Nameless escrita por Guardian


Capítulo 15
Quando as certezas ruem


Notas iniciais do capítulo

Weeee, outra vez ~



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“Se você não abrir, eu posso muito bem arrombar. Você quem sabe”

 Mail não ousou duvidar daquelas palavras.

 Então ao invés de ir se esconder na lavanderia como sua ideia original sugeria, o ruivo correu para o quarto de Mello. Parou por um único instante olhando a forma como ele estava jogado na cama toda desarrumada, a forma como mesmo dormindo a expressão em seu rosto não relaxava, e de repente aquele olhar indecifrável que viu em seu rosto horas mais cedo voltou à sua mente. Balançou a cabeça com força, forçando-se a voltar ao que devia fazer.

 - Mello... Mello! – sussurrava urgente conforme o balançava pelo ombro – Mello, acorde!

 O loiro soltou um ou dois resmungos sonolentos e se remexeu um pouco antes de enfim abrir os olhos azuis com confusão e alarme. Embora fosse uma reação que Mail até já imaginava, ainda assim ele se surpreendeu com a rapidez com que Mello puxou a arma debaixo do travesseiro e a apontou para o seu rosto. O ruivo esperou pacientemente o outro se acalmar e perceber que estava acordado e quem estava à sua frente, até baixar devagar o revólver e cair novamente de costas na cama.

 - O. Que. Diabos. Você. Está. Fazendo?! – rosnou, mas a cena de raiva que estava preparando foi arruinada pelo bocejo que não conseguiu conter. Olhou para o relógio da cômoda e de volta para o rosto agora levemente divertido do ruivo. Merda, não tinha dormido nem uma hora!

 - Depois você se irrita – Mail falou rápido, abrindo espaço para o loiro se levantar com toda a má vontade de seu ser – Tem alguém na porta.

 - Quê?!

 - Tem alguém na porta! – Mail repetiu, e por instinto olhou por cima do ombro, apenas para se certificar de que o tal alguém continuava lá e, mais importante, se a porta continuava no lugar de sempre – E está ameaçando arrombar.

 - Merda – Mello resmungou, já andando até lá com ainda mais má vontade. Antes de terminar de atravessar a sala, porém, lembrou-se de virar e fazer um gesto para Mail trancar a porta do quarto e ficar ali até que expulsasse o ser irritante. Quem quer que fosse ele. “É bom que seja algo realmente importante se quem quer que seja não quiser levar bala” pensou mal-humorado.

 - Ah, ótimo! Era tudo o que eu precisava para começar o meu dia! – Mello sentiu uma vontade muito, muito grande, imensa mesmo, de puxar a pessoa parada na sua porta até a varanda e jogá-la com muita satisfação de lá de cima e observar o corpo atingir e manchar a calçada. Um, por ter a cara-de-pau de aparecer ali depois da noite anterior, e dois, por tê-lo acordado em plenas oito horas da manhã de um domingo. Mas sabia que não podia. A varanda tinha grade de proteção.

 - O que você quer aqui? – perguntou cruzando os braços na altura do peito, e a intenção por trás desse gesto era tão clara, impedir a si mesmo de fazer alguma merda, que Klaus desistiu de fazer qualquer tipo de brincadeira.

 - Posso entrar? – perguntou calmo, mas parecia que tal calma e serenidade era apenas uma máscara, pelo modo como ele passava continuamente a mão pelas mechas negras alisando-as para trás em sua mania característica. Máscara...

 Mello ia dizer algo como “Não, você pode falar aqui mesmo. Por que acha que eu mudei a fechadura?”, mas fosse o que fosse que Klaus tivesse para dizer, não seria nem um pouco sensato fazê-lo no meio do corredor. Por isso, ao invés de ser grosso, foi para o lado dando passagem para o mais velho passar.

 - Tem dormido no sofá? – o moreno perguntou ao notar as cobertas deixadas emboladas no estofado. Por sorte não viu o leve tremor que passou pelo corpo de Mello com aquele comentário. O loiro instintivamente lançou um olhar para a porta fechada de seu quarto e o voltou para Klaus antes que este notasse.

 - Dá pra ir direto ao ponto? O que veio fazer? E espero que a resposta seja sobre dar as malditas explicações que me deve – “embora eu duvide”.

 Klaus suspirou antes de se virar para o mais novo. E seus olhos amendoados deixavam bem claro: não, não tinha vindo dar nenhuma explicação sobre a mulher do baile. Mas antes que Mello tivesse a chance de reclamar, expulsá-lo, destravar a arma, ou qualquer outra atitude esperada, Klaus começou a falar.

 - Sobre aquilo, se não for tratado na hora certa, tudo o que eu vim fazendo nos últimos anos será posto a perder e com isso não vou conseguir cumprir sua única condição quando ingressou nesse trabalho. Vim hoje falar sobre outro assunto, Mello. Um assunto de altíssima importância.

 Mello bufou insatisfeito, mas ergueu as sobrancelhas, como sinal de que estava ouvindo.

 - Lembra-se daquele trabalho de há pouco mais de um mês? O do agiota?

 Mello sentiu uma corrente fria atravessar sua espinha. Aquilo não parecia ser bom...

 - O que é que tem? Já é meio tarde pra reclamar dos meus métodos, não acha não?

 - Não é isso. Acontece que... – passou a mão pelos cabelos uma vez mais – Você se lembra de encontrar um rapaz ruivo naquela casa?

 Aquilo definitivamente não era bom...

 - Ruivo? Por que, deveria? – Mello fez sua melhor expressão de impaciência, torcendo muito para Klaus não reparar em nada que não devia.

 - Recebi há algumas horas a informação de que O’Hare cuidava de alguns jovens mais ou menos da sua idade, e que um deles o estava acompanhando naquela noite. Um rapaz ruivo, chamado... Jeevas, se não me engano. Mail Jeevas  -  Klaus falou, parecendo realmente preocupado com aquilo. Até que sua face contorceu-se em insatisfação, quando resmungou mais para si mesmo do que para o loiro à sua frente – Claro que teria sido bem melhor se aqueles incompetentes tivessem me dito isso semanas atrás.

 -... Jeevas? – Mello repetiu. Era a primeira vez que ouvia o sobrenome de Mail, e ter a posse daquela pequena informação nova estava lhe causando uma sensação... Estranha.

 - Mello, isso é perigoso – Klaus sentou-se no sofá desarrumado e cruzou os dedos debaixo do queixo, apoiando os cotovelos pesadamente em suas pernas – Se esse rapaz estava lá e escapou, é uma testemunha que não podemos ter“e não é com a polícia que estou preocupado”, completou em pensamento – Nós temos que encontra-lo. E rápido.

 O primeiro pensamento que passou pela mente de Mello foi que tinha feito uma besteira muito grande, e agora, mais de um mês depois, é que finalmente se dava conta de como deveria ter se irritado consigo mesmo por ter feito tal coisa. Por que tinha que ter se arriscado desse jeito?! Se descobrissem agora, ele também estaria com problemas! Se tivesse entregado Mail para Klaus desde o início... Então... Se tivesse entregado Mail para Klaus desde o início, o que teria acontecido? Sabia que era o que deveria ter feito, mas... Tinha um motivo para ele não o ter feito, certo? “Não, eu não me arrependo. Eu não poderia tê-lo entregado”. Mello se surpreendeu com o próprio pensamento, tão mais pela sinceridade e espontaneidade com que foi formado do por seu conteúdo, e sua expressão não passou despercebida pelo mais velho.

 Klaus ficou encarando o loiro de forma intrigada, mas logo resolveu deixar para lá. Concluiu que Mello estava apenas surpreso por pela primeira vez em anos ter cometido um erro daqueles. É, provavelmente era apenas isso.

 O mais novo tentou ajeitar sua expressão e não demonstrar nada nem em seu rosto nem em sua voz ao indagar – Vão mata-lo?

 - Obviamente.

 - Mesmo se ele não tiver visto nada?

 - Do mesmo jeito. Não temos escolha.

 Aquilo não fazia absolutamente nenhum sentido. Não era para Mello se importar com o destino do seu “hóspede”, não era para ele estar preparado para apontar sua arma para o homem que o criara caso este tentasse ir até seu quarto, não era para... Não era para ele importar. Não com aquele ruivo. Não com qualquer outra pessoa. Não era...

 Matar.

 Nunca gostou menos dessa palavra.

- E então? – Klaus ergueu o rosto, esperando alguma ação do loiro – Você vai colaborar?

 Mello virou de costas para o mais velho, não confiando em suas próprias habilidades de atuação e se irritando e assustando com isso – Não quero saber de nada disso, eu já fiz a minha parte.

“Típico” Klaus suspirou – Mas isso afeta principalmente você, mais do que a qualquer outro, mais do que a mim mesmo.

 E nessa hora Mello não resistiu e virou o rosto com um dos seus sorrisos irônicos – Você não adora dizer a toda hora que é meu “tutor”? Então o trabalho é seu, não meu.

 “Realmente típico”...

~*~

 Mello havia acabado de trancar com duas voltas a porta do apartamento quando a de seu quarto foi aberta e de lá surgiu o tão procurado ruivo.

 - Huh, pelo jeito ficou ouvindo atrás da porta – Mello comentou, sem conseguir olhar diretamente para aquelas orbes verdes. Ou talvez a questão não fosse “conseguir”, e sim “querer”. Talvez tivesse receio de que ao encarar o verde daqueles olhos, acabasse repetindo o que fizera de madrugada.

 - Eu ouvi meu nome – Mail disse simplesmente, parecendo muito calmo com aquilo tudo.

 - E? Tem alguma coisa pra dizer ou vai só ficar aí parado mesmo?

 Mas a resposta que recebeu foi a responsável por forçar Mello a erguer a cabeça e olhar diretamente para o rosto, agora com uma palidez estranha, do outro. O que era aquilo? Parecia...

 - Posso só terminar aquele livro de ficção científica antes de você me entregar? Queria ver o final da história.

 ... Parecia que uma aura de tristeza e resignação o estava envolvendo. Não havia ironia, ou mesmo a indiferença frente à morte que ele tinha apresentado na noite que se conheceram. Apenas a impressão de que ele já esperava por algo do tipo, e... O verde agora tinha um brilho tão triste, parecendo um mar que os ventos e a vida abandonaram, que quando Mello se deu conta, já tinha coberto a distância entre eles e parado bem à frente do ruivo.

 - Você é idiota? – nem o próprio loiro conseguiu identificar que espécie de tom era aquele que usava – Acha mesmo que se fosse pra te matar, eu não o teria feito naquela noite? – ergueu o braço e segurou com força o de Mail, onde agora, escondida pela manga comprida listrada, havia a cicatriz do tiro que dera na referida data.

 Mail mostrou-se verdadeiramente confuso.

 - Mas... Mas... Não é o que você deveria fazer? Livrar-se do problema? Fazer o que for preciso?

 Livrar-se do problema.

 Uma única e simples frase.

 Apenas três palavras.

 Como pôde ser o suficiente para fazer ruir a conclusão que Mello levou horas para chegar? Como pôde ser o suficiente para fazê-lo repetir o que jurou silenciosamente para si mesmo que não tornaria a fazer? Agir antes de pensar?

 Mail foi impedido de fazer qualquer outra pergunta confusa pelo hálito quente se aproximando cada vez mais de seu rosto. Quando deu por si, uma mão de Mello segurava sua nuca enquanto a outra continuava firme em seu braço, ambas puxando-o e mantendo-o mais perto, e sua boca foi invadida pela língua do loiro. O gosto aparentemente permanente de chocolate meio amargo, a forma como a língua deslizava pela sua, os lábios ligeiramente secos e bizarramente magnéticos. Tudo formava uma mistura de sensações que ele jamais chegou a experimentar e que duvidava que fosse encontrar semelhante em outro alguém.

 Os movimentos que o loiro fazia com sua boca eram possessivos, e mesmo o ar se tornando escasso para ambos, ele custou a parar. Ele não queria parar. E Mail não queria que ele parasse. Porque diferente do beijo inesperado durante a madrugada, esse de agora parecia transmitir uma estranha impressão de... Certeza.

 Ofegantes, e não sem antes uma última mordiscada no lábio inferior do ruivo, os dois se afastaram. Primeiro apenas o suficiente para buscar o oxigênio que seus pulmões pediam, e depois o bastante para olharem-se diretamente nos olhos. O brilho de tristeza tinha desaparecido. Ou pelo menos, se escondido por hora.

 - Eu não costumo dividir o que é meu – o loiro disse com a voz baixa e rouca, mas livre de qualquer contestação. Não sabia de onde tinha vindo aquela frase, mas estava longe de se importar no momento. Ele tinha encontrado o ruivo. Ele o tinha poupado. Ele tinha convivido com o outro por mais de um mês.

 Não dá pra ignorar.

 Mail era dele e de ninguém mais.


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Notas finais do capítulo

O que acharam do finalzinho? Faz muuuuuito tempo que eu não escrevo cenas do tipo, então perdão se ficou fraco.
Ah! Pode ser que o próximo cap demore um pouco mais do que uma semana pra sair, porque minha mãe cismou em me tirar do quarto e da frente do computador, até comprou aquela torre de Uno pra eu jogar com meus sobrinhos ._.