entrando assim em qualquer caverna, com medo de haver demônios em seu interior, mas Nina e Jeremy andam tranquilamente para dentro dela, como se já tivessem feito isso antes. Deixo-me confiar neles e continuo os seguindo.

As rochas que formam a caverna são de um tom de marrom e parecem um tanto úmidas. À medida que andamos, a luz do sol vai ficando para trás.

Meus amigos que nos conduzem cochicham e então Nina deixa escapar uma risadinha.

– Querem deixar de mistério e contar logo o que está acontecendo? – Pergunto, não me importando em ser rude. A verdade é que estou extremamente curiosa.

– Você precisa ver com seus próprios olhos. – Ela diz, pedindo para que eu seja compreensiva. – Calma, garota, estamos chegando.

Luke caminha quieto demais ao meu lado. Olho para ele, esperando que também olhe para mim. Assim que o faz, eu sorrio ligeiramente. Aguardo ele retribuir o sorriso, mas ao invés disso, me ignora e volta a encarar a escuridão.

Sua atitude me deixa confusa e chateada. Luke, ultimamente, não tinha me tratado com tanto desprezo assim. De repente, me pego pensativa: Será que ele havia ficado chateado com o lance da mão, mais cedo?

Continuo encarando-o e ele continua a me ignorar, até que eu fico tão magoada que minha garganta começa a arder. Mordo o lábio inferior, segurando um suspiro e volto a olhar para minha frente, desistindo de me comunicar com Luke.

A caverna se torna mais escura a cada passo que avançamos, mas isso não impede que Nina e Jeremy continuem nos guiando. Temos de nos encolher para atravessar uma passagem um tanto estreita, mas acabamos conseguindo fazer isso de forma rápida.

Entramos em completa escuridão e Luke é obrigado a incendiar uma de suas mãos para enxergarmos o caminho.

Paro para pensar e de repente, Luke tem razão: esse seria um ótimo habitat para os demônios durante o dia. O mais interessante é que eles simplesmente não estão aqui.

A luz reaparece progressivamente enquanto caminhamos e eu fico um pouco mais tranquila. Consigo encontrar um buraco no alto da parede de rochas da caverna. Noto que o chão parece um pouco mais úmido do que antes.

Estamos andando, quando finalmente Nina e Jeremy param à nossa frente. Meu coração acelera e meu estômago queima pela ansiedade. Chegamos.

Luke e eu caminhamos um pouco mais, até ultrapassarmos nosso amigos e paramos quando nos deparamos com a água. Muita água.

Meu cérebro trabalha um pouco devagar, mas trabalha e eu finalmente percebo que toda essa água vem do Shadow Ocean, já que é do mesmo tom de azul escuro. Então a caverna dá para o mar, interessante.

Encaro o feiticeiro negro ao meu lado, mas ele já não está mais obsrvando a água e sim alguma coisa à nossa esquerda. Minha cabeça vira-se nessa direção imediatamente.

Há dois indivíduos sentados, um ao lado do outro, na beira do mar. Eles param de conversar assim que chegamos e nos encaram, assim como os encaramos.

A menina da direita é a que mais me chama atenção. É definitivamente a mais bela que já vi em minha vida. Tenho certeza absoluta que qualquer garota mataria para ter sua aparência.

É jovem, parecendo ter uns vinte anos ou um pouco menos. Sua pele é perfeita e rosada como pêssego, possuindo alguns desenhos em dourado na altura dos ombros, como tatuagens. Veste algo que parece mais um emaranhado de algas com flores, para cobrir os seios. Seus cabelos de um castanho forte são sedosos e bem longos, formando cachos belíssimos nas pontas. Seus olhos são da cor de ouro e fora isso, tem um rosto de traços tão delicados e perfeitos, que dá para notar que não se trata de uma feiticeira, muito menos de uma humana. Mas eu congelo mesmo é quando meus olhos pousam em sua cauda. Uma cauda tão dourada quanto os olhos, talvez um pouco puxada para o laranja, que paira sobre a água excessivamente azul do Shadow Ocean.

É uma Sereia.

Ela sorri para mim e eu não sei se consigo sorrir de volta, já que é tão majestosa, que chega a me assustar um pouco. Já havia escutado tantas lendas humanas sobre sereias que não sei se posso ou não confiar na criatura.

Meus olhos passam para a figura ao lado, que também sorri para mim. Esse não é um sereiano, eu tenho certeza, pois consigo ver seus pés enfiados na água. Tem os cabelos loiros e a pele bronzeada. Possui alguns machucados no rosto e seu sorriso é tão familiar, que me arrepia. Então, é que eu finalmente me toco.

Como se tivesse levado uma pancada na cabeça percebo quem é o cara, que já se levanta e anda em minha direção. Com lágrimas nos olhos, esqueço de tudo e todos ao nosso redor e vou ao seu encontro. Peter.

Ele me envolve com seus braços, em um abraço apertado e eu tenho de engolir minhas lágrimas, pois odeio chorar na frente dos outros. Sinceramente, pensei que nunca mais voltaria a vê-lo. Ele acaricia meus cabelos com as pontas dos dedos e eu respiro fundo, com uma alegria tremenda.

– Emy. – Ouço sua voz, que pensei que nunca mais fosse ouvir na vida.

Me solto de seus braços e encaro seus olhos azuis como o céu.

– Por onde você esteve? – Pergunto, quase que gritando. – Não tem nem ideia de como fiquei preocupada. Achei que estivesse morto!

Peter desvia os olhos dos meus e seu sorriso é tão grande que posso jurar que vai de uma orelha à outra. Ele vira de costas para mim e olha para a sereia, que também sorri para ele.

– Estive com ela. – Ele diz, parecendo meio distraído. – Seu nome é Serena. Emily, ela salvou minha vida.

Ele volta a olhar para mim, ainda sorrindo e não sei por que, mas alguma coisa em seus olhos dizem que nutre algum sentimento especial por Serena. Não posso culpá-lo, afinal, a garota é incrívelmente bela e ainda, aparentemente, salvou sua vida. Enquanto isso, eu quase o matei.

Nunca senti algo por Peter que não fosse a sincera amizade. De verdade, eu poderia até considerá-lo um irmão. Não nos conhecemos há tanto tempo, mas mesmo assim, ele me ajudou muito em Kingswood. Ensinou-me várias técnicas de luta, que aprendeu em seu treinamento e me consolou muitas vezes em que estava chateada, principalmente com toda a confusão da Fogueira da Fortuna.

Confesso que da primeira vez que o vi, na noite em que haviamos dançado ao redor da Fogueira, o achei tão bonito que pensei em me aproximar dele com certas intenções. Intenções totalmente diferente das que tenho agora.

Se Peter está tão apaixonado por Serena quanto parece estar, eu o apoiarei em qualquer decisão que tomar em relação ao assunto. Mesmo que sua pretendente for uma sereia, afinal, eu devo isso e muito mais ao meu amigo.

Olho para Serena que acena para mim com uma de suas mãos. Seus braços com as marcas douradas chamam à minha atenção.

– Então é a famosa Emily. – Ela diz com uma voz doce e hipnotizadora.

Sorrio para ela, tentando ser gentil, enquanto Luke se aproxima e cumprimenta Peter com um aperto de mão.

***

Estamos todos sentados em volta da água, exceto por Serena, que está dentro dela. Ela mexe em seus longos cabelos, enquanto fala.

– Costumava viver no grande reino dos sereianos de Shadow Ocean. Nós temos os nossos líderes, que são o rei e rainha. Porém, eu era só uma súdita. – Ela explica, meio distante, como se lembrasse exatamente de cada fato. – O reino é imenso e somos muito numerosos, mas não me admira que não tenham esbarrado em nenhum de nós.

– Desculpe a interrupção, mas eu preciso mesmo perguntar. – Interrompo-a, sem me preocupar em parecer irritante. – Na verdade, achei que esbarraríamos em muito mais criaturas desde que saímos de Kingswood. Os demônios daqui também desapareceram. Você tem alguma ideia do que possa estar acontecendo?

Eu sei o que está acontecendo, Emily. Só tenha calma, eu ainda vou chegar nesta parte. – Serena parece mais pensativa do que antes. Então, retoma sua explicação anterior. – Mas enfim, o nosso reino adotava uma política meio violenta, a qual eu não era nada a favor.

Ela baixa os olhos, como se fosse o assunto a magoasse um pouco e é Peter quem continua a falar.

– Vocês sabem como os sereianos de Shadow Ocean são. – Peter diz, olhando para os meus amigos. É claro que eu não sei. – São mais violentos que os outros reinos de sereianos por aí.

– O que eles fazem para serem violentos? – Pergunto, impaciente.

– Atacam qualquer feiticeiro que ousa passar pelo seu reino, mesmo que não tenha más intenções. – Luke me explica. – E geralmente o tortura até a morte. Alguns dizem que fazem isso porque invejam nossos poderes, outros, dizem que é por pura diversão.

– E claro, usam seus dons de beleza e canto para nos atrair. – Nina completa, apontando para Serena que parece bem envergonhada com o comentário.

A sereia nada até ficar bem próxima de Peter, que estende sua mão. Ela a pega e eles ficam de mãos dadas. Parece que as coisas estão acontecendo mais rápido do que eu imaginava.

– Nunca gostei do fato de assassinarem feiticeiros inocentes, que nem sequer tinham interesse de nos atacar. – Explica. – Então, um dia, um feiticeiro branco muito incomum nos fez uma visita, prometendo poder se o ajudássemos em um exército de demônios e outras criaturas que abominam a espécie dos feiticeiros. Segundo ele, o exército dominaria Opposite e depois disso, o mundo humano. Ele era forte e nem mesmo a mais bela e poderosa das sereias conseguiu enfeitiçá-lo.

Essas palavras me acertam em cheio, como um soco no estômago. Olho imediatamente para Luke, que também olha para mim. Ambos sabemos de quem está falando. Do meu possível pai. O cara que tem tirado o meu sono, literalmente.

– O nosso rei ficou tão impressionado, que decidiu se juntar ao feiticeiro. – Serena explica, ficando cada vez mais próxima de Peter. – Mas eu estava assustada. Não gosto de demônios e não queria me aliar a eles e a um feiticeiro louco para destruir outros feiticeiros, que nem sequer tomam atitudes prejudiciais à nossa espécie. Então... Eu fugi. Deixei minha família e vim viver sozinha nessa caverna da ilha. Estou aqui já faz quase um ano.

Sinto uma repentina pena pela sereia e um imenso desespero com tudo o que ela diz. Então o tal feiticeiro branco dos meus sonhos realmente existe e pior: está formando um exército de demônios e outras criaturas para aniquilar os feiticeiros.

– Quer dizer que os sereianos estão aliados ao tal feiticeiro branco já faz quase um ano? – Jeremy pergunta, parecendo apavorado. Não consegue acreditar no que escuta, já que não acreditou no que eu disse sobre meus sonhos.

– Sim. É por isso que não encontraram quase nenhum demônio por aqui. Estão todos com ele, com o feiticeiro branco malígno. Os sereianos do Shadow Ocean também. Estão se preparando. – Ela nos informa, parecendo chateada. – Quando encontrei Peter, encontrei com ele a esperança. A esperança de contar aos feiticeiros sobre o exército de demônios. Vocês devem voltar à Kingswood o quanto antes e formar um exército ainda maior. Devem unir feiticeiros negros e brancos.

Uma pontada dolorida atinge meu estômago e de repente não sei se estou mais preocupada em achar meus pais, ou com a minha própria vida. Nossa própria vida, para ser mais precisa. Opposite está em jogo.

Luke está ao meu lado, tão nervoso quanto eu e simplesmente sigo o instinto de tocar o seu ombro. Não me importo mais se está chateado comigo.

– É muito pior do que eu imaginava. – Ele balbucia, chocado. – Se não encontrarmos a garota perdida e não conseguirmos unir feiticeiros brancos e negros, o exército de demônios liderado por esse psicopata nos derrotará.

O fato de Luke chamar meu possível pai de psicopata não me cheateia, porque aparentemente, essa é a mais pura verdade.

Nina e Jeremy estão tão em choque quanto nós. Ao que parece, também não sabiam dessa parte da história.

Não se trata só de uma de simples guerra entre feiticeiros negros e brancos que acontecerá, caso falhemos com a missão. Mas sim uma destruição completa de nossa raça. Separados, não somos páreos para tantos demônios, isso é óbvio.

E o mais óbvio ainda é que temos de encontrar a “garota perdida” mais rápido do que imaginávamos. Nosso prazo diminuiu drásticamente, afinal, quanto antes os feiticeiros negros e brancos estiverem unidos, melhor.

– Acalmem-se. – Serena volta a falar, provavelmente sentindo-se culpada pelo nosso desespero. – Peter me contou tudo. Sobre a “garota perdida”, sobre o tratado entre feiticeiros negros e brancos e sobre vocês precisarem encontrar o Oráculo Mágico.

Ainda estou com meu braço apoiado no ombro de Luke e o acaricio percebendo suas mãos trêmulas e o rítmo acelerado do seu coração. Ele respira fundo, tentando se acalmar.

Nina cobre o rosto com as mãos e não sei dizer se está chorando. Quero poder fazer algo por ela, mas Jeremy passa um dos seus braços em volta de seus ombros, tentando consolá-la. Confesso nunca tê-la visto naquele estado. Justo Nina que é sempre tão controlada.

Uma sensação de tristeza profunda me domina. A verdade é que os dias de Opposite estão contados. Consequentemente, os dias do mundo humano também. Tudo o que conheço, em algum tempo será tomado por um feiticeiro branco malígno e seu exercito de demônios.

Os olhos dourados de Serena parecem vacilantes e Peter olha para ela com preocupação. Então, ela finalmente diz:

– Acalmem-se. Eu sei onde está o Oráculo.


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