Notas Suicidas escrita por Pu_din


Capítulo 11
Anotação n°10




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Ainda na casa de Frank, ficamos um bom tempo conversando. Eu lhe contei sobre a morte de minha mãe, e ele sobre seu pai. Não sabia se estava vivo ou se estava morto, e sua própria mãe perdera o contato com ele. Iero me disse que, quando mais novo, sentia falta de ter uma presença paterna, mas agora é como se ele estivesse morto realmente.
- Eu já vou indo... – disse eu, prestes a levantar-me da cama.
- Eu vou com você.
- Não precisa – retruquei com certa vergonha de “depender” dele.
- Mas eu vou mesmo assim – sorriu e levantou-se, vestindo o moletom. – Aí você cai na rua e morre, e a culpa vai ser minha.
Eu ri, e saímos da casa pelos fundos, para não incomodar o tal patrão. Eu até pensei em me despedir de Mary, mas a essa altura nós dois já estávamos na rua.

- Você faria uma tatuagem de um escorpião? – ele me perguntou, roçando seus dedos na garganta.
- Não. Agulhas me deixam com medo.
Ele riu, e eu não gostei disso. O que há de errado em alguém não gostar de agulhas, afinal?
- Não deve nem doer... – ele ria.
- É que eu não gosto, merda.
Ele sorriu, e passou as mãos sobre meus ombros e sussurrou:
- Eu vou fazer uma. Bem aqui.
Apontou com o dedo o lado direito do pescoço, todo orgulhoso, mas eu quis irritá-lo. Irritar as pessoas era uma coisa que eu fazia muito bem.
- E depois você vai ficar velho e todo caído, aí isso vai ficar um pedaço de pele mole no seu pescoço. Vai ficar deformado e acabado, e ainda por cima com um escorpião todo mole caído na garganta – eu ri, passando meu braço sobre seus ombros.
- Credo, Gerard. Só fala isso porque você é cagão.
- Você que pensa...
- Bundão.
Porque as pessoas riem como acéfalos enquanto ficam perto de mim? Eu sempre me pergunto isso. É ridículo.
Enfim, chegamos a minha casa. Insisti para que Frank entrasse, mas ele recusou.
- Sério, Gerard. Eu tenho que ir.
- E depois eu que sou o bundão... – brinquei, e Iero fez uma arma com as mãos, fingindo me acertar nas têmporas.
-Tchau.

Entrei em casa ainda achando graça na atitude de Iero, e encontrei Joseph, com seus papéis espalhados por toda a mesa central da sala, fazendo o trabalho que deveria ser feito em seu escritório. Estava sentado na poltrona, ocupadíssimo, e parecia preocupado. E sempre que está assim, mesmo se o mundo cair e acabar com tudo e todos, ele não se distrai. Isso sempre me irritou. 
Sentei no sofá ao lado e passei a fitá-lo, mas parecia não perceber que seu filho estava lá. Sempre era assim, já era para eu estar acostumado, mas isso me deprimia. De um segundo a outro, tive vontade de pegar todos aqueles papéis e jogar fora. E logicamente não o fiz. O que eu fazia era encará-lo, com uma ponta de admiração e raiva. O meu humor estava virando. Não era bom.
Deitei no sofá e pousei os olhos no teto. O silêncio estava me aborrecendo, então disse em um volume um pouco mais alto que um sussurro:
- Pensei que estava trabalhando no escritório...
- A diretoria do seu colégio me ligou – ele disse, e percebi que seus olhos não saíam do papel.
- É mesmo? – perguntei em um tom mais sarcástico do que queria - E o que ela te disse?
- Que você vomitou no banheiro inteiro.
- Pois é... – suspirei e cruzei os braços sobre o peito, ainda encarando o teto.
- Está melhor?
- Estou. Um amigo me trouxe aqui, senão eu ia desmaiar no meio do caminho... – observei só para ter o gostinho de atrapalhar meu pai mais um pouco.
- Quem?
- O Frank.
Senti que ele travou. Seus olhos se desgrudaram do papel, e passaram a grudar em meus cabelos. Eu juro que não entendia isso.
- Você deveria parar de andar com esse garoto, Arthur. Ele não me parece confiável...
- Ele parece muito legal pra mim.
- Você é tão teimoso... – grunhiu.
E esse foi o último diálogo que tivemos no dia.


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