Nem Todo Mundo Odeia O Chris - 1ª Temporada escrita por LivyBennet


Capítulo 19
Todo Mundo Odeia a Corleone


Notas iniciais do capítulo

Esse foi rapidinho!
Espero que gostem......



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POV. CHRIS(Brooklin – 1983)

                Fazia um ano que minha mãe tinha me mandado pra Corleone pra receber uma educação decente, mas eu só tava aprendendo a apanhar. Eu sofria de racismo e não conseguia dormir de tão cedo que eu tinha que acordar pra ir pra lá. A pior parte era que eu era o único negro em uma escola cheia de brancos, então todo mundo me detestava. Na verdade, a única coisa boa que me aconteceu na Corleone foi virar amigo da Lizzy e do Greg. Eles eram brancos, mas não se importavam por eu ser negro.

                Eu tava com a Lizzy e o Greg nos armários e a Lizzy tava contando que ia viajar por três dias com os pais pra visitar a irmã e tal, quando uma garota branca veio falar comigo.

                “Você é o Chris, né?” Na boa, ela era muito bonita.

                “Sou. Por quê?”

                “Eu acho horrível como as pessoas te tratam. Desculpe se não falei nada até agora.” Eu tava sonhando.

                “Tá bom.” Foi tudo o que eu consegui dizer.

                “Quer ir ao fliperama pra jogar Pack Man?” Eu ia dizer que adoraria, mas algo me impediu.

                “Ô minha filha, tá me achando com cara de otária?” Lizzy. Naquela hora eu me irritei com ela. A garota tava me chamando pra sair e ela se metia. Sacanagem.

                “Não, por quê?”

                “Quem brincar de inocente? Então tá. Diz pro Caruzo que ele precisa ser mais esperto que isso. Ele tá mexendo comigo, com os meus amigos e isso não é legal. E é melhor ele parar se não vou dar uma surra tão grande que nele que vai entortar até o tataravô dele.” A Lizzy tava sendo bem grossa e a garota tava tremendo de medo.

                “Tu-tudo bem. E-eu f-falo.” E saiu correndo.

                “Por que fez isso? Ela ia me chamar pra sair.” Eu tava meio irritado, mas o meu monstrinho do orgulho tava feliz por que ela ter feito aquilo.

                “Ela tava de trama com o Caruzo, você ouviu o que ela disse.” Ela falava como se fosse óbvio.

                “Por que tirou logo essa conclusão? Será que ela não podia estar falando a verdade?”

                “Nenhuma garota branca dessa escola ia querer sair com você.” Eu já sabia daquilo, mas ouvir ela dizer doeu pra caramba e me deixou com muita raiva. Eu também sabia que ela não quis dizer no sentido que eu entendi, mas mesmo assim a raiva não diminuiu.

                “Quis dizer o quê com isso?” Ela pensou um pouco.

                “Você sabe por que elas não querem sair com você. Quer que eu repita?”

                “Quero.” Ela tava me irritando muito.

                “Elas não saem com você por que você é negro, baixinho, não é popular e todo mundo tira sarro com você.” Cheguei ao meu limite e explodi.

                “VALEU POR SABER QUE É ISSO O QUE A MINHA ‘GRANDE AMIGA’ PENSA DE MIM!” E saí deixando ela e o Greg no corredor.

POV. LIZZY

                “Droga! Eu disse besteira. Me ajuda, Greg. O que eu faço?” Ele me olhou com cara de ‘e eu sei?’.

                “E eu sei?”

                “Affy... Ele também é seu amigo.”

                “Mas quem falou o que não devia foi você.” Me estressei.

                “Que grande amigo você é!” Ia saindo quando ele resolveu falar.

                “Tá. Espera.” Me virei pra ele. “Olha, ele acha que o que você falou é o que você pensa dele.”

                “Eu sei, mas não é. É o que os outros pensam, não eu.”

                “Tem que arranjar um jeito de dizer isso pra ele.”

                “Mas como, se eu viajo pra Cambridge hoje à noite?”

                “Aí eu não sei.” E foi pra sala.

                “Grande novidade você não saber.” Resmunguei e segui ele.

                No intervalo o Chris se isolou de mim e do Greg. Tentei falar com ele, mas ele nem olhava pra mim. Me senti uma idiota e era a primeira vez que me sentia assim. Eu tinha magoado meu melhor amigo e não tava conseguindo pensar em como me desculpar antes de ir embora.

                Na volta pra casa eu procurei ele em todo lugar, mas não achei, então pensei que ele tinha ido sem mim e fui esperar o próximo ônibus. O ônibus chegou e subi, mas no último instante ele subiu, mas não falou comigo. Pensei que ele vinha se sentar do meu lado, mas ele foi pro fundo do ônibus.

                Descemos do ônibus e andamos pra casa. Quando estávamos quase em frente ao 606, eu senti que era minha última chance de tentar, aí arrisquei.

                “Chris... me escuta, por favor.” Ele só parou, mas não virou pra me olhar.

                “O quê?” Ele foi grosso.

                “Eu não queria dizer aquilo. Me desculpa.”

                “Você disse.” Ele parecia estar com muita raiva.

                “Eu sei.” Senti vontade de chorar, mas eu não faria aquilo ali. “Desculpa.” Entrei correndo no 604 e fechei a porta. Corri escada acima pro meu quarto, me tranquei lá e comecei a chorar. Não fazia aquilo há muito tempo, mas precisava. Acabei dormindo daquele jeito mesmo.

                Acordei com uma batida na porta: meu pai me chamando pra ir. Peguei minha mochila e uma mala pequena que eu tinha arrumado de manhã e saí. Do carro olhei pro número 606 e vi a luz da sala acesa.

                “Tchau, Chris.”

POV. CHRIS

                Ouvir aquilo da Lizzy doeu mais do que se eu tivesse ouvido de outra pessoa. Eu tava com raiva. Passei o resto do dia inteiro sem falar com ela nem com o Greg. Eu sei que ele não tinha culpa, mas incluí ele também. Ela tentou falar comigo até na aula, mas eu fingi que não escutei. Na volta pra casa, cogitei até pegar o ônibus seguinte, mas imaginei que minha mãe me mataria por chegar atrasado. Subi naquele, mas me sentei bem longe dela.

                Quando a gente tava quase em frente de casa, ela tentou de novo. Não sei porque parei e respondi, mas não olhei pra ela. Sabia que se eu olhasse, ia dizer que tava tudo bem, mas não tava. Ela pediu desculpas, mas eu não respondi. Ela subiu correndo e eu fiquei me sentindo mal. Pensei ter ouvido ela soluçar, mas... era a Lizzy. Ela não chora. Ou chora? Decidi falar com ela de manhã indo pra escola.

                Subi pro meu quarto e tentei escutar alguma coisa pelo buraco da parece, mas nada. Tava tudo em silêncio. Estranhei. Ela nunca dorme cedo.

                De manhã, esperei ela pra ir pra escola, mas ela não desceu. Assobiei três vezes, mas ela não veio. Imaginei que ela tivesse magoada comigo e tivesse ido sozinha mais cedo, então fui. Lá na escola, perguntei pro Greg.

                “Você viu a Lizzy?” Ele me olhou estranho.

                “Você esqueceu?”

                “Esqueci o quê?”

                “Cara, ela viajou ontem pra Cambridge pra visitar a irmã.” Senti raiva de mim. Eu sou um idiota!

                “Droga! Sabe quando ela volta?”

                “Daqui a três dias.” Droga!² Ia ter que esperar três dias.

Se eu pensei que ia esperar na paz, me enganei. Aqueles três dias foram os piores de todos. Nunca fui tão perturbado desde que tinha chegado na Corleone. Todo dia o Caruzo me batia, me zoava, derrubava meus livros. Mas naqueles três dias eu dei o melhor de mim pra sair da Corleone. Eu não queria mais estudar lá apesar do Greg e da Lizzy serem meus amigos. Talvez a Lizzy não seja mais quando voltar.

No primeiro dia, fui bombardeado com bexigas cheias de goma molhada. Cheguei em casa mais branco do que jamais fui ou serei um dia.

“Meu filho, o que aconteceu com você?”

“Mãe, me tira da Corleone. Eu não aguento mais aquilo. Eu sou zoado todo dia.”

“Mas isso não pode impedir que você tenha uma boa educação.”

“A única coisa que aprendo lá é como ser um saco de pancadas. Todo mundo me detesta e eu detesto todo mundo. Por favor, me coloca na escola do bairro.”

“Na Sanford? Onde os marginais se formam? De jeito nenhum!”

“Por favor, mãe. Na Corleone eu to sozinho.”

                “A Lizzy não é sua amiga? E o Greg também? Agora sobe e vai tomar banho.”

                “Tá bom.” O Greg eu sabia que era meu amigo, só não sabia se a Lizzy ainda era.

                No outro dia eu decidi tomar as rédeas da situação. Se minha mãe não ia me tirar da Corleone, eu ia fazer por onde ser expulso.

                “Cara, se você sair, vou ficar sozinho. To frito.”

                “Que nada. Zoam você por andar comigo. Vamos continuar a ser amigos, eu só vou mudar de escola.”

                “Vai mesmo fazer isso?” Olhei pro Caruzo do outro lado da rua.

                “Vou sim.”

                Pensei que ia ser mole ser expulso, mas não foi. Comecei a colocar em prática uma série de planos. Pixei as paredes, mas a Srta. Morello viu e não disse nada. Na verdade ela disse, disse que eu tinha escrito uma palavra errada. Acionei o alarme de incêndio de propósito, preguei peças nos professores, desmoralizei o juramento à bandeira, entre outras coisas. No terceiro dia que a Lizzy tinha ido embora, eu continuava sendo zoado e nenhum plano de ser expulso tinha dado certo. Minha criatividade tinha esgotado.

                “Cara, eu não sei mais o que faço. Fiz de tudo, mas nada deu certo.”

                “Se a Lizzy tivesse aqui ela teria um bom plano.”

                “Se ela estivesse aqui, ela não teria me deixado colocar nem o primeiro plano em prática.”

                “É bem a cara dela mesmo. Ajudar a gente.”

                “É. Uma versão da minha mãe só que mais jovem e mais legal. Ela teria dito que eu não deveria desistir, que sempre ia me ajudar, que juntos somos o trio do barulho e que podíamos dar conta do Caruzo. E se a gente ficasse com medo e desse pra trás, ela ia lá e quebrava a cara dele sozinha.”

                “É. Essa é a Lizzy.”

                “E como ela faz falta.” Eu me sentia meio vazio.

                “Ela volta hoje à noite, né?”

                “É. To muito ansioso. Será que ela vai falar comigo?”

                “E eu é que sei?” De vez em quando eu queria dar uns tapas no Greg.

                Naquele momento o Caruzo passou pela gente no corredor e esbarrou em mim.

                “E aí, garoto piche, vamos pro fliperama?” Respirei bem fundo e encarei ele.

                “Não, Caruzo. Tenho coisa melhor pra fazer.” Puxei o Greg e ia saindo quando o Caruzo me puxou pela manga da camisa, e ia me dar um soco quando a vice-diretora apareceu.

                “Brigando, Sr. Caruzo? Pra minha sala, já.” Ela se virou e saiu e o Caruzo seguiu ela fazendo um gesto de que ia me matar.

                “Ele vai te matar amanhã.”

                “Vai nada. A Lizzy vai tá aqui.” Saímos rindo.

                “Desistiu, então, dos planos de expulsão?”

                “Desisti. Não vale a pena. A escola lá perto de casa é só pra quem é marginal.”

                “Sério? Então é melhor ficar aqui.”

                “Mesmo. Tchau, Greg.”

                “Tchau.” E corri por que meu ônibus tava dobrando a esquina.

POV. LIZZY

                Peguei minhas coisas, dei um beijo e um abraço na minha amada irmã e entrei no carro. Eu tava meio eufórica. Desde que eu conheci o Chris, há um ano, a gente nunca ficou mais de um dia separados; agora tínhamos ficado três. Sentia falta dele, de conversar, das brincadeiras, e sentia medo de ele ainda estar com raiva de mim.

                “Eu fui uma idiota em falar aquilo pra ele.” Resmunguei sozinha.

                “O quê, Lizzy?”

                “Nada, Cibele. Se cuida.”

                “Você também, maninha. E vê se se acerta com o Chris.” Fiquei lívida.

                “Como você sabe?”

                “Você ficou triste e quieta esses três dias. Presumi que tinha alguma coisa a ver com ele e agora você confirmou.”

                “Odeio seu lado detetive.” Fingi raiva e sorri. “Vou falar com ele.”

                “Tá bom. Fica bem. Tchau.”

                “Tchau.”

                O carro deu partida e eu estava indo pra casa. Duas horas depois eu vi o carro dobrar o quarteirão lá de casa. Me endireitei no banco e me estiquei pra ver o número 606. A luz estava acesa e tinha alguém na janela. O carro parou e eu desci e fui em direção ao porta malas pra pegar minhas coisas. De mala na mão, abaixei a cabeça e arrisquei assobiar três vezes. Os três assobios em resposta me deixaram muito feliz. Ele queria falar comigo!

                Subi correndo pro meu quarto, me tranquei lá e me joguei no sofazinho que tinha perto do buraco da parede. Ainda com um pouco de medo eu chamei.

                “Chris!”

POV. CHRIS

                Quando deu 18:00h eu fiquei de butuca na janela esperando a Lizzy chegar. Vi um carro dobrar a esquina e reconheci como o carro do pai dela. Fiquei olhando ela descer do carro, pegar a mala e olhar pra cima. Aí ela abaixou a cabeça e assobiou três vezes. Ela queria falar comigo! Vi ela entrar e corri pro meu quarto. O Drew tava assistindo um filme do Rocky então não ia deitar tão cedo. Tranquei a porta e me joguei na cama. Um minuto depois ouço um barulho de porta do outro lado e alguém se jogando em alguma coisa. Daí escutei a voz que não escutava há três dias.

                “Chris!”

                “Lizzy!” Ninguém falou mais nada. Eu tava com vergonha por ter sido otário, mas e ela?

                “Desculpa, Chris. Eu não devia ter dito aquilo pra você.” Ouvi a voz triste.

                “Desculpa, Lizzy. Eu devia ter perguntado direito o que você queria dizer e não tirar conclusões precipitadas.” Ouvi a voz rir.

                “É bem a sua cara mesmo entender tudo errado.” Resolvi brincar.

                “É bem a sua cara mesmo falar o que pensa.” A brincadeira deixou o clima mais leve.

                “Eu... senti sua falta.” Não sei por que, mas fiquei feliz em ouvi aquilo.

                “Também senti a sua.”

                “Você me desculpa, então?”

                “Você me desculpa?”

                “Eu desculpo.”

                “Eu também.”

                “Eu não penso aquilo de você. Não me importo com você ser negro, nem levo em conta o que os outros falam de você. É meu amigo e eu... e-eu g-gosto d-de vo-você.”

                “E-eu também g-gost-to d-de você.” Eu tava com vergonha de admitir aquilo e agradeci por ter uma parede ali e ela não poder ver minha cara.

                “Eu trouxe uma coisa pra você.” Me animei.

                “O que é?”

                “Vai lá fora que eu te entrego.”

                “Tá.”

                Levantei, desci as escadas e fui bem devagar até a porta da frente e saí. Ela apareceu pouco depois com um sorriso e as mãos atrás do corpo, escondendo alguma coisa. Fiquei tão feliz em ver ela.

                “É bom ver você.”

                “É bom te ver também.” Ela deu um sorriso. “Quer saber o que é?”

                “Quero.” Ela trouxe as mãos pra frente me mostrou o que parecia ser um boneco de terno com um microfone na mão. “Me trouxe uma miniatura?” Não tinha entendi o sentido daquilo.

                “Lê a inscrição embaixo.” Olhei pros pés do boneco e tinha um plaquinha. Lá tinha escrito: ‘O COMEDIANTE’. Eu ri muito daquilo. “Eu achei a sua cara.”

                “Só podia sair da sua cabeça uma coisa dessas.” Ela fez um bico.

                “Não gostou?”

                “Gostei.” Ela me abraçou e eu me senti bem.

                Aprendi que por mais que seja um saco, doloroso e torturante estudar na Corleone, eu não vou desistir por que eu tenho a Lizzy e o Greg. Sempre seria difícil pra mim por eu ser quem sou, mas enquanto eu tivesse eles tudo estava bem. A gente entrava em problemas juntos e saímos juntos. Bem, talvez não tão juntos por que o Greg corria sempre que dava problema.

                “Boa noite, Chris.” Ela me soltou e me deu um beijo no rosto.

                “Boa noite, Lizzy. Valeu pelo boneco.”

                “De nada.” Ela entrou e eu entrei também, antes que minha mãe descobrisse que eu tinha descido e minha noite acabasse de um jeito bem ruim.

...

Por: LivyBennet


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Notas finais do capítulo

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