Sentei em frente à antiga escrivaninha de madeira escura. Olhei para a página em branco, sentindo um malicioso sorriso surgir em meus lábios. Eu me sentia estranhamente bem quando pensava em Rose. Bem como eu não me sentia de nenhuma outra forma. Ela era a única coisa que eu considerava atraente no mundo e a única coisa que realmente importava para mim. Eu a queria muito, incontrolavelmente, loucamente. Eu não sei explicar porque e nem como mas a mínima lembrança que eu tinha dela fazia meu corpo inteiro reagir. O gosto do sangue dela ainda estava vivo na minha boca e a sede ardia em minha garganta desejando por ele novamente. E mais que isso. O calor da pele dela, o som de sua respiração. Todos aqueles sentimentos eram conflituosos dentro de mim. Eu sabia que ela era uma grande ameaça se ficasse viva. Era a única que podia me deter, me vencer. Ao mesmo tempo, eu não sentia que não conseguiria matá-la mas devia. Era um dever que eu não tinha certeza se poderia cumprir. E isso me desafiava. E o desafio me movia.

Eu ainda lembrava de todo o calendário acadêmico da St. Vladmir e este era o tempo dos exames finais para a graduação. Com certeza Rose teria que cumprir com essa enorme bobagem. Eram testes ridículos, que nem de longe mediam todo perigo que estes dhampirs teriam que enfrentar quando viessem para a vida real. Mesmo assim, os guardiões consideravam um momento importante. Eu ainda era capaz de sentir uma ponta de orgulho em saber que, para Rose, eram exercícios irrisórios. Ela já tinha vivido os piores testes de sobrevivência contra Strigoi quando esteve comigo na Sibéria. E tinha conseguido se superar. Isso me irritava e me envaidecia ao mesmo tempo. Pelo menos eu sabia que tudo ela tinha aprendido comigo. De certa forma...

Peguei a caneta e comecei a escrever mais uma carta. Era a única maneira que eu havia encontrado para me manter em contato com Rose. Ela precisava saber que eu estava esperando por ela e que jamais conseguiria se livrar de mim.

Minha querida Rose,

Uma das poucas desvantagens de ter despertado é que não precisamos mais dormir, portanto nós não sonhamos mais. É uma pena porque, se eu pudesse sonhar, eu sei que sonharia com você. Eu sonharia com o seu cheiro e com a sensação do seu cabelo negro entre meus dedos. Eu sonharia com a suavidade da sua pele e o poder de seus lábios quando nos beijamos.

Eu fechei os meus olhos me sentindo entorpecido por todas aquelas lembranças dos tempos que estive com ela. O toque, os beijos, o cheiro dos seus cabelos, tudo era muito mais intenso depois que me tornei um Strigoi, por causa dos meus sentidos apurados. Ainda puxando minha memória, continuei escrevendo, imaginando e sentindo quase como se ela estivesse ali comigo. Mas, junto com aquela sensação de prazer, veio a sede por vingança e a raiva crescente. Ela tinha fugido de mim, tinha me traído. Eu lhe dei o benefício da escolha, tinha utilizado uma benevolência com ela que nem eu mesmo sabia de onde eu tinha tirado. Mesmo assim, ela me acertou por duas vezes, enquanto eu estava sendo totalmente complacente com ela. Eu não podia deixá-la viva. Ela não tinha aceitado ser transformada e mesmo que tivesse, seria muito perigosa, de uma forma ou de outra. Ela tinha que morrer e tinha que ser por minhas mãos. Imaginar a sua vida saindo enquanto eu bebia o seu sangue era uma sensação ainda melhor do que pensar em seus beijos. Olhei para a carta e continuei escrevendo.

Sem sonhos, eu tenho que me contentar apenas com minha imaginação – que é quase tão boa quanto. Eu posso imaginar todas essas coisas perfeitamente, assim como consigo imaginar como será quando eu tirar sua vida desse mundo. É algo que eu me arrependo de ter que fazer, mas você tornou minha escolha inevitável. Sua recusa de se juntar a mim numa vida de amor eterno não me deixou outra opção, e eu não posso permitir que alguém tão perigoso quanto você viva.

Enquanto Rose me perseguia pela Sibéria ela conquistou perigosos inimigos. E até mesmo agora, quando é a minha vez de caçá-la. Eu tenho subjugado vários Strigois e obrigado a eles a se manterem sob minhas ordens que sempre giravam em torno de Rose. Eu sabia que isso estava colocando a mim mesmo em risco, mas eu não podia evitar e seria um problema com o qual eu lidaria depois.

Além do mais, mesmo que você seja transformada contra sua vontade, você agora tem tantos inimigos entre os Strigoi que um deles iria te matar. Se você deve morrer, que seja por minhas mãos. De mais ninguém.

Mesmo assim, eu te desejo sorte hoje enquanto você faz suas provas – não que você precise. Se eles estão lhe submetendo aos testes – e eu não tenho dúvidas que eles lhe submeteram – é uma perda do tempo para todos. Você é a melhor do grupo, e nessa noite você vai merecer receber sua marca da promessa.

É claro, isso significa que você será um desafio muito maior quando nos reencontrarmos – mas eu vou gostar disso, definitivamente.

E nós vamos nos encontrar de novo. Com a formatura, você partirá da Academia, e assim que você estiver do lado de fora das wards, eu vou encontrar você. Não existe lugar nesse mundo onde você possa se esconder de mim. Estou observando.

Com amor,

Dimitri.

Eu dobrei o papel e coloquei em um envelope, com o endereço da Academia. Chamei um dos humanos que trabalhavam para mim.

“Coloque esta carta imediatamente no correio.” Ordenei. Pelas minhas contas, Rose receberia a exatamente no dia do seu teste e era isso que eu queria.

O humano assentiu e saiu, totalmente idiota com todos os humanos.  Era impressionante o que as pessoas eram capazes de fazer em nome da imortalidade. Panacas.

Desde que Rose tinha retornado da Sibéria, eu também havia voltado para Montana e me instalado em uma grande propriedade, localizada em meio às montanhas, que havia pertencido a um Strigoi muito antigo, mas que não teve forças suficientes para me vencer. Era o mais próximo que eu podia ficar de Rose. A Academia era protegida por fortes wards e depois do ataque de Strigois que ela havia sofrido, a segurança tinha sido reforçada ao extremo. Mesmo assim, eu tinha bastante pessoas – humanos e Strigois - trabalhando para mim. E todas elas tinham apenas uma tarefa a fazer: vigiar Rose.

Eu tinha colocado vários postos que vigiavam as saídas da Academia e eu sabia que, mais cedo ou mais tarde, chegaria a hora em que eu ficaria novamente frente a frente com ela.