O dia havia começado como todos os outros dias. Frio, cinzento, com um sol que insistia em não aquecer. Típico dia daqueles que viviam a procura de recompensas. Suas idas e vindas por inúmeros planetas e asteroides os impediam de curtir um bom nascer do sol.

Tudo acabava parecendo meio sem vida naquele pedaço perdido do universo.

Estava em um planeta qualquer a procura de uma recompensa qualquer, só pra esquecer, mesmo. Esquecer a dor, esquecer os problemas, esquecer-se de tudo.

A caça devia animá-la, de certa forma, mas não era isso que acontecia, naquele momento. Logo de manhã decidiu apenas se vestir e sair para dar uma volta. Diferente da forma como se vestia normalmente, resolveu deixar de lado o conjunto amarelo com jaqueta vermelha que usava. Vestiu um jeans de lavagem escura e uma regata preta, calçando botas pretas também. Saiu a pé. Não via muitos motivos para pegar sua nave e sair desembestada atrás de um criminoso qualquer. Não tinha vontade para isso.

Toda a sua vitalidade foi usada par tentar convencer um certo alguém de fazer uma certa coisa. Empregou nisso toda a sua força de vontade e todos os seus melhores sentimentos, apesar de ter disparado uns dois ou três tiros, só pra dar mais ênfase em suas palavras.

Mas não, nada disso adiantou. No fim, ela o viu partir, partir para não mais voltar.

“Tudo bem, eu consigo dar um passo de cada vez, hoje.”

E caminhou. Caminhou até encontrar um pub típico da Inglaterra do fim do século XX. A fachada do pub era feita de tijolos avermelhados e ela se animou ao ver que o local combinava com o que acontecia em seu interior: tudo nela agora era vermelho também. Vermelho como um coração partido em dois.

Entrou e procurou uma mesa num canto mais afastado, porque não queria a companhia de ninguém. Viu uma banda que se preparava para tocar, afinando os instrumentos, todos do século XX também. Violões, contra baixos, guitarra, bateria. Um sax, também. Enquanto via a movimentação da banda, um garçom veio em sua direção, mas ela já sabia o que iria pedir.

– Um whisky, sem gelo, duplo. – Disse, pegando o maço de cigarros no bolso de trás da calça. Acendeu um cigarro quando a banda tocava a primeira canção, que lhe pareceu estranhamente familiar.

-

Been a fool, been a clown
Lost my way from up and down
And I know, yes I know
And I see it in your eyes
That you really weren't suprised at me at all
Not at all
And I know by your smile it's you.

-

“Engraçado tocar justamente essa canção hoje, Spike. Sinceramente, eu ainda não acredito que você partiu. Me recuso a acreditar que você me deixou por causa de uma vadia loira desgraçada, que só infernizou sua vida.”

O ritmo da música, o blues que tanto a acalentava quando era criança, tacava seu coração e ditava a maneira como ela digeria finalmente tudo o que aconteceu sete dias atrás.

Bebeu um longo gole do whisky que fora serviço há poucos instantes. A bebida desceu rasgando sua garganta e aquecendo todo o seu interior.

– Realmente, eu estava precisando disso. Traga a garrafa e a deixe aqui, por favor.

-

Don't care for me, don't cry
Let's say goodbye, Adieu.
It's time to say goodbye, I know that in time
It will just fade away, it's time to say goodbye.

-
 

“Como você pode fazer isso comigo? Conquistar meu coração, me ajudar, cuidar de mim e depois ir embora por causa de outra? Você jogou meu coração pela janela e ele está agora vagando espaço afora. Você... isso não é justo...

Eu te amei. Amei mesmo, você sabia? Eu te daria tudo o que ela roubou de você. Tiraria a solidão do seu coração, traria paz a sua alma. Mas você, bem no fim, não quis o que eu tinha a oferecer. Não quis o meu coração.

E nem se dignou a me dizer o porquê.”

-

I stand alone, and watch you fade away like clouds
High up and in the sky
I'm strong and so cold
As I stand alone
Goodbye, So long, Adieu.

-

“Como vou tirar a solidão do meu coração, agora que você se foi? Você, que me ajudou a recuperar o meu passado, as minhas memórias. Como vou prosseguir na vida sem você? Como você pode deixar eu me apaixonar por você, mesmo não tendo chance de fazer esse amor virar realidade? Você não jogou todas as cartas e me deixou vulnerável na partida. Injusto.

-

Oh how I love you so, lost in those memories
And now you've gone
I feel the pain, feeling like a fool, Adieu
-

“Sinceramente, a vontade que eu tenho é de te matar, por ter me feito de idiota todo esse tempo. Irônico, não?

Mas, por mais que eu queira mudar o passado, eu não tenho mais poder para fazer isso. Não posso voltar atrás e tentar consertar o que saiu errado. Não posso desejar o impossível. A única coisa que eu consigo fazer é lembrar dos nossos momentos juntos, de como cada pequeno detalhe me fazia sentir uma mulher querida e desejada. Todos os olhares e disputas me faziam perceber que eu tinha importância na sua vida. E que, por um breve momento, eu pensei mesmo que estava jogando o mesmo jogo que você, o jogo que nós dois sairíamos vitoriosos.

Infelizmente, nós dois jogamos as cartas erradas.”

-

My love for you burns deep
Inside me, so strong
Embers of times we had
And now here I stand lost in a memory
I see your face and smile.

-
 

“E mesmo eu tentando te esquecer, eu não consigo. Eu sou mesmo uma estúpida. Por que você me fez a mulher mais feliz e a mais infeliz? Por que você não me escolheu, Spike? E agora me faz pensar que eu não era boa o bastante pra você?

Você acabou comigo e as minhas defesas, tirando meus truques de debaixo da manga.

Você me deixou aqui, entre as lágrimas e a dor de um amor não vivido, só sentido e desejado. Sendo obrigada a dizer adeus sem ter tido a chance de dizer pra voltar para casa.

E com uma pergunta que só a loira que arrancou seu coração sabe a resposta...”

-

Oh how I love you so, lost in those memories
And now you've gone
I feel the pain, feeling like a fool, Adieu

-

– Direito ou esquerdo...