As Cem Melhores Historias Da Mitologia escrita por Allan


Capítulo 38
Vertuno e Pomona




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Pomona era a deusa que presidia a floração dos frutos, e seu maior prazer era fazer a

guarda e proteger as árvores frutíferas. Seu bosque, no entanto, vivia fechado à entrada de seus

incansáveis cortejadores — na sua maioria faunos e sátiros que, tomados pela mais ardente

paixão, queriam por todo modo possuí-la. De fato, alimentada somente pelos mais tenros frutos,

a deusa dos pomares tinha um corpo invejável e uma pele perfeita. Julgando-se em segurança,

andava só por entre os troncos das suas adoradas árvores, o que fazia excitar ainda mais o desejo

dos seus pretendentes.

Dentre todos, o mais apaixonado, sem dúvida alguma, era Vertuno, o deus cujas

atribuições mais se assemelhavam às da bela deusa: Vertuno era o deus protetor dos frutos e dos

legumes.

— Nós temos tudo em comum — dizia ele a si mesmo, sem conseguir compreender por

que a deusa fugia dele.

Mas Pomona não queria, definitivamente, saber de amores. E como Vertuno parecia ter

mais possibilidade de vencer a sua resistência, era justamente dele que ela fugia com mais ardor.

Vertuno, porém, era mestre em disfarces e, por diversas vezes, apresentou-se diante da deusa,

mas esta estava sempre ocupada em podar ou fazer algum enxerto nas árvores. Certa vez

apareceu como um ceifador, pôs no chão a foice e sentou-se aos pés de Pomona, que

permaneceu, absorta, totalmente envolvida com sua tesoura a cortar os galhos e a retirar os

fungos acumulados, sem lhe dar a mínima atenção.

— Suas árvores estão cada vez mais belas — disse-lhe o deus, sem arrancar dela nenhuma

expressão. Com os braços erguidos, ela prosseguia em sua tarefa.

Noutra ocasião, Vertuno apareceu como um pescador, num disfarce infeliz. A deusa não

queria nada com pescadores e detestava esta atividade, chegando mesmo a expulsá-lo de sua

presença, com um ar enfastiado. Outra vez surgiu munido de uma escada, com um longo bigode

de colhedor de maçãs. Aproximando-se da deusa, que tentava inutilmente alcançar um dos frutos

para colocar na cesta, ele lhe disse:

— Deixe que eu as alcanço para você!

Colocando a escada encostada ao tronco, Vertuno começou a escalar os degraus, quando

sentiu a mão cálida da deusa tomar-lhe o pulso.

— Deixe que eu mesma o faço — disse ela, subindo degrau por degrau até alcançar os

frutos mais distantes.

Depois de arrancar dos galhos as maçãs, ia jogando-as uma a uma a Vertuno, que, no

chão, as ia recebendo. A maioria das frutas, porém, o acertava em cheio na cabeça, arrancandolhe

breves gritos de dor.

— O que há com você, afinal? Não está enxergando direito? — reclamava a deusa,

impaciente. — Veja, está estragando todos os meus frutos!

Se Vertuno, no entanto, tinha alguma coisa em bom estado naquele momento, era

justamente a visão: cobiçava ardentemente as perfeitas formas de Pomona.

— Tome, leve de volta a sua escada — disse a deusa, ao perceber finalmente as intenções

de Vertuno.

Quanto mais Vertuno persistia em seus estratagemas, mais a deusa permanecia irredutível,

terminando sempre por expulsá-lo de seu bosque sagrado, com maior ou menor delicadeza.

As coisas estavam nesse pé quando, um dia, uma velha encarquilhada apareceu diante de

Pomona. Estava extremamente quente, e Pomona estava mais i vontade. Um suor delicado como

o orvalho brotava de sua pele clara; na poma dos pés, a deusa tentava alcançar um galho mais

alto, deixando à mostra as axilas que uma minúscula penugem dourada protegia. O que nas

mulheres comuns poderia parecer um desleixo, na encantadora deusa era, porém, um atributo a

mais para a sua beleza.

A velha — que outro não era senão o próprio Vertuno — aproximou-se lentamente,

mancando em seu passo senil. Quando chegou aos pés da deusa. sentou-se, enquanto a observava

entregar-se à sua tarefa. Após algum tempo, Pomona finalmente, acordou para a presença da

intrusa.

— Bom-dia, senhora — disse a deusa, estendendo a mão, de modo afável.

— Bom-dia, bela jovem! — respondeu a velha, dando um beijo na deusa, que recuou um

pouco, de modo instintivo, diante daquele gesto inesperado e surpreendente.

Pomona estava podando uma vinha, e Vertuno aproveitou a ocasião para fazer uma

comparação que em tudo servia aos seus objetivos:

— Está vendo como os galhos da vinha se enroscam no tronco?

— Certamente — respondeu a deusa.

— Por que não lhe segue o exemplo?

— Como assim?

— Bem, a vinha não cresce jamais se não puder enroscar-se a um tronco forte e viril.

Estive observando você desde muito tempo e percebi que foge de todos os seres que buscam

unir-se a você.

— Ora, são todos uns boçais! — exclamou Pomona, lançando para trás os cabelos e

retomando sua tarefa.

— Talvez nem todos o sejam — disse Vertuno, acariciando as costas da deusa com sua

mão enrugada, o que renovou o espanto da moça.

— Senhora, que modos são esses? — disse Pomona, com um sorriso, tentando mostrar

de modo gentil e descontraído a sua insatisfação com aquelas pequenas e desconfortáveis

intimidades.

— Existe alguém que está muito acima de todos os seus outros pretendentes — disse

Vertuno, sob o disfarce da velha, ignorando a advertência da deusa. -Você sabe quem é, e

somente ele merece o seu amor.

— Já sei, já sei, a senhora refere-se ao importuno Vertuno — disse Pomona, com ar de

enfado.

— Sim, é ele mesmo. Ninguém mais poderá lhe fazer feliz, pois ninguém a ama mais do

que ele! — insistiu a velha, abraçando o corpo que tinha à sua frente, num transporte de desejo

que encheu de assombro a deusa dos pomares.

— Agora chega! — esbravejou Pomona, afastando a velha descontrolada. De repente,

porém, ela deu-se conta do que se passava:

— Então é você, novamente!

A velha lançou fora o véu que cobria a sua cabeça e disse:

— Sim, sou eu, Pomona querida, e venho mais uma vez tentar obter o seu amor!

— Por que não experimenta aparecer sob a sua própria forma, ao menos uma vez?

Às vezes as coisas óbvias não ocorrem, mesmo aos deuses.

Vertuno, sabendo que a deusa não tinha olhos para ninguém, procurara nas mais diversas

formas convencer a sua amada, sem dar-se conta de que talvez conseguisse seu objetivo se

aparecesse diante dela como realmente era. Desfazendo-se de seu disfarce, Vertuno surgiu diante

da moça, em sua forma esplendorosa. Pomona, acostumada ao assédio dos faunos e do horrível

deus Pã, ficou deslumbrada com sua beleza. Ele aproximou-se, então, da dócil Pamona e a cobriu

de beijos, que foram generosamente retribuídos.


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