Yuki forçou o corpo para frente a fim de se sentar logo que viu a porta de seu quarto no hospital de Konoha abrindo, mais uma vez. Uma mednin enfermeira havia vindo avisá-la de que tinha visitas, poucos minutos antes.

— Boa noite, Yuki-chan — a primeira voz que ouviu pertencia a Tsunade, a godaime hokage, que entrou no quarto seguida de Kurenai e Genma.

Os três sorriam para ela, o que a assustava de alguma maneira. As pessoas geralmente sorriem com compaixão antes de te dizerem que você tem uma doença terminal e mais 15 dias de vida.

— Como está se sentindo? — a loira quis saber.

— Bem, eu acho. Não vou morrer, né?

Genma achou graça, enquanto Kurenai e Tsunade apenas se entreolharam apreensivas. O que aquilo significava? Esses três estavam tirando Yuki do sério até que... uma figura alta, com o cabelo cinza arrepiado como se tivesse acabado de levar um choque e uma máscara preta que cobria boa parte do rosto, entrou no local. E Yuki, agora, só conseguia pensar em 3 palavras: não posso morrer. Não antes de descobrir o que há debaixo daquela máscara.

— Já contaram sobre a mãe dela? — perguntou Hatake Kakashi, fazendo com que a hokage revirasse os olhos, frustrada. Todo o cuidado que ela teve para tocar no assunto...

— Não, Kakashi-san — quem respondeu foi Kurenai.

— Antes que mais alguém nos interrompa — Tsunade começou lançando um olhar feio para o grisalho —, Yuki-chan, eu vi aqui falar sobre sua família. Felizmente, você está fora de risco, ao que tudo indica.

— Minha família? — a menina perguntou, tentando ignorar o brilho estonteante nos fios de cabelo de Kakashi.

— Sim. — respondeu Tsunade.

Flashback

Era 8 horas da manhã e Yuki estava de olhos fechados, sentada à mesa de refeições, apreciando ao máximo o cheiro delicioso de seu café da manhã, a refeição mais importante do dia. A menina havia acordado cedo e sua animação era contagiante. Fazia muito tempo que ela não tinha um dia inteiro de folga. Se empolgava com o pensamento de poderia passar horas de pernas para o ar, contando carneirinhos, ou quem sabe, até conseguiria colocar em dia seu diário sobre a rotina de seu jounin favorito, Hatake Kakashi. Tanto faz. Tudo o que importava era que, neste dia, ela faria o que bem entendesse e no tempo que quisesse. Como, por exemplo, passar horas sentindo o cheirinho maravilhosamente incrível que vinha de seu mingau, preparado com tanto carinho pela própria. E nada poderia atrapalhar aquele momento!

­— YUKI!!!!!!!

Yuki piscou os olhos algumas vezes, analisando a possibilidade de aquilo ser verdade ou de o mundo estar apenas tirando um sarro dela. Sabe, acontecia com frequência.

— YUUUUUUKIIIIII!!!!

Ouviu o chamado mais uma vez, na voz estridente de sua baa-chan, e decidiu que, de fato, era real.

— O que é, baa-chan? — respondeu, franzindo a testa. Não perdoaria ninguém por interromper seu café da manhã calmo e tranquilo. Ninguém. Nem sua baa-chan! Será que ela não entendia aquele momento sagrado???

— Eu preciso comprar algumas coisas na cidade com os seus tios. Você fará companhia para sua prima Yakumo!

— O QUE????!!!!!

— Não seja malcriada, Yuki-chan. Alguém tem que ficar com Yakumo. Ela ainda é pequena e não sabe se virar direito...

— MAS ELA É ESTRANHA!!!! EU NÃO QUERO FAZER COMPANHIA PRA AQUELA DOIDA. DEIXA ELA APRENDER A SE VIRAR E...

Yuki recebeu um olhar repreensivo de sua baa-chan. Apesar de pequena e adorável, na grande maioria das vezes, aquela velhinha sabia muito bem como ser malvada quando queria. Yuki se lembrava claramente do dia em que ela deu uma surra em um ladrão com a sua bolsinha de moedas e seu guarda-chuva. Aquela cena ainda lhe dava calafrios. Rapidamente, abaixou o tom de voz.

— Mas baa-chan, hoje é meu dia de folga e eu achei que ia poder...

— Ora, menina, é só por algum tempinho. Pode chamar as suas amigas para ficarem com você, também. Tenho certeza que elas não se importariam em te ajudar. Seja boa com a sua baa-chan, Yuki.

Nem a companhia do Kakashi aliviaria a chatice de sua prima. Disso, Yuki tinha certeza. E Sayuri e Kami haviam saído em uma missão, detalhe que ela estava tentando esquecer. Aquelas duas traidoras... Mas que alternativa ela tinha? Teria que ficar com a doida da Yakumo até a hora que a baa-chan e seus tios voltassem. Só esperava que a menina não se metesse em nenhuma confusão, desta vez...

x.x

— Ohayo, Hokage-sama! — Genma abriu a grande porta da sala principal do prédio e cumprimentou a godaime, que tentou disfarçar rapidamente, sem muito sucesso, que estava dormindo em sua própria mesa. Ele reprimiu uma risada.

— Ah, por favor. Me chame de Tsunade, querido. — disse ela, galanteadora. Nunca tinha reparado antes em quão atraentes eram os olhos de Genma a essa hora da manhã. E seu peitoral definido marcado na blusa apertada do uniforme...

O jounin arregalou os olhos. O que estava acontecendo? A sannin estava o deixando desconfortável com tantos olhares indiscreto.

— Hokage-sama? Você está bem? — perguntou, ainda que achasse graça na situação.

— Ah! — a loira finalmente despertou e percebeu que não estava mais em seus sonhos. Reparou que não vestia mais um biquíni e que não havia sido sequestrada por um macaco gigante. Nem estava presa em uma árvore esperando que alguém viesse resgatá-la. Que tipo de sonho fora aquele, de qualquer maneira? Ela sacudiu a cabeça para um lado e para o outro, e limpou a garganta. — Genma-san! Que bom que chegou! Tenho um assunto muito importante para tratar e preciso de sua ajuda. Por favor, busque Kurenai para mim.

x.x

Yuki virou mais uma página do livro romântico que pegara escondido da estante de sua avó, ansiosa pelo primeiro beijo de Gendai e Kora. Eles finalmente haviam percebido que se amavam, depois da tentativa frustrada da vilã Asami em enviar Gendai para o Alasca. Já havia se passado muitas horas desde que sua baa-chan a deixara sozinha com sua prima, Yakumo. Apesar de entediante, o trabalho estava fácil por enquanto. As duas estavam em cima de uma montanha, ao ar livre, sozinhas, e a mais nova estava grudada em sua tela de pintura e raramente abria a boca. E quando o fazia, era para falar consigo mesmo - mania que dava calafrios nas espinhas de Yuki, mas ela tentava ao máximo se focar no romance do livro e esquecer a estranhisse assustadora da prima.

Depois de mais algumas horas, Asami já estava colocando em prática seu segundo plano para separar Gendai e Kora e Yuki não suportava mais o ronco de seu estômago.

— Ei, Yakumo! Que tal irmos comer um lamen? — ela tentou iniciar mais um diálogo, sem sucesso. Yakumo continuava murmurando sozinha, concentrada em sua tela.

Yuki levantou do chão devagar, espreguiçou-se e entrou na frente do campo de visão de Yakumo, logo atrás da tela que ela pintava.

— Oooooi!!! Estou falando com você! — Yuki insistiu, balançando os braços à frente da menina. Nada. Yakumo continuava ignorando sua presença e ainda se contorcia para enxergar a vista atrás de Yuki, que bufou, claramente nervosa.

Ela podia simplesmente largá-la ali, sozinha, já que Yakumo não queria colaborar. Mas se o fizesse, sua avó provavelmente ficaria furiosa. O que fazer, então? Foi aí que a sua salvação apareceu. Naruto vinha andando calmamente pelo local, olhando para o céu, totalmente desocupado.

— Naruto! — Yuki gritou e saiu correndo em direção ao colega — Oi! Tudo bem? Você pode ficar aqui enquanto eu vou ali e já volto? Essa é a minha prima Yakumo. Yakumo, esse é meu amigo Naruto. — ela despejou todas as informações apressada, agradecendo Naruto antes que ele pudesse responder e saindo em disparada.

Ele, sem entender muito bem, deu de ombros e aceitou o pedido da Kurama. Yakumo? Não lembrava de já ter escutado aquele nome antes...

x.x

— Kurenai, Genma, estava verificando alguns dos relatórios de Hiruzen e não pude deixar passar em branco um deles. Vocês dois devem estar a par do mistério que envolve o clã Kurama, certo?

Os dois jounins acenaram positivamente para a godaime hokage. Acompanhavam o caso desde o início. Kurenai já havia treinado Kurama Yakumo a pedido do sandaime, enquanto Genma tinha sido o líder do grupo 10, que contava com Kurama Yuki.

— Ótimo. Acontece que as duas meninas estão crescendo e ficando cada vez mais perto de manifestar o segredo do clã. Vocês devem ter as observado de perto. Podem me atualizar sobre a situação e os riscos de cada uma?

— Não acredito que a Yuki seja a herdeira, apesar de sua proximidade com a última. — Genma foi o primeiro a falar — Ela é, sim, muito poderosa, mas seus últimos casos foram apenas por descontrole. Não consigo sentir a presença do monstro dentro dela.

Kurenai acenou, concordando com o jounin.

— A Yakumo me pareceu bem suspeita desde sempre, como informei ao sandaime hokage. — completou ela.

— Certo. Mas é importante que vocês dois continuem...

Tsunade não conseguiu terminar sua fala. Shizune abriu a porta sem qualquer cuidado e um membro mascarado da ANBU entrou apressado, na sala.

— Desculpe, godaime, é urgente. Temos uma ocorrência na área do clã Kurama. — disse o ANBU.

Fim do flashback

— Como você acompanhou de perto tudo o que aconteceu hoje com a sua prima Yakumo, acreditamos que te devemos uma explicação. — começou Tsunade, fazendo com que Yuki se perguntasse que relação tinha com a prima doida e, agora, falecida — Yakumo herdou um maldição que existe há muito tempo no clã Kurama. A cada geração, uma criança de seu clã nasce com um monstro, conhecido como Ido, escondido dentro de si. Ele se manifesta aos poucos até tomar o total controle da pessoa. Em muitos casos, o herdeiro conseguiu conviver por muito tempo até que perdeu o controle para o monstro, mas infelizmente não foi como aconteceu com sua prima.

Aquilo até fazia sentido, apesar de se parecer mais com uma história de terror. Yuki sempre soube que Yakumo não era normal. Hoje, depois de todo o surto que aconteceu e de a menina ter quase incendiado a própria casa e machucado todos os seus amigos, ela teve ainda mais certeza. Yuki não ficou sabendo de tudo o que acontecera, já que acabou se distraindo durante a tarde. Quando foi procurar por Yakumo e Naruto, eles não estavam mais no mesmo lugar. A menina foi correndo para a casa da prima e acabou entrando em um genjutsu esquisito no meio do caminho. Em algum momento enquanto tentava entender o que acontecia e procurar por Yakumo, ela ficou cercada por fogo e desmaiou. Mais tarde, no hospital, ficou sabendo que a prima havia sido a responsável por toda a confusão e que acabou se ferindo gravemente e não resistiu. Mesmo assim, não queria que esse tivesse sido o fim de Yakumo. Se sentia triste por isso.

— Isso quer dizer que ela não teve opção? Que não foi ela quem causou tudo aquilo? — Yuki perguntou, se sentindo um pouco mal por nunca ter se esforçado para ser amiga da prima.

— Sim, com certeza foi Ido. — assentiu a hokage.

— Mas, espera. Eu não tenho isso também, tenho?

— Não. — Tsunade sorriu, mas logo voltou a ficar séria — Mas isso não significa que está completamente fora de perigo. Sua avó nunca te contou para te proteger, mas você está mais próxima do herdeiro da geração passada do que imagina. Sua mãe foi uma jounin incrível, até que infelizmente o monstro tomou conta de seu corpo e, para salvar você, Yakumo e todo o clã, seu pai sacrificou a própria vida.

— Kaa-san? — os olho de Yuki encheram de lágrimas conforme ela lembrava de alguns pequenos momentos que teve com a mãe na infância. Sua avó contou que seus pais haviam morrido em uma missão, mas nunca lhe deu muitos detalhes. Agora tudo parecia fazer sentido.

— O que você precisa saber, é que nada do que aconteceu hoje foi sua culpa. O monstro se aproveitou da ausência de sua avó e de seus tios, você não tinha como fazer nada.

— Yakumo estava ficando mais frágil a cada ano. Logo, aconteceria mesmo com eles por perto. — completou Kurenai, tentando confortá-la um pouco mais. Só podia imaginar como a menina se sentia, mas se a culpa era de alguém, deveria ser dela por ter desistido de treinar Yakumo.

— Além disso, suas habilidades podem ter alguma influência de Ido, já que uma herdeira nunca deu a luz a uma criança antes. — Tsunade assumiu a conversa mais uma vez — Sua mãe foi a primeira a ter conseguido. Kurenai irá te treinar por mais alguns meses e isso deve te ajudar a controlar melhor seu chakra, para que acidentes como os que aconteceram durante o exame não se repitam. Tudo bem?

Yuki apenas assentiu, ainda em choque com todas as informações que tinham acabado de revelar. Levou alguns minutos para organizar seus pensamentos, enquanto Genma, Tsunade, Kurenai e Kakashi a observavam.

— Hai! Vou me esforçar nos treinos. Quero orgulhar os meus pais e agradecer por terem me salvado. — ela disse finalmente, cheia de confiança e recuperando, aos poucos, sua energia.

Genma sorriu, orgulhoso. Ás vezes tinha vontade de reassumir o time 11 e voltar a treinar Yuki, Kami e Sayuri, mas sabia que ainda não estava pronto. Enquanto isso, ele continuaria vigiando as três de perto.

— Ótimo saber que podemos contar com você, Yuki-chan. — Tsunade sorriu — Vou deixar que descanse agora. Sua avó virá amanhã cedo te buscar e você tem mais duas visitas por hoje.

Yuki olhou para a porta entreaberta, que Genma segurava gentilmente para que a hokage e os outros jounins saíssem. Dois pares de olhos curiosos e preocupados brilhavam do corredor. A menina havia sentido a falta das melhores amigas durante o dia perturbado e também não via a hora de poder ouvir tudo o que elas tinham para contar sobre a missão.

— Fique bem, Yuki-chan — disse Kakashi, um pouco antes da porta, fazendo com que o coração da Kurama fervesse e borboletas aparecessem em seu estômago.

Genma riu baixo, reparando na feição da menina e lembrando do fascínio que ela tinha por Kakashi desde o primeiro dia em que se reuniram como time 11.

— Ei, Kakashi, por que não descasca aquela maça para Yuki antes de ir? — sugeriu Genma, com um sorriso malicioso no rosto, fazendo com que o colega voltasse.

— Er, claro. — o jounin respondeu meio sem graça, com o rosto um pouco corado. Apesar de não ter entendido o pedido de Genma, não queria parecer rude na frente da menina.

— Genma-sensei! — Kami foi a primeira a entrar logo que Kurenai e Tsunade deixaram o quarto, e foi logo abraçando a cintura do jounin.

— Oi, Kami-chan. — Genma riu divertido com a atitude da pequena e bagunçou sua franja de leve. Seus olhos se encontraram com o de Sayuri, sempre quieta e misteriosa, que vinha logo atrás da morena.

— Hai, sensei. — ela o cumprimentou sem muito caso, indo se sentar perto de Yuki, que ainda observava Kakashi com fascinação — Hai, cabeça de bagre. — Sayuri brincou, dando um peteleco de leve na testa da amiga, tentando chamar sua atenção.

— Hai... — nada. Nada. Nada no mundo podia atrapalhar aquele momento, aquela visão. Yuki precisava ver cada segundo daquela cena em que Kakashi estava descascando e cortando sua maça. MA-RA-VI-LHO-SO.

Sayuri jogou o corpo para trás na cadeira, gargalhando. Era raro ver Yuki tão quieta. E Kakashi já estava ficando incomodado com os olhares da Kurama. O jounin estava tão vermelho que nem a mascara era suficiente para disfarçar.

— Vamos, Kakashi, deixa as meninas conversarem. — Genma achou melhor interromper e arrastou o colega para fora do quarto, antes que Sayuri acabasse entregando os sentimentos de Yuki na frente deles e o impedisse de se divertir mais com aquele segredo.

Sayuri esperou que eles fechassem a porta para balançar a cabeça da amiga, ainda em transe.

— Okay, me deem 10 segundos para digerir o fato de que o Kakashi-sensei acaba de cortar e descascar maças para mim e depois temos muito o que falar.

Continua...