Sob a Luz do Sol escrita por Tatiana Mareto


Capítulo 8
Capítulo 7 - Outras Compreensões




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/24249/chapter/8

 

*tema: Chopin’s Nocturne Op. 9 N. 2*

A escola começava a fascinar-me, então. Naquele dia, tive a oportunidade de sentar-me com eles. Os humanos. Aqueles que desejavam minha companhia antes. Mais ciente do meu lugar no espaço, menos atabalhoada e sentindo mais capacidade de controlar alguns de meus instintos mais confusos, eu pude sentar-me com eles. E foi divertido, devo confessar. Foi bem humorado estar na presença deles, e ouvir todas as suas conversas e absorver todo o seu conhecimento. Sem que eles me notassem. Aprendi a mentir muito bem, e a inventar histórias que em muito se assemelhavam com as fábulas de Felicia. Tão inverossímeis quanto eu parecia ser.

Eu tive a oportunidade de conhecer alguns deles. Não me recordaria de tudo, eu tinha certeza. Sylvia, a mesma da vez passada, foi quem me fisgou para a mesa dos humanos. Ao seu lado, estava uma outra garota, cujo nome eu não sabia. E também à mesa estava um rapaz, Geoffrey. Ele tinha uma cara engraçada. Como eu estava me acostumando com os machos vampiros… homens vampiros… eu achei os homens humanos somente… engraçados. Eu precisava mesmo manter a palavra homem em minha boca, ela sempre me fugia. Uma hora ela ainda me fugiria em momentos inadequados. Sylvia era divertida, e aparentemente popular. Falava bastante, e todos pareciam apreciar sua companhia. Geoffrey era calado, e parecia tímido. Eu também era tímida, então empatávamos. Conversamos bastante, trocando olhares. Era uma forma de comunicação interessante.

Edward, o guardador de minha estada, observou-me de longe durante todo o tempo. Creio que para impedir-me de falar tolices. Tolices que eram minha marca registrada. Em poucos dias que estava entre eles, já me sentia mais bem integrada. Mas ao final do dia, quando a escola nos liberou, chegando à casa dos Cullen foi que tive notícias curiosas, e talvez até mesmo perigosas. Carlisle tinha dados dos meus exames… testes… ele tinha informações sobre mim.

Os Cullen estavam então reunidos no salão, e eu parecia o assunto principal.
_Bea. – Carlisle me sorriu. – Seria bom conversarmos… estou com alguns resultados. – Ele me apresentou papéis.
_Não seja embromador, Carlisle. – Alice parecia ansiosa. – Eu quero saber o que descobriu sobre a híbrida.
_Que ela é híbrida. – Jasper implicou.
_Bem… Bea, você é uma pessoa bastante curiosa, sabia? Bem… não é uma pessoa propriamente.. é um vampiro. Disso não duvido, até porque você se assemelha a um… mas o sangue que você me forneceu… ele é muito, muito diferente de tudo que já vi.
_Como diferente? – Esme, curiosa. Todos pareciam curiosos. Eu me sentia novamente a cobaia.
_Eu descobri células mutantes. Em você… por todo o seu corpo físico.
_Mutantes? – Emmet franziu a sobrancelha. – Como… nos filmes?
_Como vocês são infantis! – Rosalie protestou. – Deixem Carlisle falar… afinal, estamos curiosos.
_A situação é a seguinte… eu precisaria de mais testes, mas não confio exatamente em ninguém para fazê-los. Afinal, Bea é uma vampira. Não posso arriscar expô-la. Porém… já posso confirmar que ela é uma híbrida, com certeza. Ela tem a presença de células completamente mortas em todo o seu corpo. Seus órgãos internos praticamente não funcionam… somente observei atividade no coração e no pulmão. Mas seu coração bate 10, 12 vezes por minuto… ou seja, ela está tecnicamente morta. – Todos ouviam o médico falar, inclusive eu. – Mas ela não é uma vampira pura, pois se fosse não teria nenhuma manifestação viva em seu corpo. Só que não foi isso que me impressionou… apesar de eu estar bastante impressionado com essa história de híbridos não serem lendas.
_O que te impressionou, Carlisle? – Edward teve que perguntar.
_O organismo de Bea parece estar reagindo a algo… parece estar mudando, se adaptando.

As interjeições foram generalizadas. Todos disseram “ah” ao mesmo tempo, demonstrando tanto surpresa quanto nenhuma compreensão do que o médico falava. Ah, eu estava reagindo… bem, tão ignorante eu não era. Desde que coloquei meus pés sobre a terra, eu senti que reagia a alguma coisa. Eu não sabia o que eu havia, mas eu sabia que eu estava diferente. Meus instintos não estavam tão errados, então.
_E isso é bom ou ruim? – Novamente, eu tinha que perguntar.
_Isso é inusitado. – Ele sorriu. – Isso significa, Bea, que você precisa de observação.
_Observação?
_Sim. Eu fico feliz que estejamos com você… e se você quiser estar conosco por mais tempo, será muito bom… eu poderei avaliar a sua evolução e acompanhar todas as mudanças que ocorrerem com seu organismo. Ainda não sabemos o que a sua parte humana influencia, além dos batimentos cardíacos e da respiração…
_Eu… não sei o que dizer.
_Fique permanentemente conosco. – Esme sorriu. – Quero dizer… uma sobrinha pode morar com os tios, não pode? A não ser que você deseje retornar para seu covil, claro.
_Não! – Detestei a possibilidade. – Eu… não pretendo retornar.
_Então está determinado. Você fica conosco… a sobrinha se muda para a casa dos tios. Forks é um ótimo lugar, pois aqui o sol não te incomodará. E uma família pequena tem vantagens. Edward tomará conta de você.

Edward tomará conta de você.

Aquela frase soou tão bem aos meus ouvidos quanto não deveria. Retirei-me para meus aposentos tão logo a conferência Cullen terminou, deixando os integrantes da família. Eu tinha que compreender estar me tornando o novo integrante da família Cullen, o que não me era desagradável… mas eu ainda não conseguia parar de enxergar o perigo. Tentando me enquadrar, banhei-me lentamente e dolorosamente, pois eu sentia meus músculos contraírem. Segundo Rudolph, eu não sentia dor exatamente… era mais uma sensação que representava, para um morto-vivo, a dor. Ah, mortos vivos. Aquele termo era inexplicavelmente sofrido, para mim. Eu desejava ser apenas viva. Apenas um deles.

Os meus sentidos aguçados me fizeram ouvir outra conversa entre os Cullen. Daquela vez, Jasper participava. Os homens estavam na sala do piano, e eu parei no meio do enorme corredor para ouvi-los. Sim, despida de alguns valores éticos que os humanos tanto consideravam.
_Carlisle… é só uma idéia. – Edward ponderava.
_Uma idéia a qual não concordo! – Jasper protestava.
_Acalmem-se rapazes… temos que ser ponderados. Edward… não consigo entender-lhe. Por que rejeita ser o tutor de Bea, agora? Aceitou tão bem o encargo alguns dias antes.
_Eu sei, é que… – Edward parecia aborrecido em falar naquilo.
_O que está havendo, Edward? – Jasper pareceu sentir o mal estar no pseudo irmão.
_É que ela me desperta sensações estranhas. – Edward confessou. Apurei meus ouvidos. Sensações estranhas? Quais poderiam ser? Repulsa, nojo, asco? Ou alguma coisa diferente? A palavra ‘estranha’ soava como algo ruim… e foi minha vez de sentir um mal estar típico dos meus momentos sob o sol. Eu já estava achando tudo aquilo muito inconveniente.
_Ora… mas disse que não sentia nada por ela.
_Enganei-me. Ela… uma parte de mim deseja que ela seja humana. Outra parte, que seja vampira. Gosto de vê-la pulsar… ela me traz recordações.
_Recordações de um lado humano que você esconde muito bem, filho. – Carlisle compreendeu a hesitação de Edward. Eu não. Tudo aquilo ainda soava irreal aos meus ouvidos.
_Então, deve mesmo estar ao lado dela. – Jasper considerou, satisfeito. – Ora Edward… ela combina com você. Seja agradável.

Novamente precisei tomar cuidado para que Jasper não me pegasse a espionar os Cullen. Corri para meu quarto, e desejei ficar trancada ali. Trancada, de forma a ninguém conseguir incomodar-me. Mas eu nunca conseguia ficar trancada… no covil as portas eram sempre abertas. Ali, pelo visto, também. Os Cullen sempre apareciam no meu quarto.

Porém naquela noite ninguém apareceu. A noite estava alta, e a lua cheia a clarear as árvores do lado de fora. A noite era tão linda… os pontos luminosos que faiscavam no céu pareciam mudar de cor. E as nuvens cinza chumbo permitiam nuances que eu desconhecia, a colorir a ausência de cor do breu profundo. E a música novamente me preencheu os ouvidos. Os acordes do piano eram suaves… mas firmes. Edward. Senti um arrepio humano ao pensar na cena anterior, no piano tocado na noite anterior. A imagem do vampiro a contrastar com o ébano do instrumento… meus olhos então novamente se fecharam, e uma nova sensação tomou conta de mim. Uma sensação de calma… de tranqüilidade. Deitada na cama, tentando lutar com o sono que fazia meu corpo inerte e desejando saltitar pela casa, senti-me confortavelmente amparada.

Havia algo naquele lugar que me fazia entender, então, o conceito de casa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sob a Luz do Sol" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.