Conversando Com Os Anjos escrita por glassmotion


Capítulo 3
Capítulo 3




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“Hold up, hold on. Don’t be scared.

You’ll never change what’s been and gone.

May you smile, shine on. Don’t be scared.

Your destiny may keep you warm.

Because all of the stars are fading away,

Just try not to worry, you’ll see them someday.

Take what you need and be on your way

Stop crying your heart out.”

[Stop Crying Your Heart Out - Oasis]

~~

            O pranto copioso já durava horas. Dias. Anos. Gerard tentava tocar o rosto dela, escondido sob o cabelo, mas não conseguia. Havia sangue nas mãos dela. Queria chamá-la, mas não sabia seu nome. E ela chorava, chorava, chorava.

            “Gerard!”

            Abriu os olhos e deu de cara com Mikey.

            “Anda logo, acorda, já são sete e vinte.”

**

            “Frankie, por favor.”

            O pequeno continuava empacado no meio do gramado, Gerard ainda tentando puxá-lo pela mão. “Mas eu não sou bom...”

            “Mas você prometeu!”

            Frank franziu a testa. “Não prometi nada.”

            Ignorando os alunos que passavam ao redor, Gerard subitamente tomou o rosto de Frank nas mãos e o beijou. E ao que o fazia, foi dando passos para trás, fazendo Frank andar para frente sem sequer perceber, e logo estava correndo e puxando o pequeno pela mão. Frank protestou que aquilo foi trapaça, mas aceitou ser arrastado até a sala de música com ele e se sentou ao piano com um suspiro exasperado.

            “Não vale zombar de mim se eu errar a nota,” avisou. “O piano do orfanato é velho, empenado e menor que esse.”

            “Eu nunca faria tal coisa!” Protestou Gerard num tom fingidamente ultrajado.

            “Okay então.” Suspiro. “Okay.”

            Os dedos de Frank, apesar de curtos, eram bem ágeis. Ele pôs-se a tocar uma melodia de ritmo rápido, com muitas notas graves e algumas agudas, um bocado dramática - talvez até trágica. Gerard imaginou que vinha de alguma música muito velha que as freiras usavam para botar medo nos órfãos tementes a Deus, mas que soava muito bonita de qualquer forma.

            O zelador idoso e mal-humorado daquela ala do colégio havia entrado na sala para expulsá-los dali, mas ficou escondido atrás de uma harpa, ouvindo Frank tocar por alguns minutos antes enxotá-los para a classe.

**

            O tique do relógio, constante e incessante, ecoava pela sala quieta enquanto os alunos faziam a prova de química. Frank fazia a prova, mesmo que não fosse receber notas por ela - era só por adaptação aos métodos de ensino do Saint Peterson. Por entre pontes de hidrogênio, sentiu algo bater em sua testa e cair no chão - uma bolinha de papel.

            Frank virou o rosto e viu Kevin, do time de futebol, olhando para ele com um sorriso zombeteiro no rosto. Kevin fechou o punho como se segurasse algo e o aproximou da boca, avançando e recuando enquanto pressionava a língua contra o interior da bochecha, numa simulação vulgar que fez os colegas rirem e lançarem olhares sujos a Frank.

            “Senhor Williams, já terminou a prova?” questionou a professora Merriman num tom severo.

            “Não senhora,” Kevin respondeu, endireitando-se no assento. Porém, assim que a professora deu as costas, ele se virou para Frank novamente e mandou-lhe o dedo do meio, sussurrando ‘veado’ de forma odiosa, arrancando mais risadas dos outros e fazendo os olhos de Frank arderem.

            Do outro lado da sala, Gerard observava tudo com olhos tristes. Balançou a cabeça, silenciosamente dizendo para Frank não se importar com aquilo. Mas ele se importava. Sentia-se humilhado. Pegou a mochila e saiu da sala, deixando a prova incompleta e os colegas rindo dele.

**

            “Eu vou acabar com esse filho da puta.”

            “Nós vamos.”

            Os dentinhos de Gerard estavam travados com força, a ira inchando dentro dele a cada segundo que esperava naquele corredor, braços cruzados firmemente sobre o peito. Jepha veio na direção deles, dobrando as mangas da camisa.

            “Eu fiquei sabendo,” disse ele. “Vou acabar com esse imbecil, faz tempo que eu quero machucar aquela carinha esnobe dele.”

            “Nós vamos,” Bert repetiu.

            “E o Frank, cadê?” Questionou Adam. Examinava o taco de croquete que tinha em mãos.

            “Quinn foi atrás dele,” falou Gerard, o rosto vermelho. “É melhor ele não ver isso.”

            Mikey apareceu correndo pelo corredor, desviando dos estudantes que transitavam por ali. “Gee,” ofegou ao chegar. “O que você vai fazer com ele?”

            Bert e Gerard trocaram um olhar preocupado e silencioso, mas foi Jepha que expressou o pensamento. “Até os juniors estão sabendo?”

            Gerard balançou a cabeça. “É tudo culpa minha.”

            “Hey, gente,” chamou Adam. Os seis garotos olharam para o começo do corredor, onde Kevin vinha andando. Mas não vinha sozinho. Tinha com ele seus três zagueiros e as respectivas namoradas cheerleaders.

            E como todos os alunos já estavam sabendo do acontecido - e esperando o que iria acontecer -, posicionaram-se junto aos armários à visão do grupo, deixando o corredor livre entre os rivais.

            “Vamos,” indicou Bert, colocando os óculos escuros ao que começaram a caminhada.

            Avançaram em linha, um ao lado do outro, e pararam a menos de dois metros da aglomeração de atletas esnobes - e futuros sacos de pancada, na mente de Jepha.

            “Aww,” fez Kevin, passando o braço ao redor da cintura de uma das loiras de saia. “Veio defender o namorado?”

            Gerard arqueou as sobrancelhas. “Oh não,” começou, abrindo um sorriso. “Vim te ensinar a chupar direito, porque pela demonstração você é horrível.”

            Kevin fez menção de avançar para cima de Gerard, mas a namorada o segurou. Os três zagueiros largaram as mochilas no chão.

            “Eu não sei do que você está reclamando, Way,” gralhou uma das garotas, Jenny. Ela havia sido rainha da primavera e ainda usava o broche no uniforme. “Vocês são mesmo um bando de bichas.”

            Bert não se importou em reduzir o ‘bando’ a apenas ele, Gerard e Frank. E Quinn, ele esperava. “Para sua tristeza, não é, querida?” Disse com a voz debochada. “Eu não esqueci do seu convite naquela festa da piscina.”

            Jenny fechou a cara e se agarrou ao namorado zagueiro, que apontou um dedo para Bert. “Cala a boca, seu veado.”

            Bert riu gostosamente, balançando a cabeça enquanto tirava os óculos escuros. Pousou os olhos muito azuis e límpidos no marmanjo à sua frente. “Oh, Zac. Eu sou duas vezes mais homem do que você jamais será, e muito mais mulher do que você jamais vai ter.”

            Zac bufou em ódio, tirando o paletó. “Eu vou acabar com você,” ele rosnou.

            “Oh sim,” gemeu Gerard, levando uma das mãos à frente da calça de Bert. “Acabe com nós dois.”

            A piscada que Gerard lançou aos rivais, combinada à forma quase obscena que mordeu o próprio lábio inferior teria sido o estopim para que o conflito se tornasse físico e violento - dezenas de estudantes os circundavam e esperavam por isso ansiosamente. Porém, o mundo parou quando a voz da diretora se fez presente no corredor, firme e autoritária.

            “O próximo a dar um pio será expulso do Saint Peterson!” Gritou a senhora Hudson e todos imediatamente congelaram nos lugares. A diretora veio andando rapidamente pelo corredor, seus saltos ecoando no chão encerado, pequena e gorducha sob o coque impecável no topo da cabeça. Frank e Quinn vinham atrás dela. “Circulando, vocês todos! Senhor Way, que vergonha.”

            Gerard abriu a boca e arregalou os olhos. “Eu?!” ele berrou. “Foi ele que ficou humilhando o Frank por nada!” Acusou, apontando para Kevin com o dedo.

            “Eu só falei a verdade,” Kevin debochou sob um sorriso, cruzando os braços fortes.

            “Senhor Way, o que vocês fazem ou deixam de fazer fora do colégio não é de meu interesse,” interrompeu a diretora, negligenciando as provocações homofóbicas dos alunos. Frank parecia estar prestes a virar do avesso, encarando o chão com o rosto vermelho. “Mas não irei admitir o nome do meu colégio ser manchado por bobagens adolescentes. Fui clara?”

            Gerard estava prestes a concordar com um ‘sim, senhora,’ mas a voz de Bert interrompeu. “É fácil ignorar quando não é com você, não é mesmo, dona meu-marido-me-trocou-pela-estagiária?” Provocou, presunçoso. A senhora Hudson se virou para ele com as sobrancelhas muito arqueadas, praticamente em choque.

            “Detenção, McCracken. O resto de vocês, para casa. Agora.

            *

            “Gerard, querido?” veio a voz de Donna junto com algumas batidas na porta. Gerard disse que ela poderia entrar e ela o fez. “Meu anjo, estou indo visitar tia Connie em Belleville. Ela me pediu ajuda com o novo bebê.”

            “Oh, okay, dê um beijo neles por mim.” Estava sentado no chão do quarto, costas contra a cama e revistinhas no colo - Frank do exato mesmo jeito. Sem gravatas, golas alargadas, mangas dobradas - Por um momento, Donna observou o quanto seu filho estava crescido e uma ponta de orgulho atingiu o coração dela.

            “Darei,” respondeu ela com um sorriso. “Volto amanhã, certo? Há dinheiro na porta da geladeira, peçam o jantar - nada de pizza, Gee. Não esqueça seu remédio e não deixe seu irmão esquecer o dele. Seu pai volta tarde hoje, muito trabalho no distrito, então tenha juízo e...”

            “Oh, mãe,” Gerard interrompeu a típica lista quilométrica e recomendações maternas. “Sabe a senhora Davis? Então, hoje tem uma festa na casa dela.” Só que ela não estará lá e não sabe da festa. “Eu quero ir, quero levar o Frank. Sabe, pra ele fazer mais amigos.” Mentira.

            Donna ponderou por um momento, crispando os lábios finos cobertos de batom escarlate. “Certo, mas não volte muito tarde. E leve o celular, irei te ligar para checar se você está bem.”

            Enquanto Frank ficava maravilhado com o cuidado dela, Gerard o dispensava com um aceno da mão. “Pode deixar, mãe, não vai acontecer nada de mais.”

            “Bem, nunca se sabe. Tenha cuidado, e leve seu irmão se ele quiser ir.”

            “Mãe!

            “Ele vai querer ir, Gerard, e se você não levá-lo, ele vai dar um jeito de ir sozinho. E isso é perigoso, então leve Mikey e esteja de volta à meia-noite...”

            “Mãããe!”

            “Uma hora no máximo.”

            Gerard bufou. “Está bem.”

            A mulher se aproximou e curvou-se para frente, pousando um beijo na testa do filho. “Divirtam-se.” Beijou também a testa de Frank. “Até logo, Frankie, foi um prazer conhecê-lo.”

            “A senhora também, senhora Way,” respondeu com um sorriso largo.

            Os dois ficaram em silêncio, encarando a porta por mais um instante depois que Donna a fechara. “Ter uma mãe é tão legal,” Frank falou com um suspiro, desejando imensamente ter alguém que cuidasse dele também.

            “Ter um Frank é legal,” retrucou Gerard, tomando o menor em seus braços. Segurou-o como um bebê, uma mão apoiando seus ombros e mantendo seus rostos bem próximos, a outra no meio das costas dele. Frank o fitou com olhos brilhantes, inocentes e esperançosos - aquelas feições e maneirismos angelicais não cessavam paralisar Gerard com todo seu encanto.

            “Hey, Gerard... você acha que ela ficaria brava se soubesse?”

            “Soubesse?” Ecoou, correndo os dedos pelos cabelos macios de Frank. Não ligava a mínima para as revistinhas sendo amassadas entre eles.

            “É, você sabe...” fechou os olhos sob o toque. “Da gente.”

            Gerard deu uma daquelas risadinhas finas e roucas. “Oh, ela sabe. Por que você acha que ela bateu antes de entrar?”

            Frank abriu os olhos, testa franzida. “Por que ela bateu?”

            “Oh, bem.” Deixou a ponta do indicador escorregar pela pele macia do rosto de Frank, que ainda segurava um bocado do bronzeado do verão. Era extremamente convidativo e Gerard teve vontade de lambê-lo. “Da última vez que ela entrou sem bater, eu não estava vestido.” Deixou o olhar encontrar o do pequeno, que o encarava desconfiado ao que Gerard tinha uma expressão brincalhona. “Bert também não estava vestido,” acrescentou num sussurro hesitante.

            Frank expirou fortemente. “Bacana.” Quando Gerard fez menção de se justificar, Frank o interrompeu. “Hey, não é da minha conta. Eu acabei de chegar, e mesmo assim a vida é sua, eu sei que eu não sou ninguém.”

            Por um momento, Gerard apenas olhou para Frank, imensurável carinho transparecendo por seu olhar e sorriso. Estreitou então o enlace, trazendo o pequeno para ainda mais perto e afundando o rosto no pescoço dele. Frank tinha sempre aquele cheiro leve de sabonete, de pele pura e limpa. “Você é alguém, e está com ciúmes.”

            “Não estou,” negou num tom seco. Pretendia soar mais ríspido, mas os lábios de Gerard em seu pescoço tinham lhe desarmado. Levou uma mão ao cabelo dele, os dedos entrelaçando nos fios negros, Gerard tão perto, respiração quente contra pele sensível, lábios abertos, dentinhos arranhando, língua úmida traçando uma linha sobre uma veia pulsante.

            “Você não precisa ter,” Gerard murmurou, a mão que não apoiava os ombros de Frank escorregando para debaixo da camisa do uniforme e acariciando a pele macia da barriga dele. “Não tem uma coisa em você que eu não goste, Frankie. E eu quero ficar com você, mesmo que pareça cedo demais para decidir.” Subiu as mãos até as costelas e os lábios até a orelha do menor. “E eu tenho absoluta certeza que, nesse exato momento, nesse agora, é com você que eu quero ficar.”

            Frank sentiu um solavanco dentro de seu corpo - estômago?, coração, talvez? - e inconscientemente segurou os cabelos de Gerard. Ninguém nunca o havia querido, nem mesmo sua própria mãe. E agora ele estava ali, num lar completo, com uma pessoa encantadora dizendo que o queria. Frank não podia pedir por mais. “Uma vez eu li num livro,” disse com a voz falha, e pigarreou brevemente para melhorá-la. Gerard levantou o rosto para fitá-lo - os olhos verdes sorrindo, o nariz arrebitado tocando o dele. “Eu li num livro que nós devemos viver como se estivéssemos morrendo.” Ofegou pela mão que deslizou pelo seu peito.

            “E você acredita nisso?” Questionou Gerard docemente, seus lábios pairando a uma partícula de distância dos de Frank, tocando-os eventualmente.

            A resposta afirmativa veio não em palavras, mas sim com o avanço do rosto do menor, que colou seus lábios aos de Gerard com urgência. Deixou o queixo cair, sua boca aberta permitindo que as carnes se mesclassem. Após uma mergulhada especialmente perfeita de Gerard, Frank agarrou os cabelos dele com força e o fez grunhir. Embora para Gerard o avanço fosse puramente bom e esperado, Frank se assustou e recuou, não estando acostumado a ir tão longe. Ficaram ali, muito próximos, respirando rapidamente contra a pele um do outro.

            “Frankie, Frankie...” suspirou longa e profundamente, balançando a cabeça e mordendo o lábio inferior. Colocou a camisa dele no lugar. “Acho melhor a gente ir pegar um lanche na cozinha.”

**

            “Santo Deus, que coisa horrenda.”

            “Ora, Frankie, vamos lá!” Riu Gerard, acenando para a TV com uma mão. “Olha os saltos! Você tem que amá-lo.”

            Fred Mercury continuava a passar o aspirador e Frank fez uma careta. “Ele é peludo e tem um bigode imenso, isso é assustador.”

            “Isso é arte,” declarou com prepotência, fazendo o outro engasgar com o marshmallow que comia.

            “Arte? - Ah céus, ele piscou? - Oh, sim, definitivamente arte,” debochou, levantando do sofá. Desfez alguns botões na base da camisa e amarrou as duas pontas na altura das costelas (Gerard decidiu que Frank estava magrinho demais). Agarrou um guarda-chuva perto da porta e encostou a ponta no chão, imitando os movimentos estranhos do homem - ou o que quer que ele fosse - da TV. Quebrou o pulso que não segurava o guarda-chuva. “I’ve fallen in love,” Frank cantou junto, arrancando de Gerard uma risada alta e escandalosa. Revirou os olhos e crispou os lábios numa sátira às caras e bocas sensuais na tela. “I’ve fallen in Love for the first time, and this time I know it’s for real!”

            “Meus olhos, eles queimam!” Berrou Gerard, escondendo com as mãos o rosto risonho.

            “Arte meu nariz,” reclamou Frank, largando o guarda-chuva e parando a dança. “Isso é medonho.”

            Gerard se esticou e agarrou a mão de Frank, fazendo-o cair de volta no sofá, sentado entre suas pernas, as costas contra seu peito. “Aw, rabugentinho,” brincou, envolvendo o torso do menor com os braços, as mãos nas laterais da barriga descoberta. “Você que é a obra de arte por aqui.”

            As bochechas de Frank queimaram e seu coração acelerou - ele imaginou se Gerard podia senti-lo.

            “Eu gostei muito dos marshmallows,” declarou, encabulado, tirando mais um doce do pacote que jazia no canto do sofá.

            “Eu ainda não consigo acreditar que você nunca tinha comido marshmallows.” Frank deu de ombros, acostumado. “E você está muito magrinho, Frankie. Vou começar a te alimentar direito.”

            “Oh.” Largou o doce. “Não precisa, Gerard, eu estou bem...”

            “Shush. Eu quero ter o que apertar aqui, sou um bichinho egoísta. Vou te entupir de porcaria e você não ouse recusar, Frankie.”

            Os lábios doces de Frank se contorceram num sorriso. Gostava de como Gerard se importava com ele, e sabia que estava comendo pouco - havia perdido interesse no mingau de aveia diário do orfanato. “Eu ando meio distraído, vou jantar direito quando chegar em casa.”

            “Nah, eu sei o que te servem lá. Hoje teremos pizza como o primeiro passo da sua dieta de engorda” - apertou o que conseguiu da barriga do pequeno, fazendo-o rir.

            “Oh Ger, pára -- ah, olha lá. Essa música sim é boa.”

            O rosto de Chrissie Hynde estava na tela, as primeiras notas da música ecoando pela sala abafada. “Você gosta dessa?” Gerard perguntou, passeando a ponta do nariz pela nuca de Frank.

            “É uma das minhas favoritas.” Deixou a cabeça cair para trás, no ombro do mais velho, as mãos pousando sobre as dele.

            “Oh,” começou Gerard, junto da mulher do vídeo. “Why you look so sad? Tears are in your eyes. Come on and come to me, now.”

            Frank sorriu e fechou os olhos, surpreso com o fato de que a voz anasalada de Gerard funcionava bem para cantar.

            “Don’t be ashamed to cry, let me see you though, cause I’ve seen the dark side too.” Apertou o corpinho miúdo de Frank entre os braços e começou a se balançar levemente para os lados, no ritmo da música. “When the night falls on you baby, you don’t know what to do. Nothing you confess could make me love you less.”

            Frank não respirava - tinha medo de que o barulho fosse estragar a música.

            “I’ll stand by you, I’ll stand by you. Won’t let nobody hurt you. I’ll stand by you,” cantou baixinho, o significado das palavras ecoando dentro de ambos. Gerard entrelaçou seus dedos aos de Frank e estava prestes a começar um novo verso quando a porta da sala foi aberta com brusquidão.

            “Puta que me pariu, acho bom alguém me chupar hoje à noite se não eu morro de tristeza,” Bert foi falando enquanto entrava, batia a porta e se jogava no outro sofá. Seu olhar caiu na barriga de Frank, ainda exposta sob o nó da camisa. “Sexy, Frankie.”

            Gerard passou a desfazer o nó da camisa de Frank, escondendo a preciosa pele. “O que aconteceu?” Perguntou ao amigo, que já mudava o canal da TV, irritadiço.

            “Puta detenção horrorosa, me fodi, me fodi legal e não no bom sentido.” Desligou a TV e jogou o controle no chão, passando a procurar por algo nos bolsos. Gerard e Frank ainda o observavam em silêncio - as mãos de Gerard protetoramente sobre a barriga agora coberta de Frank. “A diretora me obrigou a refazer todas as provas.”

            Enquanto Gerard emitiu um ‘Oh’, Frank continuava oblíquo. “E isso é tão ruim?”

            Bert terminou de acender o cigarro e jogou as mãos para o alto. “Se é ruim? Frankie, querido, presta atenção.” Curvou-se para frente e segurou o cigarro entre dois dedos. “Ta vendo o pervertido atrás de você?”

            Frank sorriu, apertando as mãos de Gerard. “Hm.”

            “Pois é. Quem fez minhas provas de exatas e tirou A foi ele. Não eu. Porque eu não sei porra nenhuma.”

            Frank fez um som de compreensão.

            “E vão valer as provas que você fez hoje?” Questionou Gerard. “E não deixa cair cinza no tapete.”

            “Lógico que vão valer as que eu me foder,” praguejou Bert, jogando as cinzas dentro do vaso de plantas plásticas que ficava sobre a mesinha. “Aquela diretora mal-comida imbecil. Alguém precisa mandar um consolo de presente pra ela.”

            “Isso,” Gerard apontou um dedo para Bert, “parece uma ótima idéia. Você... oh, nós ainda temos aquele...”

            “Temos!” Bert respondeu, parecendo animado de repente, pulando para a ponta do sofá. “Cara, acho que eu nem lavei aquilo!”

            Gerard riu. “Você nunca lava nada. Deve estar com cheiro de cereja.”

            “Ai meu Deus, nem me fala.” Tragou o cigarro mais uma vez. “Não posso pensar nisso agora, Gerard, olha o Frankie aí.”

            “O que tem eu aqui?” Frank voltou a falar, virando o rosto para olhar para Gerard, que deu-lhe um beijo estalado.

            “Nada, meu anjo, só não é bom relembrar esse tipo de coisa,” disse, enquanto Bert se jogava no sofá de olhos fechados. “Principalmente com Bert necessitado assim.”

            “Minhas bolas doem, cara,” Bert reclamou, pondo-se de pé num instante. “Vou procurar nosso brinquedo e me arrumar para a festa. Vocês vão, certo?”

            “Vamos,” Gerard respondeu. “Quer carona?”

            “Quero,” Bert disse, já indo em direção à porta. “Orgia no banco de trás.”

            Bert saiu da casa sem mais uma palavra, deixando os dois outros jovens sentados no sofá, Frank cada vez mais submerso nos braços de Gerard. Estava pensando o que diabos eles estavam fazendo com o brinquedo e sabe-se lá o quê cheirava a cereja. Decidiu que não queria pensar.

            “Hey Frankie, vamos subir. Vou te fazer a massagem que prometi.”

            Começaram a se levantar, imediatamente sentindo falta do calor um do outro. “Com o tal negócio de cereja?”

            Gerard riu. Riu alto. “Frankie!”

            Frank o encarou de volta com dois imensos olhos inocentes, e o coração de Gerard se contorceu. “Não, não com o negócio de cereja. Um dia, hoje não,” disse, tomando a mão do pequeno e o arrastando escada acima. Quando chegaram no quarto, Gerard se virou de frente para Frank. “Você vai ter que tirar isso,” disse, pousando as mãos no colarinho da camisa dele.

            “Vá em frente.”

            O maior começou a desfazer os botões da camisa surrada, lentamente revelando o peito de Frank - a pele do garoto era de um tom natural de oliva, dando a ele uma aparência saudável e extremamente tentadora. Quando a camisa estava totalmente aberta e pendendo nos ombros de Frank, Gerard pousou as duas mãos no peito do rapaz antes de deslizá-las até os ombros dele, descendo pelos seus braços até que o tecido caísse no chão.

            Frank sentiu-se repentinamente muito exposto, porém de uma forma boa. Gerard levou o indicador até o queixo dele, levantando seu rosto levemente, e inclinou-se para pousar um beijo na curva onde o pescoço e o ombro de Frank se encontravam, fazendo um arrepio sacudir o corpo do pequeno.

            “Frio?” Gerard perguntou, deslizando as mãos pelas costas de Frank antes de envolvê-lo num abraço.

            “Calor,” respondeu simplesmente, fazendo o maior sorrir.

            “Cama, Frankie. De bruços,” ordenou, soltando-o e pondo-se a caminho da cômoda. Abriu a gaveta de cima e procurou um instante por alguma loção hidratante em meio à bagunça. Viu a loção de cereja no canto, seu estômago flutuando brevemente com a idéia de usá-la em Frank ou vice-versa. Afastou a idéia e fechou a gaveta rapidamente.

            Quando se virou, Frank estava deitado na cama como lhe fora dito para fazer, balançando os pés descalços tranquilamente.

            “Frankie, eu vou ter que, uhm,” - aproximou-se da cama. - “Meio que sentar em você, okay?”

            “Oh. Oh, okay.” Não era idiota, sabia como massagens funcionavam.

            Gerard subiu na cama e passou uma perna por cima de Frank, apoiando um joelho de cada lado de seu corpo. Deixou um pouco de seu peso sobre a curva na base das costas dele, não sentando-se completamente, mantendo-se apoiado nas próprias coxas.

            A idéia havia parecido muito mais simples antes. Frank gostava de ser tocado como todo ser humano em sã consciência, porém nunca teve ninguém que o fizesse. Gerard lhe faria uma massagem relaxante e inocente. Só isso.

            Só isso?

            Frank estava seminu. Na casa de Gerard - só os dois na casa, aliás. Numa cama. Com Gerard sentado sobre Frank. Aos dezessete anos com hormônios monstruosos.

            “Okay, massagem,” murmurou Gerard, tirando - ou pelo menos tentando tirar os pensamentos da mente dos dois. Abriu o creme e despejou na pele do menor, secretamente desenhando um grande ‘G’ com a loção. Marcando seu território.

            Jogou a embalagem do creme de lado e pousou as palmas nas costas de Frank, deslizando e espalhando a loção - o pequeno decidiu imediatamente que amava aquilo.

            “Isso é bom,” Frank disse baixinho, e sentiu Gerard apertar seus ombros. “Ow, muito bom.”

            “Gostou?” questionou, massageando o pescoço do outro com seus polegares curvados e sentindo-o menear a cabeça. “Que bom.”

            Gerard passou um bom tempo naquilo. Os músculos de Frank pareciam literalmente ter nós aqui e ali, levemente inchados em alguns lugares, como uma massa de pizza que tem caroços nas bordas. Manifestações físicas de todos os problemas emocionais acumulados durante anos, ignorados e negligenciados por todos - inclusive pelo próprio Frank, que raramente reclamava de qualquer coisa.

            “Minha cabeça não dói quando você está comigo,” Gerard declarou de repente, pensando nas próprias dores, e Frank abriu os olhos.

            “Como assim?”

            “Minha cabeça dói desde que eu era criança.” Apertou os ombros magrinhos. “A dor nunca realmente parava, nem com remédios. Mas quando eu estou com você, não dói. Nada.”

            Frank franziu a testa. “Sério?”

            “Yeap.”

            “Então...” passou as unhas pelo lençol. “É por isso que você me quer por perto?”

            “Não!” Bateu levemente em seu braço. “Frankie!” - havia um tom ofendido em sua voz.

            “Okay, desculpa, eu só...” Voltou a fechar os olhos, as mãos macias de Gerard em sua pele. “Desculpa.”

            “Bobo.”

            Trouxe as mãos para perto de si próprio e, ao voltar a subi-las, dobrou os dedos e passou as unhas pela pele de Frank. O pequeno suspirou pesadamente, se esticando todo, as costas levantando quando ele inspirou e um grunhido sendo proferido quando ele expirou. Ridiculamente sexy, e mais uma vez o estômago de Gerard flutuou por um momento.

            Esquecendo o mantra ‘é só uma massagem inocente,’ ele deixou as mãos escorregarem para baixo novamente, acariciando a base (cheia de curvas e covinhas) das costas de Frank, deslizando para as laterais, segurando firmemente a cintura macia antes de subir até as costelas e...

            “Unngh,” fez Frank, enterrando o rosto no lençol e arqueando o corpo involuntariamente. Sentia-se reagir aos toques e achou inapropriado - era uma massagem! Mas a censura lhe escapou quando sentiu os lábios de Gerard pairando sobre seu pescoço, respirando contra a pele sensível antes de beijá-la demoradamente com os lábios entreabertos. Uma vez, duas vezes, três vezes, ambos tendo a mesma reação aos toques - língua da ponta do ombro ao pescoço e uma mordida firme. Que se dane, ele também está sentindo.

            Gerard se apoiou nos joelhos e mãos, levantando o corpo para que Frank se virasse sob ele. Quando o pequeno estava de barriga para cima, Gerard voltou a se abaixar, deixando os quadris se encontrarem enquanto mergulhava para beijar o peito de Frank.

            Era levemente intimidante para Frank estar deitado sob alguém numa cama - era a primeira vez que acontecia. Porém, aquele alguém era Gerard, infinitamente bonito com sua pele pálida e imensos olhos verdes, já tão familiar, digno de confiança, atraente como o inferno e provocando Frank com toques atrevidos. De jeito nenhum ele iria parar.

            Mão no quadril, lábios no pescoço, Frank com calor. Mãos mais em baixo, lábios mais em cima, beijo intenso, partes inferiores pressionadas juntas, Gerard ondulando-se todo - como um gato, Frank sempre achou que ele parecia um gato. As mãozinhas subiram pelas costas pálidas, trazendo junto a camisa e eles separaram os rostos por um momento para descartar o tecido.

            “Frankie.”

            “Shh.”

            Agarrou os fios compridos, certificando-se de que Gerard não escaparia. E ele não escapou. Deixou a mão passear até a frente das calças de Frank, pressionando e deslizando a palma contra a rigidez sob o tecido. O corpo de Frank foi sacudido num calafrio e ele grunhiu contra a boca do maior, que ficou paralisado.

            “Eu - uh - desculpa,” gaguejou Gerard, pousando a mão na cama e afastando-se um pouco.

            Frank o fitou, arfante, parecendo confuso. “Não, eu... tudo bem.”

            “Eu só vou fazer o que você quiser, Frankie. Só vou até onde você quiser.”

            Apoiando um cotovelo na cama, Frank ergueu o corpo, a mão livre indo parar no rosto de Gerard - corado e começando a ficar suado. Sabia que ele não o machucaria, que iria parar tudo se Frank assim quisesse. Confiava nele. “Você pode fazer o que achar melhor,” entregou-se, puxando Gerard de volta para si.

            Uma ansiedade gostosa tomou conta de Frank quando sentiu a mão de Gerard sobre o cós de sua calça. Um botão desfeito, um zíper aberto, os dedos pálidos escorregando para dentro e o barulho da porta batendo lá em baixo.

            “Gerard!” veio a voz de Mikey da sala de estar. “Gee?!”

            Uma palavra horrorosa saiu da boca de Gerard, que blasfemou horrivelmente e saiu de cima de Frank - que, por sua vez, sentiu o pânico lavar seu corpo e mente. Ouviram os passinhos apressados de Mikey escada acima. Quando o caçula chegou ao quarto, cabelos ainda molhados pela natação, Gerard estava de frente para o closet e Frank sentado sobre a cama, um travesseiro no colo.

            “Gee, eu quero ir à festa,” Mikey declarou, observando as costas do irmão - havia algumas marcas avermelhadas na pele dele.

            “É, eu sei.” Pegou uma toalha e pôs-se a sair do quarto. “Pegue umas roupas para o Frank, eu vou tomar banho.”

            Quando Gerard passou por Mikey, o mais novo veio a notar o quanto o irmão estava corado. Virou-se rapidamente para Frank, que estava vermelho como um pimentão, lábios inchados e uma marca imensa no pescoço. Sem camisa também. Na cama bagunçada.

            Mikey arregalou os olhos, uma expressão de horror tomando conta de seu rosto. “Oh meu Deus, na minha cama?”

            Frank passou a mão pelos cabelos e não disse nada.

            **

            A casa onde seria a festa ficava nos limites da cidade, perto do penhasco onde Gerard e Frank passavam as tardes. Após a curva da fábrica, pegavam a estrada da esquerda ao invés da direita, indo parar na casa imensa e já cheia de adolescentes hiperativos e festeiros.

            Desceram os quatro - Gerard, Bert, Mikey e Frank. Bert imediatamente entrou na casa à procura de Quinn. Mikey ajeitou a gola alta do casaco e o cabelo no reflexo das janelas antes de entrar, fingindo não ver a garota de quem falava o dia todo na porta - ela foi atrás dele: ponto para Mikey.

            Frank estava vestido com uma jaqueta de couro, calças apertadas e luvas que não cobriam os dedos. Mikey havia escolhido as roupas. Frank deixara de ser majestoso em sua inocência sensual e passara a ser extremamente sexy - pelo menos aos olhos de Gerard. Este que, por sua vez, estava vestido com as habituais roupas escuras, o que ressaltava seus olhos e fazia Frank contemplá-lo como uma menina de quinze anos apaixonada.

            Mesmo sabendo que atrairia atenção indesejada, Gerard segurou Frank pela mão ao atravessarem o jardim em direção à casa. Frank sentia-se um pouco desconfortável tendo as pessoas olhando para ele, mas sentia-se seguro ao lado de Gerard. Além do mais, estava extremamente orgulhoso de estar com ele, e isso lhe dera uma segurança que permitiu que ele avançasse pelo caminho de cabeça erguida.

            Gerard cumprimentou algumas pessoas no caminho, um sorriso torto nos lábios. Estão vendo esse ser divino ao meu lado? Pois é, ele está comigo. Podem arder de inveja.

            Algumas pessoas olhavam para eles com expressão de desprezo, outras eram indiferentes e um par de garotas fez ‘aw’ quando eles passaram. Entraram na casa escura, a sala ampla ainda não tão cheia, uma música de baixo pesado preenchendo o ambiente. Alguns sofás contra as paredes - Mikey num deles, conversando muito de perto com sua garota. Gerard conduziu Frank através de um corredor até chegarem à cozinha. Havia algumas pessoas lá, inclusive Bert, que estava ao lado do barril de cerveja.

            “Não achei o Quinn, mas achei o álcool!” Declarou com seu sorriso de coringa, passando um copo plástico azul para Gerard e outro para Frank. Pegou o seu próprio, já pela metade sobre o balcão de mármore da pia. “Saúde!”

            Brindaram e beberam - Bert e Gerard. Frank apenas cheirou o líquido em seu copo, a mãozinha esquerda ainda firme na de Gerard. “Experimenta, Frankie,” indicou Bert, “você vai gostar.”

            Frank fitou Gerard, que lançou-lhe um sorriso de encorajamento. Ainda assim, Frank hesitou - o cheiro não era muito atraente. “Espera,” disse o maior, tomando mais um gole de sua bebida e deixando os lábios bem molhados, quase pingando. Soltou a mão de Frank para envolver seus ombros e o beijou, inserindo a língua na boca do pequeno, deixando-o sugar sua carne e sentir o gosto meio amargo do líquido.

            “Não façam isso na minha frente,” implorou Bert, deliciado com a visão à sua frente. “Não se não forem me deixar entrar.”

            Após uma última lambida nos lábios de Gerard, Frank o abraçou e virou o rosto para Bert. “Sinto muito, Bertie, esse aqui é meu.”

            Um sorriso gigante se abriu no rosto de Gerard, que manteve Frank firme contra seu peito. Bert fez uma careta para eles. “Mas então vocês estão tipo, namorando?”

            A pergunta pegou Frank de surpresa, mas Gerard tinha uma resposta na ponta da língua. “Estamos noivos,” declarou de imediato. “Você vai ser a dama de honra.”

            “Que delícia,” Bert retrucou. Seu olhar caiu em algum lugar fora da cozinha. “Oh, Quinn. Vou fazê-lo desmaiar” - e saiu pelo corredor.

            Gerard voltou a olhar para Frank, que ainda estava em seus braços. “Noivos?” Questionou o pequeno, sorrindo.

            “Sim senhor.” Beijou-lhe os lábios rapidamente e deu alguns passos para trás, encostando-se no balcão de mármore, encaixando Frank contra suas pernas. “Não vai provar sua cerveja?”

            Frank levou o copo à boca e tomou um grande gole, lambendo os lábios vermelhos em seguida - poxa vida, que delícia, pensou Gerard. “Então, gostou?” Perguntou, o olhar fixo na boca de Frank.

            “Prefiro provar de você,” respondeu o pequeno, deslizando os dedos descobertos pelos cabelos de Gerard, segurando seu pescoço. O maior sorriu e bebeu mais um pouco, nunca tirando os olhos do outro. Deixou o copo na pia e puxou o menor para si, faminto por ele.

            Pelos minutos seguintes, até os héteros mais convictos que entraram naquela cozinha pararam para observar a intensa interação entre os garotos, marvilhosamente atraentes em seus beijos quentes e ritmados. Noivos.

            **

            Giraram a garrafa pela segunda vez, e o gargalo apontou para Alicia. Mikey tentou segurar o sorriso imenso que teimava em dominar seu rosto: ela já tinha pedido verdade uma vez, e ele havia feito um acordo com os garotos.

            “Conseqüência!” Gritaram os jovens da roda, fazendo sons de uivos e batendo palmas. A garota levantou o rosto, desafiadora, as pálpebras pintadas de preto semicerradas.

            “Manda, Frank.”

            O garoto trocou um olhar com Mikey, que fez ‘vai’ com a boca.

            “Okay. Você tem que beijar o Mikey.” - o cotovelo de Gerard bateu levemente em seu braço. “Por cinco minutos.”

            Meio segundo depois Michael estava caído no chão, Alicia sobre ele, devorando seu rosto em meio à música alta. Todos riram e beberam mais um pouco.

            Giraram a garrafa outra vez, e Adam perguntou a Quinn o que ele queria. Quinn escolheu verdade, os cabelos loiros caindo charmosamente sobre seus olhos embriagados. Bert inclinou-se para Adam e sussurrou algo ao ouvido dele.

            “Okay. Quinn, Bert quer saber se você gosta de garotos,” Adam falou de forma enrolada e Bert estapeou-lhe a nuca. “Ouch!”

            “Então?”

            Quinn fitou Bert de forma brincalhona. “Depende do garoto.” E piscou um olho.

            Mais uma rodada de uivos. Gerard cumprimentou Bert batendo a mão na dele e dizendo ‘score!’ antes de voltar à sua posição inicial de Frank numa mão e copo na outra.

            Mais uma vez giraram a garrafa e Alicia teve que sair de cima de Mikey para fazer uma pergunta ao irmão dele.

            “Verdade ou conseqüência?” Ela perguntou, ajeitando os seios no decote. Mikey continuava caído no chão.

            “Verdade,” pediu Gerard.

            Ela o encarou por alguns segundos, maliciosa. “Você já chupou alguém?”

            Quem respondeu foi Bert. “Sim, e eu adorei!” ele berrou, levantando os braços e fazendo movimentos de idolatria a Gerard.

            Mikey tapou os ouvidos, Gerard escondeu o rosto nas mãos, Frank lançou-lhe um olhar bravo e o resto riu alto, o barulho escandaloso sobressaindo-se à música alta e chamando a atenção de alguns outros jovens fora da roda.

            Alicia voltou a atacar Michael e giraram a garrafa novamente, dessa vez Jepha perguntando a Quinn. E como Quinn já havia pedido verdade...

            “Vai se pegar com o Bert e deixe-nos em paz,” Jepha disse calmamente, e logo suas ordens foram cumpridas - Frank aprovou mentalmente, o ciúme o corroendo, e tomou mais de seu copo.

            Giraram outra vez: Mikey perguntando a Frank. Verdade.

            “Você está apaixonado pelo meu irmão?”

            O estômago de Frank girou, e não foi pela bebida. Até Bert pausou seu ataque a Quinn e virou-se para ouvir a resposta. Gerard encarava seu copo quase vazio, balançando o pé nervosamente. Frank ficou calado, o coração batendo rápido, cabeça girando, pegando raiva de Mikey por ter perguntado aquilo.

            “Hey,” chamou Gerard, levando uma mão à coxa dele. “Você não tem que responder isso.”

            Vários ‘qual é’ e ‘vamos lá!’ encheram a roda, mas Gerard os encarou de forma autoritária. “Ele não tem que responder isso e ponto final.”

            “Imbecil,” rosnou Mikey, voltando a seus afazeres. As pessoas rodaram a garrafa novamente, mas Frank não estava prestando atenção.

            “Desculpa,” ele murmurou, escondendo o rosto no pescoço de Gerard, que largou o copo para abraçá-lo.

            “Você não tem que se desculpar, meu anjo. Meu irmão é um idiota.”

            “Mas Gerard, vê,” Frank disse com a voz mais grossa que o normal, os olhos boêmios transbordando carinho. Segurou o rosto do mais velho. “Eu adoro você. Completamente.” Colocou os cabelos negros dele atrás da orelha, deslizando o dedo pela cartilagem, arrancando de Gerard um sorriso bobo e deslumbrante. “Se eu não estou, eu vou ficar.”

            Gabe estava sendo forçado a ligar para os pais no jogo, mas Gerard e Frank só se importavam um com o outro. Os lábios do menor estavam começando a ficar dormentes, mas não o suficiente para que ele não sentisse os dentinhos de Gerard mordendo-o, provocante.

            Sem que nenhum deles percebesse, Frank foi lentamente deitando-se no chão, Gerard sobre ele, sem nunca quebrar o contato. Frank, que não estava acostumado a beber e já tinha os sentidos muito mais aguçados, sentiu as calças apertadas que Mikey lhe dera ficando desconfortáveis. Queria que Gerard pusesse a mão ali de novo, não se importando onde estavam, não se importando com nada.

            “Frankie!” veio a voz de Bert muito perto de seu rosto. Separaram-se, arfantes. “Eu pergunto pra você agora.”

            “Oh. Okay?” - não tirou as mãos das coxas de Gerard, segurando-o na mesma posição.

            “Você já pediu verdade,” Bert informou, e chegou o rosto mais perto, sorrindo torto. “Sua conseqüência é deixar o Gerard chupar você.”

            Gerard arregalou os olhos para Bert, pronto para retaliá-lo, mas a voz de Frank o interrompeu. “Por mim tudo bem.”

**

            A jaqueta de couro jazia em algum lugar no chão do banheiro, mas não era possível vê-la. Gerard decidira manter a luz apagada. Assistir a um oral tornava as coisas mais explícitas, eróticas. Sujas demais para a pureza de Frank. Sentir no escuro, no entanto, era simplesmente delicioso. Seria melhor assim.

            Frank, por sua vez, não admitia que morria de ciúmes de Bert. Tampouco admitia - sequer nem percebia - que uma das razões para ter concordado com aquilo era para tornar definitivo que ele e Gerard estavam juntos. Era irracional, inconsciente, mas estava ali. E é claro que a forma enlouquecedora que Gerard lambia a boca de Frank era um grande incentivador para que a ação avançasse.

            Gerard virou o menor de costas para si, fazendo-o apoiar as mãos na pia. Envolveu-lhe com um braço na altura do peito, mantendo o pescoço de Frank ao alcance de sua boca ávida. A outra mão Gerard usou para desabotoar o jeans do menor, e quando o fez, posicionou a ponta dos dedos contra o elástico da roupa íntima. Deslizou a mão para baixo, sentindo o começo de uma trilha de pêlos grossos até que tinha Frank enchendo sua mão, a pele fina, quente, pulsante, entregue a Gerard. O menor instintivamente investiu com os quadris para frente, gemendo baixinho, sentindo Gerard atrás de si.

            “Ugh, Frankie,” fez o mais velho, virando o outro de frente para si e voltando a beijar-lhe de forma quase obscena. Frank segurava os cabelos dele com força e, num último lampejo de juízo, disse:

            “Será que isso é mesmo uma boa idéia?” perguntou enquanto Gerard tirava sua camiseta - deixou as luvas nas mãozinhas dele, imaginando o quão sexy Frank estaria. Decidiu que acenderia a luz antes dele se vestir, queria tanto ver seu rosto.

            “Hah, oh, Frank.” Passou a mão pelo peito nu dele, fazendo o garoto suspirar. Tocou sua orelha com os lábios e mordeu seu lóbulo. “Quando eu terminar, você vai ver que foi a melhor idéia do mundo.”

            Gerard ficou de joelhos.

            Frank sentiu que ia morrer.

            Do lado de fora do banheiro, Bert escutava tudo, os sons lá de dentro misturando-se com os gemidos de Quinn. Todo mundo satisfeito.

            **

            “Talvez minha mãe possa te adotar.”

            Frank riu. “Isso seria estranho.”

            “É, eu sei.” Enterrou-se no pescoço do menor, que estava sentado de costas para ele, entre suas pernas - como já estava se tornando comum. Encaixavam tão bem. “Logo a gente vai pra faculdade.”

            Frank sentiu os braços de Gerard apertando-o mais forte. “Ger, estou cheio.”

            “Oh, desculpa. Acho que comemos pizza demais.”

            De fato, haviam comido. Mas pelo menos o alimento diminuiu um bocado o efeito das cervejas prévias, e os garotos estavam plenamente satisfeitos. Bert surgiu por entre a pequena multidão que dançava no meio da sala, olhos semicerrados e um sorriso atravessado. Jogou-se no sofá ao lado dos dois outros jovens.

            “Onde está Quinn?” perguntou Gerard. Bert suspirou, encostando-se no amigo.

            “Desmaiado na cama da senhora Davis,” respondeu com uma risada. “E vocês, como estão?”

            “Acho que estamos bem, certo, Frankie?”

            “Yeap, muito bem.”

            “Hey, Frank,” chamou Bert, aproximando-se do pequeno. “Ele é bom, não é?”

            “Cale a boca,” rosnou Gerard, empurrando Bert para o lado. E Bert, do jeito que caiu, ficou. Frank entrelaçou seus dedos aos de Gerard e ficaram quietos durante um tempo, observando as pessoas dançar - alguns ainda insistiam em encará-los com nojo ou desprezo. Mas eles não se importavam.

            “Sabe,” começou o mais novo. “Acho que esse é o melhor dia da minha vida.”

            “Ora, Frankie, não foi nada.” Virou-o de lado, de forma a poderem olhar um para o outro. “Haverá dias e noites muito melhores.”

            “Qualquer dia é bom desde que você esteja comigo.”

            Gerard sorriu e quis mordê-lo. “Promessa.” Inclinou o rosto para beijar seu menino, mas a voz de Bert os interrompeu.

            “Vocês são um nojo,” declarou, sentando-se. “Puta coisa melosinha, Jesus.”

            “Oh, calado!”

            “Sério, se eu fosse diabético...”

            “Você também está se derretendo pelo Quinn,” ponderou Frank enquanto Bert acendia um cigarro.

            “Oh sim.” Segurou o tubo entre os dedos e soprou a fumaça. “Pela bunda gostosa dele.”

            Frank deu mais uma de suas risadinhas alegres e adoráveis, mas Gerard foi distraído pelo celular vibrando em seu bolso. Pegou o aparelho: Donna.

            “Ah, merda, minha mãe.” Atendeu a ligação, tapando a outra orelha com os dedos. “Alô? Mãe? Só um instante.” Passou a se levantar, dizendo que ia lá fora por um segundo, não escutava nada com aquela música alta ali.

            Foi correndo até os fundos da casa, a chuva fina caindo sobre a grama. “Mãe?”

            “Gerard Arthur, eu disse à uma hora.

            “Mas já passou?”

            “São uma e quarenta!”

            “Oh! Oh mamãe, desculpa, estávamos nos divertindo tanto que nem vi o tempo passar,” disse com a voz propositalmente agradável.

            “Uhm. Como está Frank?”

            “Ótimo, mãe, meus amigos o adoram.” Meio verdade. A pequena turma de Gerard gostava de Frank - o resto da festa o detestava.

            “Bom. E Michael, onde está?

            “Uhh.” Bert apareceu ao lado de Gerard, que pressionou o telefone contra o peito. “Onde está Mikey?”

            Bert apontou para a lateral da casa onde, em meio às sombras, Mikey pressionava Alicia contra a parede. Gerard foi até o irmão e, ao chegar, viu que ele tinha uma garrafa de cerveja na mão. Arrancou-a dele imediatamente.

            “Hey, minha cerveja!”

            Levantou o telefone. “Mamãe.”

            Mikey arregalou os olhos e pegou o telefone. “Oi, mamãe. Estou bem, meio cansado...”

            Gerard balançou a cabeça negativamente, tomando da cerveja de Mikey enquanto voltava até Bert, que estava encostado contra a parede. “Moleque dissimulado,” rosnou por entre dentes, parando ao lado do amigo.

            “A gente fazia pior na idade dele,” ponderou com um sorriso torto e Gerard concordou.

            “É, acho que sim.” Deixou a cabeça cair no ombro do outro. “Nós temos que ir pra casa.”

            “Frank vai dormir lá?”

            “Vai.” Deu uma tragada do cigarro de Bert. “Mas isso não significa nada.”

            “Como não? Ele não gostou da brincadeira no banheiro?”

            “Bem, sim, mas...” enfiou o dedão no gargalo da garrafa, inquieto. “Ele é diferente, Bert. Ele é um anjo, eu não vou sair molestando o garoto.”

            “Anjo meu nariz, aposto que ele quer te molestar.” Jogou o filtro do cigarro longe.

            Gerard riu. “Eu ia gostar se ele o fizesse.”

            “Hey, amigo é pra essas coisas,” brincou, mordendo o nariz pontudo do outro. Mikey apareceu na frente deles, segurando a mão de Alicia, e devolveu o telefone a Gerard.

            “Ger, mamãe disse para irmos embora e...”

            Michael parou de falar. Um barulho veio de dentro da casa. Várias vozes num coro alto, e Gerard imediatamente soube que havia algo errado.

            Os três garotos e Ali correram para dentro da casa. A sala estava de repente muito cheia, e a visão que tiveram não foi, nem de longe, uma das melhores.

            Frank ainda estava no sofá, mas não por vontade própria. Ele se debatia. Dois rapazes imensos - os zagueiros daquela manhã - o seguravam pelos braços e ombros, enquanto um terceiro - Kevin - segurava a cabeça de Frank com força pelos cabelos. Empurrava sua virilha contra o rosto do pequeno, o jeans grosso machucando o rosto dele. Ferindo, humilhando, traumatizando Frankie na frente de todos.

            Um balde da mais completa ira lavou Gerard. “Hey!” ele gritou com a voz firme e muito alta, sobressaindo-se ao volume da música e cessando o coro de vozes. Os monstros soltaram Frank, que se encolheu, chorando. Os olhos de Gerard faiscaram na mais completa e odiosa fúria. Ele bateu a garrafa na parede, quebrando o corpo e transformando o gargalo pontiagudo numa arma. E estava escrito em sua testa que ele ia matar aqueles imbecis.

            Quando Gerard partiu para cima deles, os covardes saíram correndo pela porta da frente. Ele foi atrás. Escorregou ao pisar na entrada, a lama tornando os degraus perigosos, e nesse meio tempo os outros três entraram no carro. Frank e Bert apareceram atrás de Gerard gritando coisas incoerentes, mas ele estava cego e surdo de ódio.

            Os olhos de Frank fechados com força contra o jeans de marca de Kevin.

            Gerard atravessou o gramado correndo, alcançando o próprio carro quando a SUV dos outros três já batia em retirada.

            “Gee, por favor, não!” Frank berrou, correndo atrás dele com habilidade enquanto Bert tropeçava nos próprios pés e ficava pra trás.

            As mãozinhas de Frank enluvadas, punhos apertados, se debatendo, presos pelos zagueiros imensos.

            Gerard entrou no carro e colocou o cinto - Frank pulou no banco do passageiro.

            “Frankie, desce.”

            “Não, você não precisa fazer isso.”

            Fechou os olhos, respirou fundo. “Eles te machucaram.”

            “Eu sei. Eu não me importo.”

            Kevin investia contra o rostinho de Frankie, machucando seus lábios antes tão perfeitos enquanto na sala ecoava o coro de ‘chupa, chupa!’

            “Bem, eu me importo.”

            Gerard ligou o carro e pisou fundo no acelerador, escapando do alcance de Bert e sujando-o com a lama que os pneus espirraram.

            “Ger, deixa isso pra lá, não foi nada,” repetia Frank, a mãozinha esquerda na coxa de Gerard, que dirigia rápido, cortando os pingos de chuva e desviando de galhos caídos.

            “Você está sangrando, Frankie,” retrucou com os olhos cheios de lágrimas, como se sentisse a dor do menor.

            Frank levou os dedos aos lábios cortados, falhando em reprimir um som de dor ao tocá-los. “Não é nada, Gee, não vale à pena.”

            “Você vale à pena!” Virou o rosto molhado para ele por um breve momento antes de voltar a olhar a estrada. “Se eu não os fizer parar agora, eles vão te machucar toda vez que eu não estiver por perto.”

            “Então é só nós não nos separarmos!” Frank ficou de lado em seu banco. Segurou o rosto de Gerard, forçando-o a fitá-lo, lágrimas misturando-se com água da chuva que caía lá fora. “Eu só preciso ficar com você. Tudo o que eu quero é ficar com você.”

            E pressionou os lábios feridos aos de Gerard, que Frank viera a idolatrar - e era retribuído da mesma forma. O gosto do sangue invadiu a boca dos dois, num último ato desesperado de carinho antes que tudo parasse.

            Um estrondo horrível. Muito, muito alto, como o som de um mundo de vidro caindo, despedaçado, violando corpos, tirando vidas e partindo almas. Um barulho horrível que pareceu explodir a cabeça de Gerard. E depois, silêncio. Silêncio puro e absoluto, ensurdecedor em sua totalidade.

            Por algum tempo, nada existiu. A consciência foi dar um passeio, provendo um momento para que os vidros chegassem à inércia e toda a desordem se ordenasse. E então, a consciência voltou.

            Gerard não respirava. Seu peito parecia preso e ele lutou por alguns segundos para poder usar os pulmões. E algo contra seu rosto. Tecido? Algo macio, cheio, sufocando-o - ele levantou a mão direita, afastando o airbag do rosto, sentindo um pouco de ar envolvê-lo. E somente então Gerard abriu os olhos.

            Levantou as pálpebras lentamente, cenho franzido, o verde ainda destacando-se mesmo no escuro. A luminosidade dos faróis já não existia - os faróis não mais existiam. Toda a frente do carro foi esmagada - diabos, o carro todo foi espremido como um leque. A perna esquerda pressionada entre o banco e o painel. Um ferro retorcido fortemente pressionado contra seu estômago, prestes a furar a pele e fazer um grande estrago. A queimadura no pescoço, causada pelo cinto de segurança. Seu rosto pálido fora cortado pelos cacos de vidro que eram antes o pára-brisa, que se despedaçou quando Frank foi arremessado através dele.

            A parede de concreto da grande fábrica estava bem próxima de Gerard. Não se abalou quando o carro colidiu contra ela - amassou o metal como se fosse papel. E sobre o que um ia foi um capô, estava o que um dia foi Frank.

            Caído de lado, de frente para Gerard, braços retorcidos num ângulo impossível.

            Frankie subindo a colina na Saint Peterson em seu primeiro dia de aula, uniforme puído, olhos inocentes sob a franja sedosa.

            Rosto retalhado, um rombo na testa, cabelos empapados de sangue que saía de todo lugar.

            Frankie de pele perfeita sob o toque do dedo de Gerard, rindo infantilmente antes de franzir os lábios vermelhos e pedir um beijo - ainda tinha gosto de sundae de morango...

            A luva recortada estranhamente desapareceu, dando espaço a um osso que não deveria estar fora da mãozinha talentosa que antes deslizava sobre as teclas de marfim.

            Frankie doce, inocente, quente, entregue, dizendo a Gerard que o adorava completamente, colocando seus cabelos atrás da orelha.

            O rosto de Frankie muito próximo ao volante. Os olhos amendoados estavam semicerrados, as pupilas avelã paralisadas eternamente num brilho débil, sem vida. Fixos em Gerard, como se pedissem ajuda. Mas não pediam. Não pediriam, nunca mais, por mais nada. Nada.

            Os olhos de Gerard, no entanto, viram aquilo. E absorveram a visão. E ele foi repentinamente esmagado por um gigante bloco da mais pura e forte dor, em cada polegada de seu corpo, fazendo seus ossos queimarem e músculos retorcerem. Ele não queria olhar para frente, mas mesmo que pudesse se mover, não conseguiria. Permaneceu ali pelo que pareceu para sempre, seu queixo caído, pele ferida, olhos imóveis, corpo em brasas - sua cabeça foi subitamente dominada por dor tão intensa que Gerard vomitou. Não se moveu - apenas deixou a bile sair de seu corpo, e tudo doía, e ele finalmente foi forçado a deixar a cabeça cair para frente. Com a carne ferida e alma estraçalhada, o corpo dele cedeu à dor insuportável e a consciência o deixou novamente, largando-o num poço escuro e sem fundo, pelo qual ele caiu durante segundos que duraram vidas inteiras.

            E mãos. Mãos o puxando para fora do carro - algo estava quente perto de seus pés. Mãos - chuva. Gerard estava na grama... abriu os olhos. Bert. Bert segurando Frank nos braços, a camisa suja, vermelha, a chuva caindo forte neles. Jepha falando com Gerard - dor. Escuro, abra os olhos! Frank caído, sozinho, marionete sem vida. Bert segurando Gerard, Bert chorando muito, sangue nas mãos dele. Luzes vermelhas se aproximando, chuva no rosto, dor, Frank sem vida, Gerard inconsciente. 


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Notas finais do capítulo

CALMA NÃO ME ODEIEM PFVR BJKS



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