Seven Reasons escrita por SumLee


Capítulo 6
Transforma-me




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Regrets collect like old friends

(Remorsos se acumulam como velhos amigos)

Here to relive your darkest moments

(Aqui para reviver seus momentos mais sombrios)

I can see no way, I can see no way

(Não vejo uma saída, não vejo uma saída)

And all of the ghouls come out to play

(E todos os monstros saem para brincar)

Shake It Out – Florence and the Machine

5. Transforma-me

 Forks; Washington – 06:15 am. – Domingo

 Bella POV

 Olhei sonolenta para o carro que estava na frente da minha casa, não acreditando realmente no que via. Edward saiu do Volvo e veio até mim, com um sorriso divertido nos lábios. Me cumprimentou com um beijo na testa – como sempre fazia – e teve que segurar meu peso porque me apoiei nele.

 – Você é muito, muito, muito malvado, Edward. – eu murmurei e logo soltei um bocejo, sentindo meus olhos ficarem úmidos com o sono. – Podia ter esperado pelo menos mais uma horinha.

 Ele soltou uma risada baixa e me arrastou até o carro, abrindo a porta para mim. Me acomodei ali, jogando minha mochila no banco de trás e apoiando a cabeça no vidro. Vi ele dar a volta e entrar. Me olhou com uma sobrancelha levantada, e eu apenas soltei outro bocejo.

 – Não dava para esperar mais uma hora, Bella. – falou. – O que eu tenho que fazer hoje não pode esperar mais uma hora.

 – Mas ainda são seis horas! – resmunguei. – O que é tão importante assim que precisa me fazer acordar a essa hora?

 – Vamos para Seattle. – ele simplesmente disse e ligou o carro, ignorando minha expressão de espanto.

 – Para... Onde?

 Edward olhou para mim por um segundo e depois virou para a estrada novamente, diminuindo a velocidade e parando no canto perto da calçada. Ele se virou para mim e pegou minhas mãos.

 – Eu sou um burro, Bella. Esqueci de perguntar o que seu pai acharia sobre você demorar... – fez uma careta.

 Eu apertei suas mãos com as minhas, sentindo o calor emanar delas. Ao invés de eu me sentir irritada como Edward achava que ia ficar, eu estava era me sentindo bem, porque ele não me via como uma aberração com hematomas roxos, como algumas pessoas viam. Ele se esquecia do que Charlie fazia, mas de uma forma que não se importava, era como se... Ele conseguisse encarar os fatos, e pensasse em alguma forma que pudesse me tirar, mas enquanto isso, eu seria apenas como uma garota normal. Essa sensação era realmente a melhor, como eu nunca havia experimentado antes em toda a minha vida. Com ninguém além daquelas crianças.

 – Não... Ele não vai se importar. – menti, porque eu sabia que o que quer que Edward fosse fazer, seria para me ajudar. – E se ele falar algo eu sei o que fazer.

 – O que quer dizer com isso? – me inquiriu.

 – Não é nada, só que vou correr para o meu quarto, como já fiz algumas vezes. Só... Preciso ser rápida. – dei de ombros. – E eu não me assustei pelo que meu pai vai achar, mas sim porque de ser lá tão longe.

 Edward deu um mínimo de um sorriso e beijou minhas mãos, logo voltando a sentar direito e ligar o carro. Eu me aconcheguei perto da porta, colocando meu capuz como uma almofada. A viagem de três horas poderia ser o suficiente para eu dar um bom cochilo, só que o fato de eu saber que Edward não havia dormido o suficiente me deixava com uma pulga atrás da orelha. Não que eu não confiasse nele dirigindo, porque ele sabia muito bem fazer aquilo, até andava rápido, só que ele não tinha dormido bem por minha causa, e seria horrível da minha parte dormir e deixar ele ali, sozinho. Eu sabia que ele deve ter menos de seis horas de sono porque vi quando ele, cuidadosamente, me tirou de cima dele para poder sair, e assim que pulou da janela, eu olhei as horas, e eram quase duas horas da manhã. Ele não parou nem por um minuto o carinho que fazia na minha cabeça, o que significava que ele não tinha dormido no tempo que estava comigo.

 Decidida a vencer o sono que estava lutando nervosamente para me dominar, eu me espreguicei e passei as mãos nos olhos, dispersando qualquer indicio de que eu cairia no sono novamente. Olhei para Edward, que estava concentrado na estrada, com os pensamentos perdidos a quilômetros daqui. Eu não queria interromper sua linha de raciocínio, então decidi mexer no carro. Eu não sabia se era de Edward – na verdade eu não sabia nada dele –, mas sabia que ele não se importaria de eu estar mexendo em suas coisas. Abri o porta-luvas e vi que ali não tinha quase nada, igualmente ao meu, que apenas continha uma cópia velha de Romeu e Julieta e geralmente tinha uma pomada ou gaze para curativos. E o que eu menos usava, uma base que pudesse tampar os hematomas que mais ficavam em evidencia. No carro do Edward tinha papeis de bala, um pequeno vidro de amostra de perfume, um canivete qualquer comprado em alguma lojinha de estrada, um pacote de camisinha e uma carteira. Eu arregalei os olhos, me perguntando se Edward era um garanhão ou algo do tipo para só ter aquilo ali. Sua risada me tirou dos meus devaneios. Eu o encarei, e vi sua expressão divertida, então decidi brincar. Peguei o pacote de camisinha e balancei na mão.

 – Quer dizer que alguém aqui é muito do responsável? – ergui uma sobrancelha.

 – Bem... Sim. – deu de ombros, rindo. Aquela resposta realmente me incomodou. – Jasper tem uma vida bem ativa, e fora dos meus padrões.

 Oh cara, eu poderia sentir alivio ao ouvir o nome de outra pessoa ali? Digo, sério, quer dizer que Edward não era nenhum cafajeste filho de uma mãe que destruía os corações das garotinhas, como aquele garoto do parque, que estava dando em cima da garota que mais parecia uma bonequinha. Ela sim parecia, eu não. Eu ainda sentia um calafrio ao lembrar-se dos olhos azuis daquele garoto, me davam um sentimento negativo que Edward tentava espantar a todo custo. Era por isso que evitava pensar naquela visita ao parque, para não começar a chorar pelo garoto. Ele parecia tão infeliz que chegava a doer em mim. Eu tinha ficado feliz ao ver que a garota o recusou, porque assim ele não podia passar a raiva e infelicidade dele para ela. Era egoísta de a minha parte pensar em só uma pessoa? Sendo que a outra parecia ser quem estava sofrendo mais? Eu deveria entendê-lo, mas era estranho, porque ele descontava a raiva nos outros, e não guardava para si.

 – E quem é Jasper? – perguntei, guardando as coisas no lugar e fechando o porta-luvas.

 Eu estava com um pé atrás em perguntar isso, porque a maioria das vezes em que perguntava algo para Edward ele me respondia com um sorriso. Era injusto por um lado, porque eu queria conhecer mais sobre o homem que estava me salvando do mundo e de mim mesma, saber da vida dele. Por outro lado, era mais que justo, porque assim não me sentia tão conectada a alguém que vai embora assim que terminar seus serviços comigo. Ao invés de me sentir uma Lois Lane com ele sendo meu Clark Kent, meu Super-homem, eu me sentia apenas uma moradora de Smallville, que ele apenas salvava e ia embora.

 – É um amigo meu. – falou, me olhando por rápidos segundos. Ele virou para frente, com um sorriso enorme nos lábios. – Um colega de quarto.

 Minha boca se abriu em um "O" com a surpresa de ele ter respondido, pela primeira vez, uma pergunta minha. Será que ele estava se abrindo mais para indicar que iria ficar comigo? Mas... Eu não podia acreditar nisso, porque seria me iludir, sendo que o futuro era tão incerto para mim.

 – Ele mora com você naquele trailer? – decidi continuar com o questionário, já que Edward parecia estar em um humor ótimo.

 – Yeah. – assentiu com a cabeça.

 – Hm. – fiz.

 Então Edward não morava com os pais, e sim com um amigo. Claro, uma coisa perfeita para um homem de dezoito anos que decidiu ir atrás da sua independência, e saiu de casa. Mas, de onde ele saiu? Não fora de Forks, porque eu vivia aqui os meus dezoito anos e nunca o tinha visto. E vamos falar sério, era impossível não reparar em um garoto como ele. Ainda estava impressionada em como não o vi no penhasco antes de sequer me aproximar. Ele era silencioso... Tão perfeito em seu jeito quieto que me intrigava, me torturava e me encantava.

 – E esse carro? – questionei também, queria saber se ele ainda daria mais respostas. – Eu sou fã de Volvo. – passei a mão lentamente na porta, sentindo o estofamento ali. – São tão perfeitos...

 – É do Jasper. – respondeu e eu arregalei os olhos. – Ele disse que como moramos juntos, também é meu.

 – Como assim? Quero dizer... – balancei a cabeça. – Vocês dois moram em um trailer, e tem um Volvo?

 Edward sorriu de canto para mim e voltou a olhar para frente. Eu bufei, irritada, porque novamente ele tinha encerrado o assunto com aquele sorriso. Se eu pudesse, abriria a boca dele e o faria cuspir tudo sobre si, pelo menos assim não parecia uma garotinha curiosa na TPM. Também não querendo dar continuidade ao assunto, eu me encostei novamente na porta e fechei os olhos, querendo voltar ao dormir, mas as dúvidas sobre o garoto me deixavam a todo vapor, querendo sair pergunta por pergunta sobre a vida dele. Eu já estava quase pensando em morder a língua quando me lembrei que algo ali poderia em distrair. Abri um olho e olhei para Edward, que continuava focado na estrada, só que agora batia ritmicamente as mãos no volante, em uma música que tocava dentro de sua mente. Eu me arrumei no banco e estiquei a mão, apertando o botão de power no aparelho eletrônico do carro. Ele processou o CD que estivesse lá dentro e então começou a tocar uma música conhecida por mim. Sorri comigo mesma, começando a acompanhar o toque delicioso e rouco que era a banda Goo Goo Dolls. Era uma sinfonia tão única, com a voz dele. Era uma das poucas bandas que eu ouvia quase todas as músicas. IrisBlack Ballon e a mais perfeita para definir o que Edward havia se tornado para mim: All That You Are. Era tão perfeita para o que ele fazia. Era uma das minhas favoritas, e agora vendo que ela tinha o encaixe perfeito para uma pequena parte da minha vida – tão grandiosa ao mesmo tempo – que fez ser a música perfeita.

 – Estou impressionada. – falei, me interrompendo. Edward me questionou com o olhar. – Que seu amigo garanhão goste de Goo Goo Dolls.

 – Não é ele. – sorriu. – Sou eu mesmo. 

 – Sério? – sorri também. – Eu sou uma grande fã deles!

 Edward me olhou pelo canto de olho, e eu vi algo ali como admiração. Eu não sabia o porquê dele ficar assim por eu gostar de uma banda, mas era tão bom saber que ele sentia admiração por mim em poucas coisas, que eu recebia algo assim dele, sendo que a primeira vez que o vi, seu olhar foi de decepção por eu querer acabar com minha própria vida.

 Soltei um pequeno bocejo, sentindo com o som leve da musica e o movimento do carro, o sono voltar. Eu não conseguia muito dormir a noite, mas como tinha tido uma boa noite de sono com Edward ao meu lado, aquilo pareceu maravilhoso demais e agora meu corpo queria mais daquela sensação. Edward, vendo que eu estava sonolenta, abaixou um pouco o volume do som e me puxou para encostar-me a ele – como tinha feito no dia que fomos ao orfanato – e eu me aconcheguei ali, mesmo não estando confortável como estava na minha Chevy. Por ser um carro mais baixo e a marcha ficar no meio, atrapalhava que eu ficasse próxima a ele – e era uma coisa que realmente queria. Voltei a acompanhar a parte da música novamente, que estava quase no final. Fechei os olhos, tirando a imagem da estrada e dos diversos carros que passavam por nós, e me embalei no sono, cantarolando a música na minha cabeça. You're the sound of redemption... The faith that I've lost... The answers I'm seeking no matter the cost... You opened the window... Now I can see... And you taught me forgiveness by giving your love back to me...

 Quando acordei duas horas depois – sem ser interrompida – nós já estávamos entrando nas redondezas de Seattle. Logo os prédios altos e baixos tomavam conta da nossa visão, deixando para trás as árvores. Eu me afastei de Edward, acomodei no banco e me espreguicei, olhando ao redor. Por ser domingo, algumas lojas se encontravam fechadas, mas outras lojas estavam como se fossem um dia normal da semana. Edward foi passando por todas elas, até entrar em uma rua pequena e depois entrar em um estacionamento. Como todas às vezes, ele abriu a porta do carro para mim e nós saímos andando pelas ruas. Passávamos por lojas e Edward não falava nada sobre o que iriamos fazer ali, eu também não perguntei, só o deixei me guiar pela mão. Entramos em uma pequena cafeteria e tomamos nosso café-da-manhã por ali, em meio à conversa e risadas sobre as coisas que Edward via no parque em que Alice trabalha. Quando terminamos, passava já das dez horas. Edward começou a me puxar novamente pelas ruas de Seattle.

 – Bella, me explica uma coisa... – Edward pediu enquanto andávamos por uma rua menos movimentada. – Qual é a definição de... Garota perfeita pra você?

 Mordi o lábio inferior, vendo a imagem de a garota perfeita começar a se formar na minha mente. Os cabelos longos e loiros caindo em cascatas, à pele branca como marfim – não fantasmagórica -, os olhos grandes e redondos como bolas de gude de um azul céu perfeito, o nariz arrebitadinho e certinho, a boca fininha e carnuda de um rosado natural, assim como o mesmo rosado das bochechas. Alta e cheia de curvas, mas nada exagerado. Atrativa... Assim era Tânia Denali, a garota mais linda de toda a escola. Essa era realmente a imagem perfeita na minha mente. E foi assim que eu falei para Edward, que assentia com a cabeça, concordando.

 – E o que exatamente chama mais a atenção nela?

 – As roupas. – respondi essa fácil. – Tânia se veste muito bem, como uma estrela de cinema.

 – Ela é popular, sai sempre, tem muitos amigos e um sorriso lindo?

 – Como você sabe? – perguntei já sentindo meu coração dar uma vacilada. – Você a conhece...?

 A imagem da garota perfeita começou a mudar na minha mente, ela ainda era a protagonista, estava lá com toda a sua beleza exuberante, mas agora tinha alguém com ela. Esse alguém era um garoto. Era Edward, ao lado dela, lindo como é, e sorrindo daquela forma que me deixava sem fôlego. A imagem formada era tão dolorosa por ver que eles combinavam tanto, que eu queria poder espanta-la, mas não conseguia. Ela ficava lá, me perturbando.

 – Não. – Edward respondeu e foi então como se a imagem virasse liquido e escorresse. – Mas eu sei como são essas garotas. E você se acha estranha, excluída porque não é assim.

 Abaixei minha cabeça, envergonhada, mesmo que Edward não tenha falado tais palavras usando algum tom de voz maldoso. Era apenas uma constatação que ele fez, entendendo exatamente o que eu pensava. Depois disso, Edward voltou a ficar quieto e nós seguimos lado a lado. Foram quase dez minutos andando – esses que eu fui contando como entretenimento – até pararmos em uma loja que as roupas eram... Como as que Tânia usava. Todas de marca, delicadas, mas ao mesmo tempo sensual. Aquelas que se encaixavam perfeitamente no corpo da pessoa.

 – O que estamos fazendo aqui? – perguntei baixinho.

 – Vamos transformar você em uma garota perfeita, Bella. Não gosto da forma que fala de si, então nós vamos reverter isso. – ele fez uma careta. – E se para você isso é ser uma verdadeira garota, vamos fazê-la ser uma.

 Eu não acreditava nas palavras de Edward, porque eu achava que ele iria me dar uma lição de moral sobre cada um ser como é, que não devemos querer ser como os outros e que não deve se julgar. Mas ali estávamos nós em frente a uma loja de grife, prontos para comprar roupas de grife e me transformar em uma garota como Tânia. Isso não podia ser certo, eu sabia, mas a tentação de querer pelo menos experimentar como era ser daquele jeito me deixava cega, e me fazia consentir com isso. Nada de eu falar "Está louco, Edward, isso não parece ser de você", ou eu ditar a lição de moral ali, eu apenas concordei e nós entramos na loja.

 Uma mulher, de aparência jovial, veio nos atender. Ela fora super simpática... Com Edward, claro. Tudo que ele pedia ela trazia, e quando ele pedia uma opinião, ela dava. Logo, eu estava sendo empurrada por ele para um provador, trazendo nas mãos três vestidos, duas saias e cinco blusas. 

 No começo eu fiquei relutante em vestir aquelas roupas que não eram para mim, mas Edward insistiu tanto que acabei cedendo. Coloquei um vestido bege, que era de botões, e que marcava a cintura com um cinto fino. Ao me olhar no espelho vi outra imagem, não de uma garota adolescente com problemas, mas de uma mulher. E... Aquilo não me agradou ao todo. Sem mostrar para Edward, eu troquei de vestido, e coloquei um tomara que caia preto, que ia até o meio das minhas coxas. Ele se ajustou ao meu corpo sem curvas, e eu até poderia gostar, se eu não parecesse mais de luto do que de alguém que vai para... Ah é, Edward não falou para onde. Minha pele pálida deixava o vestido negro demais, e isso me fazia parecer doente. Vesti uma saia para ver se era melhor que vestido, só que ela mostrou como minha cintura magra era realmente fina. Então, com certa raiva por não ter um corpo que ficasse tão perfeito quanto às garotas bonitas, eu vesti o ultimo vestido, decidida de que se aquele não ficasse bom, eu desistiria logo.

 Eu borbulhava de tanta raiva que me virei de costas para o espelho, não querendo ver exatamente tudo. Peguei o pequeno vestido vermelho fosco e de um pano grosso e vesti, vendo ele se alinhar aos poucos no meu corpo, se encaixando em cada lugarzinho que deveria. Eu fechei o zíper que ficava do lado, deixando-o um pouco apertadinho e marcante. Olhei para baixo vendo que ia até metade das minhas coxas finas, deixando bem a mostra meus joelhos ossudos. Isso só fazia eu me lembrar de que era mais um motivo de nunca usar vestido. Mexi meus dedos dos pés, em expectativa para ver como tinha ficado. Eu bem sabia que se não tivesse ficado bom – o que eu tinha plena certeza – eu sairia daquele provador e falaria para Edward que ou ele fizesse alguma coisa, ou nosso trato já era, porque eu não iria me martirizar ainda mais vendo que eu não tinha nada de corpo ou beleza para ser... Atrativa.

 Como uma leitora nata de livros, apaixonada por séries e filmes, eu mais uma vez confundi a realidade com a ficção. Fechei meus olhos e me virei de frente para o grande espelho que começava no chão e ia acima da minha cabeça. Com a respiração lenta e controlada, eu comecei a contar...

 1...

 2...

 3...

Agora!

 Abri meus olhos, dando uma pequena arregaladinha. Impressionantemente impressionante, o vestido estava... Tinha ficado bonito. Minhas pernas magrelas não pareciam tão magras olhando daquela forma. Minha cintura não parecia tão fina. E minha pele não parecia tão clara. O pequeno vestido vermelho de boneca se encaixava perfeitamente. A gola em forma de U não deixava muita coisa à mostra, as alças eram grossas. O vestido ficava apertadinho até a cintura, e então ele se abria para os lados. Dei uma pequena voltinha e vi que atrás ele se estendia um pouco pelas costas como um V, e no meio dele havia um pano roxo. Era tão perfeito que eu não conseguia despregar meus olhos do vestido.

 – Bella? – Edward deu três batidinhas na porta, me assustando e me trazendo ao mundo real.

 – O-oi? – gaguejei.

 – E então, já escolheu?

 Sua voz estava calma, não impaciente. Era impressionante como ele nunca ficava impaciente comigo, como a maioria das pessoas ficavam. Ele sabia esperar meus momentos de lerdeza, não se importando que eu haja como uma criança que nunca vira o mundo aberto. E para falar a verdade, eu era em parte isso.

 – Eu acho que... – olhei mais uma vez para o vestido. – Sim, Edward, eu já escolhi.

 – Ótimo! – ele falou animado, e sua voz indicava que estava sorrindo. – Estou te esperando aqui fora então.

 – Ok.

 Eu tirei o vestido – mesmo querendo ficar mais um pouco com ele – e sai do provador, entregando o resto das roupas para a mulher que nos atendia. Ela deu um sorriso grande quando viu qual eu havia escolhido, o que me fez ficar confusa. Com a roupa na mão, eu saí para o lado aberto da loja, encontrando Edward sentado em um dos pufes que haviam por ali. Ele sorriu para mim assim que me viu, e indicou para que eu chegasse mais perto. Assim que viu o vestido, seu sorriso aumentou.

 – Eu acho que vamos precisar de um sapato para combinar, certo? – perguntou e eu dei de ombros.

 Não havia pensado nessa parte. Tudo que eu tinha era tênis, e eles estavam surrados, coisa que não combinava com aquela roupa de grife.

 Edward chamou a mesma mulher e pediu para que ela indicasse sapatos que combinassem. E assim ela fez, trazendo pelo menos uns cinco pares. Foi explicando sobre cada um, como se fosse realmente importante saber a marca ou do que ele é feito, se é couro ou camurça. Eu peguei uma pequena botinha em tom de roxo – assim como o pequeno pano nas costas – e coloquei no pé. Ele me encantou da mesma forma que o vestido. Foi como amor a primeira vista.

 – Parece que você gostou. – Edward falou para mim, com um sorriso.

 – É bonito. – admiti, olhando para o sapato de todos os ângulos.

 – Então é ele?

 Olhei mais uma vez, imaginando como ficaria o vestido com a bota de cano médio. E a combinação ficou tão perfeita, que eu assenti com uma convicção nunca vista em mim.

 – Sim, é ele. – murmurei.

 A atendente pegou o sapato e o vestido e seguiu para o caixa, com nós dois em seu encalço. Assim que ela começou a passar os produtos, eu peguei minha bolsa para abrir, mas Edward me impediu. Lhe lancei um olhar inquisitivo, e ele negou com a cabeça, tirando a carteira do bolso e pegando um cartão negro dentro dela para entregar para a atendente. Eu ia abrir minha boca para protestar quando ele me deu um beliscão no braço.

 – Ai! – exclamei.

 Edward continuou me ignorando e deu o cartão para a atendente, que com um sorriso enorme, passou sem nem falar o preço que deu. Eu queria falar alguma coisa, mas sabia que levaria outro beliscão, então esperaria quando saíssemos da loja. Não deixaria Edward pagar por algo que eu usaria, não era dever dele. Outra atendente me entregou duas sacolas de papel grande, onde estavam às coisas, e Edward pegou o cartão. Em silêncio, seguimos para fora da loja, e fomos assim até o carro, aonde eu guardei as sacolas.

 – Agora vamos para...

 – Não vamos para lugar nenhum! – o cortei que arregalou os olhos e sorriu divertido. – Pode me dizer quanto foi tudo isso.

 – Para que você quer saber?

 – Ué, para eu lhe pagar! – dei de ombros e ele me olhou como se estivesse ofendido. – Não faça essa cara, seu idiota, que eu não vou mudar de ideia.

 – Ah, claro. – revirou os olhos. – Eu não vou falar nada, e não vou aceitar o seu dinheiro. Isso foi ideia minha então eu quem pago. Sou eu quem está fazendo tudo isso, então não fale nada, Bella.

 Cruzei os braços e bufei.

 – Fala agora. – disse lenta e autoritária.

 – Você é dura na queda, garota. – ele bufou também e torceu a boca em um biquinho engraçado. – 4.670$. – sussurrou.

 Arregalei os olhos, minha boca se abrindo em um "O".

 – Eu acho que ouvi errado, Edward. Você falou baixo demais. – ri secamente. – Juro para você que ouvi quatro mil seiscentos e setenta dólares.

 – Você não ouviu errado, Bella. Foi isso mesmo. – ele revirou os olhos. – Agora vamos logo porque você tem horário marcado.

 Edward passou por mim, que estava estática ainda tentando processar o que ele acabara de falar. Vendo que eu não me movi, Edward voltou e começou a me empurrar, falando que íamos a um salão de beleza para que eu pudesse cuidar do cabelo, pele, unhas... Deus, ele estava mesmo disposto a fazer um up total em mim. Enquanto seguíamos para lá, eu fiquei pensando na forma em que conseguiria o dinheiro para pagar Edward, pois como eu disse, não o deixaria pagar coisas que eram minhas agora.

 No salão de beleza, assim que nós chegamos eu fui atendida e já encaminhada para fazer hidratação de cabelo. Enquanto isso, eles fizeram minhas unhas dos pés e das mãos. Eu estava ridícula com uma toca rosa na cabeça e aquelas duas mulheres do meu lado, mas tentei relaxar. Edward não estava ali, ele falou que precisava ir a um lugar resolver umas coisa e que logo estaria de volta. Depois eu fiz limpeza de pele, e então veio a pior parte de todas: a depilação. Aquilo tudo foi uma tortura horrível, mas eu consegui sair viva. Dolorida, sem a pele, mas viva. Então, o cabelereiro afeminado me levou até uma parte com um espelho enorme que ia de um canto ao outro, e havia cadeiras de frente ao espelho, que tinha prateleira cheia de coisas.

 E eu vi ali, diante dos meus olhos arregalados, ele cortar meus cabelos que iam até um pouco abaixo do meio das costas. Meu coração apertava a cada mexa que ele cortava com sua tesoura afiada com strass rosas. No meio de tudo, ele me virou de costas para o espelho – vendo as lágrimas nos meus olhos – e continuou a pior das torturas – pior até que a depilação. Foram mais do que uma hora ali até então ele parar na minha frente e começar a dar pulinhos de felicidade.

 – Ah, ficou uma merda, foi? – decidi brincar e ele gargalhou.

 – Never, baby. Eu sou uma puta de uma milagreira, ficou foi lindaaaaa. – ele falou animado e eu soltei uma risada. – Agora, vamos para a make-up.

 Então apareceu uma mulher pequena e de cabelo cortado chanel com uma maleta prata. Ela começou a me "pintar" e foram mais uns quinze minutos até ela se afastar sorrindo brilhantemente para mim.

 – Você está linda, querida. – falou carinhosamente e eu corei.

 O cara afeminado voltou e deu mais uns pulinhos animados, e então finalmente parou atrás da minha cadeira e me fez virar. Hoje poderia ser considerado o dia das surpresas, porque mais uma vez eu fiquei de queixo caído a me ver completamente e estupidamente diferente... E pelo menos um pouco mais bonita – pois ninguém fazia milagre em mim. Os olhos castanhos chocolate se destacavam com a maquiagem escura e negra, com uma leve tonalidade de roxo platinado. A boca estava um pouco avermelhada, mas nada parecendo uma vadia. As bochechas já naturalmente rosadas estavam com uma tonalidade puxada para pêssego. E a pele... Parecia tão macia e leitosa. E o cabelo... Estava desfiado – totalmente desfiado -, batendo no meio das costas e revolto, como se eu tivesse andado de moto com o vento batendo ali.

 – Oh meu Deus... – sussurrei, tocando minha bochecha.

 – Eu disse que você estava linda. – a mulher falou. – Seu namorado vai adorar quando vê-la.

Namorado? Olhei para ela sem entender nada, afinal, eu não tinha namorado. Mas então eu me toquei que eu tinha entrado aqui com Edward, e ela deveria ter supondo isso.

 – Ah, não... Não... Ele não é meu namo...

 – Bella! – Edward apareceu do outro lado do espelho, com um sorriso enorme. Ele soltou um assobio. – Você está linda.

 – Er... Obrigada. – murmurei totalmente constrangida e mais uma vez corando.

 Edward me ajudou a descer da cadeira e nós seguimos para o caixa, aonde tivemos uma pequena discussão sobre quem iria pagar. Dessa vez eu ganhei, e falei para ele que as roupas eu também iria pagar. Antes que ele protestasse, o sai puxando pela mão para fora do salão, com um pequeno aceno para o cara afeminado que eu nem perguntara o nome. Seguimos para o carro.

 – Agora me diz Edward... Para que tudo isso? – decidi perguntar, enquanto me divertia com uma linha solta da minha blusa de lã. – Quero dizer, roupas caras, salão de beleza...

 – Vamos sair hoje, Bella. – ele disse casualmente, olhando para frente. – Vamos ter uma noite bem animada.

 O olhei sem entender nada, mas Edward não explicou. Dez minutos depois eu percebi que não estávamos indo para a saída da cidade, e sim entrando ainda mais nela.

 – Para onde estamos indo agora? – perguntei e Edward deu de ombros. – Ah, ótimo. – murmurei ironicamente e revirei os olhos.

 Para minha surpresa, Edward nos levou primeiro a um restaurante para almoçarmos atrasados e depois para um hotel, aonde ele já tinha pagado por um quarto com duas camas de solteiro. Assim que entrei no quarto, que não era nem tão pequeno e nem tão grande, joguei as sacolas ao lado de uma das camas e me joguei nela, afundando e depois voltando com o colchão.

 – Estou cansada. – murmurei com a voz sonolenta.

 – Caramba, mas já? – ele perguntou divertido, se jogando na outra cama. – Então é melhor descansar porque acho que hoje você não dorme cedo... Ou melhor, você vai dormir cedo.

 O olhei interrogativamente, mas fui ignorada por ele, que fechou os olhos e respirou fundo, com um sorrisinho divertido nos lábios. Eu encostei minha cabeça no travesseiro e encarei o teto do quarto, que era de um bege claro, assim como as paredes. As cortinas – também de um bege – estavam fechadas, balançando com o vento e deixando o quarto escuro apenas com uma pouca luz do lado de fora. Havia uma pequena TV de tela plana colocada na parede, e uma mesinha abaixo dela, com um pequeno vaso de flor, aonde habitava uma única rosa vermelha. Mais ao lado tinha uma penteadeira grande sem nada, apenas com um espelho – também grande – e redondo. Ao lado da minha cama – do contrário da outra cama – tinha uma porta, que eu sabia que era o banheiro. Entre as duas camas tinha um pequeno criado-mudo com um rádio relógio e o celular de Edward.

 Soltei um suspiro.

 Eu ainda não entendia aonde ele queria chegar fazendo toda essa mudança em mim, digo... Eu não era burra para saber que aquela mudança toda não fazia o bem exatamente como o bem de Edward. Deixava-me bem – ou um pouco -, mas não era bom e não limpava a alma. Sabia que as pessoas ainda se afastariam de mim por causa do meu jeito, não importando a minha roupa. E bem... Como Edward poderia mudar uma máquina com defeito? Pois era isso que eu era, uma máquina defeituosa, pois só sabia fazer as coisas erradas. Mudar minha roupa não faria minha mãe voltar...

 Dei uma pequena olhada em Edward, que tinha a respiração lenta, como se ele tivesse adormecido. Aos poucos fui fechando meus olhos, querendo também tirar uma soneca antes do que quer que nós fossemos fazer.

 Eu saí do banheiro enrolada em uma toalha, dando com o quarto vazio. Minha roupa estava esticada em cima da cama, com o par de botas ao lado. Edward havia saído para que eu pudesse me trocar, e eu só queria saber onde ele estava agora que também precisava tomar banho e se trocar. Eu acho...

 Desenrolei a toalha do meu corpo e a joguei para o lado, ficando apenas de calcinha e sutiã. Peguei o vestido vermelho e o vesti, vendo no espelho que ele continuava ficando bonito em mim, e não era apenas ilusão no espelho da loja. A maquiagem continuava intacta, assim como o cabelo. Me virei novamente a cama, e foi então que eu percebi que tinha uma pequena sacola de papel rosa ali e estava escrito Victoria’s Secrets. Peguei a sacola e vi que dentro tinha um creme rosa e um perfume com o vidro transparente. Mais uma vez Edward tinha comprado algo – provavelmente quando me deixou sozinha no salão – e eu não pude me defender e pagar. Ele era um cretino maldito que jogava sujo.

 Sentindo uma falsa raiva dele – para esconder a felicidade – eu abri o creme e senti logo um delicioso cheiro adocicado invadir minhas narinas. Não era algum cheiro que eu já tenha sentido, mas me lembrava de um... Não, me lembrava duma deliciosa tarde de domingo com sol, mesmo eu nunca tendo passado por um dia assim. Passava uma sensação quente e ao mesmo tempo dava vontade de comer. Eu não sabia explicar exatamente como era o cheiro, mas era doce. Sem nem pensar, eu passei o creme nos braços e nas pernas. Se Edward queria que eu usasse, eu iria usar.

 Coloquei as botas e fiquei em pé, vendo minha falta de equilíbrio mais uma vez dar o ar da graça, fazendo meus pés dar uma balançada. Arrumei minha postura e arrisquei um passo à frente, e novamente veio a balançada como um vento soprava uma madeira em falsa, só que eu não caí. Arrisquei outro passo e então mais outro, até dar uma volta no quarto e vê que eu não cairia. Sorrindo para mim mesma, eu voltei até a cama e peguei o perfume, encantada com o minúsculo frasco em minhas mãos. Assim como aconteceu com o creme, assim que abri, fui tomada pela fragrância mais deliciosa que eu já tinha sentido. Era como lilás, laranja e morango. Uma mistura também doce, sem explicação. Era floral. Tão...

 Ouvi o barulho da tranca e segundo depois Edward entrou no quarto, com outra roupa e com os cabelos molhados. Ele estava com a cabeça abaixada quando entrou, e só me viu ali parada no meio quando fechou a porta e virou. A surpresa em seus olhos foi grande, e ele demorou alguns segundos para demonstrar alguma coisa. Ele sorriu. Aquele sorriso lindo e fofo que ele tinha que também sabia ser sedutor.

 – Oi. – murmurou, me olhando de cima a baixo. – Está linda.

 Eu apertei minhas mãos uma nas outras – com o perfume ainda ali – e mexi o pé, constrangida. Sentia meu rosto quente como se pegasse fogo, e eu quis me bater por começar a corar com um elogio. Mas o problema é que eu não recebia elogios, principalmente de garotos, ou melhor, de ninguém. E hoje foi o que mais recebi só que ainda não sabia lidar com eles. E mesmo se soubesse, eu sentia que sempre iria corar com um elogio de Edward. Era impossível, porque mesmo em silêncio ele conseguia fazer isso comigo. Eram seus olhos penetrantes que mesmo já sabendo alguma coisa sobre mim, mesmo vendo o físico, insistiam em ver por dentro também, atravessar minha alma.

 – Obrigada. – murmurei baixinho. – Você também está... Bonito.

 Eu tinha dado a rápida olhada nele assim que entrou pela porta. Edward usava uma calça jeans de lavagem escura, uma camiseta branca que parecia fina e leve demais, e uma jaqueta de couro preta, assim como o tênis. Aquele jeito totalmente dele, do anjo rebelde.

 – Valeu. – ele sorriu sem constrangimento algum. – Tenho um presente para você, garota.

 – Mais um? – perguntei ironicamente. – Já não está bom de Christian Louboutin e Victoria’s Secrets?

 Edward soltou uma risada gostosa e se aproximou de mim, parando atrás e colocando as mãos nos meus ombros. Senti uma quentura e formigamento aonde ele tocava seus dedos quentes aquecendo o lugar em contato. Era uma sensação tão boa. Ele me empurrou até ficar de frente a grande penteadeira. Vi nosso reflexo ali. Eu admitia que não parecesse eu ali, e sim uma das amigas de Tânia Denali. Uma bonequinha. Sorri com esse pensamento, lembrando que Edward me chamava assim. Ou mais ou menos.

 Ele estava ali atrás de mim, parado, observando. Edward era pelo menos uns quinze ou vinte centímetros mais alto do que meus 1,65. Ele podia encostar seu queixo na minha cabeça e ainda ficaria um pouco curvado. Mas ele não fazia isso, estava um pouco para o lado, fazendo a imagem até parecer uma foto. Eu percebi que ele também era branco, só perdia alguns tons para mim, que mais tinha a pele translucida.

 Vendo meu sorriso, Edward também sorriu de forma carinhosa.

 – Eu gosto do seu sorriso. – ele disse, apertando levemente meus ombros. – Parece que você carrega uma coisa tão linda dentro de você.

 – Está enganado, Edward. Mais uma vez você vê errado algo referido a mim. – sussurrei.

 – Ou você não se vê claramente, Bella. – Edward tirou uma mão do meu ombro e colocou no bolso da calça, e depois ele a tirou tendo presa entre os dedos uma corrente. – Espelhos não são o suficiente, não se pode ver só o exterior. As pessoas fazem da beleza exterior uma coisa importante, mas não é isso que as fazem ser amigas, amar ou ser feliz. Afinal, com poderia ter o companheirismo, a confiança, ou as risadas sendo que apenas vê a beleza? É isso, Bella, que você tem que perceber. E você é linda tanto por dentro, quanto por fora.

 Enquanto Edward falava, ele colocou a pequena corrente de ouro em mim. Levei minha mão até ela, tocando-a com as pontas dos dedos. Seu pequeno pingente delicado tinha o um formato redondo preto e dentro dele havia uma pomba de ouro. Parecia aquele símbolo que encontrava no chão da sala principal da Casa Branca com a águia. Era fino, como se apenas o toque fosse quebrar.

 – Porque isso? – perguntei baixinho.

 – Bella, o que mais você procura na sua vida? Porque você foi lá naquele penhasco? – os olhos de Edward ganharam uma dor quando ele falou "penhasco", mas logo sumiu esse sentimento.

 – Paz. – murmurei, olhando para ele através do espelho.

 – Eu espero que ele te ajude a encontrar isso. – ele sussurrou com os lábios muito perto da minha nuca. Seu hálito quente bateu ali, fazendo meus pelinhos se arrepiarem e uma onda de nervosismo atacasse. – Eu só quero o seu bem, Bella.

 Então tão delicado como só ele sabia me tratar, Edward encostou os lábios na pele do meu pescoço, na parte atrás da orelha, e demorou alguns segundos para se afastar. De olhos arregalados e com o coração querendo sair pela garganta, eu o encarei pelo espelho, dando com os olhos verdes dele. Tinha algo ali que eu não conseguia entender. Parecia um carinho grande com algum desespero que não fazia sentido nenhum para minha cabeça. Como alguém que não me conhece totalmente podia ficar desse jeito?

 Ok, talvez eu entendesse... Porque me doía imaginar Edward saindo da minha vida naquela hora. Era doloroso e angustiante demais.

 Me virei de frente para ele e lhe dei um abraço, enterrando meu rosto em seu peito. O que quer que Edward tenha feito para eu ficar daquele jeito, eu não me importava nem um pouco. Eu adorava como ele se importava comigo, mesmo sem nem me conhecer direito, sem saber a má pessoa que eu sou. Talvez ele só estivesse iludido por uma Bella que tenha criado na própria cabeça, uma boa, mas isso porque ele não sabia nem da metade das coisas. E quando soubesse, claro que ele iria querer terminar com aquilo logo, então eu aproveitaria esse Edward que me da o carinho que eu nunca ganhei de ninguém.

 Edward retribuiu meu abraço de forma apertada, como sempre fazia, passando aquela sensação de que eu tinha alguém ali comigo, para qualquer coisa.

 – Obrigado, Edward. – murmurei. – Por fazer essas coisas por mim.

 – Não precisa agradecer, Bella. Eu já disse que sempre estarei aqui por você, e isso não é uma coisa a qual me sinto obrigado a fazer porque você quase se matou. É por que... – e então ele parou no meio da frase, puxando fundo o ar e soltando lentamente. Seus braços se tornaram apertados em volta de mim. – Acho que está na nossa hora de ir.


 Eu estava impressionada em ver como Seattle era brilhante à noite. Em toda a minha vida medíocre, eu nunca tinha vindo aqui nessa hora. O máximo que eu tenha vindo aqui fora umas duas vezes e não foi exatamente a Seattle, e sim apenas passei de carro, rápido. Forks não era o que se podia chamar cidade luz, pois era pequena e não havia prédios altos lá. Eram poucas as luzes, pois as casas ficam um pouco distantes. Além de ela ser pequena. E eu só via essas cidades brilhantes pela TV nos filmes que assistia. Nova Iorque... Paris... Londres... Rio de Janeiro...

 – Aonde nós vamos? – perguntei para Edward mais uma vez.

Mesmo eu estando insistindo nesse assunto, eu não conseguia despregar meus olhos da cidade. Eu não duvido muito que se me distraísse eu iria enfiar minha cara na janela e ficar igual aquelas criancinhas dos filmes quando estão impressionadas com alguma coisa. Eu até queria fazer isso para ver ainda mais de perto, só que não pagaria esse mico na frente de Edward.

 – Bella, eu já falei para você relaxar que vai ser legal. – ele colocou a mão na minha coxa, um pouco perto do joelho, aonde o vestido não cobria. Fingir não perceber que eu fiquei arrepiada, assim como ele.

 – Eu estou relaxada. – finalmente me virei para ele, que tinha um mínimo de um sorriso nos lábios. – Só estou um pouco curiosa para saber o porquê dessas roupas... Dessa produção toda.

 – Logo você vai saber, querida.

 Fiquei o encarando por um tempo, repetindo mentalmente o “querida” doce e carinhoso que ele soltou. Talvez sem perceber, ou talvez porque é assim que ele fala, mas era tão caloroso. Tudo em Edward passava isso, como estar em uma casa quentinha e com proteção de um caixa forte.

 Eu prestava atenção nas ruas ainda quando ele entrou em um estacionamento subterrâneo, passando por vários carros que estavam parados lá. Não deixei de notar que todos eram caros, como o Volvo que Edward dirigia. Ele parou perto do elevador, e abriu a porta para mim, me ajudando a sair do carro. Seguimos calmamente para o elevador, e ele apertou o botão do ultimo andar.

 – Eu ainda não sei para onde estamos indo... – cantarolei, me olhando pelo espelho que tinha na porta.

 – Espera só mais alguns minutos, Bella. – ele disse, rindo. – Você vai gostar... Eu acho.

 – É algum tipo de restaurante caro, Edward? Porque hoje do jeito que você anda... – torci a boca em desagrado, e ele continuou rindo.

 – Não. Não é nenhum restaurante caro. Não precisa se preocupar. – passou um braço por cima do meu ombro.

 Eu olhei para cima, vendo que estávamos quase no vigésimo andar, que era aonde íamos descer. Bati o pé impacientemente no chão, fazendo Edward soltar uma risadinha. Foi mais um andar até a porta se abrir e eu arregalar os olhos. – Seja bem vinda, Bella, a Party Spirit.

Eu conhecia bem o que era a Party Spirit e sabia que apenas os vips entravam ali. E quando eu digo vips, quero dizer pessoas com muito dinheiro e com estilo. Como Tânia. Agora... Como Edward podia me levar ali?

 Estávamos nada mais nada menos que na cobertura do prédio, que, diga-se de passagem, era bem alto. O lugar estava escuro, com aquelas luzes verde, amarelas, vermelhas e azuis apontando para todos os lados, deixando o lugar com cara de balada. Também tinha uma luz branca, que piscava rápido, deixando os movimentos das pessoas nas pistas de dança ainda mais dançantes. Não dava para ver muita coisa, mas com o pisca-pisca de luzes, se via que havia muitas pessoas ali, dançando, bebendo, se beijando... Estava uma loucura como uma festa de série adolescente. Eu era baixinha, e precisei me esticar um pouco para ver o lugar um pouco melhor. De frente para o elevador, que era ainda onde estávamos, estava uma plataforma em cima aonde um DJ com cabeça de Mickey tocava. Ela ficava mudando de cor, do amarelo para o verde, do verde para o azul, às vezes se transformava na bandeira dos Estados Unidos, ou passava o próprio Mickey mesmo. Era ali que estava a maioria das pessoas, pulando e dançando como se não houvesse amanhã. Para o meu lado esquerdo tinha umas mesas penduradas no teto, assim como as cadeiras, aonde as pessoas bebiam e conversavam. E perto dali estava o bar, com seu balcão tendo chamas e atrás dele os barmen bargirl fazendo malabarismos para servir as pessoas. Era divertido de se ver.

 A direita tinha uma parede enorme de vidro, que dava para ver os outros prédios. E eu não duvidava que por fora para ver o alvoroço que estava ali dentro. Para o final tinha uma escada que dava para ver que era de vidro, pois parecia transparente, que subia ainda mais para cima, aonde eu acreditava ser o terraço.

 Parecia até surreal um lugar daqueles, com todas aquelas pessoas bonitas e bem arrumadas, curtindo o domingo em uma animação louca. Eu imaginava que poderia ser assim, mas não exatamente daquela forma. Era tão mais divertido, barulhento e excitante do que qualquer ilusão que eu tenha criado. O clima ali mudava. Não era como pegar uma garrafa de vodca e beber. Ali beber tinha uma coisa a mais. Ou escutar uma música com batida em casa, mesmo alto, ou até com fones. As batidas ali pareciam outras. Tudo ali parecia outra coisa.

 – E então, o que achou? – Edward perguntou alto no meu ouvido, por causa da música.

 – Isso aqui é demais! – falei alto também, com uma animação que nunca havia sentido. – É tudo tão diferente...

 – É, eu sei. – ele sorriu de canto para mim, e eu retribui. – Aonde você quer ir primeiro?

 Olhei para todo o lugar, me sentindo perdida. Até aquele momento eu não tinha parado para pensar o que eu poderia fazer ali. Eu apenas olhei e achei legal e divertido. Mas e agora, o que eu faria para me divertir? Eu não sabia dançar... Eu nunca havia bebido...

 – Eu não sei. – admiti para ele, que balançou a cabeça. – Decide por mim, Edward!

 Ele sorriu abertamente e olhou para frente. Passou uns dez segundos até ele começar a me puxar na direção do bar. Passávamos pelas pessoas que se moviam no ritmo da música, a maioria com copos enormes e de cores florescentes nas mãos.

 Eu reparei em algumas garotas, vendo que elas se vestiam como eu estava. Dava para ver de longe seus vestidos e sapatos de marca. Estranhamente, eu minimamente me senti como se fizesse parte dali. Mas eu sabia que não fazia, porque aquele estilo não era o meu. Estava assim apenas por um dia... Ou melhor, por uma noite.

 Paramos no bar, arranjando dois bancos que ficavam ali.

 – E então, Bella, o que vai querer? – Edward perguntou e eu o encarei com tédio. – O que?

 – Olha para mim, Edward, e me responda: tenho cara de quem sabe o que tem aqui?

 Edward gargalhou alto e passou a mão carinhosamente no meu braço, concordando comigo de que aquele lugar provavelmente era daqueles que eu nunca tinha visitado na minha vida. Ele chamou um barman e pediu uma bebida com um nome estranho. Eu fiquei admirada com a destreza e a coordenação do cara ao jogar as garrafas para cima, fazendo malabarismos. Ele colocou dois copos na nossa frente, dando uma piscadela para mim, e um sorriso um tanto sedutor.

 Eu fiquei parada, não acreditando no que tinha acabado de acontecer. Nunca, nunca mesmo, nenhum cara tinha feito aquilo para mim. Digo... Nenhum sequer me olhou com interesse. Não um cara tão bonito quanto ele. O barman era lindo, mesmo não dando para ver ele direito com aquelas luzes fracas. Mas seu sorriso com certeza era encantador. Só não conseguia passar de um...

 Balançando a cabeça, eu peguei meu copo e levei aos lábios. Um cheiro forte de álcool invadiu minhas narinas, chegando ao meu cérebro. Eu senti uma leve tontura e enjoou com o cheiro, mas de alguma forma, eu não estava realmente enjoada. Tomei um golinho, não sentindo muito o gosto da bebida. Decidi tomar um longo gole. Foi então que me arrependi, porque a bebida desceu rasgando e queimando pela minha garganta, quase querendo voltar. Bati o copo no balcão com força, xingando um “porra” bem baixinho e bem na mesma hora chamas subiram dali, fazendo eu me assustar. Com os olhos arregalados, olhei para Edward, que tomava sua bebida em goles apressados, como se ele precisasse daquilo. Ergui uma sobrancelha para ele, mas parecia que ele não estava me vendo ali. Fiquei impressionada com a facilidade que ele tomou aquilo tudo, sendo que queimava demais.

 Edward também bateu o copo com força no balcão, e mais chamas subiram, só que dessa vez eu não me assustei. Não em parte... Ainda dei um pulinho no banco. Voltei minha atenção para ele, que parecia estar respirando fundo. Seus olhos mirados no barman que tinha nos atendido.

 – Edward? – chamei-o, que se virou para mim, sorrindo. – Ahm... Está tudo bem?

 – Claro! – ele falou animado. – Quer mais? – perguntou, apontando para o meu copo ainda cheio.

 – Er... – olhei para o liquido rosa no copo e fiz uma careta.

 – No começo é ruim mesmo. – Edward disse vendo a minha cara. – Mas depois do terceiro gole, fica gostoso.

 – Você só tomou um gole. – ironizei.

 – Mas já dei os três primeiros há muito tempo. – ele piscou um olho. – Vamos lá, Bella, você quer se divertir!

 Encarei o copo mais uma vez e assenti com a cabeça, pegando o tomando outro gole. E então mais outro. Foi no fim já da bebida que eu comecei a gostar daquilo. Ele era um pouco doce, mas tinha um amargo que fazia eu automaticamente fazer careta. Mas fora isso, era gostoso demais. Edward pediu mais uma dose para cada um daquilo, e com os copos divertidos – em formatos de taças gigantes só que coloridos – seguimos para a pista de dança, que estava lotada.

 – Agora, Bella... Nós vamos dançar.

 Edward pegou minha mão e me rodou, fazendo um pouco da minha bebida pular do copo. O encarei de olhos arregalados, e ele me lançou um sorriso aberto.

 – Eu... Eu não sei dançar. – admiti para ele, que riu. – Edward, isso não tem graça! – soltei minha mão da dele, com raiva.

 – Eu não estou rindo de você não saber dançar, Bella. – Edward passou um braço pela minha cintura, me trazendo para bem perto dele. – E sim de você se preocupar com isso, ainda.

 Ele começou a se mover lentamente, seu corpo levando o meu junto naquele ritmo que não batia certo com a batida animada da música. Apesar de eu ter um seguimento, não conseguia ter a mesma leveza que Edward. Pareciam robótico e forçado os movimentos.

 – O que você quer dizer com o "ainda"? – perguntei.

 – Bella, relaxa o corpo, por favor. – pediu, tomando um longo gole da bebida. Sua mão se movia carinhosamente nas minhas costas, para cima e para baixo, como se ele quisesse me acalmar. – Eu disse ainda porque você está bebendo, e quando a bebida subir para a sua cabeça, não vai mais nem ligar para isso.

 Edward me apertou ainda mais a ele, e seus movimentos aceleraram um pouco.

 – Essa eu duvido muito. – ironizei, erguendo uma sobrancelha. – Essa bebida é ruim demais para eu ficar bêbada.

 – Ah é? – ele parou e seu sorriso se abriu ainda mais. – Então vamos ver agora. Tome isso tudo de uma única vez.

 – Eu não. – fiz uma careta. – Se já queima a garganta com goles, imagina tomar tudo de uma vez só.

 – Ah, Bella, vamos lá! – ele fez um biquinho e eu neguei com a cabeça. – Isso não vale! Tem que se divertir, Bella.

 Olhei mais uma vez para o copo e depois para ele, que mexeu as sobrancelhas em forma sugestiva. Então, com coragem e me preparando para a bebida ruim que tomaria, eu levei o copo até os lábios e tomei tudo em um só gole. Senti o álcool descer rasgando pela minha garganta, e logo uma sensação horrível de que por onde passava, ele deixava rastros de fogo, queimando. Isso até meu estomago. Eu pude sentir passar o caminho inteiro até lá. Não evitei a careta, e nem a vontade de querer colocar tudo para fora. Edward percebendo, começou a gargalhar e me fez continuar dançando – ou o que ele chamava de dança.

 – Isso é horrível! – falei alto para ele, quando a queimação passou.

 – Eu sei. – disse, sorrindo. – Mas pensa por um lado bom agora você vai se divertir ainda mais.

 – Duvido muito. – murmurei e ele balançou a cabeça.

 As pessoas ao nosso lado se agitavam em grupos, dançando até suar. Uma garota ao nosso lado dançava sozinha, ela se mexia de forma lenta – ao contrário da música – e de olhos fechados. Suas mãos subiam e desciam pelo seu corpo, como se ela se auto modelasse. Com as luzes coloridas eu via as gotículas de suor que se acumulavam na testa, na raiz dos cabelos e até pelos braços. Ela parecia estar absorta do mundo barulhento que se encontrava, e perdida em seu próprio mundo. Ela mexia os lábios rápidos, como se cantarolasse, indicando que não estava tão longe assim dali.

Como ela conseguia fazer aquilo?! Como ela conseguia se perder no meio daquela bagunça, sem se importar em ser empurrada? O que a fazia ser levada de tal forma que sua dança mais parecia de um show de balé?

 – Bella, agora você vai saber o que é diversão. – Edward falou no meu ouvido, me fazendo encara-lo, e para minha surpresa, ele tinha mais dois copos na mão, cheios.

 – De onde você tirou mais? – perguntei.

 – Com o garçom. – ele apontou com o dedo para um cara sem camisa e com gravata borboleta, levando na mão uma bandeja com copos coloridos cheios e vazios. – Agora, vamos curtir!

 Edward falou para eu beber novamente tudo em um gole, que a partir de agora ficaria mais fácil, pois jaz sabia o que era álcool. E foi exatamente como ele disse, eu bebia mais rápido e apreciava o gosto doce e meio amargo ao mesmo tempo. Depois do segundo copo, mais vieram, e logo eu me percebia animada o suficiente para tentar mexer meu corpo como as pessoas dali. Eu não sabia nem um pouco dançar, mas eu sentia que podia estar arrasando ali com movimentos nunca feitos por mim. Edward estava sempre do meu lado, dançando e pulando comigo. Agora eu entendia porque as pessoas ali dançavam como se não houvesse amanhã: porque realmente isso não seria mais a mesma coisa no outro dia, então aproveitar ao máximo aquela adrenalina que fazia o sangue bombear tão rápido a ponto de bater nos ouvidos era a melhor e mais produtiva coisa que se podia fazer ali. Aquela adrenalina era tão única, tão prazerosa, tão distante da adrenalina de querer se atacar de um precipício.

 Mais copos e mais copos vinham, um atrás do outros, e eu não pegava mais com Edward. Tudo que eu bebia era eu mesma que conseguia. Edward até tentava me frear, mas uma reclamada, um choramingo e umas empurradas para ele voltar a dançar fazia-o esquecer e aproveitar o que ele mesmo planejara. Fiz amizade ali também – até o ponto em que eu ainda me encontrava consciente – e até dei meu número de telefone para alguns amigos. Mas o que eu mais fazia ali era dançar, dançar e dançar. 

 A tal garota que eu olhava antes ainda continuava ali no meio da pista, dançando sozinha, absorta. Eu me aproximei dela e tentei dançar como ela, mas eu não conseguia. Não conseguia me perder em um mundo maluco como ela se perdia. O meu negocio ali era se movimentar o máximo que podia, com a maior animação que encontrava dentro de mim.

 Uma hora Edward avisou que ia ao banheiro e pediu – ou implorou – para eu não sair de onde estava, pois ele voltaria logo. Eu concordei com a cabeça, sabendo que não teria para aonde ir, se a melhor parte da festa se encontrava ali, na pista de dança. Com um beijo na testa, ele se foi, me deixando ali. Enquanto dançava sozinha, eu sorria comigo mesma, não acreditando que a vida poderia dar aquela sensação maravilhosa.

 Onde eu estava que nunca experimentara?

 Eu não conseguia acreditar que tinha me prendido tanto a uma vida medíocre e cheia de tristeza sendo que eu podia me divertir daquela forma. Podia muito bem ter fugido de casa e aproveitado essa vida. Eu era tão estupida e ridícula para me prender em algo que só me afundava, me levando para o fundo do buraco. Mas agora as coisas iriam mudar. Eu iria fazer mais disso, iria beber, iria dançar, eu iria aprender a viver. Edward tinha conseguido, ele tinha-me liberto daquela vida e agora eu não era mais a Bella depressiva. Mas... Espera!... Se ele havia conseguido, isso significava que ele agora podia ir embora, pois a sua "missão" estava cumprida.

 Eu parei de dançar, sentindo uma forte dor no peito.

 Edward não podia me deixar. Mas ele iria, assim que conseguisse me livrar da grande tristeza. Eu sabia que isso iria acontecer, só que não queria que fosse tão cedo assim. Queria que demorasse por muito, muito tempo ainda. Talvez para sempre, se fosse possível. Ter Edward ali do meu lado era a melhor coisa que havia acontecido comigo, e só de pensar – e saber – que ele era apenas algo passageiro fazia uma dor enorme no meu peito me consumir.

 – Hey, Bell, você está bem? – um par de sapatos altos, negros e brilhantes apareceram na minha frente, me fazendo perceber que eu tinha me abaixado um pouco.

 Eu levantei e encarei a... A... Deus, como era mesmo o nome dela?! Eu não lembrava, mas era uma loira que tinha olhos extremamente azuis que até pareciam superficiais como lentes de contatos, mas ela havia jurado para mim de pés juntos que eram verdadeiros quando eu me enturmei com sua roda de amigos. A garota loira colocou uma mão no meu ombro e deu um aperto leve, sorrindo animadamente para mim.

 – E então, você está se sentindo bem? – perguntou novamente.

 Olhei para os lados vendo que todos continuavam dançando e pulando. Voltei minha atenção para ela e neguei com a cabeça, sentindo meus olhos doerem com as lágrimas que queriam sair.

 – Eu estou triste. – admiti para ela, que mudou de expressão completamente para uma solidária.

 Ela começou a me puxar para fora da pista de dança e eu me deixei ser levada, pois com aquela tristeza que eu me encontrava eu não sentia mais aquela vontade de dançar como antes.

 – Hey... Hey... Garota, o que foi? – perguntou quando entramos no banheiro feminino.

 Ali tinha apenas duas garotas que se olhavam no espelho enorme, retocando a maquiagem.

 – Eu... Eu estou com medo.

 – Do que?

 – De Edward.

 – Seu namorado?

 Silêncio.

 – De onde você tirou que ele é meu namorado? – perguntei, desviando os olhos dos dela.

 – E não é? – ela ergueu uma sobrancelha. Eu neguei levemente com a cabeça. – Caramba, e o que você está fazendo ai perdendo tempo? Um gato daqueles e tão na sua e você não tem nada de nada com ele?

 – O... Que?

 – Deixa de ser sonsa, Bell, por favor. – a loira se virou para o espelho e limpou um borro do batom que era imperceptível. – Volta lá para aquela pista de dança e agarra aquele gato que está contigo.

 Olhei para meu reflexo no espelho vendo que eu ainda continuava com tudo intacto. Ou melhor, quase tudo, porque meu cabelo estava um pouco bagunçado e suado, mas nada que precisasse arrumar. Era até um bagunçado legal. Mas ver que eu ainda continuava "bonita" não me faria fazer o que a garota loira falava.

 – Eu não tenho coragem. – murmurei.

 – Ah, que bobagem! – ela bufou, mas sorriu. – Então é isso? Falta de coragem?

 Assenti.

 – Não é um fator importante a coragem na nossa vida? – questionei.

 – Claro que é. E também é uma coisa que pode ser resolvida facilmente.

 – Como?

 A loira se aproximou de mim e pegou minha mão, me puxando para fora do banheiro. Nós seguimos para na direção do bar, aonde ela sentou em um banco e eu ao seu lado, e pediu ao barman duas bebidas com nomes estranhos. Assim que ele trouxe, a garota loira tirou uma carteira da pequena bolsa que carregava, e de dentro da carteira pegou um comprimido.

 – Aqui está à solução dos seus problemas, Bell.

 Eu podia ficar presa em casa, ser uma garota bobinha que acredita em amor por causa dos muitos livros que lê, mas não era trouxa nem ignorante a ponto de não saber de cara o que era aquele comprimido. Eu sabia, e muito bem, e também sabia que não era certo. Só não conseguia acreditar que uma garota como aquela – tão linda, de atitude, tão... Tânia – pudesse andar com e usar esse tipo de coisa. Afinal para que? Ela tinha dinheiro, era bonita, sabia se divertir sã. Não havia lógica. Era algo intrigante.

 – Eu... Eu não... – comecei a negar, mas ela gargalhou alto me cortando.

 – Deixa disso, Bell. Isso aqui não é algo perigoso nem nada. É só um remedinho pra animar e dar coragem. Não precisa se preocupar. É tão seguro quanto qualquer bebida, gata.

 Sem nem esperar eu falar nada a garota loira abriu o comprimido e colocou um pouco do pozinho dentro da minha bebida e o resto na dela. Eu vi pelo copo transparente o pó descer passando pelos borbulhantes da bebida até chegar ao fundo, onde ficou. Encarei mais uma vez a garota que tomava sua bebida em um gole só e depois sorria ainda mais abertamente assim que terminava.

 – Vamos lá, Bell, beba! – incentivou. – Eu lhe prometo que você vai se sentir ótima e amanhã ainda vai se lembrar de tudo.

Shake It Out – Florence + the Machine (The Weeknd Remix) (http://www.youtube.com/watch?v=utZ7ahphZpM)

 Olhei dela para o copo, indecisa em acreditar ou não. Edward me deixara beber porque me falara que não fazia mal quando se bebia com consciência. Mas ali estávamos falando de comprimido, não de bebida – mesmo esse comprimido reagindo como bebida, como a garota loira disse. Eu estava ali para me animar e curtir, só que com minha linha de pensamentos em Edward me deixando não estava mais me dando tanta animação. O que com certeza ele perceberia e iria embora. Isso tudo significava que eu estragaria a festa dele, e eu não queria fazer isso. Desde que entrei aqui falei para mim mesma que não estragaria nada dessa vez e faria tudo que fosse bom para ele, então... Se eu teria ainda o controle de mim e me lembraria de tudo, o que custava?

Nada!

 Eu peguei o copo e em um só gole tomei toda a bebida. Ela desceu rasgando pela minha garganta, essa era ainda mais forte do que as outras que eu havia tomado. Senti tudo começar a esquentar com mais álcool que eu tomava, logo chegando aquele estado de calor e enjoo fraco na boca do estomago. Ao meu lado a garota loira batia palmas, feliz por eu ter aceitado e tomado. Eu sorri para ela, sabendo que agora as coisas seriam ainda melhores.

 – Vamos dançar! – ela falou alto já pulando do banco e me puxando para a pista de dança.

 Empurramos as pessoas até chegar o mais perto possível das caixas de sons e do DJ. Assim que achamos um bom lugar, a garota soltou minha mão e começou a se mover rápido no ritmo da música, e eu a acompanhei, dançando e pulando. Eu sentia algo me levar como se não fosse eu mesma controlando meus movimentos. Uma destreza tomava conta de tudo, e eu me sentia flutuar. Cantar o mais alto junto com a música não parecia suficiente para diminuir tanta animação que eu sentia crescer cada vez mais. A garota, que uma hora gritou por cima da música para mim que seu nome era Ellen, pois eu soltei sem querer outro nome, também estava tão ou mais animada que eu.

 Aquela euforia toda foi crescendo ainda mais até chegar a um ponto que eu só queria dançar mais. Meu coração parecia que iria sair do meu peito de tão rápido que batia. O suor que se acumulava na minha testa, nuca e clavícula não me incomodava em nada. Nem o calor absurdo que eu sentia. Na verdade todas aquelas sensações eram prazerosas, me fazia me sentir poderosa, sensual e única.

 Aos meus ouvidos a música foi diminuindo de ritmo até chegar ao lento, e eu me movi junto. Meus braços subiam e desciam pelo meu corpo como se tivessem vida própria. Eu estava expondo o que eu sentia. Não me importava que a pista inteira pulasse em outro ritmo fora do meu, nem na bagunça de gente, eu só queria seguir o balanço que eu ouvia dentro da minha cabeça. Fechei os olhos para assim poder aproveitar ainda mais aquilo que era tão bom. Me sentia como se estivesse novamente naquele penhasco, bem na ponta, mas só aproveitando a brisa fresca, que me dava choque prazerosos contra o calor que consumia meu corpo por dentro. Yeah, eu me sentia queimar por dentro, mas sem ser de forma dolorosa, e sim prazerosa.

 Aquilo era tão bom.

 Agora eu entendia porque aquela garota que eu tinha visto quando cheguei dançava daquela forma. Ela deveria ter tomado aquele comprimido também. Porque eu não descobri isso antes? Deveria, pois não existia nada comparado ao que eu sentia.

 Muito melhor do que só beber e dançar. Melhor do que receber o carinho das crianças do orfanato. Melhor do que sorrir verdadeiramente. Eu podia dizer que aquilo era como estar sendo abraçada por Edward, mas dez vezes melhor. Estar com ele era diferente. As duas coisas eram boas de formas diferentes, e eu queria ter elas para sempre comigo. Queria sentir esse calor que o comprimido havia proporcionado junto do calor gostoso que era estar com Edward.

 – Hey, Bella! – ouvi de longe a voz dele me chamar.

 Abri meus olhos e encarei os verdes de Edward, que estava na minha frente com uma expressão preocupada.

 – Hey! – eu dei meu maior sorriso para ele, para mostrar o quanto estava feliz.

 Ele também sorriu assim que olhou para mim.

 – Eu achei que tinha perdido você, garota. – me abraçou e aquilo me fez gargalhar alto. Era engraçado ele me chamando de garota, fazia eu me sentir pequena. – Porque mudou de lugar? Eu estava lhe procurando como um louco.

 O abracei pela cintura começando a mover meu corpo lentamente e fazendo ele me acompanhar também. Dei de ombros.

 – Queria ficar mais próxima da música. – contei.

 Edward sorriu para mim e começou então a realmente dançar comigo, no meu ritmo lento. Novamente fui levada pelo que eu sentia, não me importando com mais nada, apenas em dançar com Edward, que era o que eu queria, juntar o útil com o agradável. Dançar com Edward era bom, nós parecíamos fazer uma dupla perfeita ali. Eu conseguia me esquecer de tudo e de todos, e só me concentrar em nós. Em um momento que dançávamos, eu estava com as mãos na nuca de Edward e ele com as mãos na minha cintura. Olhar para ele era como uma prioridade, ver em seus olhos que ele gostava de fazer aquilo era bom, pois ninguém nunca havia olhado para mim com o sentimento de que minha presença era agradável.

 – Eu gosto de você, Edward. – falei antes que pudesse segurar minha língua.

 – Eu também gosto de você, Bella. – ele deu aquele sorriso de canto que me fez sorrir também. – E espero que você esteja se divertindo.

 Suas palavras me fizeram rir e muito, o que fez Edward me olhar de forma engraçada, e isso serviu de mais estimulo para eu rir. Era muito engraçado porque Edward não imaginava o quanto eu estava me divertindo ali, como eu estava gostando de tudo aquilo, de ter feito amizades, ter dançado, bebido, até de ter tomado o comprimido.

 – Obrigado, Edward. – agradeci verdadeiramente.

 E novamente sem pensar, apenas agindo pelo calor que me consumia, eu me estiquei na ponta dos pés e lhe dei um pequeno beijo no canto da boca, aonde eu me demorei. Edward ficou parado sem reação alguma por pelo menos uns três segundos, até suas mãos se apertarem fortemente na minha cintura. Eu sorri comigo mesma e me afastei, logo dando as costas para ele e começando a dançar em um ritmo mais animado.

 Edward pareceu voltar a si e me puxou para voltar a ficar de frente para ele, aproximou seu rosto do meu e me encarou nos olhos. Foi então que eu vi sua expressão curiosa e duvidosa passar para entendimento em questão de segundos, e logo para raiva.

 – O que você tomou, Bella?!

 Eu gargalhei.

 – Ué, tudo que você me deu. – dei de ombros.

 – E o que mais você tomou quando eu saí, Bella? – me balançou um pouco o que me fez rir. – Me fala logo!

 Continuei rindo e dei de ombros, querendo me soltar de suas mãos e voltar a dançar. Mas Edward não parecia muito disposto a me soltar, o que era triste porque eu realmente queria dançar agora. Ele ficou me encarando e eu sorri para ele. Aquilo pareceu ser a gota d'água, pois Edward começou a me puxar para fora da pista de dança e quando eu percebi nós já estávamos no elevador.

 Eu me encostei na parede para manter o apoio. Edward estava do outro lado do cubículo com uma expressão não muito boa – o reflexo da minha. Eu queria continuar naquela festa, queria continuar dançando, bebendo e curtindo. Eu não entendia porque ele tinha ficado bravo e decidido ir embora só porque eu tomei algo quando ele não estava. Eu era grande o suficiente para saber o que fazia.

 – Você vai ficar assim? – perguntei baixinho para ele, que bufou.

 – E você quer que eu fique como, Bella?

 – Eu não sei. – dei de ombros, sorrindo comigo mesma ao perceber como ele ficava fofo todo bravo.

 Ele bufou mais uma vez e isso me fez soltar um risinho que logo ficou preso na garganta ao ver a expressão de raiva que ele direcionou para mim.

 O elevador chegou ao estacionamento subterrâneo e nós descemos, seguindo para o Volvo. Mesmo com raiva Edward ainda era um cavalheiro, ele abriu a porta para mim, mas não fechou ela com muita delicadeza. Assim que saímos das redondezas do prédio onde ficava a Party Spirit, eu não aguentava mais ficar em silêncio. Principalmente sabendo que esse silêncio estava sendo causado por Edward estar com raiva de mim.

 – Edward, olha... Eu não bebi nada demais, ok? Só foi uma única bebida lá que Ellen pediu...

 – Quem é Ellen, Isabella?!

 – A garota loira dos olhos azuis que parecem falsos. Quando você saiu, ela veio falar comigo, e então... – travei a língua sabendo que o porquê de Ellen ter me ajudado não era algo que eu queira comentar com Edward. – Ela disse que nós estávamos muito desanimadas, principalmente eu, e fomos beber algo no bar.

 Edward parou o carro em um farol e assim pode me encarar.

 – E o que tinha nessa bebida? – questionou.

 Percebi que não adiantava de nada eu esconder o que realmente eu tomei, pois Edward sabia em apenas olhar para mim, assim como fez lá. Ele andava nesses lugares e com certeza já devia ter visto algo assim. Era muita certeza em sua pergunta.

 – Ela colocou um pozinho de um comprimido. – admiti em um fio de voz.

 Edward ficou me encarando por exatos cinco segundos até sua expressão passar de incrédula para raiva.

 – Mas que porra, Edward! – berrou socando o volante. – Como você pode deixar isso acontecer? Que descuido o meu. Burro! Burro! Burro! – ele falava socando o volante.

 Ele realmente estava com raiva. Na verdade com muita raiva, e não era de mim, era dele mesmo. E aquilo me incomodou muito, pois Edward não tinha culpa de eu ser fácil demais a ser levada, principalmente bêbada. Eu odiava pessoas se culpando dos meus erros. Eu fazia as coisas erradas e tinha que aguentar as consequências, não deixar as pessoas fazerem isso por mim.

 – Para com isso, Edward! – falei alto sobre a briga dele consigo mesmo. – Para! Para! – toquei o braço dele, fazendo-o me encarar. – Você não é culpado por isso, então para. Eu quem estava sendo levada por sentimentos na hora, não foi você quem me fez tomar. Então pare com isso!

 – Mas Bella, eu deveria saber que era perigoso lhe deixar sozinha lá!

 – Você não é vidente, e eu já sou grande, você não tem que ficar de babá para mim. Vamos encarar isso da formar certa. Eu fiz burrada aqui e não você, então pare de brigar e se culpar e comece a brigar comigo, escutou?

 Edward balançou a cabeça e acelerou o carro. Foi então que eu percebi as buzinas atrás de nós por termos parado no farol que agora estava verde. Eu cruzei os braços e encostei-me ao banco, encarando as ruas vazias e escuras. Por ser bem tarde estava quase tudo fechado e apagado, ao contrário do que estava quando estávamos indo. Edward ficou em silêncio e eu o acompanhei, constrangida demais com minha falha para poder falar algo. E também porque se eu falasse, iria chorar.

 Nós voltamos para o hotel e o silêncio ainda se prolongava. Edward entrou e foi direto para o banheiro. Eu soltei um suspiro e segui para minha cama, sentando e tirando a botinha. Mexi meus dedos que estavam vermelhos. Olhei para a porta do banheiro sentindo uma vontade louca de chorar, mas me controlei. Deitei na cama, me cobrindo e fechando os olhos.

 Eu queria muito dormir, mas no estado em que me encontrava essa era missão quase impossível. Ainda sentia a euforia da droga no meu organismo, assim como o álcool na cabeça, e a tristeza junto da raiva de mim mesma eram coisas que me faziam pensar demais. Eu tentava deixar a mente limpa, mas não conseguia. Não quando sabia que Edward estava bravo consigo, comigo, e que estávamos brigados. Queria tanto pedir desculpas, mas estava com medo de que começar assim eu acabasse falando algo errado. Um medo absurdo que me fazia ficar de boca fechada, pois eu sabia muito bem, era uma expert em pronunciar palavras erradas e estragar tudo.

 Ouvi Edward abrir a porta do banheiro, caminhar pelo quarto e deitar na outra cama. Eu estava de olhos fechados, sem coragem de encara-lo. Mas uma hora meus olhos se abriram sem minha permissão e eu dei com os dele, me encarando. Foi então que o olhando diretamente nos olhos, eu não consegui mais controlar e as lágrimas saíram. Edward fez uma expressão triste e ergueu o edredom como um convite para eu me juntar a ele. E foi o que eu fiz, levantei e o mais rápido que podia e me deitei ao lado dele, enterrando meu rosto em seu peito.

 – Me perdoa, Edward. Me perdoa por ter sido tão burra a ponto de usar droga. Eu sei que não devia, mas eu estava triste e a bebida... Não quero você se culpando por um erro cometido por mim. Você não merece alguém como eu, toda errada assim... – solucei alto.

 – Shiiii, Bella, se acalma. – ele pediu com a voz de veludo. – Não fale coisas assim, querida, por favor.

 Eu o encarei.

 – Mas é a verdade, Edward. Eu não sei por que eu estou insistindo em algo que não vai dar certo. Nada para mim foi feito para dar certo. Esse mundo... Ele não é para mim, essa vida que eu vangloriava por achar que era a melhor... É um erro.

 Ele passou a mão carinhosamente nos meus cabelos, tirando os fios que grudaram no meu rosto molhado pelas lágrimas.

 – Bella, esse mundo que você criou na cabeça pode ser certo para você, mas da forma certa. Eu lhe levei lá para você ver como realmente as coisas eram – mesmo que não era para ir tão fundo como você foi. Queria lhe mostrar que é bom curtir um pouco, mas que não é pra fazer disso uma coisa importante na sua vida, como beleza, popularidade. Isso tudo não traz felicidade, e é isso que quero que você aprenda. Esses protótipos de pessoas perfeitas que você criou vendo Tânia não são bons. Essa garota mostra toda a felicidade que ela acha que tem, mas deve faltar algo dentro dela. É tudo muito superficial, me entende? A maioria daquelas pessoas que você viu vive essa vida superficial e acha que é perfeito, mas eles ainda vão entender que falta algo. Sair e curtir são bons de vez em quando, algo que lhe tire um pouco do tédio e da tristeza.

 Eu assenti com a cabeça, sabendo que no final disso tudo Edward iria me mostrar algo importante. Ele simplesmente não iria me fazer virar uma superficial, como ele mesmo chamou, para no final eu viver na mentira de que aquela vida é boa. Isso não era uma coisa que ele faria, só eu que era estupida no começo para achar que sim, que ele iria me levar para aquele mundo e então as coisas estariam resolvidas.

 Agora eu tinha entendido mais essa parte da vida, de que havia coisas que só eram aparências. Eu não sabia se Tânia era ou não feliz, se ela tinha algo a mais além da beleza e da popularidade, mas agora sabia que apenas isso não era suficiente. Não importa o quanto eu tivesse me sentido leve, feliz, como se o mundo fosse o melhor, nada daquilo lá durava. Era só pisar fora daquele prédio que o encanto passava e então a vida voltava à realidade. Não tinha como ser só aquilo. E agora eu sabia e via.

 E sabia também que essa experiência eu só teria essa vez, pois como disse para Edward, isso não era para mim. Eu bem sabia aonde era o meu lugar e não era ali. Eu não era uma garota linda, não tinha o corpo perfeito nem o sorriso mais bonito, muito menos conseguiria ser adorada por todas. É, eu sei que isso não pode ser importante, mas vou ser franca, no fundo todos queremos sermos bonitos e ser adorados. Afinal pra que existem elogios? Não é pra da uma aquecida por dentro e fazer você gostar mais de si? Qual é, por mais que digam que pessoas não devem se importar tanto com beleza, a sociedade também impõe que sim. E eu queria estar dentro disso, mas como disse isso não era para mim.

 – Bella, me responde uma coisa? – Edward perguntou me fazendo encara-lo novamente e assentir. – Quando você disse por que decidiu tomar o que a garota lhe deu, disse que estava triste. – ele passou a mão carinhosamente nos meus cabelos. – Por quê?

 Eu desviei rápidos meus olhos dos dele e mordi o lábio inferior. Eu estava cansada de inventar desculpas – ainda mais a que eu carregava nos ombros sem poder contar. Não queria mais mentir para Edward. Eu me lembrava de que ele escondia tudo sobre ele, e que as únicas coisas que eu sabia era seu nome, idade, que era filho único e que morava em um trailer com um amigo, mas de resto... Nada. E apesar disso, ele não mentia para mim, só não falava. Ao contrário de mim. Como eu conseguiria ajuda se escondia alguns motivos?

 Voltei a encarar Edward que esperava pacientemente minha resposta. Peguei a mão dele no meu rosto e apertei, sentindo-a quente contra a minha gelada. Ele segurou minha mão e deu um aperto leve.

 – Eu estava com medo. – admiti.

 – Medo? – questionou confuso. – Do que?

 – Medo de você ir embora e me deixar. – sussurrei muito baixinho até para meus próprios ouvidos.

 Silêncio.

 Eu voltei a encarar a roupa de Edward, usando isso como pretexto para não ver o sentimento de arrependimento em seus olhos, pois eu sabia que era isso agora que ele estava sentindo. Edward decidiu me ajudar porque sentiu pena da garota suicida e ele não queria carregar nos ombros a minha morte – não como se ele tivesse me empurrado, mas sim deixado que eu fizesse. Então estava aqui agora, mas não estava nos seus planos que eu me apegasse tanto a ele a ponto de ficar triste com sua eminente partida. E se não fosse esse o motivo dele me ajudar, era porque Edward era uma pessoa boa demais e não tinha mais nada de bom para fazer.

 Desculpe tais pensamentos, mas eu não era o tipo de pessoa que recebia ajuda sempre que precisava, e ainda de boa vontade. Nunca me ajudaram, e eu havia aprendido a conviver com isso. Era um fato que eu tinha que carregar, então...

 Edward tirou a mão debaixo da minha e do meu rosto, e eu senti meu coração doer e vacilar já se preparando para a rejeição, as palavras de Edward sendo: Bella, me desculpa, eu queria lhe ajudar, mas não estava nos meus planos você criar esses sentimentos por mim, então... Acho melhor cortarmos por aqui. Yeah, era isso mesmo que eu esperava. Mas Edward me surpreendeu quando pegou meu queixo e me fez encara-lo.

 – Eu não vou embora, Bella. E muito menos te abandonar. Seria incapaz de fazer isso com você e comigo. – ele puxou o ar com força e deu um pequeno sorriso de canto. – Então se preocupe menos com isso e mais com nós juntos superando isso tudo, ok? Somos eu e você contra o mundo agora. Nós, juntos. – ele frisava bem essa parte, de que estávamos juntos.

 Senti meus olhos se encherem de lágrimas e essas escorrerem pelo meu rosto. Eu não sabia o que falar para Edward aquele momento, pois eu ainda não havia me acostumado com algo tão... Bom para mim. Edward era a melhor e única coisa que aconteceu na minha vida e esse medo inexplicável de perdê-lo me aterrorizava tanto que me doía só de imaginar. E minha mente adorava fazer isso, era costume de uma vida inteira sendo só coisa negativa. Eu tentaria mudar, mesmo que ela ainda faça essa tormenta, pois eu acreditava em Edward. Eu tinha que acreditar. Era ele quem pedia isso.

 – Obrigada, Edward. – murmurei e o abracei pela cintura, sentindo ainda as lágrimas saírem. – Muito obrigado por ter aparecido.

 Edward me apertou contra ele de forma confortante e me aninhou, me deixando quietinha ali bem pertinho dele.

 – Eu quem agradeço, Bella. Você está me dando uma segunda chance. – murmurou baixinho no meu ouvido.

 Eu queria lhe perguntar o que ele queria dizer com isso, mas eu já o conhecia o suficiente para saber que Edward não iria me falar. Então eu apenas deixei de lado – por um tempo só para achar o momento perfeito para perguntar – e continuei ali, aproveitando, até cair no sono.

 O barulho enjoativo que meu corpo fazia ao colocar todo o líquido de ontem para fora já estava doendo meus ouvidos. Fora a minha garganta, que eu estava já duvidando se ela ainda existia, pois depois de tanto vomitar era capaz de ela ter saído junto. Eu dei descarga e fechei à privada, me sentando no chão frio e me apoiando nela.

 – E eu lhe apresento a ressaca. – Edward falou da porta do banheiro que era até aonde eu havia o deixado chegar.

 Ele tentou entrar e segurar meu cabelo, mas eu não deixei porque essa cena era constrangedora e nojenta demais para ele ver. Foi uma guerra difícil, mas depois que eu ameacei vomitar nele – o que o fez rir muito, mas também aceitar ficar do lado de fora.

 – Muito desagradável de a sua parte fazer isso. – brinquei e ele riu alto.

 Era engraçado como a minha voz quando batia nos meus ouvidos parecia ir lá ao fundo da mente e martelar em uma dor de cabeça insuportável, mas a calma e rouca de Edward só incomodava um pouco.

 – Desculpe, Bella, mas são as consequências. – levantou um ombro e eu lhe mostrei a língua e logo fiz careta percebendo o gosto horrível que tinha na boca. Isso só o fez rir ainda mais. – Dentro desse armário tem uma sacola com escovas de dente, pegue uma. E tome um banho que logo lhe apresento um bom remédio. – ele piscou um olho e saiu da porta, fechando-a atrás de si.

 Soltei uma risada irônica e ainda pude ouvir sua gargalhada alta. Com uma fraqueza nas pernas eu me levantei, dei descarga e segui para o Box. Liguei o chuveiro e enquanto aos poucos ele esquentava eu tirei o vestido e entrei. Não demorei muito no banho, pois queria logo tomar o tal remédio que Edward falara. Vesti, para meu total constrangimento, uma lingerie que Edward comprou enquanto eu ainda dormia, e a mesma roupa de ontem. Escovei os dentes três vezes para tirar o gosto ruim da boca e mesmo assim não adiantou muito. Assim que sai do banheiro dei com Edward sentado na cama tendo em uma mão um copo com água e na outra um comprimido. Eu peguei os dois e tomei, agradecendo logo depois a Edward, que sorriu para mim.

 Eu não queria tomar café-da-manhã, pois meu estomago não estava bom para receber qualquer tipo de alimento, então no caminho para casa Edward só comprou café para nós dois – o meu bem forte. Na maior parte da viagem eu dormi, hora ou outra acordava, falava um pouco com ele, mas logo estava na terra dos sonhos novamente. O que era bom porque como a garota loira da festa me garantiu ainda me lembrava de tudo que eu tinha feito ontem, assim como fui ousada com Edward, e toda vez que olhava para ele eu corava violentamente. Torcia para que ele não tivesse percebido, pois Edward era educado demais par tocar nesse assunto. Quando Edward estacionou o Volvo em frente de casa, eu estava acordada e já tinha me preparado para entrar lá e dar com Charlie.

 – Você tem certeza que vai ficar tudo bem? – Edward perguntou pela milésima vez para mim enquanto encarávamos a mansão.

 – Tenho sim. – balancei a cabeça. – Eu sei me virar com ele.

 – Bella... – ele se virou para mim e pegou minha mão. – Eu não quero... Eu não posso nem imaginar... Ele fazendo aquilo novamente com você. Você não quer que eu vá com você?

 Eu estremeci só de imaginar Charlie abrindo a porta e me vendo com Edward. Não sabia do que aquele homem era capaz e nem o que ele iria imaginar me vendo chegar com um garoto e depois de nem dormir em casa. Com certeza não era coisa boa.

 – Eu acho melhor não, Edward... – mordi o lábio inferior. – Eu lhe prometo que Charlie não vai fazer nada.

 – E como você vai me cumprir essa promessa? – ergueu uma sobrancelha.

 Peguei minha mochila vermelha no banco de trás e balancei-a para ele.

 – Tenho minhas desculpas perfeitas. Agora são três e meia, Charlie acha que estou chegando da escola. Ou pelo menos é isso que vou o fazer acreditar. – dei de ombros.

 Edward olhou mais uma vez para a mansão e depois para mim antes de dar um suspiro de quem desiste. Eu sorri para ele em forma de conforto, que ele pareceu aceitar um pouco. Nós nos despedimos como sempre, com ele me dando um beijo demorado na testa, e eu saí do carro, atravessando a rua e seguindo para a mansão. Dei uma ultima olhada para o Volvo antes de entrar devagar pelos grandes portões de ferro – que eu tomei o máximo de cuidado para não fazer barulho. Ao invés de entrar pela porta da frente como era o esperado, eu dei a volta na casa e segui para os fundos do quintal que era onde ficava a janela do meu quarto. Coloquei as duas alças da mochila nas costas e pela árvore comecei a escalar. Eu era um desastre ambulante que trocava as pernas e tropeçava, mas já tinha feito aquilo tantas vezes que acabei aprendendo. Assim que coloquei os pés no chão do quarto, soltei um suspiro de alivio, pois vi que ele continuava intacto como eu havia deixado. O que significava que nem Charlie nem Lauren arrombaram a porta e entraram.

 Joguei a mochila no chão – que continha meu material escolar e as roupas que comprará ontem – e segui para meu banheiro para procurar um remédio para dor de cabeça. Abri o armário e entre tantos frascos eu não encontrei nenhum, o que me irritou. Peguei logo um dos calmantes de Lauren e tomei para poder dormir, quem sabe assim não passava e junto o enjoo que eu sentia.

 – Bella? – ouvi a voz de Charlie quando ele deu três socos na porta. – Se você não me responder agora eu juro que arrombo essa porta!

 Revirei os olhos para sua grande atuação. Se eu tivesse tomado calmantes e deitado na banheira, ou quem sabe cortado meus pulsos, morreria facilmente porque ele depois de um dia inteiro é que iria arrombar a porta. Agora percebo que essa era a escolha mais fácil de fazer para se matar, eu teria mais chances que desse certo.

 Estremeci.

 Encarei meu reflexo vendo que estava de olhos arregalados, porque junto com os pensamentos de me matar veio também aquele desespero com a falta de Edward na minha vida. Se eu tivesse feito isso não o teria conhecido. E era isso que me assustava, o garoto se tornar mais importante que minha vontade de morrer.

 – Bella! – Charlie berrou.

 – Essa garota deve estar morta ai dentro, só pode! – Lauren falou calmamente.

Era isso que você mais quer, não é, vadia?, pensei com raiva. Segui para o quarto, fechando a porta do banheiro atrás de mim. Com calma comecei a abrir a porta para dar de cara com os dois.

 – O que é, Charlie? – perguntei.

 – Eu quem devo perguntar, sua insolente. Estou desde ontem lhe chamando e você não abre essa porta! – ele deu um passo para dentro do quarto, me fazendo dar um para trás. – Onde você estava?

 – Aqui? – revirei os olhos para o teatro. – Fala sério, não é a primeira vez que eu faço isso, e não é a primeira vez que você finge. Vamos pular essa parte de baboseira que você vai me culpar de fugir, vai me bater, e ir logo para a parte em que vocês dois saem do meu quarto?

 Charlie me lançou um olhar de raiva que eu segurei junto ao meu. Eu me sentia meio tonta e sonolenta, o remédio começava a fazer efeito e o que eu mais queria era poder deitar na minha cama e dormir. Mas antes tinha que me livrar dos dois. E essa pressa, a dor de cabeça da ressaca me deixava mal humorada, o que me fazia falar desse jeito.

 – Vai a deixar falar assim com você, Charlie? – Lauren colocou lenha na fogueira.

 – Cala a boca, vadia! – falei para ela e me voltei para o Charlie. – Eu estava aqui dentro desse quarto, sai para a escola – apontei para minha mochila no chão. -, e cheguei agora. Não tenho culpa se vocês não prestam atenção em nada. Agora da pra me dar licença que eu tenho dever para fazer. – dei um sorriso falso.

 Charlie me avaliou dos pés a cabeça, parando nos meus olhos. Eu sustentei seu olhar novamente para assim garantir que minha mentira desse certo. Ele bufou e me deu as costas, saindo do quarto. Lauren e eu arregalamos os olhos para a atitude porque nunca, nunca mesmo, Charlie me deixou falar assim com ele. Eu estava sendo atrevida na forma de falar e até xingando Lauren, e isso significava que eu levaria uma, mas na forma que eu me encontrava, parecendo anestesiada, era capaz de eu não sentir nada. Só que Charlie saiu do quarto sem falar nada.

 Me virei para Lauren.

 – Sua vez de vazar, vagabunda. – a peguei pelo braço e comecei a empurrar para fora do meu quarto.

 – Escuta aqui, Bella, eu não vou admitir você falar assim comigo. – ela se debateu até eu a soltar, já fora. – Vagabunda é você, sua pirralha. – apontou o dedo na minha cara.

 – Vê se me erra, Lauren. – bati a porta na cara dela. – E vai se ferrar, vadia. – cuspi alto o suficiente para ela ouvir.

 Ignorando seus xingamentos eu segui para a minha cama, caindo nela de qualquer jeito. Meus olhos pesavam, mas eu ainda não conseguiria dormir. Não com uma pergunta martelando na minha cabeça: que bicho mordeu Charlie? Eu não entendi nada essa sua atitude de ignorar a forma que eu falei e sair do quarto sem dizer nada. Isso era bom, mas estranho. Muito estranho.

 Peguei meu celular e mandei uma mensagem para Edward avisando que eu estava bem, depois joguei o aparelho para lá e me aconcheguei nas cobertas, finalmente entrando na terra dos sonhos aonde era tudo colorido e cheio de sorrisos superficiais.

Emmett POV

 Port Angeles; Washington – 14:40 pm. – Segunda

 Eu descia as escadas de casa me preparado para começar com a encenação que eu teria que viver por pelo menos alguns dias da minha vida. Eu nunca havia feito isso, achava uma imbecilidade total ser alguém que não era, e bem, aqui estava eu fazendo isso e sem poder reclamar. Só aquela mulher para me fazer de hipócrita. Não, só aquela garota loira para me fazer ir à onda da mulher e ser essa pessoa falsa.

 Eu sempre fui verdadeiro. Mas agora tinha que ser o mais falso para conseguir o que queria. Nunca na minha cabeça que eu me imaginava fazendo isso.

 Mas tudo bem, vamos lá, Emmett!

 – Boa tarde! – Catherine falou animada assim que me viu entrar na cozinha.

 Assenti com a cabeça para ela.

 – Boa tarde. – insistiu, ainda sorrindo.

 – Ah, qual é!

 – Boa tarde.

 – Boa tarde. – repeti com ironia.

 – Fale direito.

 – Boa tarde. Boa tarde. Boa tarde! Está feliz agora? – me joguei na cadeira.

 A mesa já estava posta com o almoço, e eu comecei a me servir. Catherine continuou me olhando com seus grandes olhos azuis e sorrindo. Eu bufei diante daquela felicidade dela – algo normal que eu fazia sempre – e ela nem se abalou.

 – O que foi? – perguntei já me irritando com aquela atenção esquisita.

 – Assistiu aos filmes?

 – Assisti. E é tudo uma grande merda, para deixar avisado.

 Catherine soltou uma risada que para algumas pessoas soaria encantadora. Mas não para mim.

 – E pelo visto você não aprendeu nada, não é?

 – Talvez. – dei de ombros.

 Eu coloquei um pouco de comida na boca e mastigando a encarei com uma sobrancelha erguida, esperando para ver o que ela iria falar. Mas Catherine ficou quieta, ainda me encarando com aquela expressão feliz que já estava me dando nos nervos.

 – Hm... – comecei, engolindo. – Você sabia que essa sua cara assusta? Não, melhor... Ela mostra o quanto é chata.

 – Sim. – assentiu. – Eu sei disso.

 Ficamos em silêncio, e eu continuei comendo tentando não me irritar por ela ainda continuar calma, sem se abalar com nada que falei. Como ela conseguia? Se fosse eu ali no lugar dela, tinha dado um soco na minha cara. Na verdade, se eu fosse qualquer pessoa na rua e me visse, me daria um soco. E daqueles de deformar a cara.

 – Emmett, se a garota te olhar assim, como estou fazendo agora, o que você vai fazer? Vai falar que ela lhe assusta?

 Sua pergunta me pegou de surpresa – que eu não demonstrei. Então era isso, ela já tinha começado?

 – Se a garota me encarasse assim com certeza, porque significa que ela é louca.

 Catherine negou com a cabeça, mostrando desgosto. Finalmente, Deus! Finalmente ela tinha parado de sorrir.

 – Você não assistiu a filme nenhum.

 – Eu assisti sim! – bati o punho na mesa.

 E era mesmo verdade, eu tinha passado pela primeira vez depois de muito tempo, assistindo filme. Assisti todos, mesmo que já no começo me desse vontade de desligar a TV e ir jogar videogame, eu fui firme no que queria. E admito aqui que eu vomitei em alguns, porque era muita melação para o mundo. Principalmente em A Dama e o Vagabundo naquela cena do macarrão... Só de lembrar me dava vontade de vomitar novamente.

 Empurrei meu prato, perdendo na hora o apetite.

 – Então você deveria pelo menos imaginar o que significava o que eu estava fazendo.

 Encare-a sem entender, e foi então que me toquei.

 – Sério mesmo?

 – Sim, isso é bem sério. Não brinco com pessoas como você, Emmett. Aprenda. – ela caminhou até a porta, me deixando de boca aberta. – E termine logo ai para começarmos essas aulas.

 E assim foi para a sala. Eu fiquei encarando a minha frente não acreditando que tudo era encenação da parte dela, e que eu tinha caído. Essa mulher estava sendo muito abusada com essas aulas. Não era porque eu tinha aceitado ser... Menos eu que iria ouvir sem falar nada. Se ela começasse, eu também começaria. Não estava aqui para ficar aguentando alguém agir como... Como...

 – Desgraçada! – rosnei baixinho.

 Ela estava agindo como eu.

 Levantei da mesa, seguindo para a sala atrás dela, que estava mexendo no Micro System. Logo o cômodo foi tomado por uma musica antiga e romântica.

 – O que é isso? – perguntei.

 – Antes me diga se você sabe dançar.

 – Mas é claro que eu sei dançar! – soltei perplexo. – Não me diz que vai querer me ensinar?

 – Você sabe dançar isso? – apontou para o micro.

 Olhei dela para o aparelho. Eu sabia sim dançar, mas não tinha especificado o que. E dança lenta não estava na lista das danças que eu conhecia. Nunca quis aprender isso, e nem precisei. Os lugares que encontrava as vadias não tocavam isso.

 – Erm... Não. – soltei baixinho.

 – O que?

 – Eu não sei dançar essa mer... – ela ergueu as duas sobrancelhas. – Essa dança. – arrumei a frase.

 – Ótimo, então já sabemos por onde começar.

 – Claro. – revirei os olhos.

 Catherine se sentou no sofá e pegou a agenda que tinha escrito antes. Ela começou novamente, murmurando coisas para si mesmas, hora assentindo outra negando, até então parar e se virar para mim, que estava novamente na poltrona, longe.

 – Emmett, uma coisa importante para um homem que quer conquistar uma lady é saber dançar.

 – Ridículo. – ela me repreendeu com o olhar. – Continua que eu vou me calar.

 – Elas gostam de dança, ainda mais aquelas que têm contato visual sem intenção sexual, se é que você entende. Para alguém tão romântica e antiquada, ir direto ao ponto principal é até um tanto assustador.

 – Virgem de treze anos. – sussurrei baixinho.

 – De treze, quatorze e até vinte um se possível.

 Soltei um rosnado baixo por ela ter escutado.

 – Então primeiro só quero deixar avisado que não vai ser no primeiro encontro que você vai conseguir ela. No mínimo três, dependendo de como você agirá.

 – Tudo isso?!

 – Ainda é pouco. – ela soltou uma risadinha. – Leve a um restaurante que tenha um clima bom e quente. No quente de romântico, claro.

 – Não sou burro.

 – Com uma boa música clássica. – me ignorou. – Se possível violinos ao vivo, para ter mais classe. – assenti, concordando. – E quando vocês já tiverem jantado e conversando, a convide para dançar. Dança lenta é um bom tempero que a encanta. Eu sei bem disso porque seu pai fez isso comigo. – ela suspirou.

 – Olha, Catherine, vamos colocar uma regra aqui. Eu não quero saber do seu passado e daquele... – mordi a língua para não continuar. – Só quero as minhas aulas, e estou fazendo o máximo para cumprir o que lhe prometi. Então, enquanto eu aguento ser essa pessoa que você quer que eu seja, apresse-se, sim?

 Catherine abaixou a cabeça e assentiu. Vi tristeza em seus olhos, mas nem me importei. Era falso, mas não tanto a ponto de querer ouvir historinhas idiotas e melosas deles.

 – Vamos começar agora com a dança, depois explico mais coisas.

 – Certo. – concordei.

 Esperei Catherine falar ou fazer mais alguma coisa, só que ela ficou quieta, e novamente me encarando daquela forma esquisita. Fiz uma careta para ela, que soltou um suspiro.

 – Você pretende que ela saiba como que você quer convida-la para dançar?

 – Ela nunca vai saber apenas me olhando.

 – Isso mesmo. Então você tem que falar.

 – É, disso eu já sei.

 – Então o que está esperando?

 Olhei para os lados, sem saber o que responder. O que ela queria? Que eu a chamasse para... Oh, não. Isso não!

 – Você só pode estar brincando com a minha cara. – falei.

 – Se quiser uma boneca, eu posso pegar para você. – fez menção de se levantar, mas eu levantei uma mão.

 – Para com isso.

 Essa mulher só podia estar tirando uma com a minha cara, com certeza. Ela era maldosa, e por dentro devia estar gargalhando do grande mico que eu estava pagando com toda essa baboseira. Eu estava começando a desistir de tentar pegar aquela loira, pois estava custando caro demais tudo isso. Dançar com a Catherine? Isso era muito.

 Só que então minha mente me lembrou dos olhos da garçonete e dos amiguinhos dela... Eles debochando de mim. E também daquele corpo da loira... Do sorriso dela... Valeria a pena? Sim, e muito. Eu faria aqueles três babacas perderem a pose a teria aquela garota na minha cama.

 Fiquei de pé, me segurando para não fazer uma careta, e fui até Catherine. Ela estava séria, me encarando. Estiquei uma mão na sua direção.

 – Gos... – engoli o orgulho. – Gostaria de dançar?

 Catherine colocou a mão sob a minha e ficou em pé. Tentei ignorar a sensação que passou por mim ao ter a palma quente de sua mão na minha, e a puxei até o meio da sala.

 – E agora? – perguntei com a voz falha de raiva.

 – Primeiro: você coloca a sua mão na cintura dela. Não seja abusado e nem tente descer ela. É uma dança casual, nada de paquerar com mãos ou corpo. Se for, Emmett, é apenas com os olhos, e inocentemente, sem que ela perceba. Nada de parecer um... Tarado a procura de sexo.

 Bufei para suas palavras. Coloquei hesitante, minha mão na base da sua cintura. Não queria ficar tão perto dela assim, me dava ânsia. Catherine ignorou minha careta e pegou minha mão com a dela.

Love Will Take You – Angus & Julia Stone (http://www.youtube.com/watch?v=eashb-IzvIk)

 – Hm? – fiz, querendo que ela continuasse.

 – Dança lenta é muito mais fácil do que as que você dança por ai. Não tem nenhum segredo além de... – e ela me deu um solavanco para que eu desse um passo para o lado, e depois seguido de outro. – Além de se mover em sincronia com a parceira. – e no final ela sorriu.

 Catherine começou a nos guiar pela sala ao som de uma música que não era nada clássica, mais algo como indie. Mas que você imaginava tocando em algum restaurante com piso amadeirado, poucas pessoas, uma comida requintada e flores. Muitos vasos de flores espalhados em lugar localizado para deixar ainda mais bonito.

 E também, uma música que dava a sensação de que Rosalie escutaria em uma vitrola enquanto se movia pelo quarto, com seus cabelos loiros se movendo junto ao seu corpo e a saia de seu vestido esvoaçando. Junto, ela sorria de olhos fechados, imaginando seu príncipe – como a garçonete falara que ela parecia esperar. Era agradável imaginar Rosalie naquela cena. Tudo tão perfeito e feito para ela.

 Eu conseguia realmente imaginar isso.

 – Seja mais leve, Emmett. – ouvi Catherine falar baixinho. – Solte mais seus ombros e tire essa tensão. Ninguém aqui precisa ficar tenso.

 Eu precisava sim ficar, pois estava tendo um contato corporal com uma pessoa que eu odiava muito. Isso era um bom motivo para tensão, mas eu fiz o que Catherine falou para acabar logo com tudo aquilo e poder ir para lições teóricas e sem prática. Torcia que essa fosse à única em que eu tinha que tocar nela.

Seja mais leve..., pensei mentalmente comigo mesmo.

 Aos poucos fui relaxando, me deixando ser levado pelos passos dela, enquanto ainda rodava na minha cabeça Rosalie sozinha e no quarto.

 – Ai. – Catherine resmungou quando pisei em seu pé.

 Eu apertei os lábios, como se falasse "Foi sem querer", e ela assentiu. Voltamos novamente à dança, e mais uma vez pisei em seu pé.

 – Droga. – resmunguei para mim mesmo. – Isso não é para mim.

 – Claro que é. – Catherine apertou minha mão com a dela, me impedindo de soltar. – Não existe essa coisa de não é para mim. Você só tem que se empenhar em fazer certo que vai conseguir.

 – Ah, claro. – soltei ironicamente.

 Voltamos, até eu pisar em seu pé novamente.

 – Você sabe dançar quando sai, não sabe? – perguntou vendo minha careta de raiva.

 – Sim, sei. E quer saber? Sou o melhor lá. É por isso que digo que essa não é para mim.

 Catherine me encarou e gargalhou.

 – Difícil imaginar você sendo o melhor lá sendo que erra uma das mais fáceis danças que existe. – Catherine gargalhou. – Parece que tem dois pés esquerdos.

 Lancei um olhar de raiva para Catherine, que nem se importou e continuou gargalhando alto. Eu não gostei nem um pouco do que ela falara, mas admito que tenha um pouco de graça. Só um pouco.

 – Vamos, continue. – ela insistiu.

 E nós continuamos com aquilo por mais de uma hora. Eu não sabia mais como Catherine estava aguentando minhas pisadas em seus pés, mas ela parecia se divertir com toda a minha falta de experiência e equilíbrio. Sua gargalhada ultrapassava qualquer música ali. Chegou uma hora que sua careta de dor foi tão engraçada que eu tive que rir, e nisso me engasguei, sendo a vez de Catherine rir.

 – Emmett, querido, isso é realmente estranho. – ela falou, tocando meu ombro.

 Olhei para sua pequena mão ali, perto de meus músculos, que se retesaram na hora. Que porra que eu estava fazendo ali?, pensei, vendo que até o clima tinha mudado. Estava tudo muito... Leve. Uma coisa que não acontecia há muito tempo. E isso não era bom. Não mesmo. Esse Emmett que ria com Catherine não era eu.

 E eu nunca voltaria a ser ele.

 – Não me chame de querido. – falei, me afastando dela. – Sem amabilidade.

 Catherine parou de rir, me olhando nos olhos. Ela suspirou.

 – Voltou. – disse mais para si mesma do que para mim.

 – Não, não voltou. Não tem como voltar algo que não foi embora.

 – Discordo.

 – Não pedi a sua opinião e muito mesmo se você concordava ou discordava. Estou afirmando, Catherine. Não quero que nada disso faça você acreditar que nossa relação vai ficar boa, ou aos extremos de mãe e filho, pois não vai. Você sabe que o que eu estou fazendo aqui é para iludir uma garota, não seja igual a ela e se iluda com uma pessoa que eu não sou.

 Vi os olhos azuis de Catherine ficar marejados. Ela abriu e fechou a boca algumas vezes.

 – Como você pode dizer isso?

 – Estou apenas falando a verdade. Não se faça de tola como se não soubesse. – segui para a escada, mas na metade parei. – E você sabe que eu só falo verdade. Eu sempre falei a verdade, e você como sempre não acreditou em mim.

 Subi as escadas correndo e indo direto para meu quarto, aonde eu bati a porta com força e depois disparei minha raiva no saco de areia. Catherine conseguia me tirar do sério e me fazer ficar com uma raiva que mais ninguém conseguia. Ela com todo esse papinho idiota e amoroso me irritava, me deixava com ódio. Eu odiava a palavra "amor" e mais ainda sentimentalismo. Era por isso que eu era desprovido de todas essas coisas. Se ela queria se iludir o problema era dela, pois seria o seu coração que sairia magoado. Não o meu. Não mais. Então se não era eu, que se fodesse. Eu estava cagando e andando para aquela idiota que acreditava em coisas boas quando não existiam mesmo.

 Catherine teria que aceitar que seu filhinho amoroso tinha morrido, e que era eu agora quem estava aqui. Se não aceitasse, que me deixasse em paz.


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Notas finais do capítulo

heeeeey finalmente eu postei um capitulo aqui em SR, nossa faz tanto tempo que eu estava morrendo de saudades.
Eu estou tendo uns problemas pra escrever ja que minha mente é uma confusão completa que as vezes nem eu mesma consigo me entender, entao to focada em outra fanfic e acabo ficando bloqueada em todas. Eu quero me desculpar com voces pela demora, mesmo, e que tenham paciencia comigo e com SR. Ela é uma fanfic complicada em que eu tenho que achar o lado mais triste do personagem, como também o raivoso do Emmett, e isso acaba mexendo comigo.
Bem, eu vou tentar voltar logo com o próximo para voces. Me digam o que acharam desse capitulo.
Obrigada a todas e até o próximo capitulo.