Shindu Sindorei - as Crianças do Sangue escrita por BRMorgan


Capítulo 8
Capítulo 8




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Ruínas do Palácio de Lordaeron.

 - Acorde, dorminhoca... – cutucou o dedo esquelético de Derris em seu ombro protegido pelo manto pesado. – Vamos... Hoje vai ser sua iniciação...

 - Iniciação do quê? – perguntou ela se levantando dolorida, o sono fora perturbado por uma mariposa teimosa em sua lamparina. Drenou a mariposa e extraiu um pouco do muco ventoso para remendar os rasgos em suas roupas velhas.

 - Você acha que é uma feiticeira boa não? – e com um sorrisinho sarcástico, esticou seu corpo novo. Era uma carcaça mais conservada com tom amarelado, de porte físico não tão decrépito. Em vida, talvez, o seu mestre Derris fora um feiticeiro com boa altura e massa corpórea. – Só vai ser mesmo quando começar a estudar os seus poderes direito...

 - Preciso comer... – resmungou ela revirando a sacola e encaixando a cota de escamas dentro da manga do manto pesado. Sentiu o vigor correr pelos seus braços e depois pelo corpo. Ainda sonolenta, ajeitou os cabelos caídos no rosto. O mestre estendeu algo como um osso fino e lixado. Ela entendeu o presente e prendeu os cabelos firmemente atrás da nuca.

 - Vou te levar a um lugar prestável aqui... Você está ficando uma caveira ambulante desse jeito... – os dois caminharam devagar da Quadra dos Magos para a Quadra dos Mercadores, indo em direção ao elevador. A clériga Imladris se juntou a eles dentro do cubículo que subiu aos solavancos para a parte externa da cidade. As duas trocaram olhares de gentileza como se dissessem “bom dia” uma para a outra, Sorena percebeu que Imladris carregava um livro de capa preta em suas mãos e ruminava uma canção desconhecida sem mover os lábios. A elfa do sangue mais velha olhou para seu mesttre alil na frente perto da porta e percebeu que ele também carregava um livro (Mas de cor diferente) nas mãos cadavéricas. Sem poder se conter, ela despejou.

 - Voces tão pra aprontar alguma coisa comigo né? – no sotaque carregado de sua terra de criação.

 - Aprontar? Quê isso? – perguntou Imladris em dúvida pela palavra que jamais ouvira. Derris balançou a mão negando.

 - Ela quis dizer que vamos chacoalhar o esqueleto dela... – a clériga entendeu prontamente, mas Sorena não. Na verdade ela se encolheu em si mesma ao pensar que as palavras haviam sido literais. Não queria seu esqueleto exposto ou sacudido por ninguém!

 - Escuta, eu não quero ser...

 - Tudo bem Sorena... Vamos treinar hoje... – explicou a clériga com os ombros balançando em euforia. – Vamos a Deathknell fazer algumas missões bobas, mas extremamente importantes... – listando com os dedos da mão esquerda. – Depois vamos fazer poção com o Mestre Maximilian lá em tarren Mills e oh oh sim! Vamos pegar um morcego voador para isso, você tem problemas com alturas? – Sorena arregalou os olhos em terror. Morcego voador e altura. Do que eles estavam falando?

 - Cara clériga, não deixe a criança apreensiva... – alertou Derris saindo quando o elevador chegou ao corredor transversal a Sala da Tumba de Terenas, o antigo e último Rei de Lordaeron. Já Imladris agarrou o braço de Sorena com vontade e a arrastou pelo caminho em passos apressados e quase dançados.

 - Vai ser tão legal! Você vai gostar novata!

 - Você já fez isso?

 - Várias e várias vezes! – e depois cobriu a boca para sufocar um riso de sua piada. – Desculpa... Mas é que tinha um feiticeiro como você aqui há pouco tempo... – Derris apressou o passo lá na frente das meninas e estalando a mandíbula de ferro para chamar uma carroça em péssimo estado, mas comandada por um cavalo esquelético de cor ligeiramente vermelha. – Ele falava meio engraçado sabe? Não tanto quanto você, mas era engraçado de ouvir e então... – o pátio externo do palácio de Terenas ficou para trás e as ruínas de Lordaeron pareciam gigantes aos olhos de Sorena Atwood. Todas as lendas que a Ordem da Luz contava sobre a grande batalha contra o Flagelo ali naquele lugar pareciam ser meras historinhas de dormir. Era algo que Oxkhar gostaria de ver se pudesse, mas infelizmente não saberia mais o destino de seu irmão e pai após tantos anos longe de casa. Subiram na carroça, enquanto Derris ficou no cavalo esquelético o controlando sem amarras, mas apenas com magia. – Ele sempre falava isso de jeito extravagante: “Várias e vááárias vezes!” – gesticulando para o alto com a mão direita - Eu ria muito com ele. Tinha histórias ótimas do Norte. Molko era seu nome, muito bonito por sinal... – a carroça começou a andar e o solavanco fez a mais nova trombar com a mais velha. – Foge não, novata... Tem muita coisa pra você fazer e aprender... – as duas riram, cada uma de seu jeito.

 - Aqui é sempre assim...? – perguntou Sorena olhando para o alto, grossas nuvens cinzentas e carregadas estavam acima delas, o ar era uma mistura de odor de mofo e decomposição vegetal, mais o pesado clima úmido dali.

 - Tá pra chover, mas não chove? – a clériga sorriu largamente e suspirou contente – É, é sempre assim desde que me lembro... – arfano um pouco do ar úmido e frio de Tirisfal Glades. – É um clima ótimo, ao meu ver...

 - Mas é quieto assim também? – logo a quietude foi interrompida por um grunhido vindo de alguns arbustos ali. Um cão raivoso e espumante atacou a carroça sem pestanejar, a reação de Derris foi de enxotar o bicho com um movimento rápido de seu pulso na direção do bicho. O cão deformado pela Praga foi atingido em cheio por um feitiço desconhecido e caiu duro ao chão com um ganido breve. Sorena fechou os olhos para não presenciar a cena, já Imladris abriu a boca para reclamar:

 - Não precisava ser tão rude com o pobre coitado!

 - Antes a carcaça dele que minha perna perdida... – Sorena arrepiou-se e concordou com a cabeça.

 - É preferível assim mesmo...

 - Boa aluna... – respondeu o feiticeiro cutucando um colar estranho que usava em volta do pescoço. Simbolos feitos de osso e madeira, penas minúsculas de pássaros e moedinhas tão desgastdas que não dava mais para saber se tinham valor ou não.

 - Esse é o problema com o pessoal do Apotecário... – a clériga falou baixo, mas depois elevou a voz para ser ouvida – Acham que podem fazer o que bem entendem com o fluxo natural das coisas...

 - O fluxo natural das coisas já era menina... – respondeu o Abandonado. – O único fluxo que estou seguindo é para Deathknell... – a clériga balançou a cabeça em desaprovação e marcou algo em seu caderninho de capa preta. Sorena se esgueirou para ver o que ela havia escrito, mas a mais velha fechou as páginas antes de dar uma olhada.

 - Espero que não se importe com cemitérios... – Sorena negou veemente, já estivera em tantos durante aqueles 4 anos nômades. – Os novatos vêm de lá, saem do Sepulcro e correm direto pra nossa vila. Mas como há alguns probleminhas na hora de acordar, nossos sacerdotes cuidam para que eles não se machuquem ou machuquem outros quando se levantam...

 - Machucar...? – Sorena não queria saber a resposta, mas se era para ficar na companhia de cadáveres pro resto de sua vida, teria que fazer perguntas como aquela.

 - Auto-mutilação... – respondeu a clériga coçando o queixo distraidamente. – Nós temos um jeito peculiar de voltarmos à vida. Trazer um pouco da violência causadora de nossa morte pode acarretar um sério problema por aqui... O poder que nos liberta é forte demais para alguns... – e sussurrando no ouvido de Sorena – Na verdade alguns ficam meio birutas quando descobrem que estão mortos e tudo mais... É uma realidade diferente...

 - Estou vendo... – tremelicando rapidamente, Imladris segurou a mão da garota sem pensar e deu um breve aperto e um sorriso amigo.

 - Fica calma... Vai dar tudo certo, você vai ver... Tenho a certeza que você será uma ótima feiticeira e entenderá como as coisas funcionam por aqui...

 - Maldito seja Derris!! – alguém gritou do outro lado de uma cerca improvisada com arame farpado e estacas quebradas.

 - Vai se danar MacMalleys! – replicou seu Mestre desviando de um grosso pedaço de cogumelo voando em sua direção. A coisa caiu perto das meninas atrás na carroça, Imladris o pegou, cheirou levemente e esperou o fazendeiro morto chegar perto da carroça com um sorrisinho sem dentes.

 - Cadê o meu cavalo?

 - O seu cavalo?

 - Sim, aquele que você pegou emprestado há 4 anos atrás e não devolveu...

 - Oh aquele cavalo... – Derris apontou para Sorena aterrorizada com a falta de órbitas no rosto da magricela filha Rosemary do fazendeiro MacMalleys. A garota deveria ter sua idade. – Ela que sumiu com ele... – Imladris cumprimentou a garota com um aceno vigoroso, ela o retribuiu com o costumeiro bordão dos Abandonados:

 - Que a Dama Sombria vele por ti, clériga Imladris!

 - Oh Rose... – Imladris jogou gentilmente o pedaço de cogumelo gigante para a mocinha morta que pegou sem dificuldade. – Que a força da Rainha esteja sempre conosco! – Derris bufou e deixou o cavalo andar calmamente para poder acompanhar o reclamante fazendeiro.

 - Sabe quanto me custa para criar um cavalo daqueles?

 - Sei sim... – o velho mestre falava entediado.

 - É a minha família que está pagando pelo preço, Derris... Trate de pagar o meu cavalo ou terei que...

 - Fará o quê, MacMalleys? – a rispidez na voz do mestre alertou Sorena. Não era uma hora boa para intervir, mas saltou da carroça e cutucou o fazendeiro brevemente.

 - Custava quanto o cavalo...? –perguntou tão baixo que o crânio de MacMalleys teve que estalar na espinha para poder chegar perto dela falando.

 - 50 moedas de ouro, mais os atrasados... 4 anos são muito, sabe? A inflação no mercado e aqueles malditos goblins que superpopularam as casas de ação... Como odeio aqueles vermezinhos...

 - Menina, não temos tempo para isso... Você tem que treinar com Maximilian na capela... – interrompeu Derris puxando Sorena pelo manto manchado, a Abandonada Rosemary a puxou do agarro do mestre.

 - Na verdade, querido pai... Há uma coisa que a feiticeira pode nos ajudar... – o fazendeiro olhou sem olhos para a filha que olhou para Derris que estava encarando a estrada com uma cara amarga. Imladris pulou da carroça e levantou os braços.

 - Seja o que for, nós estamos dentro! – disse animada encorajando Sorena a fazer o mesmo.

 - Por mim tudo bem...

 - Errr bem... Acho que essas meninas podem ajudar sim... – a filha morta chamou as duas com a mão ressecada e foram em direção dos estábulos atrás da cerca improvisada. Derris ainda estava no comando da carroça e estalou a mandíbula novamente.

 - Quando acabarem, tratem de ir a capela! – Sorena concordou, mas foi arrastada para longe do alcance do mestre por uma Imladris animada em ajudar seus compatriotas. O fazendeiro foi em direção da construção arruinada pelo tempo e a falta de manutenção, as garotas passaram para um campo infértil cheio de ervas daninhas e fungos na colheita que apodrecia ali. O estábulo estava perto, mas a Abandonada Rosemary pedia que elas fossem silenciosas.

 - Clérigo Lancaster disse que ela está enferma por causa das mordidas dos Hobbers... – murmurou a garota cadáver para as duas quando empurrou a portinhola do estábulo. Não havia iluminação suficiente lá dentro, mas o arfar pesado de um ser vivo vinha de um dos espaços reservados para as vacas de outrora. Sorena sentiu uma tontura anuviar seus olhos e virou-se para sair dali, Imladris a agarrou a tempo.

 - O que foi?

 - Muita... muita gente ali... – balbuciou Sorena colocando as mãos nos ouvidos.

 - Muita gente como? Só tem uma vaquinha machucada oras... – explicou a dona do fazendeiro. Imladris forçou as vistas e espiou para dentro, um berro estridente foi ouvido e as três pularam no lugar. Não era o berro de uma simples vaquinha.

 - Oh pelas barbas de um murloc...! – Imladris arregaçou as mangas e puxou as vestes para cima para poder pular pela portinhola. – Não é uma vaquinha, Rose... – o seu pulo foi amortecido por feno mais do que seco e outro berro foi ouvido, Sorena cobriu os ouvidos com tanta força que sua testa estava com uma veia tencionada. A filha do fazendeiro estava apavorada.

 - Pra mim ela fosse só uma vaquinha machucada pelos Hobbers, aqueles saqueadores de uma figa...!

 - Tantas mortes, por queeeeee?! POR QUEEEEEEEEE?! – o grito da criatura nos estábulos foi aumentando até todas ali fecharem os olhos pela dor nos ouvidos.

 - É um tauren, Rose... – Imladris ajeitou-se como pode dentro do edifício e foi até a criatura enferma.

 - Tauren?! O que um tauren faria aqui? – perguntou Rose duvidosa, Sorena agora aplacava a dor de cabeça batendo o punho levemente na têmpora. Parecia que havia um turbilhão de coisas em volta do cubículo onde o tauren estava, como milhares de vozes altas falando ao mesmo tempo e pedindo pela mesma coisa: Vingança.

 - Hey você... – Imladris chegou de mansinho, procurando não atordoar o hóspede doente. – E-eu posso ajudar? – perguntou mesmo já sabendo a resposta negativa. Um filete de sangue corria para fora do cubículo onde o tauren se encontrava deitado, segurando o lado esquerdo do corpo enorme e o rosto todo arranhado.

 - Não, não... A morte está perto... Ela está muito perto... Deixe-me...

 - Como é que um tauren foi parar aqui? – perguntou Rose confusa com a situação, seu pai chegou com uma espingarda enferrujada de cano de boca larga.

 - Eu disse que se essa coisa voltasse a berrar como o inferno, eu atiraria! – Rose tentou parar o pai, mas foi Sorena que tomou a arma da mão do fazendeiro e o obrigou a dar alguns passos para trás com a força desconhecida vinda da recém-chegada.

 - A morte... Ela está me espreitando... Desde sempre, desde sempre... – balbuciava o tauren. Imladris pegou um lampião velho ali perto e o acendeu magicamente, fazendo o cubículo se iluminar moderadamente.

 - Oh pela Luz, ela está muito ferida...! – a clériga se apressou ao se ajoelhar e tirar sua capa de viagem para cobrir o corpo febril da tauren.

 - Como sabe que ele é ela? – perguntou Rose curiosa, já o fazendeiro MacMalleys se digladiava com Sorena pela posse da arma.

 - Solte essa arma, sua idiota! Vou estourar seus miolos sua elfa do sangue imunda!

 - Papai, por favor! – implorou Rose antes que algo acontecesse de pior.

 - A morte, ela está aqui...!! Deixe-me ir, DEIXE-ME IIIIIR!!

 - Eu posso curá-la, cara xamã da Horda... Eu posso fazer isso... – Imladris preparou o poder em suas mãos e olhou para trás. – Por favor, senhor MacMalleys, você e sua fiha, fiquem longe do estábulo?

 - Vou é acabar com o sofrimento dessa aberração de chifres!

 - Papai, páre! Páre!

 - Se eu fazer a magia de Cura Total aqui, vou machuca-los bem mais que posso imaginar! Por favor saiam? – pedia a clériga preocupada com ambas as partes. Ninguém previu quando Sorena, com uma das mãos no cano da espingarda engatilhada, sacou uma pistola de tamanho considerável de debaixo de seu manto e apontou na cabeça do fazendeiro.

 - Se vocês criaturas infectadas tiveram amor a vida quando vivos... – murmurou em uma voz grave e cheia de hostilidade, Imladris sentiu um arrepio na nuca e energia imposta ali naquele estábulo, mas o choro da tauren a fez perder a concentração em o quê ou quem estava ali também com eles. – Saiam já daqui...

 - Fique tranquila, fique calma... – pedia limpando o rosto ensanguentado da tauren e tentando fazê-la virar para verificar o sangramento excessivo. – Eu preciso fazer isso agora ou vai ser tarde demais!

 - Fora... daqui... – disse alguém através de Sorena, a arma mecânica engatada em um modo mágico e dois Abandonados encarando o seu agressor desconhecido. Rose puxou o pai com força e os dois correram para a casa abandonada do outro lado da propriedade. Um clarão de luz foi visto por todos que passavam pela estrada, inclusive a carroça de Derris foi inclinada para trás por causa disso. O cavalo esquelético não suportou muito e desfaleceu abaixo dos pés do Abandonado feiticeiro. Todos ali sentiram uma sensação amarga no paladar e um arrepio característico de quando alguém fazia magia arcana da Luz.

 - É, nem deixo elas 5 minutos sozinha e olha só o que dá... – pegando suas coisas na carroça quebrada e voltando mancando para a fazenda de MacMalleys. Passou pelo fazendeiro e jogou o osso da nuca do cavalo esquelético que sobrara em sua mão. – pronto, aí seu pagamento pelo cavalo de 4 anos atrás, agora saia da minah frente sim?

 - T-tá...? – respondeu o fazendeiro sem palavras e mal acreditando que havia uma criatura viva nos seus estábulos. Já a menina Rosemary tinha os olhos pálidos pela morte tão marejados, assim como um sorriso admirado no descarnado rosto.

 - Clériga Imladris é tão... – ela suspirou segurando um crucifixo que fora deixado pro sua mãe antes de morrer e que agora etsava sempre em volta de sua cintura fina como um amuleto contra a Cruzada Escarlate.


                Mestre Derris abanou as mãos para dissipar a poeira que subira com o uso de poder mágico que Imladris fizera. Era difícil ver a aprendiz de Aelthalyste curando algo vivo por aí e muito menos usando uma magia tão forte e arrebatadora como aquela. Pigarreou com desconforto pela sensação que perdurava e pegou a pistola caída no chão a sua frente. Sua aprendiz estava em um canto escuro, curvada contra a parede, expelindo tudo que comera no café da manhã em acessos doentios.

 - Precisa de ajuda aí, novata? – perguntou ele, mas ela abanou a mão vigorosamente para a clériga no cubículo mal iluminado. Com o poder arcano em sua mão esquerda fez a lamparina arder em um fogo verde e intenso, assim iluminando todo o lugar. Imladris arquejava ao chão, respirando pesadamente e pegando fôlego tão vigorosamente que produzia sons de sofrimento. A tauren agora se encontrava de pé, mãos nervosas na capa de viagem colocada tão gentilmente em seu corpo doente e encarou o Abandonado com incerteza. Seu olhar amendoado foi para o colar de ninharias exóticas no pescoço de Mestre Derris, isso a fez sorrir benevolente e levantar a clériga devagar, cobrí-la de volta com sua própria capa e ajuda-la a respirar melhor a levando para o centro do estábulo. O Abandonado curvou um pouco a cabeça para ouvir melhor os sussurros esvoaçantes que ocupavam aquele lugar, vozes infinitas de ancestrais tão antigos que qualquer mortal duvidaria de sua existência. – Sorena... – a aprendiz não respondeu, estava tossindo seus fluidos para fora de seu nariz, incomodada e enojada ao mesmo tempo. – Vai lá pra fora sim? – ela saiu correndo e cambaleante para a propriedade dos MacMalleys e se jogou em uma tina de água turvada ali perto. Levou a agua ao rosto e cuspiu saliva amarga ao chão ao lado da tina, queria se livrar daquela sensação pegajosa que se apoderou de seu corpo quando estava lá dentro. Era como se toda a umidade do mundo houvesse impregnado em sua pele e o chão se tornasse uma parte sua, assim como o ar que respirava. Rosemary se aproximou lentamente, curiosa e apiedada pelo estado da recém-chegada.

 - E-eu... Tome isso, amiga de Imladris... – disse ela se colocando ao lado de Sorena e oferecendo um balde d’água potável para ela pdoer sorver e se limpar. – Se precisar mais...? – Sorena acenou que não e satisfez sua sede com vontade. Recebeu alguns tapinhas nas costas da filha do fazendeiro e teve seus cabelos presos bem atrás das orelhas pontudas por uma tiara vinda dos cabelos ralos e cinzentos da Abandonada. Um gesto simples de solidariedade que ela jamais recebera em sua vida em Goldshire.


                A casa de MacMalleys virara uma aglomeração de pessoas entrando e saindo, todas curiosas para ver a imensa vaca sentada e falante na mesa do fazendeiro rabugento de Deathknell. Alguns já ouviram falar de taurens, outros estranhavam a visão da xamã Bertulina falando mansamente e quase melodiosamente, explicando sua aventura de Mulgore até ali em Tirisfal Glades.

 - Gostaria de recuperar os meus companheiros de viagem, caro senhor... – direcionando a pergunta a MacMalleys, tão embasbacado pela criatura que quisera matar horas atrás saber falar, andar e até ser educada com os seus. – Eles não podem ficar lá, sendo devorados pela moléstia que atingiu vosso povo... – Imladris tomava uma caneca enorme de chá medicinal para restabelecer suas forças que os sacerdotes do Culto das Sombras Esquecidas haviam dosado para ela. Sorena estava perto da lareira acesa após anos sem uso para se aquecer do frio da noite. A cara da clériga para a colega de quarto era de “missão cumprida, mas derrotada”, já que as duas mal conseguiam se manter em pé após a Cura Total descarregada pela aprendiz da Luz. Derris estava no vilarejo, reportando a notícia de que havia mais 4 viajantes de Mulgore perdidos em Tirisfal Glades. Um grupo de busca já havia ido em direção de onde os viajantes foram atacados, e mais outro se preparava para ir a Undercity dar a notícia a Rainha.

 - Pobres coitados... – sussurrou Imladris pegando um pouco de sua capa e cobrindo uma Sorena tremelicando e observando atentamente o fogo crepitando na lareira dos MacMalleys. – Deveríamos ir atrás deles, não acha? – Sorena negou veemente com os olhos grudados na brasa. A tauren continuava a narrativa de sua viagem longa nas Terras Ocidentais. – Deveríamos mesmo... As pessoas precisam da gente... A Horda precisa da gente...



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