The Ruler And The Killer escrita por Marbells


Capítulo 15
Don´t play with me, you will regret it


Notas iniciais do capítulo

Olá, gente! Eu queria ter postado ontem ou no dia anterior, mas não consegui. Bom, o capítulo é um pouquinho grande - pelo menos é maior do que costumo escrever -, por isso, não vou empatar mais.



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Já tinha amanhecido á muito tempo, e eu andava pela floresta á procura de comida para levar para a cornucópia. Os outros carreiristas e Peeta estavam lá, pegaram nas tendas e nas mochilas e combinámos que enquanto Glimmer, Jean e Peeta vigiavam a cornucópia, eu ia caçar e Cato e Marvel iam procurar tributos. Mas, as coisas fugiram do controle no preciso momento em que, com um coelho morto nas mãos e três esquilos também mortos na minha mochila, ouvi um grito.

Aquele não era um grito normal, assemelhava-se áqueles gritos de guerra que os antigos guerreiros davam antes de se iniciarem as batalhas. Obviamente, nunca ouvi um verdadeiro grito de guerra, apenas aqueles que passavam na televisão. Porém, quer tendo ou não ouvido um verdadeiro grito de guerra, eu sabia que aquele grito não indicava nada de bom e, pior ainda, vinha do lugar para onde eu tinha visto Cato em Marvel deslocaram-se á minutos atrás. Rapidamente, coloquei o coelho morto no interior da mochila, voltei a colocá-la nas costas e corri o mais depressa possível para o lugar de onde vinha, repetidamente, o som. Com agilidade eu saltava sobre os ramos e pequenos troncos espalhados pelo solo, desviava-me das árvores e, com sorte, não caí nem uma vez. O meu corpo não estava habituado às temperaturas da arena, a minha pele estava seca devido ao calor intenso durante o dia e ao frio durante a noite; até os meus pés se queixavam, dando-me dor terríveis cada vez que eu parava depois de correr durante alguns minutos. Tudo isso e este era só o segundo dia na arena. Morrer parecia-me, agora, bem mais fácil do que antes, bastava que eu me desligasse do Mundo durante alguns segundos, que ignorasse tudo á minha volta e que tirasse do meu rosto aquela máscara que fazia todos, com apenas uma exceção, recuarem.

-Seu miserável! – agora o grito já era compreensível e pude reconhcer a voz de Cato – Como se atreve a dizer isso, hã?

-É apenas a verdade! – zombou a voz de Marvel, o que me fez apressar ainda mais.

-Cato! – gritei á medida que me aproximava – Cato!

-Ela vem aí, não ouve? Quer ser visto assim, como o monstro que é? Vai arriscar-se a perder a garota de vez? – não entendi porquê e nunca cheguei a entender, mas aquela mísera frase foi o suficiente para uma briga entre dois garotos se tornasse algo maior e, conseuqentemente, mais perigoso.

-Cala-se! Você vai arrepender-se e eu não me importo se temos uma aliança ou não! – giritei mais uma vez quando ouvi um som familiar, aquele som que tanto me chegara a empolgar, mas, que naquele momento, quase que me deu vontade de chorar.

O som de socos, murros e pontapés fez-se ouvir á minha volta, mas eu já não sabia de onde vinham esses sons, estava perdida e era obrigada a ouvir aquilo sem saber como estava Cato. Não queria saber de Marvel, esse podia morrido logo na bloodbath e eu nem teria notado. Aliás, eu teria notado sim, mas apenas para festejar a morte do desgraçado. Eu estava era preocupada com aquele garoto teimoso, convencido e perigosamente descontrolado, que quando perdia o controlo de si mesmo não conseguia voltar ao normal sem ter atingido o seu objetivo. E era isso que me assustava, a pequena, mísera, mas possível hipótese de, devido ao seu fraco auto controlo, Cato estar magoado. Eu detestava vê-lo magoado. Lembro-me quando treinávamos no Centro de Treinamento, havia sempre uma fila enorme de garotos que queriam lutar contra o “invencível Cato”. Eles nunca o venciam, essa é a verdade, mas Cato saía magoado várias vezes. E todas essas vezes em que eu tinha de assistir ao seu sofrimento, cheirar o sangue que fluía das suas feridas e ver as manchas arroxeadas na sua pele, tudo isso era como se eu própria estivesse a ser repetidamente atingida, com força e precisão por todo o meu corpo. Qualquer pessoa do Distrito 2 – se soubesse como eu me sentia, é claro - poderia dizer que eu era egoísta, que apenas não o queria ver a sofrer porque sabia que sofreria também. Sim poderia até ser isso, pois sou uma carreirista, mas, neste caso, não era. Não me importava com a porcaria da dor, na realidade, eu até tinha uma boa resistência à dor. Mas não era isso. Eu, pura e simplesmente, não podia ver aquele garoto a sofrer. A minha dor não tinha importância, mas a dele tinha e qualquer um que o fizesse sofrer minimamente pagava, sempre tinham pago e não era agora que isso ia mudar.

Um grito de dor trouxe-me de volta á realidade e voltei a correr. Desta vez, uns sons pareciam mais e mais perto á medida que me aproximava, pelo que deduzi estar a seguir o caminho correcto. De repente, parei de correr, a imagem á frente chocou-me e não sei como não gritei também. Fiquei imóvel enquanto observava aquelas duas figuras a lutar, rolando pela grama á medida que se tentavam agredir o máximo possível. Cato estava por cima de Marvel, distrubuindo-lhe socos no rosto, o seu rosto estava cheio de cortes e a testa tinha um corte um pouco mais profundo, de onde um líquido escuro escorria, fazendo o seu caminho pelo pescoço do garoto. Vi algo a brilhar no chão, era a espada de Cato, estendida no solo a alguns metros dos dois garotos que lutavam. Marvel, por sua vez, não estava num estado muito diferente de Cato, mas estava muito pior. O rosto estava coberto de sangue e Marvel cuspia algum de vez em quando, devido á força dos socos de Cato. Mas o garoto do Distrito 1 não se ia deixar ir abaixo sem luta, pelo contrário. Os pontapés de Marvel tinham como alvo o estomâgo de Cato e faziam o meu parceiro de Distrito gemer de dor, mas Cato nem por isso parou de atingir Marvel, ambos praguejando palavras que nem eu sabia o que significavam.

 Aproveitei que nenhum dos dois tinha reparado na minha presença e, tão rápido como me era possível perante aquela cena, retirei do meu casaco uma faca e lançei-a  no ar. O alvo era o pé esquerdo de Marvel, aquele de que ele sempre se queixava durante as caminhadas pela arena e, felizmente, o meu ataque teve um efeito melhor ainda do que aquele que era esperado. Marvel berrou de dor e controceu-se debaixo de Cato, mas Cato não parou de agredir Marvel. “Merda” pensei enquanto corria até eles “Maldita testosterona!”

-Para com isso, Cato! – gritei, mas o garoto continuou como se não tivesse notado a minha a minha presença. Naquele momento, Marvel já estava incosciente e mais um pouco e o seu rosto ficaria completamente desfigurado – CATO! – afastei-me, ganhando balanço, e, segundos depois, o meu corpo era jogado furiosamente sobre o de Cato, fazendo-nos rolar sobre o solo.

-Mas que… - Cato encarou-me em choque, os olhos esbugalhados e a boca completamente aberta – Clove, o que…

-Seu idiota! – exclamei e o afastei de mim – Porque fez isso com o Marvel? Não podia esperar até ele ser completamente desnecessário?

-Está a defende-lo? – a voz de Cato estava encolerada novamente, mas era um cólera diferente, ciúmes.

-Talvez. – respondi indiferente, levantando-me e limpando o meu casaco e as calças, a sujidade parecia ter cola naquele lugar.

-Você não faz ideia do que ele disse, daquilo que ele disse sobre você! – Cato acusou e, mais rápido do que eu poderia imaginar que fosse possível ele se mover, ele estava novamente perto de Marvel e dava um pontapé certeiro no estomâgo do garoto. Gemi, imaginando a dor que Marvel sentiria ao acordar.

-Não me importo com o que dizem sobre mim, Cato, e você devia fazer o mesmo. Eu posso perfeitamente cuidar de mim, não preciso que me defenda dos comentários dos outros.

-Não posso fazer isso, não dá para ignorar o que aquele miserável disse! – toquei o ombro de Cato e ele voltou-se para mim, o seu rosto em pura agonia. Era isto que eu temia, ver a dor no rosto dele, ver os estragos do ataque de Marvel na sua pele, sentir o cheiro do sangue de Cato e querer vomitar, não de nojo, mas sim de aflição. Vê-lo naquele estado ou vê-lo em carne viva não teria grande diferença.

-Shiu! – tapei a sua boca com a minha mão e sorri, olhando rapidamente para o corpo de Marvel, que estava estendido no chão – Não queremos acordar a princesa adormecida, pois não? – Panem inteira devia estar a rir da expressão confusa que Cato fez naquele momento.

-O quê? – gargalhei, tentando distrai-lo (e a mim também), o que, felizmente, deu resultado.

-Esqueça, mas, agora, temos de ir.

-E o que fazemos com… isso? – apontou para o corpo de Marvel, sorrindo ao ver os estragos que fizera no rosto do garoto.

-Podíamos deixá-lo aí mesmo, mas ele ia morrer mais cedo ou mais tarde e, detesto admiti-lo, mas o garoto ainda é útil. Por mais estúpido e miserável que ele seja, Cato, nós ainda precisamos dele. – eu disse calmamente, afagando o rosto de Cato evendo-o fechar os olhos devido ao contacto dos meus dedos no seu rosto.

-Tudo bem. – ele cedeu com um suspiro – Mas, eu não vou carregar o corpo desse traste a não ser que ele esteja morto, e como dúvido que consiga e não quero que o carregue sozinha, vamos para a cornucópia e os outros logo o vêm buscar.

-Ótimo. Assim até podemos pôr a comida já na fogueira.

*

Já era de noite e, na minha opinião, aquele foi o dia mais rápido de que tenho memória. Glimmer entrou em histeria quando soube o que aconteceu e, com a ajuda de Peeta, ela foi Buscar Marvel. Jean, para minha suspresa, não fez nada além de rir do desgraçado e até disse “Já que não matámos o Peeta, você podiam ter-se livrado do Marvel”. Essa garota me surpreendia e nós até nos dávamos bem, com exceção dos momentos em que Glimmer se juntava a nós e eu era forçada a ir embora.

-Como se sente, Marvel? – Peeta perguntou, enquanto estávamos todos juntos á volta da fogueira. Íamos passar a noite na cornucópia, mas, no dia, seguinte, começaríamos a explorar mais profundamente a arena, iríamos para perto do lago.

-Nem vou responder.

-Porque não?

-Porque a resposta é óbvia. – Peeta suspirou. Eu não conseguia entender o que ele queria ao conversar com Marvel, quero dizer, o garoto apenas era útil com as lanças, nada mais, nem para conversar decentemente ele servia.

Olhei para Marvel e um sorriso maldoso apareceu no meu rosto. O garoto estava realmente mal, mas em poucos dias estaria melhor. O rosto de Marvel tinha vários cortes e hematomas, enquanto alguns cortes mais profundos eram visíveis nos seus braços e pernas, onde, certamente, os ramos de árvores caídos no chão o devem ter atingido e, em alguns casos, perfurado a sua pele. Mas era merecido, muito bem merecido na verdade. Ainda não sei o que Marvel disse sobre mim para fazer Cato o atacar tão ferozmente, mas, de qualquer forma, eu não precisava de saber, pois tinha a certeza de que Cato o tinha feito pagar muito bem pela asneira que ele deve ter dito.

-Então, gente, - Jean começou animadamente, tentando quebrar o silêncio – o que pensam em fazer se, caso ganharem, voltarem para o vosso Distrito? – a ideia de Jean pareceu resultar, porque todos os rostos, menos o meu e o de Cato, pareceram iluminar-se de repente.

-Eu vou para a Capital. – respondeu Glimmer, balançando o cabelo e fazendo uma expressão que ela devia pensar ser sensual. Pelo contrário, aquilo era patético – Vou vender a minha casa na Vila dos Vencedores e vou comprar um apartamento na Capital.

-Eu vou abrir uma loja de lanças!

-Não sei, - Peeta parecia um pouco hesitante, distante talvez. O garoto parecia estar a ponderar as hipóteses de regressar vivo a casa e, pela expressão no rosto dele, elas não pareciam muito grandes. E não eram, porque a única pessoa que ia voltar dali viva seria Cato, nem havia outra hipótese – eu trabalhava na padaria dos meus pais, mas talvez continue a trabalhar lá depois de vencer. Se vencer. – a última frase foi proferida num múrmurio.

-Bem, eu vou trabalhar num Centro de Treinamento. – Jean disse com um sorriso – E vocês os dois?

-Não sei, - Cato respondeu com um encolher de ombros – vou tentar viver a minha Vida normalmente.

-Isso é impossível. – a minha voz estava fria e ácida, o sorriso desaparecera do meu rosto – É isso que os vencedores dos Jogos Vorazes perdem, uma Vida completa que poderiam ter se não fosse isto! – apontei para a floresta á nossa volta e continuei, ignorando o fato de saber que estava a ser filmada – Quem tiver a “sorte” de sair vivo daqui nunca voltará a ser como antes e não será um apartamento de luxo na Capital, uma boa casa na Vila dos Vencedores ou outra porcaria qualquer que vos vai fazer esquecer os dias que passaram aqui. Porque, e vocês sabem bem disso, todos nós estamos, de qualquer forma, condenados. Sempre estivemos, mas só soubemos quando o nosso nome foi sorteado.

O silêncio imperou durante minutos, todos olhavam para mim, como que meditando sobre as minhas palavras. Eu tinha razão, estávamos condenados a partir do momento em que nascemos, porque, de uma forma ou de outra, todas as pessoas morrem, mas nós íamos morrer primeiro. Por uma estupidez da Capital, eu nunca poderia viver uma Vida longa com Cato. Não, ele teria de voltar sozinho. Bom, pelo menos com essa parte eu já me tinha conformado, agora, o que me irritava era esse controlo que a Capital tinha sobre os Distritos, sobre as pessoas, sobre nós. No final, estávamos todos condenados, inluindo a Capital, porque, mais cedo ou mais tarde, os Distritos teriam a sua vingança, e essa era mais uma das coisas que eu me lamentava de vir a perder. Como seria bom ver aquela gente da Capital a cair na desgraça, a sofrerem como nós, a passarem fome e a viverem sem saber quanto tempo mais teriam de Vida, se segundos ou horas, se dias ou semanas. Nem eram as histórias deploráveis dos tributos sobreviventes das Edições anteriores dos Jogos Vorazes ou a vida das pessoas dos Distritos que me fazia ansiar tanto pela Vingança, na verdade, era Cato e tudo aquilo que ele ia perder. Estava presente na minha consciência que Cato passaria por tempos horríveis quando saisse da arena, os pesadelos seriam frequentes e eu temia o que aquele garoto que me compreendia tão bem podia vir a sofrer no futuro.

*

No dia seguinte, deixámos a cornucópia e avançámos para o norte da arena, em direção ao lago. Estavam todos calados desde que eu tinha feito aquele meu “discurso” e eu me perguntava se estavam ainda sobre efeito das minhas palavras ou tinham resolvido odiar-me enquanto estivéssemos juntos. Mas uma vez, pouco me importo com isso. Uma das coisas que aprendemos no Centro de Treinamento é a focalizar a nossa mente no essencial, ignorando tudo o resto. No início não é fácil, a consciência pesa e não sabemos se estamos a fazer o correto. Mas, com o passar do tempo, a consciência foi transformada em algo quase imaginário, uma espécie de apêndice mental. Não precisamos dele para sobreviver, mas podemos ficar gravemente doentes caso ele fique infetado. E o mesmo acontece com a consciência, ela não infeta, mas pode pesar quase tanto quanto o céu da arena. Tudo isso sobre os nossos ombros. Tudo isso até cedermos. No final de contas, até agradeço por ter aprendido a controlar a minha consciência dessa forma. Porque torna-se mais fácil ignorar um peso sobre os meus ombros quando passei anos a ser ensinada a não sentir.

Naquele momento, eu estava duvidar seriamente da capacidade dos Idealizadores. Quero dizer, tinha passado um dia inteiro e não tinha ouvido nem um canhão! Como eu qeuria poder livrar-me daqueles trastes que me seguiam e a mim e a Cato, enquanto nos embrenhávamos pelo verde da floresta e nos aproximávamos mais dos tributos restantes. 12 ou 13 mortes até agora, isso era muito pouco. Eu só esperava que não estivessem á espera que eu partilhasse as vítimas, porque, sinceramente, se me aparecesse algum tributo á frente eu não hesitaria em cortar-lhe a garganta e vê-lo esvair-se em sangue. Isso era divertido demais para partilhar.

-Cato, podemos parar um pouco? – Glimmer pediu ao meu parceiro de Distrito, que estava a poucos metros á minha frente.

-Sim, talvez seja melhor. Estamos a andar á muito tempo e temos de guardar energia para quando fôr de noite, porque é quando os tributos são mais descuidados.

Fizémos como Cato mandou e parámos para descansar. Usámos a fogueira da cornucópia e comemos alguns animais que eu, Jean e Peeta caçámos. Glimmer não comeu quase nada, alegando que a carne de esquilos e coelhos não era própria para uma garota como ela. Tenho de admitir, apenas não me ri porque Cato me lançou um olhar de aviso antes que eu sequer pudesse pensar nisso e, internamente, agradeci-lhe, pois não me apetecia nada estar a ouvir a loira tagarela a dizer mais idiotices do que o que era costume. Aliás, nem sei como a Glimmer pode ser carreirista. Ela podia partir uma unha e faria um drama pior do que se estivesse prestes a ser morta.

-Onde acham que está a “Garota em Chamas”? – Marvel perguntou e deu um olhar rápido em Peeta, que estava sentado em cima de uma pedra e afiava a única faca que tinha.

-Não sei, mas espero que o próximo canhão seja dela. – Peeta não olhou para nós, mas vi a sua mão a apertar o cabo da faca com mais força. “Interessante”.

-Ou, talvez, ela tenha feito aliança com algum tributo.

-Não ficaria nada surpreendido se ela fingisse gostar de algum garoto na arena só para ter o apoio dos patricionadores.

-Oh, então tenham cuidado, garotos, - Glimmer disse com acidez – qualquer um de vocês pode ser o próximo a “arder”! – as nossas gargalhadas foram o suficiente para fazer as mãos de Peeta tremerem. Ninguém além de mim reparou nisso, mas eu sabia que o simpático e exemplar lover boy estava prestes a explodir e, por alguma razão que desde aí me foi sempre desconhecida, eu não quer ver isso. Talvez eu compreendesse o que aquele garoto com ar inofensivo sentia e, talvez também, eu soubesse que ele, tanto como eu, faria tudo para proteger a pessoa com quem mais se importava no Mundo. Porém, para a azar de Peeta, nem por sombras que Katniss Everdeen ia voltar viva ao Distrito 12.

-E você, Peeta, não faz ideia de onde a garota estará? – Cato perguntou com um tom arrogante.

-Afinal, é por isso que você está vivo, loverboy.

-O Marvel tem razão, - Jean concordou – mas, ainda nãos vimos nem o rasto da “Garota em Chamas”, o que significa que, até agora, …

-Você tem sido inútil. – completei com malicia na minha voz, deixando bem claro que queria ter as honras de matá-lo. Ok, eu até compreendia o que o garoto, possivelmente, sentia, mas isso não significava que eu o odiasse menos. Aliás, isso apenas fazia o meu ódio aumentar, porque era mais um aliado para a “Garota em Chamas”.

-Exatamente, - Cato concordou e sorriu para mim – pelo que precisamos de uma razão para o deixar a continuar respirar, Peeta. – o nome do garoto do Distrito 12 foi dito com nojo, quase como se ele tivesse menos valor do que a lama que cobria, naquele momento, o chão que nós pisávamos.

-Eu sei como ela pensa, - ele murmura tão baixo que as suas palavras quase que não chegam até mim – posso levá-los até ela.

-Espero que sim, seria uma pena ver “uma cara como a sua” ser desfigurada pela Clove. – Marvel comenta maldosa e irónicamente, utilizando as palavras que Caesar disse na entrevista com Peeta.

-Eu já disse que vos vou levar até ela! – ele repetiu, agora, quase gritando, erguendo o rosto e fitando-me nos olhos com uma clara expressão de frustração.

-Calma aí, garoto! – Cato ordena com um tom imperativo e inqustionável.

Peeta baixa o olhar e volta a concentrar-se na sua faca. Sorrio para Cato e recebo um olhar promissor em troca, era como se Cato me disse que não ia deixar que ninguém falasse mal comigo e, muito menos, que alguém me magoasse. Ouvi um resmungar vindo de onde Glimmer estava e fiz uma expressão provocadora e ri internamente ao ver o brilho de ódio nos seus olhos grandes e verdes-esmeralda. Encolhi os ombros e, tal como Peeta, decidi verificar o estado da minha arma. Porém, a minha “arma” era uma coleção de quase todas as facas existentes na cornucópia, as maiores, as médias, as mais pequenas e as mais afiadas e as mais finas todas dentro do meu casaco, dos bolsos das minhas calças e, em menor quantidade (por ser mais demorado de alcançar em caso de necessidade) na minha mochila. Depois de me certificar que todas as facas estavam limpas e afiadas a meu gosto, voltei a guardá-las e, sem seguida, cedi às vontades do meu estomâgo. Tirei também da minha mochila um saquinho com tiras de carne seca e a minha garrafa de água. A comida não era tão boa como a da Capital, isso era óbvio e esperado, mas quem a ingerisse receberia a energia necessária para um dia inteiro a caminhar, sem parar e sempre com todos os sentidos acordados o máximo possível.

Comi mais alguns algumas tiras de carne e voltei a colocá-las dentro da mochila, onde estava comida suficiente para eu não passar fome durante algum tempo. Bebi quase metade da água que estava na garrafa e, quando já me sentia satisfeita, guardei tudo, sacudi as migalhas que estavam nas minhas caças e levantei-me.

-Já pudemos ir, ou também querem um sono de beleza? – Jean sorriu cumplicemente para mim e levantou-se.

-Dispenso o sono de beleza, mas acho que você está a precisar de um bem longo, Marvel. – o garoto apertou com força a garrafa que tinha nas mãos e rosnou, fulminando Cato com o olhar. Por sua vez, Cato soltou uma gargalhada gutural e levantou-se também, vindo para perto de mim. Pegou na sua mochila, que era a maior de todas, e colocou-a nas costas, em seguida, anunciou:

-Vamos para o lago!

*

Estava no lago com Peeta, enquanto Cato estava no nosso acampamento montado perto do rio. A nossa tarefa era, naquele momento, encher todas as garrafas com água e tentar pescar algum peixe com a lança de Cato. Marvel insistiu em ficar com a sua lança, pois era a arma que melhor usava e Cato tinha a sua espada.

Com as costas da mão, limpei o suor que escorria pela minha testa e suspirei. A mudança de temperatura fora drástica e, do dia para a noite, o calor que antes era apenas desagradável tornara-se asfixiante. Porém, os dias estavam demasiados silenciosos e calmos, quase que não se ouvia um disparar de canhão ou a imagem de um tributo morto no céu da arena.

Olhei para Peeta, ele também parecia estar a sofrer com o calor, tinha as faces vermelhas e ofegava.

-Pode parar. - eu disse e ele me olhou confuso – Mais um pouco e você vai desmair por causa do calor, mais vale eu fazer o trabalho sozinha, não quero ter perder tempo a carregar o seu corpo.

-E porque você se importaria de carregar o meu corpo? – mesmo retruquindo contra o que eu disse, Peeta largou as garrafas e sentou-se no solo cheio de pequenas pedras.

-Porque somos aliados, ou prefere que dê uso às minhas facas enquanto você está incosciente? – Peeta balançou a cabeça.

-Eu sei o que você tenta esconder dos outros, Clove.

-E o que será isso? – não demonstrei a hesitação nem o receio que sentia,pois havia apenas um segredo que eu tinha.

-Não me faça dizê-lo á frente das camaras. – sorri maldosamente.

-Para alguém que anunciou que ama a “Garota em Chamas” em frente a toda a Panem, isso não é a atitude esperada. Mas, não sei, talvez a Katniss goste de garotos bipolares!

-Chega! – deixei a lança de Cato cair no lago e afastar-se de mim com a água. O tom de Peeta não me assustou, mas deixou-me surpreendida. Nunca antes eu tinha visto o garoto daquela forma, ele parecia triste, com raiva e confuso. Ótimo, uma versão feminina de mim! – Você não tem de fazer isso!

-Isso o quê, lover boy? – voltei á minha atitude sarcástica e maldosa e Peeta pareceu ficar ainda mais impaciente.

-Você se esconde atrás da imagem de uma garota sádica e louca por sangue, mas eu sei que você não é assim. – arqueei a sobrancelha e ele continuou – Apenas vou dizer isto porque dúvido que nos ouçam com o som da água, - eu sabia bem a quem ele se referia e apenas fiz sinal para que continuasse – você zomba de mim pelo que eu disse na entrevista, mas, e esta é verdade, você tem inveja.

-Inveja? – gritei com incredulidade e indignação – Ficou louco de vez, seu inútil? Porque porra que teria inveja de você, hã? – rosnei com ódio e aproximei-me lentamente de Peeta que, quase que calmamente, balançou a cabeça em reprovação.

-Você não tem de ser mais uma peça no jogo deles, Clove.

-Mas eu sou! Todos nós somos! – apontei para o meu peito e para o sítio onde Cato, ao longe, nos olhava com uma expressão suspeita  - Não ouviu o que eu disse no outro dia, lover boy? Nós não temos poder sobre o que acontece ou não, a Capital manda e, se quisermos continuar, obedecemos. Por mais doentio que seja, é assim a Vida e todos temos um lado doentio e “capitalizado”. Sim, Peeta Mellark, eu sou mais uma peça na merda do jogo deles!

-Mas não tem de ser assim! Eu podia fazer isso, eu podia opor-me, mas eu sou, como vocês dizem, o lover boy! – Peeta levantou-se e aproximou-se mais de mim, fitando-me nos olhos.

-A diferença entre nós, garoto, - eu disse da forma mais odiosa possível, queimando de raiva por dentro – é que sou capaz de matar qualquer pessoa que meter no meu caminho.

-Oh, não, - Peeta, pela primeira vez na arena, riu, mas um riso seco e sem vontade, um riso deplorável e vazio – não, Clove. Não minta, porque, como eu já disse antes, eu sei o seu segredo. – sussurrou a última parte e, involuntariamente, estremeci.

-Não tenho nenhum segredo.

-Oh sim, eu sei que tem e ele se chama Cato.

-Além de estúpido também é mentiroso? – cuspi com ódio.

-Não, Clove, eu apenas sei como você se sente.

-E como eu me sinto?

-Apaixonada.

-Isso é mentira, seu cobarde! – gritei e atirei-lhe uma pedra que estava no chão. Peeta levantou os braços e tapou a cabeça com os mesmo, mas isso nada de lhe serviu, pois a pedra acertou em cheio na curva do seu pescoço, fazendo-o gemer de dor – Ainda não sei porque não o matei ainda, seu inútil!

 –Não me importa se morro agora ou depois.

-Claro, porque você sabe que a Katniss não gosta de você e que ela estava apenas a fingir, certo? – zombei, mas, ao contrário do que eu esperava, Peeta confirmou aquilo que á muito tempo eu suspeitava e usava contra, mas que eu não tinha, até áquele momento, a certeza de ser verdadeiro ou não:

-É isso mesmo, você me compreede. – o garoto suspirou, levando a mão ao local onde tinha sido atingido – Não vale a pena viver sem a pessoa que amamos.

-Eu não amo ninguém! – o meu grito mais se assemelhava a um berro, um berro de negação de algo que eu sabia ser verdade, mas que me negava a admiti-lo em voz alta – Você está com alucinações!

-Não, Clove, eu apenas prestei atenção á forma como você olha para Cato e, por acaso, ele a olha da mesma maneira.

-É normal isso, burro, nós nos conhecemos desde pequenos!

-E se amam desde pequenos também? – o lover boy perguntou com um meio sorriso isso foi o suficiente para me deixar fora de controlo. Sem pensar duas vezes, levantei o meu braço no ar, preparando-me para atingi-lo. Porém, quando o meu punho estava a mílimetros de distância do rosto suado e petrificado de Peeta, eu decidi baixá-lo. Ao sentir o impacto do meu punho, Peeta abriu, hesitante e amedrontadamente, os olhos e fitou-me icrédulo – Porque… Porque não me bateu?

-Porque eu costumo perder o meu tempo com coisas que valem mesmo a pena. – baixei o meu braço e, antes de virar as costas e afastar-me dele, cuspi-lhe no rosto. Oh, como aquilo soube bem!

Ainda procurei pela lança de Cato no lago, mas não havia sinal dela. Bem, pelo menos ele tinha escolhido a segunda melhor de todas as que estavam na cornucópia, o que quer dizer que ele podia voltar lá e tirar uma, mas dúvido que Cato perca tempo com isso. Na verdade, suspeito seriamente que Cato tenha escolhido aquela lança apenas para provocar Marvel e, ainda mais sinceramente, acho que o garoto do Distrito 1 não vai hesitar em odiar-me ainda mais quando souber que “perdi” uma lança no lago.

-Clove, - cheguei ao acampamento sentei-me num tronco, ao lado de Cato, que estava a afiar a sua espada – o que você e o Peeta estavam a falar? - encolhi os ombros, deixando claro que não estava com vontade de conversar, mas Cato insistiu: -Eu fiz uma pergunta, Clove, estou á espera da resposta.

-Estávamos a falar sobre a “Garota em Chamas”. – Cato olhou diretamente nos meus olhos – Eu… hum, nada mais que isso. Foi só isso, mas não consegui fazer o Peeta falar, ele deve gostar mesmo dela, o que faz dele ainda mais estúpido do que eu pensava.

-Não foi só isso que vocês falaram.

-Acabei de dizer que foi! – Cato negou:

-Não acredito.

-Cato! – não, eu não ia contar aquela conversa ridícula com Peeta! Quero dizer, isso só ia servir para confundir e provocar Cato e para me magoar ainda mais , esfregando na minha cara o quanto era impossível eu ia Cato sermos felizes. Juntos e vivos – Não houve nada de interessante naquela conversa. O garoto tentava enrolar e inventar desculpas, mas, além disso, nada mais.

-Tem a certeza? – Cato colocou a espada no chão e, aproveitando que estávamos sozinhos (e tapados por algumas árvores que impossibilitavam a visão das camâras) tocou o meu rosto – Você parecia frustrada.

-Eu sempre estou frustada, lembra? – brinquei, tentando escapar ao seu olhar inquisitor.

-É, eu lembro. – Cato deu um sorriso fraco e beijou-me rapidamente. Sorri ao sentir o seu hálito nos meus lábios, aproveitando os poucos momentos que teria tão perto dele – Pequena, - ele me chamou passados alguns minutos, eu estava com a cabeça no seu ombro e uma das suas mãos rodeava a minha cintura, enquanto a outra mão de Cato levava ao seu nariz uma madeixa do meu cabelo – o que acha de irmos caçar alguns tributos, hein?

-Acho uma ótima ideia. – concordei sorrindo e levantei-me pegando a sua mão e trazendo-o comigo.

Talvez, apenas talvez, eu devesse ter continuado a conversa com Peeta, deixando Cato com a sua espada no acampamento. Não porque o garoto do Distrito 12 realmente me compreendia ou porque eu agradecia isso - pelo contrário -, mas sim porque, se eu o tivesse feito, talvez as coisas não tivessem corrido tão mal.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e comentem! Fiquei com receio de que algumas partes tenham ficado confusas ou algo do género, então, me avisem se isso aconteceu. Vou postar o próximo capítulo assim que receber pelo menos três comentários.