Depois de a enfermeira me dar alta, recolhi minhas coisas, me troquei e fui ao encontro dos meus amigos, que estavam na sala de espera.

- Então, vamos? – perguntei, sorridente. Os três assentiram, e enquanto Ingrid e Wook iam caminhando na frente, Lih me puxou pelo pulso, me fazendo esperar um pouco, com um sorrisinho malicioso no rosto. Sabia que aí tinha coisa, por que os dois ali na frente até caminharam mais depressa, deixando-nos um pouco mais pra trás. Keh! Como se eu não tivesse os visto dando risadinhas! Esses malditos...

- Kid-kun irá adorar esse moletom – Lih comentou, me fazendo corar – Por sinal, ele ligou perguntando sobre você algumas vezes...

Meu rosto estava tão vermelho que eu o sentia queimar. Ela realmente sabia como me deixar assim.

- Sério – ela riu, mostrando-me um pedaço de papel com uns números escritos. Ao ver, era uma conta do telefone do hospital. Reconheci o número imediatamente como o da Shibusen. Meu rosto estava tão vermelho que eu não conseguia nem falar direito.

-... Mentira – foi a única coisa que consegui dizer, depois de respirar fundo – P-Podia ser qualquer um da Shibusen!

- Mas foi o Kid – ela disse, guardando a nota e inflando as bochechas, irritada – Ah, e outra coisa. Talvez eu tenha mencionado como você era uma graça dormindo e que você gemeu o nome dele várias vezes nesses três dias... Ele ficou todo sem jeito – Lih riu alto.

- Você quem deveria ficar sem jeito... E sem os dentes também – murmurei.

Depois de alguns minutos, chegamos ao aeroporto. Por sorte, conseguimos quatro cadeiras juntas agora. Da esquerda para a direita estavam sentados: Ingrid, Wook, eu e Lih. Eu queria saber o final daquele sonho de qualquer jeito, então conectei os fones de ouvido que a companhia dava de graça na entrada do braço da poltrona, colocando na música mais calma que eu encontrei nas estações que o avião oferecia, reclinando ao máximo minha poltrona. Somando ao meu cansaço de ter saído de um coma (sim, eu fico três dias dormindo e acordo cansada), dormi rapidinho.

...

O espelho de antes agora estava quebrado, mas eu ainda estava beijando o Kid. Sim, eu o estava beijando-o. E eu tinha a leve impressão que aquele beijo havia sido demorado. Ah, e como havia. Mas ainda não parávamos o beijo. Eu estava com ambas as mãos nas costas dele, e ele com as mãos na minha cintura. Não sabia o porquê, mas eu tinha a quase certeza de que o meu cabelo e as minhas roupas continuavam aquelas mesmas do outro sonho, somando com três listras horizontais atravessando a parte direita da minha cabeça.

Por um momento, eu me senti puxada, como se me arrastassem pela gola da camisa para fora daquele cenário, o que me fez fechar os olhos. Por isso, me agarrei ao moreno que me beijava com todas as minhas forças, para não soltá-lo de jeito nenhum. Pela minha surpresa, ele fez o mesmo.

Acabamos caindo no chão. A dor do impacto do o granito frio com as minhas costas me fez soltar um gemido de dor. E eu o ouvi rindo pervertidamente. Ao abrir os olhos novamente, percebi que ele estava em cima de mim, segurando meus pulsos com ambas as mãos, e os joelhos do lado do meu quadril. Eu congelei ao perceber onde estávamos: no quarto dele. Como eu sabia? Bem, aquilo me parecia familiar. E também a simetria do quarto, devia ser óbvio só por aí. E umas fotos dele espalhadas por aqui e ali.

- O que foi? – disse Kid, malicioso – Conseguiu se recuperar da sanidade, foi?

- E-Eu... Eu já sonhei com isso antes... – eu disse, apesar de não saber bem o porquê, os olhos dourados dele fixados nos meus, o que me fazia corar mais ainda. Ele riu novamente, beijando o meu pescoço se apoiando com o antebraço direito no chão. Com a mão esquerda, subia levemente a barra da minha blusa. Mesmo mudando o cenário do sonho, as roupas continuavam diferentes.

- Já sonhou comigo antes? – ele perguntou, começando a lamber o meu pescoço, arrancando alguns suspiros de mim – Ora... Como é bom saber disso...

-...! – o meu rosto pegou fogo naquele momento. Dava pra ver até uma fumaça branca saindo das minhas orelhas, de tanta vergonha.

-... Os seus olhos... – ele disse, encostando as nossas testas e logo depois os nossos narizes – São tão lindo vermelhos...

E logo depois, selou nossos lábios. O momento seria lindo se ele ainda não continuasse a levantar a minha blusa. Dos meus lábios, voltou para o meu pescoço, e eu levei minhas mãos aos cabelos listrados dele. Ele era tão... Tão...

- Dani.

Acordei com um salto, sufocando um grito. Ao tocar umas das minhas bochechas, percebi que ela estava queimando. Olhei a TV à minha frente, percebendo que meus olhos estavam verdes novamente. Ufa.

- Por que estava suspirando...? – me perguntou Lih, com um olhar malicioso. Olhei pros lados. Nenhum passageiro me olhava esquisito. Apesar dos meus suspiros terem sido BEM altos no meu sonho, parece que eles não se repetiam na vida real com a mesma altura. Mas as duas pessoas sentadas à minha esquerda e a outra à minha direita pareciam ter ouvido tudo.

- Com o que estava sonhando, hein Dani? – perguntou-me Wook, com o mesmo tom de voz que Lih, enquanto eu voltava a colocar minha cadeira no lugar – Estava suspirando assim ó: “Ah... A-Aaaah... Ah!” – imitou, bem baixinho.

- M-Mentira...! – eu disse, olhando pros lados novamente, ainda com o rosto muito vermelho – Pare com isso!

- É verdade, Dani – falou Ingrid, com aquele tom inocente de sempre – Até eu ouvi.

- Calma. Ninguém mais pareceu se interessar ou ficar incomodado. Só nós ouvimos – comentou Lih, tentando me acalmar – Agora, me diga com o que você estava sonhando, sua pervertida! Na certa você estava fazendo cooooooooisas com certo moreno com listras na cabeça...

- E deviam ser coisas muito quentes, não é não? – comentou Wook, mexendo na gola da própria camisa, afastando-a do corpo algumas vezes, bem rápido, com um sorrisinho pervertido.

- P-Parem de pensar essas coisas! – eu disse, cobrindo o rosto com ambas as minhas mãos.

- Dani, eles estão brincando – falou Ingrid. Lih e Wook olharam para ela como se dissessem com o olhar: “Não estamos de brincadeira!”.

- Mas ainda queremos saber o que aconteceu – disse Lih, cutucando minha bochecha direita – Vamos, nos conte!

Suspirei. Pela pressão, acabei contando tudo (tirando alguns detalhes, tipo o que acontecera no quarto) pra eles. Os três olharam confusos pra mim.

- Insanidade? Olhos vermelhos? Listras? Roupas? – perguntou Lih – O que isso tem a ver com os suspiros?! Me conte, Daniella!

E depois me deu um tapa fraco na bochecha. Ô menina insistente! Wook olhava pra mim como se quisesse fazer a mesma coisa. Mas em vez disso, ele começou a me fazer cócegas.

- HA... HAHA... HAHAHAHAHAHAHA! – eu comecei a rir, colocando o travesseiro que a companhia nos dava no rosto, para abafar o riso – P-Pare com isso, W-Wook! HAHAHAHAHA!

- Não vou parar até você me contar, sua imbecil! – ele disse, continuando a fazer as cócegas. Eu só consegui aguentar por mais alguns minutos, até por fim dizer que eu ia contar. E eu tive que dizer, né. Por que agora já nos olhavam esquisito.

No final de tudo, Lih colocou a mão direita na frente da boca, tentando (eu disse, tentando) esconder um sorrisinho, enquanto Wook já ia rindo. Ingrid olhava pra mim com uma cara decepção.

- Não acredito o quanto você é pervertida, garota... – ela murmurou.

- Eu sabia! SA-BIA! – disse Wook – Você gosta dele! Gosta demais! Até tá sonhando hentai com o garoto!

- Shhhhhh! – falei, colocando um dedo indicador da mão esquerda entre os lábios, o rosto voltando a praticamente pegar fogo. Estava mais vermelho que os meus olhos no sonho, se bobear.

- Eu vou contar isso pro Kid quando eu vê-lo de novo! – disse Lih, pra si mesma.

- Ah, não você não vai! – eu reclamei, escondendo meu rosto no travesseiro.

- Me obrigue! – ela retrucou, rindo.

Depois de mais alguns minutos, pousamos em Nevada. E depois de mais ou menos uma hora e meia, voltamos à Shibusen. Nisso, quando eu olhei para o relógio do meu pulso esquerdo (que era sempre o correto), eram três da tarde.

- Três horas... – murmurei. Para o meu azar, Lih escutou. E para o meu azar pela segunda vez, ela abriu um sorriso de orelha a orelha.

- Dá tempo de voltar à Shibusen! Vamos, vamos! – ela disse, me pegando pelo pulso e chamando pelo primeiro táxi que viu. Claro que Wook estava ajudando ela, me empurrando pelas costas, enquanto Ingrid corria ao nosso lado.

Quando chegamos à Death City, eram três e quinze. E à Shibusen, eram três e meia. Mas que merda...

- Vamos! Subam, subam, subam! – Wook disse, me empurrando novamente, forçando-me a subir os degraus. Eu subia tão devagar que Wook acabou me carregando no colo para irmos mais rápido. Eu fiquei surpresa com a força dele, mas ao mesmo tempo eu me debatia para ele me largar no chão. Quando chegamos em frente à sala foi quando ele me soltou.

- Obrigada, filho da p--!

Engoli o palavrão, por que foi nessa hora que o Dr. Stein abriu a porta, encarando-nos com aquele seu olhar aterrorizante, seu jaleco cheio de costuras e mexendo no parafuso em sua cabeça. É, ele com certeza me dava medo.

- Então... Vocês chegaram... – ele disse, dando passagem para entrarmos na sala de aula – Finalmente. Bem, eu estava terminando a aula... Depois a professora Marie irá entrar. Não terá problema algum vocês entrarem agora. Vamos, vocês sabem quais são seus lugares.

Nós quatro voltamos em silêncio aos nossos lugares, sem dizer uma palavra ou trocarmos algum olhar. Sentei-me ao lado esquerdo de Kid, enquanto Lih ao meu lado esquerdo, do lado direito de Soul. Quando fui olhar pro moreno ao meu lado, foi na mesma hora em que ele olhou pra mim, forçando-me a desviar meu olhar, ficando vermelha novamente. Olhei pra Lih novamente, e ela estava trocando bilhetinhos discretamente com Soul, que lia os bilhetes, olhava discretamente para mim, depois para o Kid, e logo ria baixinho.

Ah, não... Minha reputação está com certeza indo por água a baixo...