Lies escrita por Juh Begnini Collins


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Gente, aqui vai o primeiro capítulo do livro.
Desconto para a minha pessoa, galera, já que é meu primeiro livro e provavelmente eu cometa algum errinho ou outro - ou, as vezes, algum erro horrível.
Espero que gostem.
Ah, e comentar não é proibido, viu? =)



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Inglaterra, 1815


Está tudo tão confuso... Eu deveria estar morto agora. O que aconteceu de errado, afinal? Seria eu tão incompetente ao ponto de não conseguir nem cometer suicídio?

E pior: estou vivo, sem Lydia. Para que viver sem minha doce Lydia, afinal?

Ok, isso soou depressivo. Mas a realidade é essa: ela era tudo o que eu tinha, e se foi. De que adianta viver sem nada, sem nenhum motivo para tal?

Mas está tudo tão confuso... Me sinto tão estranho... Nada parece estar certo, e eu não faço idéia de o que está errado. Deve ser comigo, ou com o mundo, ou Deus sabe lá.

Vejo uma garota muito bela aproximando-se. Ela está ferida, pedindo por socorro, duas manchas vermelhas sangrando em seu pescoço. E então, ela me vê. Com um grito, seus passos apressam-se para o lado contrário ao qual me encontro, como se estivesse incessantemente fugindo de mim.

Espremo os lábios um contra o outro, e sinto uma pontada de dor. Olho para minhas roupas encharcadas de sangue e toco em minhas presas. Finalmente, as lembranças me vêm à cabeça.

Estava andando pela rua, perdido e moribundo, uma faca atravessando meu peito. Eu mesmo a pus lá, se querem saber. Um homem apareceu e me mordeu. Não um homem, mas um repugnante vampiro. E então ele quebrou meu pescoço, e eu morri definitivamente. Quando acordei, bebi todo o sangue de uma garota e parte do sangue dessa, que agora fugia de mim.

Mas que droga, eu agora era o que sempre lutei para destruir: um vampiro.

Mas aquela sensação... ah, a sensação do sangue escorrendo pela minha garganta, a sensação de minhas presas perfurando aquele perfumado pescoço, a sensação de grandeza, de poder...

Sabe, sempre repudiei os vampiros por serem tão cruéis ao ponto de matar as pessoas sem remorso. Mas agora, sentindo a mesma sensação que eles, sentindo a euforia de beber sangue, a adrenalina da caçada... É tudo tão compreensível...

É isso que eu sou, a partir de agora: um vampiro. E, se quer saber, estou amando isso.


McKingley High School, atualidade.


- Elizabeth Price, pensa que eu esqueci a data de hoje?

Mary Anne aproximava-se da amiga, o barulho dos saltos ecoando pelos corredores da pequena e modesta MKH. Com sua mini saia drapeada, sua camisa branca e seu colete preto, chamava a atenção de todos os estudantes do sexo masculino por onde passava. Linda, com seus cabelos loiros bagunçados, como sempre, exalava confiança e decisão.

E... sua memória era perfeita.

- Não, Mary, não... por favor, não comemora.

- Feliz aniversário amiga. – ela a abraçou fortemente.

Falar com Mary era como falar com uma pedra. Ela nunca te obedeceria, a não ser que quisesse isso. Sua teimosia dava medo.

- Eu acho... – disse Lys, afastando-se da amiga – que pedi para você não comemorar. Mesmo assim, obrigada.

- Nossa, que mau humor, Lys. E eu não estou comemorando... ainda.

- O que você quer dizer com “ainda”, Mary Anne Hidel?

- Estou querendo dizer, Elizabeth, que é seu aniversário e que faremos uma mega festa lá na minha casa. E estou querendo dizer, também, que você não poderá se negar a comparecer, por que eu já comprei tudo, está tudo preparado, e seria um imenso desperdício de comida e bebida, fora a decoração, é claro.

Lys não estava com vontade nenhuma de festejar. Desde que terminara o relacionamento com Philip, ela só queria ficar em casa, assistir algum bom filme, se empanturrar de sorvete e esquecer-se dos problemas.

Era assim que ela se sentia bem. Por que ninguém a entendia?

- Mary, por favor, sério mesmo... dá pra pular essa parte?

- Não, Lys! Você não vai morrer para a sociedade só por que um idiota te deu um pé na bunda.

- Nossa, assim você me deixa muito melhor, Hidel.

Ela a olhou, compassível. Sentia pena de Lys. Nos últimos dias, a garota andava muito para baixo. Não era justo que um cara a fizesse sofrer dessa maneira.


- Ai Lys, sério, desculpa... você sabe que eu não...

- Tudo bem, Hidel. Eu vou à festa. Mas não espere que eu fique animada nela, ok?

A garota apenas assentiu com a cabeça.

- Ah, e Elizabeth... – Mary pareceu ter medo de continuar. – Você se importa se um primo meu estiver na festa?

- Quem, o Matt? Aquele ruivinho cheio de sardas de sete anos de idade?

- Não, Price! – ela estava descrente. – Não acredito que você pensou que eu fosse levar meu primo bebê para uma festa de adultos! Eu me refiro ao meu primo, Ian. Ele é novo na cidade, e minha mãe quer que eu o ajude a se adaptar... e ele é lindo, tem olhos azuis e...

- Hey Hidel, se eu disser que sim, você para de tagarelar quanto à beleza épica do seu primo?

- Yeah! – ela comemorou.

O sinal tocou e elas foram para a aula de história com o Sr. Revis.

Ao fim da aula, Lys e Mary estavam saindo da sala quando depararam-se com Joe.

Era tão ruim, para Mary Anne estudar com o meio irmão... Era como se alguém estivesse vigiando seus passos o tempo todo, pronto para esfregar qualquer deslize na sua cara. Ainda mais Joseph, o cara perfeito, o aluno perfeito, o enteado perfeito, o namorado perfeito... ele era perfeito em tudo, menos em ser meio irmão.

Quem sabe toda aquela implicância dela fosse graças aos sentimentos que ele nutria por sua melhor amiga. Era complicado ter seu meio irmão amando a sua melhor amiga de uma maneira platônica. É claro que esse sentimento só era platônico por que Mary havia o convencido a nem tentar, dizendo que ele não teria chances.

“Quem sabe eles se dessem bem, no final. Iam formar um casal bem bonitinho, na verdade.”

Ela expulsou esses pensamentos de sua cabeça.

- Meninas. – ele cumprimentou.

- Joe! – Lys o abraçou, fazendo seu coração acelerar.

- Ameba. – Mary cumprimentou.

- Joe, fala pra sua irmã que eu não quero uma porcaria de festa de aniversário.

- O que? Não! Depois de todo o trabalho que tive pra ajudar na decoração e, principalmente, depois de toda a força de vontade que tive que usar para não matar minha irmã com toda a sua chatice de “isso aqui tem que ficar perfeito e você não faz nada certo e blá blá blá...” – ele disse, imitando a irmã.

Lys riu. Ela gostava muito de Joe. Dois anos atrás - antes de ela conhecer Philip, seu mais novo ex-namorado idiota – ela até cogitou a idéia de namorar o garoto, porém Mary a advertiu de que o irmão já estava gostando de uma garota. Ela amava mesmo ele, e foi difícil na época, mas finalmente, ela superou.

Ainda assim, Lys não conseguia pensar em nenhum amigo melhor do que Joseph. Ele era quase seu irmão.

- Poxa, Joe, não dá pra você convencer ela, por favor? Por mim, a sua amiguinha linda que você ama. Por favor? – disse ela, passando a mão pela cintura do amigo, provocando-lhe um arrepio;

- Dessa vez não, Lizzie. Me desculpe, mas sou obrigado a (não acredito que vou dizer isso) concordar com a Mary. Eca. Alguém tem um creme dental e uma escova? Não, por que depois de falar isso eu vou precisar desinfetar minha boca.

- Todo mundo sabe que da sua boca só sai porcaria, Joseph. Por isso o desinfetante de banheiro é o correto para o seu caso, não acha?

- Hey, vocês dois, dá pra parar de se alfinetarem? Deixem essa implicância familiar de lado e comecem a prestar a atenção no MEU problema. Eu não quero uma festa de aniversário, gente!

- Mas vai ter! – disseram os dois juntos.

- Além disso, Price – complementou Mary – você precisa conhecer o gato do meu primo. Gente, aqueles olhos azuis... Meu Deus, eu quase morri por falta de ar quando o vi pela primeira vez e...

- Ele nem é tudo isso, Lys, acredita em mim. É metido, convencido e extremamente irritante.

- Você diz isso, Joseph, por que ele é muito melhor que você. É inveja.

- AH, NÃO DÁ PRA CONVERSAR COM VOCÊS. – disse a garota, dirigindo-se ao armário.

Os dois ficaram olhando a garota indo, enquanto riam e continuavam se alfinetando.


~*~*~


- Ah, então é hoje a festa da garota responsável por toda essa... movimentação um tanto quanto desorganizada, não é?

A garota olhou para Ian, furiosa.

Ela estava ficando louca por causa dos aperitivos da festa, enquanto Joe ficava agüentando os gritos da irmã caso algum dos balões ficasse meio centímetro para baixo do que ela havia determinado. E Ian, para variar, não estava ajudando em nada.

- É, é hoje. E, aliás, os convidados já devem estar chegando, não vai se arrumar?

- Eu realmente acho que nenhuma roupinha alinhada vai melhorar a perfeição que eu tenho em mim, mas, já que insiste, estou indo. Melhor do que ficar ajudando.

O vampiro sorriu, daquela forma sensual que ele sempre fazia com as garotas, e depois subiu as escadas. De lá de cima, ouviu o suspiro da prima. Aquilo o fez sorrir, mais uma vez. A coisa que ele mais amava em ser ele era que nenhuma garota resistia. Ele já até havia acostumado-se com esse fato, fácil demais, na verdade.

Ainda sorridente, ele foi tomar um banho.


- Mas que... porcaria é essa, Joseph? – disse Lys, enquanto olhava para a casa, inteiramente decorada com balões e véus azuis, que, surpreendentemente, era a cor do seu vestido. Até isso Hidel havia descoberto.

- Desculpa, Lys, mas foram ordens da Mary! Ela disse que uma festa dela não seria nada menos do que luxuosa.

- Ah, eu mato ela. – disse a garota, andando furiosa para a casa.

Joseph ficou para trás, rindo.

A garota apressou-se, olhando para o chão. Poxa, ela não queria uma festa, nunca quis.

De repente, chocou-se contra um peitoral masculino. Ah, legal.

- Opa, olha para onde anda, pequena. – disse o rapaz.

A garota levantou os olhos e enfeitiçou-se pelo azul profundo dos olhos dele. Eram hipnotizantes!

- V-você viu a Mary?

- Ela está na cozinha. – disse ele, depois riu. – Bem vinda à lista das pessoas que querem matá-la.

- Obrigada – disse a garota, e afastou-se, evitando o contato visual com ele novamente. Será que ele tinha notado as batidas do coração dela?

Ela andou em direção à cozinha, constatando, no caminho, que não conhecia ninguém daquela festa. Eram os amigos da Mary, não dela. Ela preferia comer uma pizza com Mary e Joe, e só.

- Mary Anne Hidel! – ela chamou, quando aproximava-se da garota, que era meia cabeça mais alta que os demais, graças aos exagerados saltos. – O que você fez?

- Uma festa, de nada.

- Mary, eu não conheço metade dessas pessoas, e do resto só converso com dois ou três. E isso ta parecendo um formigueiro! O que foi que você pensou, hein?

- Relaxa, Price. Aproveita!

Lys afastou-se, ainda furiosa, exclamando algo sobre ponche, e deixando Mary rindo sozinha atrás dela.


Ian olhava atenciosamente para a garota que bufava, encostada na mesa de ponche. Ela era muito bonita, ele tinha que admitir. Talvez servisse como almoço, ou quem sabe jantar... ou, se dependesse da vontade dele, ela podia o entreter durante a noite e servir-lhe de café da manhã no dia seguinte...

- Admirando a causadora de toda essa calamidade?

- Essa é a tal Elizabeth? – ele perguntou, saindo de seus devaneios, à sua rima, que acabava de se aproximar.

- Quem, essa estressadinha que você estava babando? Sim, é ela... e olha, eu, no seu lugar, não teria muitas esperanças. Ela acabou de terminar um relacionamento, o idiota deu um pé nela, e ela ta estressada...

O vampiro deixou Mary falando sozinha. Entregou seu copo de ponche para a garota, sem nem olhá-la, e dirigiu-se à morena irritada.

- A garota que topou em mim! – ele falou, zombeteiro. – E, acabo de descobrir, a aniversariante. Meus parabéns! – ele fez uma pausa, diante da cara de confusa dela. – E você deve ser controlada, nem matou a prima Mary...

A garota o observou, por uns instantes, hipnotizada com o mar azul que eram seus olhos. Depois, percebeu que ele ainda esperava que ela falasse algo.

- Então você é o Ian... primo da Mary...

- E do Joe. Prazer. – ele beijou a mão da garota. – E você, Elizabeth... Price, é isso? Lys para a Mary, Lizzie para o Joe... alguém já te chamou de Lizbela? Tipo, Lisbela e o prisioneiro, aquele filme, sabe?

- Não, não me chamaram...

O vampiro continuou falando, enquanto Lys, por algum motivo, sentia-se perturbada. Ele a deixava perturbada, quem sabe até temerosa... ela responde tudo no automático, mas ele não pareceu perceber o efeito que exercia sobre ela.

- Olha, eu estou com um pouco de dor de cabeça, acho que vou para casa... – disse ela, pouco tempo depois. Queira logo se ver livre dele.

- Foi um prazer conhecê-la, Lizbela. – ele beijou a mão da garota.

- O prazer foi meu, Armstrong. – a garota respondeu, tentando dar o assunto por encerrado.

Então, ela saiu do pátio da casa, em direção ao seu carro. Ian ficou observando-a ir.

Ela era, realmente, deliciosa. Teria dado um bom lanchinho.


Quando todos finalmente foram embora, sem nem ao menos darem-se por falta da aniversariante, Ian foi para o seu quarto e jogou-se na cama.

“Festa idiota, horrível, lotada de humanos. Esses humanos são todos dispensáveis. Graças a seja lá o que for, eu posso devorá-los. Pelo menos livro o planeta da sua existência tediosa e desmotivadora.” Pensou o vampiro, assim que suas costas afundaram no delicioso colchão da casa dos Hidel.

Depois, seus pensamentos vagaram até Lys. Por que, afinal, ela havia sido tão temerosa com relação a ele? Ele fora o exemplo da gentileza, fora educado, e isso já era um avanço, tratando-se de uma humana. E, ainda assim, fora engraçado, sensual, irresistível... afinal, ele era Ian Armstrong, ser assim já fazia parte de ser ele, anos e mais anos de experiência.

Mas por que, depois de tudo isso, ela havia sido tão... amedrontada graças à sua presença? Isso não era normal.

Normalmente, ele era quem causava medo nas garotas. Antes disso, nenhuma delas resistia aos seus encantos e à sua aparência. Ter uma garota tentando fugir dele sem que ele tenha provocado essa reação nela era um tanto quanto... intrigante.

Será que ela sabia sobre o que ele era? Não, impossível, ele não lembrava de tê-la visto antes em sua longa existência, e mesmo que em sua época de humano, jamais esqueceria daquele rosto tão jovial e belo...

Mas, se ela não sabia, então que explicação haveria ao seu estranho comportamento?

Qualquer uma que fosse a resposta, ela era um desafio que ele não deixaria escapar.

Antes de ser a caça, ela seria seu joguinho. E ele não jogava para perder.

Um sorriso surgiu em seus lábios, tingindo suas lindas feições com tons de maldade.


Elizabeth afundou no seu colchão de água. Ah, como ela odiava aquele colchão. Mil vezes seus pais houvessem dado de presente um colchão de molas. Mas não, deixaram-se ludibriar por uma infeliz vendedora que os afirmou ser aquele o melhor colchão já produzido. Ela podia ter avisado que não haveria troca também.

Mas o colchão era o menor de seus problemas.

Armstrong era seu maior problema. Ou melhor, o jeito como ela agiu para com Armstrong.

Ele era lindo, gentil, cavalheiro, engraçado... até beijara a sua mão! Mas... havia algo estranho nele, ela podia sentir. Ele escondia algo...

“Ah, esquece isso, Elizabeth, é coisa da sua cabeça. Está traumatizada por causa do Philip.” Ela tentou convencer-se.

Devia ser só isso. Devia ser trauma dela. Depois que Philip demonstrou-se um perfeito idiota, era compreensivo ela pensar que todos os homens tivessem algo a esconder, algo terrível e com total capacidade de ferir uma garota.

Antes de Philip ela podia até dar uma chance para Ian... agora não. Ela não conseguiria, mesmo se tentasse. Muito menos depois da sensação.

A garota enfiou a cabeça no travesseiro e tentou tirar sua mente dele.

Parecia que aquela seria mais uma noite que ela passaria em claro, absorta em pensamentos.


~*~*~


Elizabeth chegou à McKingley High mais cedo do que o habitual, pegou seus materiais e foi para a sala de aula. Não queria ter que falar com Mary tão cedo. Não por estar brava com a amiga, pelo contrário, ela não conseguiria ficar brava por tanto tempo. É só que Mary Anne a vira com o primo na festa, e iria fazer perguntas difíceis de serem respondidas... além disso, ela não havia dormido a noite toda, não queria ter que falar com ninguém de tão mau humor.

Mas ele não saia da sua cabeça. Que droga, por que ela não podia parar de pensar em quanto aqueles olhos azuis a amedrontavam?

Ela sentou-se em sua classe no exato momento em que o sinal bateu. Em poucos instantes, os alunos encheram a sala. A professora Margareth Lits, que lecionava química, entrou no local e, diferente do rotineiro, manteve-se em pé na frente da mesa.

- Alunos, acalmem-se. – ela esperou, mas o burburinho da sala continuou. Então, ela desistiu e continuou a falar. – Esses são Jacques Claude e Ann Marie Villaz, alunos de intercâmbio. Eles vieram da França e serão seus mais novos colegas, pelo menos na minha aula.

A professora indicou os lugares onde os alunos deviam sentar-se. Jacques sentou-se ao lado de Lys.

- Olá! Bem vindo à escola. Meu nome é Elizabeth...

- E eu sou a Mary Anne. – disse a garota, sentada na frente de Lys.

- Olá. – ele respondeu, a voz rouca arrepiando a nuca de Mary. – Meu nome é Jacques.

- Lindo sotaque, Jacques. – elogiou Mary. – mas, quem sabe... posso te chamar de Jake? Jacques é muito chique, só para momentos especiais. – falou a loira, cutucando a amiga por debaixo da classe.

Lys riu da investida nada discreta da amiga.

- Claro que pode. E vocês...

- Lys e Mary. – respondeu Lys, antes que a amiga se empolgasse demais e inventasse um apelido vergonhoso para si.

A conversa durou todo o período de química. Lys queria pular no pescoço da amiga, por não deixá-la prestar a atenção, mas na verdade, estava gostando do garoto.

No fim da aula, ela sabia que ele já havia viajado por vários lugares do mundo, tinha alergia a moluscos, não gostava de esportes e fazia aulas de teatro, chegando a ganhar grandes concursos franceses. Além disso, ele escrevia poesias e era muito legal.

Pelo menos ela não estava mais pensando em Ian. Além do mais, Jake podia ser um ótimo amigo.


As aulas passaram-se num piscar de olhos. Fora as conversas com Mary, Jake e Joe, ela havia esquecido todo o resto. Na verdade, ela não havia esquecido, o problema era que ela nem havia prestado a atenção. Mal havia dado-se conta de que professor era! Tudo por causa dele.

Que porcaria, por que, afinal, ela não conseguira tirá-lo da cabeça o dia todo? E pior, por que ela não conseguia tirar da cabeça o medo que sentia dele?

A garota largou seus materiais no armário e o trancou. Depois, tirou o celular do silencioso e dirigiu-se à saída da escola, estranhando por não encontrar Mary pelo caminho.


Ian tirou o prego do pneu e jogou-o longe, antes de escorar-se em seu próprio carro. Ok, era infantil furar o pneu do carro das pessoas, mas era a maneira mais rápida de aproximar-se de Lys, e se possível, ganhar sua confiança ainda hoje.

Olhou ao redor. O estacionamento estava quase vazio, e isso era um ótimo sinal, pois as chances de ela pegar carona com outra pessoa eram quase nulas. O céu estava se fechando, formando pesadas nuvens. Logo iria chover, ele pensou, alegremente. Seria muito bom se começasse a chover caso ela negasse o cavalheirismo dele, mas mesmo se isso não acontecesse, ela iria olhar para o céu e pesar a decisão. Ela tinha que aceitar, era irrecusável.

A garota estava se aproximando lentamente, ainda na saída da escola. Se não fosse a visão apurada de vampiro, ele jamais a teria reconhecido, assim, de tão longe. Olhou para o pneu. Ótimo, ele já estava quase vazio. Daquela maneira, quando ela chegasse, a roda estaria no chão, excluindo qualquer possibilidade de ela ir de carro até o borracheiro.

Ele escorou-se no próprio carro, de maneira sedutora e casual, e esperou.

- Olá, Lizbela... – disse ele, sem ao menos olhá-la, mas já sabendo que ela estava quase chegando ao carro.

- Ian, oi. – ela respondeu, seca, um frio tenebroso subindo por sua coluna novamente.

- Eu vim aqui buscar a Mary e o Joe, mas eles já haviam partido. – mentiu ele. – então eu resolvi te dar uma carona. De nada.

- E por que eu precisaria de carona, Armstrong? Eu tenho carro. - disse ela, gesticulando para o automóvel prateado à sua frente.

- Eu também. – disse ele, jogando a cabeça levemente para trás e dando duas batidinhas leves com a mão na lataria preta do esportivo. – E é por isso que eu sei que não podemos andar de carro quando o pneu está furado e vazio. – ele deu ênfase no “E”, antes de baixar o olhar para o pneu furado.

A garota seguiu o olhar dele e então entendeu do que o outro estava falando.

- E vai chover. – concluiu ele, assim que os olhos da morena foram do pneu furado aos seus. – Tem certeza que não quer minha carona?

- Não precisa, cara, ela vem comigo, não é, Lys? Prazer, Jacques Claude Villaz. – disse ele, apertando a mão de Ian.

- Ian Armstrong. – ele respondeu, sério. Depois, encarou Lys, esperando por uma resposta.

A garota virou para trás, aos olhos do dono da mão que agora pousava em seu ombro, procurando por algum incomodo na expressão facial dele. Não encontrou nada, fato que a motivou a responder.

- Isso, Ian, eu vou com ele, não se preocupe.

- Ah, ok então. – o vampiro respondeu, a contragosto. – Cuide-se, Elizabeth. Nos vemos em breve.

Ele beijou a mão da garota e depois ficou vendo ela afastar-se, com o braço de Jacques por sobre seu ombro.

- Jacques, Jacques, Jacques... – ele sussurrou de maneira quase inaudível, para si próprio, tentando assim trazer à tona uma memória antiga.

De onde será que eles se conheciam? Por que Jacques transmitia-lhe familiaridade? Será que eles se conheciam da época em que ele ainda chamava-se Ioseph, quando ainda era um humano ignorante?

Se fosse, não seria nada bom. Mas o pior de tudo seria se eles se conhecessem de épocas mais recentes, quando Ioseph já havia dado lugar para Ian, o ripper, o vampiro sedento por sangue. Nesse caso, ele só poderia estar atrás do sangue de Lys.

De qualquer maneira, Ian não deixaria que outro vampiro, ou seja lá o que fosse esse tal Villaz, brincasse com o seu brinquedinho da vez. Antes disso, seria uma guerra.

Ele deu a partida no carro, manobrando lentamente pelo estacionamento quase vazio. Se tudo tivesse dado certo, agora ele estaria conversando animadamente com Elizabeth, enquanto ela tremia de um pavor inexplicável.

                Mas como sempre, o fracasso havia despertado sede no vampiro. E ele sabia exatamente onde iria encontrar comida.

                Ele fez o retorno, em direção ao parque municipal.

Em direção ao seu jantar.


Ele sentou-se em um banco e ficou observando as garotas que passavam por lá, levando cachorros para passear, caminhando com os namorados, brincando com criancinhas... e sentadas em grupo, conversando animadamente. Eram essas as que ele mais gostava, os alvos mais fáceis. Normalmente, elas estavam atrás de caras que não quisessem compromisso, para se divertir pelo fim de semana apenas. E era aí que entrava Ian.

Deparou-se com uma jovem garota, uns dezoito anos no máximo. Loira, olhos verdes, um pouco magra demais, mas dava para o gasto. Ian esperou até a garota dar uma risada ruidosa de algo que sua amiga baixinha dissera. Então, entrou na mente da garota e manipulou seus pensamentos, fazendo-a dar uma desculpa qualquer e separar-se do grupo. Então ele se aproximou.

- O que uma garota tão bela faz sozinha no parque?

- Ah, obrigada. Eu só estava...

Ela continuou falando, mas o vampiro não prestou nenhuma atenção. Estava sedento, e o cheiro de sangue e a visão das finas veias azuis por baixo da pele alva faziam com que o corpo do vampiro doesse de ânsia, as presas arranhassem na boca, ansiando por libertarem-se e cravarem no pescoço dela.

Ele tinha que fazer algo, antes que não conseguisse se conter, antes que a matasse na frente de todos.

Ian não sabia ao certo se a iniciativa havia partido dele ou se ele havia manipulado os pensamentos da loira, mas no instante seguinte eles estavam beijando-se, indo em direção à um beco escuro.

Ele a beijava calorosamente, ansiando para provar de seu sangue. Ela, naturalmente, não sabia dos interesses do vampiro, e por isso agia por instinto, vivendo o momento.

O vampiro enrolou os dedos no cabelo da garota e puxou sua cabeça para o lado e para trás. Ele não agüentava mais, estava sedento demais.

A garota tentou gritar, mas ele tapou sua boca. Podia manipular os pensamentos da garota para fazê-la parar de gritar, mas não queria. Ele gostava de sentir o medo dela, de precisar dominá-la, de sentir que ela o temia. Era empolgante.

A visão da jugular da garota, pulsante em sangue, o fez delirar. E então ele não agüentou mais.

A garota sentiu os lábios dele em seu pescoço, então duas afiadas prezas causando uma dor dilacerante, duas pontadas na fina pele, perfurando-a e depois drenando o sangue.

Ela tento gritar, se debater, mas de nada adiantou, a não ser para deixá-la ainda mais cansada. Ela já estava exausta quando a escuridão a dominou por completo.

Ian sentiu suas presas perfurarem a pele dela, e então aconteceu. Aquela sensação que sempre acontece, que durante todos esses anos ele jamais foi capaz de se acostumar. A euforia, a sensação quente e enérgica de sentir o sangue escorrendo por sua garganta, o arrepio gelado e prazeroso percorrendo sua espinha e espalhando-se por todo seu corpo, a sensação de poder... tudo aquilo era indescritível.

E ele amava ser humano.

Mas a melhor parte... ah, a melhor parte estava, de longe, no medo da vítima, todas as emoções da vitima passando prazerosamente para o seu ser, o deixando sentir-se inatingível... aquela era a melhor parte, sem dúvida.

Finalmente, a garota parou de debater-se, seu sangue sendo tirado completamente de seu corpo inerte. Ele a pegou no colo e saiu.

Estava escuro, ninguém ia notar se ele por acaso saísse carregando a garota. Ninguém repararia no seu pescoço, nem na falta de movimento dos pulmões... naquela escuridão, ele pareceria apenas um namorado levando sua garota adormecida no colo.

A pôs no carro e dirigiu até a floresta, não longe ao ponto de ele não poder ir a pé, mas era mais seguro ir de carro.

Adentrou a densa mata com a garota nos braços e parou logo após, jogando o corpo sem vida no chão, nada gentilmente. Então tirou do bolso do casaco um vidrinho de Inívia, uma substância altamente inflamável que consumia rapidamente, desconhecida pelos humanos, mas muito usada por vampiros.

Cobriu o corpo com aquela densa substância amarelada. Então, acendeu um fósforo e, como quem joga um papel de chicle no chão, jogou- por cima do corpo. Depois, sentou-se ao pé de uma árvore e ficou esperando o  corpo queimar, enquanto fumava um cigarro.

Logo, o fogo consumiu-se por completo, até que não restasse mais nenhum indício de que a loira de olhos verdes estivesse ali antes.

Ele apagou o cigarro, ainda pela metade, e jogou-o no chão. Ele odiava fumar. Fumava para poder rir dos humanos, ver o quanto aquilo era nocivo para eles, mas o quanto era inofensivo para um vampiro, mais uma prova de que humanos eram desnecessários para outra razão que não para sua alimentação.

Mesmo assim, fumava apenas quando não tinha nada melhor para fazer. Era um habito ridículo, caro e inútil, só servia para prejudicar os humanos e entediar a ele próprio.

Pensando nisso, assim que a última brasa rapidamente apagou, ele voltou ao se carro e dirigiu de volta para a casa da prima.



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Notas finais do capítulo

Era isso, gente.
Gostaram? Já podem comentar, viu? Juro que nem vou me zangar se vocês o fizerem. =)
Espero que tenham gostado.



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