Tempestade escrita por Aislyn


Capítulo 5
Entre dias de sol e de tormenta


Notas iniciais do capítulo

"A revelação tardia de um amor profundo..."



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– Kiyo! Você não pode fugir do banho... Volte aqui!

Reiko corria pelo pátio do Kyuubantai atrás de seu irmão, estava com oito anos e como uma criança desta idade, odiava tomar banho. O Do-gi branco que ele trajava estava sujo e a hakama vermelha totalmente chamuscada por causa do treinamento de kidou que Reiko ministrava todas as tardes.

– Nee-sama! Se conseguir me pegar, eu juro que vou tomar banho.

O garoto começou a correr, no entanto, esbarrou em alguém e nem viu, caindo no chão.

– Kidou de novo, moleque? Está na hora de ser um homem de verdade!

Reiko viu Kensei aparecer diante de Kiyo, gostava quando ele usava shunpo para enganá-lo, pois assim, o garoto tinha mais vontade de aprender. Porém, as discussões logo começariam, mais uma vez, o taichou trazia uma katana de madeira para substituir a que Kiyo havia quebrado num treino entre eles. Reiko desaprovava os métodos de Kensei.

– Kensei-aniki! Eu aprendi o Sai, consegui prender a nee-sama!

– Sai, é? Humm...

A expressão de pouco caso por parte de Kensei deixou Kiyo irritado, ele levantou-se e chutou a canela dele. Reiko saltou e puxou Kiyo pelo braço, não queria que seu irmão fosse castigado com mais duas horas de treinamento, não depois de ter se esforçado tanto para aprender o bakudou número um. A ama do garoto, Sora Hayashi, apareceu e interrompeu a briga antes mesmo de começar.

– Kiyoku-kun... Preparei o seu banho, ande antes que esfrie.

O garoto aceitou, afinal, Reiko o havia apanhado de qualquer jeito. Antes que ele saísse, Kensei jogou a katana de madeira e Kiyo a pegou agilmente, sorrindo em seguida. O taichou retribuiu o sorriso, aos poucos estava se acostumando com a idéia de que o garoto não era mais um bebê e queria que ele crescesse do jeito certo, sem os mimos que Reiko quase sempre concedia.

– Você poderia no mínimo fingir que está contente com o progresso dele em kidou!

– Que foi isto?! – Ele queixou-se, havia recebido um soco no ombro direito. – Está treinando em pedras, é? Seu soco era mais fraco...

– Fazer isto todos os dias em você me torna mais forte! – Ela cruzou os braços e amarrou a cara. – Já estou cansada de você, sabia? Não sabe o quanto são importantes para Kiyo os treinamentos diários...

– Bla... Bla... Bla... – Kensei imitou o gesto de Reiko. – Você me irrita, mulher!

– Grosseirão!

Ela pisou no pé do taichou e saiu dali furiosa. Kensei adorava o jeito que ela andava quando estava brava, colocava os braços para baixo e prendia-os junto ao corpo, punhos fechados e passos largos. Oito anos e ainda não conseguia dizer na verdade o que sentia pela mulher que encantava cada minuto de seus dias. Reiko já havia desistido de esperar que ele dissesse o que ela tanto queria ouvir, preferiu acreditar que Kensei a amava do jeito dele, único e indefinível.

– Nee-sama, sabia que eu ouvi algumas shinigamis falando que hoje é um tal de “Dia de São Valentim”? – Comentou Kiyo algumas horas depois, já em seu quarto. – Elas estavam em uma loja que fez o maior sucesso. Parece que é uma novidade que alguém trouxe do mundo real...

– Ah, você foi às compras hoje com a Sora-chan...

– Sim! Ela comprou um doce chamado de “giri-choco” para presentear o Kasaki-sama. Disse que era para retribuir as gentilezas que ele fazia por ela, ajudando-a em tudo.

– Eu realmente desconheço estes costumes que vêm do mundo real, otooto-chan. Agora, vá dormir... Já passou da sua hora.

– Boa noite, nee-sama! Eu amo você.

– Eu também amo você, meu querido.

Reiko adorava o ritual que fazia com seu irmão todas as noites antes de ele dormir. Conversavam e após um longo abraço, ele deitava e pegava no sono como um anjo, coisa que nem de longe era. Ela havia mentido quanto a não saber do que se tratava aquele dia, tinha a ciência de que as mulheres do mundo real presenteavam seus amados com chocolates feitos em casa e também, outros homens que eram gentis com elas, com chocolates que compravam. Era muita besteira pensar que um dia comum poderia tornar-se tão especial, mas, tinha inveja das mulheres que viviam no mundo real, lá a liberdade para o amor era bem maior do que em Seireitei, principalmente.
Quando abriu a porta de seu quarto, Kensei esperava-a sentado na cama, com uma caixa em mãos, embrulhada com papel vermelho. Ela desconfiou, contudo, não quis perguntar nada, apenas aceitou o presente que ele ofereceu também sem falar nada. Ao desembrulhar o presente, começou a sorrir. Sabia do que se tratava, já que tinha visto alguma coisa parecida na nova loja.

– Você é maravilhoso...

– Pensei que eu fosse um grosseirão! – Ele rebateu fingindo mau humor.

– Um grosseirão gentil... – A oficial deitou a cabeça no colo dele e pegou um dos chocolates em formato de coração, deixando a caixa ao seu lado. – Ah, Kensei... Obrigada, apesar de eu achar que o costume é ao contrário.

– Danem-se os costumes! Eu provei um desses, aliás, comprei várias caixas. A dona da loja estranhou um pouco, mas nem questionou...

– Seu salário está ótimo, hein? – Comentou ela antes de morder o chocolate. – Realmente, é uma delicia...

– Quer companhia esta noite? – Perguntou Kensei, há anos que não se sentia mais sem jeito ao lado dela.

– E eu nego a sua companhia alguma noite? Nem sei por que pergunta. É claro que eu quero, baka.

– Reiko... – A expressão de Kensei tornava-se séria e o tom de sua voz também. – Pode parecer besteira, mas, eu preciso perguntar uma coisa para você.

– E o que é? – Ela retirou as luvas do taichou e começou a beijar cada um dos dedos dele. – Não me assuste...

– Quando irá contar a verdade para Kiyo? Ele está crescendo e eu não acho certo esconder tudo o que aconteceu no passado.

– Pretendo contar no próximo aniversário dele. Vou deixar com que Kiyoku escolha entre ser um shinigami, ou, voltar para a mansão Shimazu futuramente e cuidar de tudo. Meu tio está desempenhando muito bem o papel que era de meu pai, contudo, ele sabe melhor do que ninguém que caberá somente a Kiyo fazer a escolha.

– Ótimo! Saiba que eu vou estar ao seu lado neste dia...

– Eu sei, é por isto que eu... – Ela calou-se, havia prometido para si mesma que jamais diria que o amava e continuaria mantendo sua promessa.

– Por isto o quê?

– Ah... Só ia dizer que é por estar sempre comigo em situações difíceis que eu não deixaria de contar com você.

Um ano tranqüilo se passou na Soul Society, o dia do aniversário de nove anos de Kiyoku havia chegado e Reiko fez questão de que não passasse em branco. Além da comida tradicional, ela havia comprado um bolo em uma doceria e com a ajuda de todos do Kyuubantai, o salão de reuniões havia sido decorado. Kiyo recebeu alguns presentes, mas sem dúvidas, o que mais havia gostando era o que ganhou de Kensei: um uniforme idêntico ao que seus oficiais usavam, em tamanho menor e luvas iguais as dele. O garoto vestiu com empolgação, e assim que colocou as luvas, fez uma pose para todos.

– E então, eu pareço um membro do bantai agora? – Perguntou o garoto denotando empolgação em sua voz.

– A cada dia que passa, ele se parece mais com o Kensei-taichou – disse Shinobu para Reiko.

– Acho que é a convivência, Shinobu-kun...

Reiko e Shinobu estavam sentados diante da mesma mesa, o taichou brincava com o aniversariante junto aos outros oficiais. O yonseki estava pensativo, às vezes, seu olhar se chocava com o de Reiko, mas ele logo disfarçava.

– Reiko-chan... Você o ama de verdade, não ama?

– O quê? – A pergunta tomou Reiko de surpresa, porém, não tinha coragem de mentir para Eishima Shinobu. Tinha uma dívida eterna com ele e lhe devia lealdade. – Bem... Eu amo o Kensei com todas as minhas forças. Sinto como se nós fôssemos uma família, ainda mais quando ele me ajuda tanto com o meu irmão. Até hoje, nunca disse isso para ele... Assim como, também nunca ouvi tais palavras por parte dele.

– É uma pena, doce Reiko – ele tocou no rosto dela, queria confortá-la. Invejava seu superior, achava que uma mulher como Reiko era digna de demonstrações de amor, tanto por palavras, quanto por ações. Muitas vezes se perguntou se ela nunca havia reparado que dentro do coração dele sempre houvera pequenas brasas que aguardavam para entrarem em chamas se fosse correspondido. – Kensei é um homem de sorte. Mas, eu sei que ele deve amá-la, tanto quanto... – Ele parou de falar quando ouviu os risos de Kiyo ao pular nas costas do taichou. – Tanto quanto você o ama – finalizou com dificuldade.

– Shinobu-kun, você tem sido muito importante na minha vida... Muitos anos se passaram desde que eu entrei para este time. Eu era uma garota mimada, não tinha experiência alguma de vida. Hoje me vejo como uma mulher madura e não somente diante do espelho... Sinto que sou uma, entende? – Reiko parecia confusa, no fundo, sabia bem aonde queria chegar. Por muitas vezes pensou que certas coisas deveriam ficar no passado para sempre, mas achava que tinha que ser sincera com ele, e com ela mesma. – Muguruma Kensei surgiu na minha vida como uma tormenta, bagunçou tudo por completo no início. A princípio, eu o odiava, não suportava a idéia de ter um homem tão grosseiro como superior, tanto que ele lembrava um pouco o velho Kenpachi. Aos poucos tudo foi mudando, eu reparei que por detrás daquela brutalidade toda, havia um homem gentil, que daria a vida por qualquer um de seus homens, que se preocupava com todos ao seu redor. Nesse meio tempo, eu vi em você o homem que Kensei jamais seria... Você é muito mais do que gentil. É doce, cortês, culto. Um dia eu disse para mim mesma, você é um sonho. Um sonho que eu estava pronta para viver, se já não estivesse perdida em outro sonho sem ao menos ter reparado. Demorei muito para perceber que ele já fazia parte da minha vida e eu juro, Shinobu-kun, lutei muito para não me deixar envolver... Mas, quem pode lutar contra uma tormenta? Ela devasta tudo o que estiver ao seu alcance... Derrubou as minhas defesas, alagou o meu coração com bons sentimentos.

– Você não sabe o quanto me alegra ouvi-la falar sobre isto – Reiko pegou na mão dele e ele a acariciou. – Eu entendi, perfeitamente. Por isso mesmo resolvi não tirá-la do meio desta tormenta. Eu sempre soube que meus braços não poderiam protegê-la como eu gostaria... Como ele pode fazer.

– Não fale besteira... Você me protegeu da morte certa! Isso eu não posso esquecer. Shinobu-kun – Reiko tentou controlar as lágrimas, sentia um aperto no peito. – Se eu realmente quisesse ter sido salva desta tormenta, pode ter certeza que os seus braços teriam sido o abrigo mais perfeito, seguro. Não se subestime, querido. Eu nunca quis lhe dar falsas esperanças, acho que eu jamais machucaria alguém que amo... Quero que você saiba que nesta existência o amor que tenho para lhe oferecer é fraterno, mas, em outra existência se nos encontrarmos, tenha a certeza de que se você chegar antes da tormenta, este sentimento poderá ser diferente.

– Eu realmente não sei se um dia a nossa vida aqui será findada, também não quero pensar nisso, apesar do risco que corremos como shinigamis. Mas, caso isso ocorra para todos nós e houver a chance de um recomeço, vou reencontrá-la e procurarei invadir a sua vida como um sol arrebatador, que jamais deixará a tormenta se fazer presente. Agora, vá para lá brincar com o seu irmão... Muguruma Kensei sempre será o maior espelho da vida dele, essa criança foi abençoada por ter um homem assim como figura paterna, digamos desta forma.

– Kiyoku foi abençoado sim, Shinobu-kun... Ele tem os melhores exemplos ao seu lado, e você, é um dos maiores. Como pessoa, eu sempre falo que ele deve se espelhar em você também, fique sabendo.

– Para mim é uma honra! Vou fazer de tudo para continuar merecendo esse reconhecimento.

– Continue sendo você mesmo sempre! – Ambos se levantaram e ela abraçou o yonseki. – Arigatou!

– Reiko-chan... Para que meu coração possa se acalmar de vez, posso aproveitar este momento? Quero dizer... Eu preciso falar, é a condição para que eu encontre paz novamente. Se me achar egoísta, por favor, me diga.

– Claro!

– Eu amo você... – Ele parou de abraçá-la e segurou as duas mãos dela, estava sorrindo. – Sei que não é da minha boca que você deseja ouvir isso, contudo, espero do fundo do meu coração que você ouça por parte dele também. Você é tudo o que um homem pode desejar, nunca se esqueça. Se um dia Kensei a fizer sofrer, eu nunca vou perdoá-lo, por isso, todos os dias eu rezo para que ele a faça feliz. Tão feliz quanto eu poderia fazer... Aquela vez você disse que eu era um irmão. A partir de hoje você também é a minha irmã. Minha querida irmã e eu vou sempre estar com você, protegendo-a de todos os males. Mesmo quando eu morrer, continuarei zelando por você, Reiko...

O coração da shinigami queria sair pela boca, se já não controlava as lágrimas antes, agora as deixava rolarem livremente, sem se importar com os outros ao seu redor. Sentiu um frio repentino invadir o seu corpo, algo estava errado.

– Shinobu-kun... Deste jeito parece que nunca mais vamos nos ver. Não fale assim, nunca mais!

– Não fique brava, por favor. Eu só senti a necessidade de abrir meu coração para você... Assim, garanti a minha paz e me sinto muito mais feliz, pode acreditar.

– Eeeee! – O elo dos dois foi quebrado por Kiyo que veio correndo e pulou sobre as costas de Shinobu, adorava fazer aquilo com todos. – Shinobu nii-sama! Eu sei que não posso interromper conversas de adultos dessa forma, mas, o aniki prometeu que me daria uma recompensa caso eu fizesse isto... Então, não fiquem bravos comigo!

– Ah, o Kensei fez isso é, Kiyoku? – Perguntou Reiko, ela olhava enfurecida para o taichou.

– Não conta para ele, nee-sama! Senão, eu perco a minha recompensa...

– O que ele vai dar para você? – Shinobu estava rindo da situação, conhecia bem a imaturidade de Kensei.

– Uma katana de verdade! – Os olhos do garoto brilhavam. – Finalmente eu vou poder cortar como um homem!

– Kiyoku – Reiko o desaprovou com o olhar, odiava o termo “cortar”. – Amanhã mesmo eu lhe darei uma katana e mais o dobro da sua mesada se você for até o seu “aniki” e disser para ele que eu o mandei para aquele lugar que ele já deve imaginar!

– Eu vou agora mesmo, nee-chan! – Assentiu o garoto com inocência, não entendeu o que Reiko quis dizer sobre “aquele lugar”. – Promessa entre irmãos?

– Promessa – ela ofereceu o dedo mínimo para Kiyo e ele fez o mesmo, selando um acordo com ela.

– Eu vou falar com os outros, Reiko-chan! Por favor, fique bem.

– Você também! Nos vemos mais tarde, Shinobu-kun!

Após cerca de três horas de festejo, Reiko chamou o irmão até o jardim, Kensei já os aguardava sentado em um banco de pedra. A oficial respirou profundamente, já era tempo de contar a verdade para Kiyoku e ela temia a reação dele. Aos poucos, Reiko foi entrando no assunto, explicava de uma forma mais branda o que aconteceu com seus pais e o garoto ficou mudo o tempo todo, só quando ela finalizou Kiyo finalmente falou.

– Então quer dizer que é mentira a história de que você não conheceu os nossos pais, nee-sama? Mas... Por que mentiu para mim?

– Porque eu não queria que o peso do sobrenome Shimazu caísse em suas costas tão cedo, meu amor. Fiz isto para que pudesse fazer a escolha que seu coração mandasse, no tempo certo.

– Nee-sama... Eu nunca vou entender! – O garoto afastou-se de Reiko, lágrimas escorriam por seu rosto. – Vocês escondem coisas demais de mim. Pensam que eu não sei o que existe entre vocês dois.

– Kiyoku! – Kensei pegou o garoto pelo braço e o puxou para perto dele. – Você já é um homem, então, deve entender sim que Reiko omitiu isso para o seu bem. E quanto a essa sua última afirmação, depois conversaremos a respeito.

– Me solta, aniki! Eu nunca vou perdoar vocês... Nunca!

Kiyoku saiu correndo assim que Kensei soltou o braço dele. Reiko levantou-se, entretanto, o taichou a parou antes que ela saísse atrás do garoto.

– Dê um tempo para ele, Reiko...

– Mas, ele não pode sair sozinho a esta hora da noite!

– Kiyo conhece isso tudo melhor do que nós, acredite.

O que Kensei e Reiko não sabiam era que o garoto conseguiu fugir para longe, aproveitando-se de uma brecha aberta por shinigamis que foram patrulhar alguns distritos de Rukongai. Aquele mundo era realmente assustador, não acreditava que estava vendo pessoas dormindo na rua, mendigando. Algumas crianças aproximaram-se dele e o cercaram, todas com pedaços de madeira nas mãos.

– Um nobrezinho...

– Deixem-me passar! Não quero machucar vocês!

– Nós é que vamos machucá-lo... Ande, passe as suas roupas.

– Nunca!

Kiyoku encarava um dos garotos, era o maior de todos, usava um kimono azul em farrapos e estava com os pés descalços, assim como os demais. Num salto, parou diante de Kiyo e desferiu um golpe com a sua arma de madeira improvisada contra ele. Em poucos segundos, todos foram para cima de Kiyo, contudo, ele os derrotou rapidamente e saiu correndo dali. Queria ficar o mais longe possível daquele distrito, então, encontrou uma floresta e ali com certeza seria um bom esconderijo.

“Nee-sama... Eu sempre confiei em você! Era o meu espelho...”

Os pensamentos do garoto foram cortados por gritos e naquele momento, o seu sangue gelou. Num misto de coragem e curiosidade, Kiyo aproximou-se do local em que pensou ter ouvido os gritos, seus olhos arregalaram-se. Teve que tapar a própria boca para não gritar e então, saiu correndo o mais depressa que pôde, voltando para Seireitei.

– Kensei... Aniki... Acorde! Aniki!

Por sorte, a porta do quarto de Kensei estava destrancada e ele pôde entrar. Tentava de todas as formas acordar o Taichou, até que, obrigou-se a pular em cima dele. O shinigami acordou assustado, levantou-se e acendeu a luz.

– Kiyo... O que aconteceu? Está ferido? – Kensei sentou-se sobre a cama novamente e abraçou o garoto que não parava de tremer.

– Não... Eu preciso contar o que vi, aniki.

– Acalme-se moleque e me conte – ele afagou os cabelos de Kiyoku, queria acalmá-lo.

– Foi horrível, nii... Um grupo de homens gritava na floresta de Rukongai, e eu me aproximei, fiquei escondido por entre as árvores. Não sei bem o que vi, só sei que algo saía pela boca deles e eles desapareciam... Sofreram demais. Pude notar mais três figuras por entre a penumbra, só não consegui saber quem era porque saí correndo de lá.

– Kiyoku... Isso o que me falou foi muito importante, não se preocupe, eu irei averiguar. Agora, me prometa que irá falar com a sua irmã e que a perdoará. Sabe, ela o ama e daria a vida por você.

– Eu sei, aniki, vou até ela agora. E eu prometo, mas também, quero que você me prometa que não irá se machucar. Algo está me dizendo que não vou voltar a vê-lo... Nunca mais.

– Ora, moleque estúpido! Ainda tenho muito a ensinar para você, afinal, quero que um dia possa tomar o meu lugar! – Kensei tentava esconder a preocupação que invadiu o seu ser. – Nada vai acontecer... De qualquer forma, você tem que se tornar mais forte do que eu para proteger a sua irmã.

– Então, eu já decidi, Kensei -taichou! Vou treinar o quanto puder aqui no bantai e quando estiver pronto, irei para a academia e eu garanto que vou me formar em pouco tempo.

– Confio em você, Kiyo. Amanhã, nos vemos na mesma hora para o treino, certo?

Muguruma Kensei e seus oficiais saíram na manhã seguinte para averiguar o que estava acontecendo, já sabia que moradores de Rukongai desapareciam sem deixar rastros há cerca de um mês e a pista que Kiyoku deu era o melhor que até então todos os investigadores haviam conseguido. Reiko ficou para cuidar de tudo, afinal, um bantai não podia ficar nem um minuto sem a atenção de um oficial. Já era noite e tudo o que ela sabia era que o grupo acamparia na floresta, e que haviam descoberto vestígios do grupo de investigação que ele mandou na mesma noite em que Kiyoku contou o que vira.

– Kiyo... Obrigada por ter me perdoado.

– O aniki abriu os meus olhos – sussurrou o garoto. – Então, eu decidi que vou me tornar um shinigami de verdade e claro, vou levar com orgulho o nome Shimazu comigo, nee-chan.

– Que bom, meu querido irmão... Ah, a propósito...

Reiko não pôde dar a boa notícia para o irmão, uma mensagem de emergência ecoava em Seireitei. Reiko teve que se controlar, não podia deixar-se levar pelas emoções. Assim que instruiu Kiyo sobre o que fazer, ela pegou a sua zanpakutou e saiu correndo, ignorava a mensagem que era expressa aos taichous.

“Perdemos os sinais dos poderes espirituais do taichou do Kyuubantai, Muguruma Kensei e da fukutaichou, Kuna Mashiro...”

Aquelas palavras martelavam na sua cabeça, nem mesmo toda a sua velocidade era o bastante. Reiko congelou, diante da barraca com o símbolo de seu bantai, Eishima Shinobu, Kasaki Heizou e Gizaeimon Toudou estavam caídos.

– Amigos... – Balbuciou vacilante. – Meus queridos amigos... Todos mortos! Não pode ser...

Ela verificou, nenhum estava com vida. Não conseguia esboçar emoção alguma a principio, a não ser quando se aproximou do corpo de Shinobu. Ele estava com um corte no peito, não parecia ter sofrido tanto. Reiko tocou no rosto dele, já estava frio, com pesar, passou a mão sobre os seus olhos e os fechou para a eternidade. Desesperada, ela começou a chorar, deixou-se cair no chão e trouxe o corpo dele para o seu colo, abraçando-o. Não se importava pelo fato do sangue dele estar manchando-a, era a segunda vez que o via daquela forma, todavia, não haveria mais volta. Parecia ter perdido o chão, as palavras dele na festa nunca fariam tanto sentido se aquilo não estivesse acontecendo.

– Shinobu... – Ela falava com dificuldade. – Você foi o primeiro homem a dizer que me amou e não somente isso, seus lábios foram os primeiros a tocar os meus, por mais que você não tenha se lembrado. Apesar de que, algo me diz que você lembrava sim... Só não queria magoar o Kensei... Você se sacrificou por nós dois, não foi? Eu... Eu nunca fui digna do seu amor, meu querido irmão. Nunca! – Ela gritou, olhou para o céu, a lua cheia acabava de ser revelada por nuvens que iam embora, parecia estar ali para confortá-la. – Agora eu sei que a nossa vida é efêmera. Um dia estamos fazendo planos, no outro, a morte pode nos rondar e nos levar sem mais. Agora mais do que nunca, eu vou lutar pelo amor do Kensei, por respeito a você que abriu caminho tão gentilmente para que nós pudéssemos ser felizes. Eu vou vingar a morte de vocês... Eishima Shinobu... É uma honra chamá-lo de irmão.

Reiko respirou fundo, tinha que procurar por algum sobrevivente. Antes, precisava prestar uma última homenagem a Eishima Shinobu. Ela aproximou-se dos lábios dele e o beijou, suas lágrimas caíam sobre aquele rosto angelical, antes tão cheio de vida. Quando acomodou o corpo dele gentilmente no chão, ajoelhou-se perante Kasaki.

– Vocês foram os homens mais honrados, valentes e fiéis que eu já conheci! Kasaki-sama, obrigada por ter estendido a mão para mim quando eu caí o primeiro tombo... Pelas noites de sakê, xadrez, treinamentos de bakudous. Por toda a sua paciência quando eu falava mal do Kensei. Você foi como um pai para mim... – Após cerrar os olhos do sanseki, ela prestou a mesma homenagem a Toudou. – Toudou-san! Me perdoe por ter mentido para você aquele dia a respeito das rachaduras, uma mentira tão inocente tem um peso muito grande num momento como este. Sei que eu era uma das exceções na sua vida, você sempre tentava sorrir quando me via e eu ficava tão orgulhosa disto, apesar de temer o seu sorriso. Obrigada por ter me ensinado a ter paciência com algumas funções no Kyuubantai e acredite, você foi um dos homens mais brilhantes que eu já conheci. A vocês três, eu prometo... Isso não vai ficar impune! Me perdoem por deixá-los aqui, mas, vocês terão um funeral digno quando eu voltar... À altura da grandeza que vocês demonstraram ter sempre, comigo, e com todo o Kyuubantai. Sei que após a morte passam-se os anos e a tendência é o esquecimento, porém, vocês viverão para sempre no meu coração. Serão meus guias enquanto eu viver!

Infelizmente, ela teria que insuflar-se de coragem e seguir em frente, precisava descobrir onde estava Kensei, Kaname e Mashiro, não pensava que os três estivessem mortos também. Reiko impulsionou o corpo e levantou-se, estava um pouco tonta. Após caminhar sem rumo, não quis acreditar no que seus olhos viram...

– Kensei... O quê?

– Reiko... Saía daqui, agora!

Ela não obedeceria. O corpo de Kensei estava coberto por sangue e parecia que uma máscara se formava em seu rosto, já havia tomado conta da metade esquerda dele. Era visível o sofrimento do taichou, ele segurava a cabeça com as duas mãos e gritava. Reiko aproximou-se e estendeu a mão.

– Kensei... O que aconteceu? Por que isto está tomando conta de seu rosto, parece até...

– Um hollow... – Completou com pesar.

Quando ela finalmente tocou o rosto dele, Kensei a empurrou e fez com que caísse longe. Reiko levantou-se, não deixaria que ele fosse embora.

– Eu não vou me afastar de você, Kensei! – Ela aproximou-se novamente. – Kasaki-sama, Toudou-san... Shinobu-kun... Estão todos mortos! Me diga quem fez isto!

– Por favor, Reiko... Não estou conseguindo mais controlar isto, está gritando em meu interior. Vá embora daqui e salve a sua vida!

– Não! – A oficial teimou e num ímpeto, o abraçou. Kensei a apertou com força contra o seu corpo, naquele instante, a máscara começou a tomar conta do lado direito de seu rosto. Reiko sofreu ao ouvir o lamento dele. – Vou ficar aqui com você, por mais difícil que possa ser...

– Takeuchi – suplicou ele. – Isto é uma ordem...

Assim que ele terminou de falar, afastou-se de Reiko, pois sentia algo querendo rasgar o seu corpo. Ela sentiu o pavor tomar conta de seu ser, o homem que amava estava se transformando em um monstro, algo que não conseguia definir. A máscara no rosto dele estava completa, podia enxergar um brilho vermelho em seus olhos.

– Você tem que lutar contra isto, por favor... Kensei, você é mais forte do que isso!

– Eu já não consigo mais – ele estava ofegante, sua voz quase inaudível. – Prometa que vai se salvar... Prometa que irá seguir em diante e que transformará Kiyoku em um homem de verdade. Prometa que cuidará de tudo na minha ausência... Prometa!

– Não vou prometer, Kensei... Você estará ao meu lado e vai presenciar tudo com os seus próprios olhos. Eu...

Reiko já não parava de soluçar, sentia uma dor no peito, tudo o que mais amava parecia estar se dissolvendo perante ela. Queria parecer forte diante daquela situação, contudo, estava amedrontada. Não ousava admitir... Não podia... Seus pensamentos estavam em desordem. Se por um acaso aquele fosse realmente o fim, teria que expressar tudo o que sempre se negou a dizer para ele. Ela conseguia sentir o esforço que Kensei fazia para manter o controle sobre si mesmo e por isto, tinha que ajudá-lo.

– Reiko...

– Não fale, poupe seus esforços... – Ela segurou nas mãos dele, apesar de nem parecerem mais mãos humanas e as apertou com força. – Muguruma Kensei! Não pense que eu estou dizendo isto por achar que nunca mais iremos nos ver. De qualquer jeito, eu preciso que você saiba o que eu realmente sinto por você.

– Eu sei o que você sente por mim... Não há mais tempo, Reiko... Antes que eu me afaste para não machucar ninguém, vou falar algo que há anos tento e não consigo. Eu amo você, de uma maneira quase inconfessável... Nos seus olhos eu encontrava a resposta para tudo... Sempre amei você, até mesmo com as constantes mudanças de humor e ânimo que eu tinha. Não importa o que vai acontecer de agora em diante, mas, quero que você acredite que vou guardar o seu doce sorriso para sempre em meu coração e esse seu olhar, ficará eternamente gravado em minha mente.

– Kensei... Por quê? – Ela olhou no fundo dos olhos dele, ainda conseguia enxergar a sua essência. – Por que parece uma despedida? – Reiko não o deixaria sem confessar o seu amor. – Eu amo você! Sempre senti que fios invisíveis atavam o meu destino ao seu e por isso, as nossas vidas estarão amarradas para sempre. Aconteça o que acontecer...

– Minha Reiko – desejava abraçá-la, mas daquele jeito poderia machucá-la. Quando sentiu a presença daqueles que o traíram, num último esforço para manter-se sob controle, desferiu um soco contra o estômago de Reiko. Kensei usou força suficiente para fazer com que ela pudesse acordar somente quando tudo estivesse acabado, não queria de forma alguma que ela soubesse da verdade. – Me perdoe...


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