Take Good Care escrita por Chibi Midori


Capítulo 1
Coisas que eu nunca direi


Notas iniciais do capítulo

Narrado pelo Noruega. Boa leitura.
Dicionário:
Bror - Irmão
Dumme - Estúpido
Danmark - Dinamarca



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Isso não me faz bem algum

Para que serve isso para você o que está em minha mente?

Se eu pudesse dizer o que queria dizer

Diria que quero ir com você para longe

Estar com você todas as noites

Acho que estou jogando minha vida fora

Com essas coisas que nunca vou dizer

Things I'll never Say - Avril Lavigne



Eu não conseguia dormir. Ultimamente, a qualidade de meu sono estava diretamente relacionada com a presença do dono da casa, embora eu não quisesse pensar no motivo. Acontece que, nos ultimos meses, com frequência Dinamarca voltava num estado deplorável para casa. Ao ser perguntando sobre o assunto, resmungava qualquer coisa sobre uma briga de bar ou cair de uma escada e, com um sorriso largo, mudava de assunto. Suécia e Ice pareciam dispostos a deixá-lo continuar com seu comportamento bizarro e mesmo o gentil Finlandia parecia ter se resignado com os segredos do dinamarquês. Mas não eu. Eu queria saber o verdadeiro motivo pelo qual Dinamarca andara lutando.

Era essa curiosidade que me mantinha de olhos bem abertos encarando a janela de meu quarto. Havia passado uma semana inteira desde que Dinamarca saíra de casa, o que significava que era a sétima noite em que eu ficava em claro elaborando teorias e perguntando que motivos teria alguém para atacar Dinamarca. O pior era que não conseguia pensar apenas num motivo para NÃO atacar Dinamarca. Também não era fácil deduzir porque Dinamarca recusava-se a contar a seus irmãos o que estava acontecendo realmente, mesmo que fosse óbvio.

Ao fundo, ouvia a respiração tranquila de Ice. Era bom dividir o quarto com alguém como ele, pois meu irmão mais novo nunca se importava me deixar dormir até tarde. Ele provavelmente sabia que eu estava repondo o sono perdido na noite anterior, mesmo que nada sobre o assunto fosse comentado. Era disso que eu mais gostava em meu irmão.

Estava quase admitindo que não chegaria a uma conclusão naquela noite e fechando os olhos para dormir quando um barulho me fez despertar. Virei-me para Ice para conferir se ele ainda estava dormindo. Ele sequer havia se mexido, então concluí que o barulho apenas podia ter vindo do andar de baixo da casa. Levantei com cuidado para não fazer barulho e, uma vez no corredor, notei que havia luzes acesas na cozinha. E vozes. Vozes baixas. Definitivamente, Dinamarca estava de volta.Tomei o cuidado de não fazer barulho enquanto descia as escadas para a sala, que ainda estava às escuras, e atentei os ouvidos às vozes.

– ...terminar isto sozinho. - era a voz de Dinamarca. - Vá dormir, Fin.

– Tudo bem. - respondeu a gentil voz de Finlandia - Eu acordei quando ouvi você tomando banho e, já que estou de pé, não tem problema ajudar. Fora isso, você não conseguiria fazer estes curativos sozinho.

Curativos?

Eu me esgueirei pela sala sem emitir qualquer ruído e tomando cuidado para não bater nos móveis. A porta da cozinha estava apenas entreaberta, deixando uma fresta de luz escapar junto com os sons das vozes de Finlandia e Dinamarca. Felizmente, era o suficiente para que eu espiasse para dentro do cômodo. Podia ver Finlandia sentado de lado para a porta e, de frente para Fin, estava Dinamarca. Arregalei os olhos. Dinamarca tinha os cabelos molhados, como se tivesse acabado de sair do banho, e estava sem camisa. Por toda a extensão de suas costas e braços, haviam cortes e hematomas recentes. Sua mão esquerda estava sendo tratada por Finlandia.

– O Suécia vai ficar bravo se souber que te incomodei a essa hora.

– Já disse que não é nada. - Finlandia começou a revirar uma caixa de primeiros socorros que estava em cima da mesa - Não tem motivo para o Su-san ficar bravo. Ah, eu não sou muito bom em primeiros socorros, mas vou dar o meu melhor. Desta vez, foi uma luta e tanto.

– É...

– Uma briga de bar?

– Sim.

– Você não parece o tipo de pessoa que entra nessas brigas, Dinamarca. O que aconteceu, realmente?

Prendi a respiração. Dinamarca continuou em silêncio.

– Você anda lutando muito e tendo muitos problemas, não é? Não precisa suportar isso sozinho, pois somos como irmãos, não? Se quiser contar para mim, pode desabafar. Eu não contarei aos outros, nem mesmo ao Su-san.

– Você é realmente gentil, Fin. - Dinamarca riu - Acho que eu sei agora o motivo pelo qual o Suécia gosta tanto de você.

– Isso... Não... - Finlandia corou e atrapalhou-se com o curativo que estava preparando. - Eu... Não mude de assunto!

– Noruega.

Quando meu nome foi pronunciado, achei que havia sido descoberto e automaticamente recuei um passo, mas então notei que Dinamarca estava falando com Finlandia.

– Eles querem o Noruega e parte do Islandia. - continuou Dinamarca - Por isso tem constantemente lutado comigo.

– Isso é terrível! - ofegou Finlandia.

Eu não quis mais olhar, mas ao mesmo tempo não pude voltar para o quarto. Encostei-me à parede e deixei-me deslizar até o chão. Então... Era esse o motivo pelo qual Dinamarca andara ferido. Ele estava defendendo a mim e ao meu irmão. Primeiro, me senti terrivelmente culpado. Não me saía da mente o que havia visto nas costas e braços de Dinamarca, especialmente com a consciência de que era o motivo de grande parte daqueles ferimentos. Em seguida, raiva. Se o que queriam era pegar-me, Dinamarca não tinha o direito de lutar sozinho. Não era como se eu fosse um completo inútil incapaz de se defender ou de lutar por si só. Não queria ficar em dívida com Dinamarca, não queria depender tanto assim dele e, acima de tudo, não queria ver Dinamarca ferido daquele jeito. Seja por minha causa ou por qualquer outro motivo. Aquela visão machucava meus olhos.

– Tudo bem. - ouvi novamente a voz de Dinamarca - Se você para proteger o Nor e o Ice, eu não vou perder. Vou protegê-los sem falhas, porque são muito preciosos para mim.

Aquele idiota.

Considerei voltar para o meu quarto e deixar Dinamarca sob os cuidados do desajeitado Fin como castigo, mas estava bravo demais para simplesmente ir dormir. Todo o sono que sentia minutos antes havia desaparecido por completo. Deixei de me importar se estava fazendo barulho ou não e entrei na cozinha. Tive de me controlar para não soltar um suspiro frustrado ao encontrar Finlandia tentando descobrir como se abria o pote de pomada. Talvez deixar Fin cuidar dos ferimentos de Dinamarca fosse uma punição mais cruel do que eu havia pensado a princípio.

– O que está fazendo, bror? - perguntei, como para anunciar minha chegada.

– Noruega! - Dinamarca levantou e quase derrubou a caixa de primeiros socorros de Finlandia. - Há quanto tempo está aí?

– Ouvi barulhos então desci para verificar.

– O Dinamarca voltou machucado. - Contou Finlandia mostrando o remédio. - Eu ouvi quando ele saiu do banho e vim ajudá-lo a fazer curativos.

Olhei para o curativo mal feito no braço de Dinamarca de um jeito crítico e em seguida lancei a Finlandia um olhar descrente. O finlandês corou e baixou o rosto, envergonhado da própria falta de habilidade, o que me fez sentir um pouco mais culpado: As intenções dele eram boas, ainda que tivesse feito mais mal do que bem ao tentar ajudar Dinamarca. Com um suspiro, fui até a mesa tomar seu o lugar e pegar eu mesmo o kit de primeiros socorros.

– Eh? O que está fazendo, Nor? - perguntou Dinamarca.

– O curativo. - respondi inexpressivo.

– Ah, eu posso fazer! - Finlandia insistiu - Eu farei direito, por isso...

– Fin, vá dormir. - ordenei friamente. - Eu cuido disto aqui.

Finlandia encolheu-se. Não havia sequer a olhado para ele, mas eu sabia que naquele momento eu devia estar exalando uma aura de Se-não-vai-ajudar-não-atrapalhe-seu-inútil. Conhecendo Finlandia, ele provavelmente interpretaria minha atitude como se eu estivesse dizendo Não-toque-no-Dinamarca-pois-apenas-eu-posso-lidar-com-ele. As duas opções eram verdadeiras, então ignorei o atarantamento de Fin, ocupei o assento em que ele estivera segundos antes e segurei o pulso de Dinamarca.

– Ei, Nor, você você não precisa... - Dinamarca começou, mas calou-se ao receber um olhar gelado.

– Você pode ir dormir, bror. - falei a Finlandia sem erguer os olhos do meu trabalho.

Com a dispensa fria, Finlandia tornou a encolher-se e olhou para Dinamarca. Pelo canto do olho, eu o vi sorrir como se pedisse desculpas, indicando que estava tudo bem. Finlandia suspirou e nos deixou a sós.

Ficamos em silêncio enquanto eu terminava de limpar os arranhões no braço do dinamarquês com a expressão vazia, parecendo totalmente concentrado no que estava fazendo. Eu podia sentir os olhos de Dinamarca registrando detalhes da minha aparência. Eu sabia que ele podia ver como meu cabelo estava bagunçado por ficar muito tempo revirando-me de um lado para o outro na cama. Perguntei-me se ele podia ver as manchas roxas ao redor dos meus olhos, a prova de que meu sono não andara muito regular. Eu o conhecia o suficiente para saber que ele se culparia por aquilo. Ele devia saber que eu estava naquele estado por causa de sua ausência constante e provavelmente estava pensando se não podia cuidar melhor de mim.

– Nor... - começou Dinamarca - Você parece cansado. Posso terminar isso sozinho.

– Não, você não pode. - foi a minha resposta ferina - Fique quieto ou vou ferir você mais ainda, dumme.

Dinamarca sorriu tristemente, o que não era muito comum, mas não prestei atenção a isso, tão concentrado que estava na tarefa de tratar os seus ferimentos.

– Você ouviu, não ouviu? - perguntou - Ouviu a conversa que eu estava tendo com o Fin.

Silêncio. Os nossos olhos se encontraram, os meus sem nada expressar e os dele outro com uma emoção que não podia ser identificada. Os cantos da boca de Dinamarca tremiam ligeiramente enquanto ele mantinha o sorriso suave.

– Você não precisa se preocupar comigo, Nor. - prosseguiu - Eu sou forte o suficiente pra cuidar de vocês, posso me virar sozinho.

– Você está ferido desta maneira por minha causa e pelo meu irmão. - observei, sem exprimir nenhuma emoção àquele fato, como se fosse indiferente a ele.

– Não. Estou assim porque estava protegendo as pessoas que são importantes para mim. Não tem a ver com vocês, mas sim comigo. É um egoísmo meu... Eu fico feliz de ter vocês por perto, e o preço que tenho que pagar por esta felicidade é protegê-los. Você não me deve nada, por isso...

– Dumme. Você acha mesmo que eu faço isso por um sentimento de dívida? Não seja idiota. Eu estou aqui porque se você não cuida de si mesmo direito, alguém tem que cuidar.

–Eu entendo. É pelo Ice que você faz isso, não é?

– O que?

– Eu já disse, todos vocês são importantes pra mim, mesmo o Suécia. Eu prometo não deixar nada acontecer nem à você e nem ao Ice.

Fiquei incrêdulo. Não entendia como alguém podia, sozinho, ser tão infinitamente burro. Dinamarca reagira exatamente da maneira que eu imaginava que reagiria: Abriu um sorriso largo muito satisfeito, como se aquela conclusão o tivesse feito ganhar o dia, embora seus olhos ainda estivessem denunciando aquela emoção que eu não podia identificar. Trinquei os dentes, pela primeira vez naquela noite demonstrando alguma emoção de verdade: Raiva. Encarei Dinamarca com os olhos estreitos de impaciência, os lábios comprimidos reprimindo todas as palavras que queria dizer naquele momento àquele estúpido dinamarquês.

– Nor?

Respirei fundo e pousei em cima da mesa as gazes que estava preparando para por em volta dos seus braços machucados. Se apenas pudesse dizer tudo o que queria dizer... Mas não podia. Era de se esperar que Dinamarca soubesse daquilo por si próprio, sem precisar que eu dissesse, mas aparentemente ele era idiota demais para isso. Ora... Cheguei a repreender-me por esperar alguma coisa daquele estúpido. Ele ficava lá, sorrindo para tudo e todos, não importa o que acontecesse, sempre suportando tudo sozinho...

Fazendo com que eu me sentisse daquela maneira, mas sem sequer perceber o que estava fazendo. Ele e aquele estúpido sorriso perfeito.

Suspirei, sabendo que, se quisesse algo bem resolvido, teria que resolver por mim mesmo. Era melhor deixar as coisas claras de uma vez por todas, ainda que nunca, jamais, fosse dizer aquilo em voz alta. Existem coisas que são preciosas demais, é preferívei guardá-las para si e não deixar que jamais sejam ditas. Pus-me de pé e segurei o rosto dele, forçando-o a encarar-me diretamente nos olhos.

Dinamarca ficou estático de surpresa, sem compreender o que eu estava prestes a fazer, mas não estava disposto a deixá-lo continuar sendo tão burro. Queria que ele soubesse de uma vez por todas, porque haviam coisas que eu jamais iria dizer, embora estivesse disposto a demonstrar. Foi fácil, uma vez que ele estava sentado e eu de pé: Curvei a cabeça até fazer nossos lábios se tocarem. Com os braços, envolvi a sua nuca e aprofundei o beijo até sentir as mãos dele me segurando pela cintura e me puxando para mais perto. Envolvidos num abraço apertado, beijamo-nos até não ter mais fôlego, até que eu julgasse que a mensagem fora passada. Isso levou vários minutos. Interrompi o beijo lentamente e afastei-me para poder encarar Dinamarca outra vez. Olhando diretamente nos olhos dele, que estavam atônitos, falei:

– Você falou de egoísmo, não foi? Trata-se de um egoísmo meu cuidar de você, Danmark. Fico irritado particularmente por ver você ferido, então vou tratar das suas feridas quantas vezes for necessário, mas é bom você parar de fazer isso tão descuidada e deliberadamente, ou vou te dar ferimentos de verdade. Você entendeu agora?

Sentimentos preciosos demais para ser verbalizados, difíceis demais de serem demonstrados. Eu quase senti inveja de Dinamarca, por ser tão transparente e ter tanta facilidade em demonstrar o que sentia, como naquele momento: Dinamarca abriu o sorriso mais verdadeiro que havia aberto até então, tão largo que parecia que ia machucar o rosto a qualquer momento.E então...

– O que foi agora? Você não vai chorar, vai? Francamente, você ainda se diz homem...

Dinamarca tornou a me abraçar com força. Ele enterrou o rosto na minha barriga e eu senti meus lábios se curvarem minimamente para cima, mesmo contra a minha vontade.

– Não, não vou. - riu baixinho. - Obrigado, Nor.

Suspirei. Não importa quanto tempo levasse, estava disposto a deixar claro tudo aquilo que jamais ia dizer.


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Notas finais do capítulo

Finalmente, finalmente, finalmente escrevi algo DenNor! Waa estou tão feliz! Eu não escrevia nada de Hetalia desde o fim de No Pain, no Gain, também, então estava com saudades. Comentários, críticas e elogios são bem vindos e me incentivam a postar a próxima One-shot mais rápido :3 Obrigada por ler!