Ele era constantemente perseguido. Em qualquer momento que baixasse suas guardas, eles voltariam para assombrá-lo. Para lembrá-lo do que ele mais se esforçava em esquecer. Para fazê-lo recordar-se de que jamais se libertaria.

Eram olhos dourados.

De um dourado radiante, liquefeito, acolhedor.

Olhos melancólicos, de uma alma sensível, poética. Olhos sonhadores de um garoto triste. Olhos doces, gentis. Olhos que, num passado tão distante que parecia irreal, haviam feito-o sentir-se seguro.

Não importava o quanto ele tentasse matá-los, eles sempre voltavam.

Então ele fugiria, sentindo-se de novo como o garotinho assustado que tivera medo de amar.

Ele sempre fugira dos olhos dourados.

Olhos tão, tão profundos.

Profundos olhos dourados.

Eles o perseguiam em seus sonhos, também.

E quando ele acordasse, ainda parcialmente imerso em sua utopia, os olhos a encará-lo seriam azuis, não dourados, e uma parte dele morreria. Mas estes olhos também seriam doces e gentis, e tão repletos de amor que ele se sentiria em paz.

Não totalmente, porém.

Porque eles não eram dourados.

Os olhos azuis também lhe eram queridos, é claro. Seguros. Acolhedores. Sinceros. Ele deveria achá-los perfeitos.

Mas não eram dourados.

No início ele achara que os olhos azuis conseguiriam fazê-lo esquecer-se dos dourados. Este sem dúvida fora o maior erro que ele já cometera. Ainda doía lembrar-se de sua escolha.

Era a mesma dor de dez anos atrás. Latente. Abrasiva.

A dor de desistir dos olhos dourados.

Ainda não sabia exatamente porque o tinha feito. Talvez eles fossem idealizados demais. Distantes demais.

Ele tentara então se convencer de que sua dor não era justificável; de que a paixão não era real. Eram apenas olhos dourados, afinal.

Tolo, tolo garoto cego.

Como não percebera?

 Era exatamente essa toda a questão. Era isso que fazia toda a diferença. E fôra o que o cativara desde o princípio.

Eles serem apenas olhos dourados.

Profundos, profundos olhos dourados.